Hanako e Nene juntos passeando- ...
Tomei um enorme cuidado ao escolher o que vestiria no dia.
Não podia ser nada muito relaxado para ficar bem para a Nene. Porém, não podia ser nada muito arrumado para o meu irmão não desconfiar.
E eu abusei da sorte: pedi dinheiro à minha mãe para comprar um pudim na padaria para a Yashiro.
Logo depois de comprar a guloseima, dirigi-me até sua casa para irmos juntos. Quase infartei ao ver que não foi ela que atendeu à porta, e sim quem devia ser seu pai.
Ele era uns 20 centímetros de altura mais alto do que eu. Sua aura era assustadora. O cabelo era preto e ondulado como o da Yashiro. A parte do meu cérebro que não estava surtando ponderava se o cabelo da crush era loiro natural ou se ela pintava.
— Pois não? — falou, a voz grossa dando-me arrepios.
— A ... a Yashiro está? — perguntei, evitando fazer minha voz tremer.
— Sim. O que quer com ela?
Fui salvo pela própria.
— Ah, você chegou! — virou para o progenitor enquanto aproximava-se — Pai, esse é o Amane Yugi. Ele que me chamou p'ra ver o eclipse!
Ele olhou de mim para a filha diversas vezes. Engoli em seco.
— Não voltem tarde.
— Pode deixar, Senhor Yashiro. — garanti.
Caminhamos os dois em silêncio até a escola. Eu guiei-a até a laje, onde teríamos uma bela vista do espetáculo.
Estendemos uma toalha verde sobre o chão e colocamos o que trouxemos sobre ela.
— Aqui. — extendi o pudim a ela — É o seu doce favorito, né?
— Ah, obrigada! Você lembrou ... — falou, admirada — Eu também trouxe uma coisa p'ra você! — pegou um saquinho de pano florido e me deu — Donuts caseiros!
Agradeci, os olhos brilhantes de felicidade e gratidão.
Conversamos sobre assuntos aleatórios enquanto comíamos, rindo de bobagens. E a conversa continuou enquanto eu montava o telescópio.
— (...) Só daí eu consegui pegar ele e colocar de volta na gaiola!
— Cara, o teu hamister faz jus ao nome.
Rimos novamente.
— Por que você gosta tanto de astronomia, Hanako-kun?
— ... Vai soar muito idiota ...
— Claro que não! E se soar, qual o problema? Todo mundo tem sua parte idiota.
Engoli saliva, continuando a montar o equipamento para não ter que olha-la ao falar.
— A gente sempre acha que somos muito importantes e, às vezes, que o mundo pararia de girar se morressemos. Que somos grandes.
"E então vemos que nosso planeta é apenas um entre sete, e nem mesmo o maior deles. E que nosso Sol nem é tão grande. E que nossa Galáxia, tão gigante, é apenas mais uma entre bilhões.
Pensando assim, somos menos que pó. Inúteis para o universo, tão vasto e lindo e inalcançável.
Mas somos importantes de diferentes maneiras para quem está ao nosso redor. Somos indispensáveis para poucos que também são indispensáveis para nós.
Acho lindo como essa relatividade se aplica à astronomia. Como um sistema solar é tão inútil e importante ao mesmo tempo. Como cada estrelinha junta, em sua pequenez insignificante, é importante para uma complexa constelação.
Como cada um dos astros que admiramos é tão insignificante e longe, mas ao mesmo tempo tão importante e perto ..."
Interrompi-me, vermelho. Acho que falei demais.
— ... Essa é uma visão muito linda sobre o espaço. — comentou ela — E é bem a sua cara, Hanako-kun!
Demorei dois segundos para processar a informação. Logo que o fiz, ri e Nene também riu.
— Olha só, quer dar uma olhada nas estrelas enquanto ainda não chega a hora do eclipse?
— Quero, sim!
Passei um minuto inteiro para ajeitar o ângulo.
— Olha só: aquele é vênus. Parece com uma estrela. Chamavam de Estrela Dalva. — falei, dando uma olhada nele antes de deixar minha acompanhante observar — Não é lindo?
— É, sim! — concordou, facinada — O que mais dá para ver?
Perdi a conta de quantas vezes reposicionei meu telescópio – sempre consultando meu livro de astronomia, claro. Yashiro ficava cada vez mais facinada com esse universo pelo qual sempre fui apaixonado.
— E ... pronto! — ajeitei o ângulo uma última vez — Essa é Antares!
— Wow. Nunca ouvi falar até hoje. — confessou, chegando perto para observa-la — Me fala sobre ela, também?
Engoli saliva com dificuldade. Respirei fundo lara falar.
— Ela é uma supergigante vermelha da constelação Scorpios. 16⁰ estrela mais brilhante do céu noturno e, na minha opinião, uma das mais lindas também. Tem mais de 11 milhões de anos. Muitos acham que ela já morreu, e que apenas parte de sua luz nos permite saber de sua existência magnífica ...
Calei-me subtamente. Se continuasse assim, viraria uma declaração. E eu não merecia declarar-me à ela.
— Gostei de Antares.
O sorriso bobo veio sem eu deixar.
— Que bom. Eu amo Antares.
— 'Cê sabe o quão longe ela 'tá?
— Aproximadamente 554,5 anos-luz. — informei, virando-me para o astro em questão, apoiando a cabeça em meu punho fechado — Isso tudo para chegar perto de uma estrela que talvez nem exista mais. Uma estrela talvez inútil pensando num contexto universal, mas p'ra mim tão importante, linda e, acima de tudo, inalcançável.
"É", pensei. "Acabei me declarando sem querer. Merda!"
— Você ... tem sua própria Antares? — questionou, já não mais observando pelo telescópio.
Corei dos pés à cabeça.
— Tenho. — confessei — Uma perfeita Antares, sem dúvida.
— Oh. — soltou, e corou também, abrindo um de seus sorrisos doces — Eu ... eu acho que também tenho um Antares e só recentemente me dei conta. — disse, olhando-me com um carinho quase palpável.
Eu sei que você, leitor, provavelmente está querendo me matar por ter certeza absoluta de que o Antares dela era eu e eu estar com grandes dúvidas quanto a isso.
Em minha defesa, não dá para ter certeza absoluta de algo assim quando se está vivendo o momento a não ser que a outra pessoa diga com todas as letras.
Uma coisa é supor o quase óbvio, e outra é ter o quase óbvio confirmado.
Por esse motivo eu encontrava-me surtando internamente, tentando descobrir se era eu ou não.
— E quem seria o sortudo? — provoquei com um sorrisinho perverso.
— Eu só falo sobre ele se você falar sobre a sua. — sentenciou.
— ... Justo. — cedi.
Eu provavelmente me ferraria lindamente. Porém, taquei o "foda-se" mais lindamente ainda.
— Ok. Ele ... ele é um amorzinho de pessoa, mas nem todo mundo sabe disso. E um fofo.
— Ele não é um crush veterano babaca, ou é? Porquê da última vez deu merda, e não foi pouca.
— Não, não! Pelo contrário! — balançou a cabeça negativamente — Ele 'tá na nossa sala. E ele é um ótimo amigo e sempre me ajuda quando eu preciso!
Forcei meu coração garganta abaixo quando ele tentou escapulir pela boca. Criar expectativas era a pior coisa que eu poderia fazer.
— Nossa, Yashiro. Deu sorte grande, hein?
— Dei, sim! — concordou, sonhadora — Sua vez. Conte-me sobre a sortuda que roubou o seu coração.
Abri um sorriso amarelo, e ela riu. Puxei bastante ar para, enfim, expressar meus sentimentos mais profundos em palavras:
— Sabe, eu sempre achei ela linda. Ela tem aquele jeitinho meigo e doce e bobinho que pouca gente tem hoje em dia mesmo depois de machucarem ela tantas e tantas vezes. Cara, eu ... eu devo parecer um acéfalo perto dela. Dá pane no meu cérebro toda vez que ela faz qualquer coisa! E, tipo, não dá p'ra evitar! E ela tem um abraço tão, tão gostoso ... — falei tudo de uma vez, deixando-me levar — Sério! E ela me faz me sentir tão especial, e ... e como Antares ... eu não mereço ela. E a última coisa que quero é trazer a primeira pessoa a ser gentil comigo pro buraco onde eu 'tô.
É. Eu falei demais.
Virei-me lentamente para minha companheira, temeroso. Ela apenas parecia levemente surpresa.
Abri e fechei a boca diversas vezes, tentando arranjar uma explicação. Entretanto, a única plausível era "eu te amo e sou uma perfeita cadelinha sua". Como percebem, tal explicação não resolveria o problema – pioraria.
E, então, Nene sorriu. E era mais doce do que jamais foi.
— Sabe quando eu percebi que ele era o meu Antares?
Fiquei atônito com a pergunta. Ela descobriu que eu gostava dela e fazia uma pergunta dessas? Limitei-me a negar com a cabeça.
Desgrudou os olhos de mim, admirando a estrela vermelha a qual eu tanto comparava-a em pensamentos.
— Foi quando ele não me julgou por chorar por um babaca e tentou me animar só depois que eu coloquei tudo p'ra fora.
Se eu fosse um computador, eu teria dado tela azul.
Quando o meu cérebro voltou a funcionar, a ficha custou a cair.
Nene Yashiro gostava de mim.
Antares queria a poeira cósmica que estava quase sendo engolida por um buraco negro voraz.
— Ele não é a pessoa com mais amor próprio do mundo, sabe? — continuou — Eu não o culpo, mas não vou deixar isso continuar por muito tempo. Ele é um diferente bom. Um diferente que vale a pena o risco.
Voltou a encarar-me, seus olhos tão vermelhos transbordando amor. Nunca dei-me ao luxo de sonhar em receber um olhar assim – nem dela e nem de ninguém.
— Mesmo com o irmão sádico dele? — perguntei num fio de voz.
— Apesar do irmão sádico dele. — confirmou — Ele vale a pena.
Abracei meus joelhos, sentindo centenas de milhares de borboletas por meu corpo. Uma sensação nunca foi tão gostosa.
— ... O Tsukasa moeu o meu coração até sobrar só caquinhos. Se você quiser, e só se quiser ... todos esses caquinhos são seus. Apenas seus.
Tornei a olha-la, e estava radiante. Mais do que Antares, e mais do que qualquer estrela que eu já observei e/ou iria observar.
Talvez porquê eu nunca alcançaria nenhuma outra estrela senão Yashiro.
— Eu quero, Amane. — aproximou-se, tomando minhas mãos delicadamente e entrelaçando nossos dedos — E também quebraram meu coração milhares de vezes. Acho que vamos ter que colar as peças juntos.
Rimos da metáfora. Nunca ri com aquela leveza até o momento.
Não sei descrever o silêncio que reinou entre nós. Sorriamos e encaravamos um ao outro com um amor quase palpável.
Com minha destra, fazendo tudo lento o suficiente para que Nene pudesse pedir para não encostar nela, coloquei umas mechas rebeldes atrás de sua orelha. Desci para sua bochecha, fazendo carinho tão cuidadosa e lentamente que parecia que sua pele era de porcelana fina.
Seus olhos vermelhos como Antares iam da minha boca para meus olhos. Eu não fazia muito diferente.
Reuni cada gota de coragem em meu ser para pronunciar uma só palavra, inclinando sutilmente minha cabeça:
— Posso?
— Pode.
Senti-me flutuando sobre as nuvens quando nossos lábios finalmente encontraram-se.
Tecnicamente, eu deixei de ser BV e BVL no ano anterior. Perde-los foi, de longe, uma das situações mais traumáticas da minha vida. Eu perguntava-me se teria vontade de beijar alguém se a pessoa não fosse o Tsukasa.
A resposta é um grande sim.
Que se dane o "tecnicamente". Meu primeiro beijo de verdade foi com a Yashiro.
Foi num encontro, pouco antes dum eclipse lunar, depois de declararmos nosso amor e foi estupidamente doce. Doce como tudo que vem da loira-platinada.
E não foi só um. E para cada beijo a mais e para cada lugar em que eu encostava, murmurava um "posso" em tom de pergunta.
Porquê eu senti na pele o que é o assédio. Não desejo isso nem para os meus piores inimigos. Nunca que eu encostaria na pessoa mais importante para mim sem o devido consentimento.
Perdi a conta de quantos selares tivemos, e não faço ideia de quanto tempo nossas línguas dançaram em conjunto. Talvez tempo o suficiente para sentirmo-nos completos e amados e cuidados.
Sentia que meu coração sairia pela boca. Era um tipo diferente de ansiedade; uma que deixava-me voraz pela atenção da loira-platinada. Voraz por cada parte dela: seus lábios, seus olhos, seu sorriso, sua risada, suas mãos gentis, seu tudo.
Encostamos nossas testas com carinho, tentando recuperar o fôlego. Éramos dois projetos de tomate.
As palavras saltaram de minha boca:
— Te amo, Yashiro.
Sorriu-me, beijando minha testa.
— Também te amo, Amane.
Encontrei-me novamente entre seus braços acolhedores, recebendo cafuné.
Depois de tantas declarações e carinhos, o eclipse foi apenas um bônus. Ele foi lindo.
Eram quase nove horas quando chegamos à casa da Nene. Andamos o caminho todo de mãos dadas. Parecia aqueles filmes clichês água com açúcar da Netflix – e isso com certeza deixava-a feliz.
— Muito obrigada por me convidar, Hanako-kun! — agradeceu, bem à frente da porta de sua casa.
— Obrigado eu por aceitar. — cocei a nuca, sorridente.
Bem lentamente, inclinou-se sobre mim e beijou minha bochecha.
— Feitiço de proteção contra babacas.
— Isso virou costume, né?
— Que foi? Esse costume é lá ruim? — retrucou, franzindo as sobrancelhas.
— Que naada. Só constatei que virou costume. E bons costumes devem ser perpetuados, não é?
Assentiu com a cabeça, rindo meigamente.
Quando ela entrou, tomei o rumo de minha casa. Meu sorriso era ridiculamente largo.
— Eu beijei a Yashiro. E ela gosta de mim. — falei em voz alta, quase incrédulo.
Permiti-me ser um bobão apaixonado e pulei no meio da calçada, soltando um longo "uuuhuuu".
Só por aquele momento, permiti-me ser apenas um adolescente apaixonado feliz e sem preocupações. Permiti que aquelas sensações tomassem conta de mim.
Porquê nunca senti-me assim, e não fazia ideia de quando teria tal luxo novamente.
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