Cap. 29 - O Amor é a nossa Força

Entrei na mansão sem nenhuma dificuldade, passei pela janela do quarto e sentei-me na cama. Alana ainda dormia profundamente e parecia estar sonhando alguma coisa, mas pela expressão de seu rosto não estava gostando muito do sonho. Seria algum pesadelo?

Deitei-me com cuidado e fiquei observando-a dormir. Não consegui pegar no sono e não sei por que tive essa ideia, mas me peguei sussurrando para o medalhão um resumo de tudo o que havia escutado hoje. Não pensei o quanto isso poderia ser perigoso e terminei com um dos conselhos da Senhora Annie dizendo ainda mais baixo que nosso amor era nossa força. Senti-me ridículo por isso, entretanto, o discurso da tia da garota-fantasma havia, de alguma forma, mexido comigo e nos recantos mais profundos do meu ser, passei a acreditar na história das almas gêmeas sem tomar consciência exata disso. Era simplesmente um fato que parecia real, concreto e inquestionável.

Não tinha ideia se a garota, Analice, estava mesmo presa no medalhão, nem se conseguia me ouvir ou me ver, mas senti que precisava lhe explicar tudo o que havia ouvido no encontro. Por alguns instantes a ideia de que Alana talvez não estivesse dormindo tão profundamente assim me assombrou e flagrei-me rezando para que não conseguisse ouvir e acabasse descobrindo que tentaríamos salvar sua prisioneira.

Tentei de tudo para dormir, mas não estava tendo qualquer progresso e não entendia o motivo. Sentia-me cansado e deveria conseguir relaxar a ponto de dormir. Acariciei o rosto de Alana tentando sentir a presença de Analice. Por que me lembrava dessa garota de maneira tão vaga? Por que apenas conseguia sentir a presença dela em raros momentos? Será mesmo que deveria acreditar que havia uma garota presa dentro do medalhão e que estávamos destinados a ser guardiões do amor? Isso é mesmo verdade? Por que acreditei nisso tão facilmente? E como nosso amor é capaz de ser nossa força? Parece até aqueles temas chatos de filmes românticos melosos...

Não precisava acreditar em Jamie só porque fora quem me transformou. Isso até poderia torná-lo meu tutor, mas não era obrigado a aceitar tudo o que dizia. Pensei em uma maneira de conseguir provar a mim mesmo que aquilo tudo era verdade ou mentira e acabei tendo uma ideia que me pareceu boa no momento. Pesquei o medalhão no pescoço de Alana e fitei a pedra redonda envolta pela moldura dourada.

— Alana, meu amor, acorde. Quero falar com você. — Sussurrei. A pedra do medalhão estava com um tom de verde musgo, mas assim que pronunciei essas palavras, escureceu para um tom de verde tão escuro que parecia mais ser preto. Então mudei minha abordagem. — Analice... não sei se pode me ouvir, mas pretendo salvá-la. Não sei como nem porque, mas sinto sua presença aqui e não vou desistir de libertá-la. Aguente firme.

O corpo de Alana se contraiu como se estivesse com dor e sua expressão era de sofrimento. Voltei a olhar o medalhão, que brilhava num tom de verde claro nas bordas e branco no centro e havia algumas faíscas douradas também. Não percebi o sorriso em meu rosto, surpreso pela suposta confirmação que obtive. Realmente havia uma garota presa dentro do medalhão e minhas palavras poderiam fortalecê-la ou enfraquecê-la. Finalmente consegui relaxar e fechar os olhos e pela segunda vez me flagrei rezando para que Analice resistisse bravamente até conseguirmos resgatá-la do plano cruel da garota deitada ao meu lado.

(Analice)

Alguma coisa me informava que não poderia ficar calada para sempre se quisesse sobreviver e ganhar forças para me libertar dessa prisão de Alana. Quando ficava em silêncio absoluto era como se a pressão ao meu redor aumentasse a ponto de me sufocar e sentia que seria partida em duas. Fui obrigada a acordar novamente quando Shane abraçou Alana e tentou reconfortá-la. Pensei comigo que se não tivesse acordado teria sido bem melhor. Era estranho quando estava acordada e Alana dormindo, pois ficava trancafiada em seu corpo sentindo o que sentia e ouvindo o que ouvia sem ouvir seus comentários e sem poder enxergar através de seus olhos. Era como estar em um quarto completamente escuro.

Quando acordou, Alana saiu para fazer compras e algumas outras coisas que não me interessaram, mas gritava comigo constantemente por deixar seu corpo mais pesado ao tentar dormir. Continuei tentando, mas era praticamente inútil com seus gritos me despertando a todo o momento. Não sei o que aconteceu exatamente, mas parei de ouvir seus gritos de repente e consegui adormecer, antes disso senti o baque do corpo de Alana contra o chão. Havia desmaiado e a névoa do sono me levou a um dos sonhos mais estranhos que já tive.

Estava deitada em uma cama, de olhos fechados. Acho que dormia e tinha alguém comigo. Quando abri meus olhos vi Alana deitada ao meu lado, mas não sentia a presença fria e poderosa que causava quando aparecia. Sentia algo bem diferente, era quase imperceptível. Também havia ali uma presença quente e acolhedora, não parecia tão poderosa no momento, mas alguma coisa me dizia que era. Sentir uma presença é como sentir uma brisa, quando a presença é mais leve, ou um vento forte, quando sua força é maior, mas as presenças parecem penetrar sua pele e não simplesmente passam por ela. Sentia uma vontade imensa de ajudar essa presença mais quente, porém não sabia se isso era o certo a ser feito. Tinha consciência de que se escolhesse salvar a mais fraca, a outra sucumbiria e desapareceria para sempre. O mesmo se fizesse o contrário.

Estranhei não sentir nenhuma pressão me esmagando no sonho e parecia que eu era eu novamente. Ou quase. Levantei-me da cama, segui para o banheiro e entrei em choque ao ver meu reflexo. Não era eu quem via, era Shane. "Mas o que está acontecendo aqui?" Tentei gritar, mas não conseguia encontrar minha voz, esse corpo não era o meu. Meu estado de choque continuou, até que fui obrigada a acordar sentindo que alguém chacoalhava meus ombros com força. Abri os olhos, alarmada, e vi o rosto do segurança que escoltava Alana em suas tardes de compras.

Tentei não pensar muito no sonho, não queria que Alana soubesse dele porque isso me ligava diretamente à Shane, de uma maneira bem estranha, mas ligava. Durante todo o restante do dia me obriguei a ficar acordada em silêncio e tive sorte por Alana estar mais preocupada em me ameaçar caso dormisse de novo do que em ler meus pensamentos.

Depois daquele dia que me pareceu tão extenso, finalmente nos levou para casa e não encontrou Shane por lá. Sua presença se tornou instável e tensa, difícil de suportar, mas não de controlar. Estava com raiva. Tive que me esforçar para me manter firme, a energia ao meu redor ficava cada vez mais forte. Assim que voltou, Alana mandou os seguranças o apagarem e levarem de volta ao quarto onde estivera preso antes. Não tentei protestar, embora tenha me sentido muito mal ao vê-lo caindo no chão inconsciente. Alana percebeu meu mal-estar e riu disso, fazendo a pressão ao meu redor ganhar força novamente. Achei que não fosse aguentar dessa vez, mas precisava sair dali. Precisava salvar as pessoas da maldade dessa psicopata e só conseguiria isso se arrumasse uma maneira de fugir. Tentei manter minha mente focada em salvar minha família e meus amigos, mas meu inconsciente tornava a colocar a imagem de Shane na lista de pessoas que precisava salvar e não compreendia isso. Ele ameaçou me matar e mesmo assim ainda queria salvá-lo?

Quando a noite caiu, finalmente entendi que nunca podemos perder a esperança. Já era bem tarde, Alana havia adormecido instantaneamente e estava em sono profundo, a pressão ao meu redor ainda estava ali, mas era mais fraca e apenas me sentia um pouco mole. Alguma coisa me impedia de dormir, por isso me mantive alerta ao que acontecia ao nosso redor. Shane havia saído para algum lugar há um longo tempo e rezei para que tivesse resolvido fugir, até que senti novamente a presença dele ao nosso lado. Estava aflito e inquieto, deitou na cama e começou a contar coisas que havia escutado em um encontro na casa da minha tia, com Jamie e os outros. Estava confuso sobre acreditar ou não naquilo tudo e não consegui entender se estava falando comigo, com Alana ou sozinho, até que parou e começou a acariciar o rosto dela.

— Alana, meu amor, acorde. Quero falar com você. — Ao ouvi-lo sussurrar isso senti minhas forças e minha esperança minguarem até quase sumir. Parecia que a pressão, antes leve, agora tentava me esmagar e me partir, por mais que tentasse resistir parecia que minhas tentativas eram em vão. Então, voltou a falar e me esforcei para não ouvir mais nada que me enfraquecesse, mas foi em vão. — Analice... não sei se pode me ouvir, mas pretendo salvá-la. Não sei como nem porque, mas sinto sua presença aqui e não vou desistir de libertá-la. Aguente firme.

Uma explosão de energia pareceu nascer em mim e me senti um pouco tonta, mas algo dentro de mim também informava que estava feliz. Feliz? Queria me libertar... acreditou na história das almas gêmeas e sobre estarmos destinados... mesmo depois de quebrar meu coração sem saber, agora ainda era capaz de reconstrui-lo, de unir cada caco espalhado nas mais diversas direções. Por mais que tentasse não conseguiria deixar de amá-lo. Não importava quantas vezes parecesse me afastar ou não se lembrar de mim.... Era irrelevante ter me ameaçado de morte. Nada disso mais importava quando o ouvi dizer aquelas palavras. Isso só podia significar que havia se lembrado de mim e que ainda me amava. Não é?

Esforcei-me para reprimir a explosão de energia. A última coisa de que precisava era que Alana acordasse naquele momento e percebesse minha felicidade. Minha energia lutava para se expandir e lutava para impedi-la. Por sorte, Alana não acordou. Tive que conter também a vontade de o abraçar, beijar e dizer que o amava. O medo de que Alana descobrisse o que disse tomou conta de mim e me empenhei ainda mais em conter aquele poder que crescia dentro de mim. Adormeci rezando para que Alana não se lembrasse de nada disso por meio de sonhos, quando acordasse no dia seguinte.

(Shane)

O dia seguinte passou depressa, mesmo sendo obrigado a ficar dentro da mansão, sem permissão de ir ao jardim ou qualquer lugar do lado de fora da construção. Voltei à biblioteca onde havia tido aquele sonho estranho e peguei um livro de suspense para passar à tarde. Se precisava ler alguma coisa, que pelo menos fosse capaz de me entreter. Terminei rápido demais e não consegui dormir como na outra vez. Alana estava ocupada em organizar à moda dela o Baile de Outono do Senhor Helsten e por isso me deixava em paz durante o dia e à noite também, já que adormecia assim que deitava na cama.

Quando a noite chegou, esperei que Alana dormisse e escapei novamente, em direção à casa da Senhora Annie. Estava ansioso para falar com o Jamie sobre o que havia acontecido com o medalhão. Toquei a campainha e aguardei, impaciente. Quem atendeu foi minha irmã, Ally, que mal me deixou entrar e pulou em meu pescoço, chorando ao me abraçar forte. Em seguida passou a me bater e gritar que sabia que não estava morto e que conseguiria fugir.

— Não. Eu não morri, mas também não fugi. — Consegui me separar de seu abraço e entrei na casa, procurei o olhar de Jamie tentando perguntar através da minha expressão se minha irmã sabia sobre Analice. A resposta era não.

— Onde está a Ani? Por que ela não veio? — Fechava a porta quando paralisei ao ouvir a pergunta. Todos pareceram prender a respiração. A Senhora Annie foi quem se recuperou primeiro.

— Querida... — guiou minha irmã até o sofá e a obrigou a sentar.

Tentamos amenizar a situação e enrolamos o quanto pudemos para dar a notícia. Ally estava impaciente e não parecia muito feliz com toda a nossa enrolação. Cruzara os braços em frente ao corpo e batia o pé no chão, até que Jamie teve sangue frio suficiente para dizer de uma vez.

— COMO VOCÊS DEIXARAM ISSO ACONTECER? — Nunca tinha visto minha irmã chorar daquele jeito. Ellen levou-a até a cozinha para tentar acalmá-la com um copo de água com açúcar.

— Ela vai ficar bem? — Fitei a porta da cozinha, preocupado.

— Vai ficar. Ellen é muito boa em acalmar as pessoas. — George explicou com um sorriso triste.

— Vou aproveitar para contar a vocês o que descobri sobre o medalhão. — Informou a Senhora Annie e desisti de contar minha experiência naquele momento. Talvez dissesse mais tarde.

Nos explicou como funcionava o objeto, que era uma magia muito poderosa e maligna. A Senhora Annie também havia descoberto como tirar Analice de lá sem matar Alana. Não sabia se queria deixar Alana viva, mas imaginei que isso era por causa da relação da tia de Analice com o pai de Alana. Contou que era necessário que Analice estivesse realmente muito forte, mas que aprendesse a canalizar sua força para que Alana não soubesse que a estava armazenando. Sabíamos como deixá-la mais forte e isso teria que acontecer gradativamente, para que tivesse tempo de aprender a controlar sua energia. Também sabia como tornar Alana mais forte a ponto de conseguir sobreviver e isso acontecia sempre que sentia raiva ou prazer com o sofrimento alheio. A única coisa que precisava era contar para Analice o plano e pedir para que se controlasse como pudesse até o Baile de Outono, no qual colocaríamos o plano em prática.

Tentaria, durante a semana, encontrar um jeito de sairmos de lá sem sermos vistos, algo como uma passagem secreta ou um caminho esquecido pelos moradores da casa. Exploraria o lugar durante todo o dia e faria o possível para ignorar Alana. Assim a deixaria irritada o suficiente para não morrer quando libertássemos Analice e, para fortalecer a sobrinha da Senhora Annie, conversaria com ela todas as noites, provando que me lembrava e ainda gostava dela. No final da reunião, todos concordaram com o plano e nos desejamos boa noite. Então me lembrei de uma pergunta que precisava fazer a Senhora Annie.

— Senhora Annie...

— Pode me chamar de tia, querido. — Sorriu amavelmente.

— Certo. Tia Annie, posso fazer uma pergunta?

— É claro que sim.

— Como o amor pode ser a fonte das forças da Ani? Como isso se torna real? Aquela história toda de universo e poder parece muito interessante, mas como isso se torna efetivo?

— O amor é a luz que nos guia. É fonte de esperança e é através dela que a pessoa encontra forças para lutar.

— Então não é o amor que é a fonte de poder, mas a esperança.

— Não, querido. A esperança é o canal pelo qual o poder do amor flui. Sem um leito o rio não saberá o caminho que deve seguir. A esperança é a gravidade que nos mantém firmes e o amor é a matéria onde estamos presos por vontade própria, pois temos o poder de desligar esse tipo de gravidade...

— Mas não fazemos isso para não vagar a esmo pelo mundo.

— Exatamente. — O sorriso dela se iluminou. — O amor é a luz incerta da esperança em meio à certeza do vazio que se esconde nas trevas da escuridão profunda.

— Tia Annie, vocês encontraram algo de diferente ontem? — Lembrei-me de ter deixado o corpo de Analice deitado na grama do quintal dos fundos e tive receio de ter sido descuidado, levando em conta que poderia ter sido encontrado por qualquer um que olhasse para o jardim, não necessariamente pela tia dela. A mulher me observou atenta e seu olhar assumiu um brilho astuto.

— Foi você quem a trouxe, não foi? Onde a encontrou?

— Estava na floresta. Em uma clareira na floresta. — Sustentei seu olhar com seriedade. — Como ela está?

— Não se preocupe, o corpo dela está bem conservado. Já ouviu a história da Branca de Neve? Guardei-o em um caixão de vidro enfeitiçado, como na história, para que se mantivesse preservado até a alma retornar.

— Obrigado por me dizer, notei que os rapazes não falaram nada...

— Eles não sabem. Não contei a ninguém para que não ficassem a incomodando. Pretendo restaurar sua pele ferida, dar-lhe banho e cuidar para que permaneça tão bonita quanto antes do ataque. Tenha uma boa noite, querido.

Tia Annie me surpreendeu ao beijar minha testa, mas consegui me recuperar e respondi a tempo. Saí da casa com vontade de voltar e pedir que me deixasse vê-la, mas não sabia o estado em que se encontrava e talvez, se estivesse consciente, não gostaria que a visse. Contei a Analice o que precisaria fazer e informei que logo estaria livre, esperei o medalhão me informar se havia ou não escutado...

(Analice)

Shane havia saído novamente.... Teria ido a outro encontro com Jamie? Teriam conseguido traçar um plano? Por que não foge de vez? Por que continua aqui? Pode me salvar de qualquer maneira, mesmo não estando aqui, então por que continua vivendo com Alana? Minha consciência estava discutindo da seguinte maneira:

Superego: "Está aqui por que é loucamente apaixonado por você! Ele te ama, sua boba! É claro que está aqui para protegê-la! Que romântico!".

Id: "Para de ser iludida, sua trouxa! É claro que não está aqui por você! Quer é salvar a própria pele! Alana é uma bruxa poderosa e ele um mentiroso egoísta!".

Superego: "Ora! Que pessimismo! Que pensamento mais ridículo! É claro que não é por isso! É amor!".

Id: "Amor? É claro que isso não é amor! Medo. Fúria. Egoísmo. Maldade. Tudo, menos amor!".

Superego: "Cale-se! Você não sabe o que está dizendo! É uma pessimista cruel!".

Id: "Não me mande calar a boca! Você que é uma romântica iludida!".

Ego: "CALEM-SE AS DUAS! Ele está aqui para proteger a família, é evidente...!".

Id: "É claro! Foi o que eu disse!".

Ego: "MAS...! Também está aqui para nos proteger. Ele nos ama. Está aqui não apenas por sua família e por seus amigos, está aqui por amor...".

A discussão foi interrompida quando senti a presença de alguém entrando no quarto. Antes de continuar, permita-me explicar o que são Superego, Ego e Id. Segundo o pai da psicanálise, Sigmund Freud, essas são as três divisões da consciência. O Superego é como os pensamentos "bons" de um indivíduo, Id são os "maus" pensamentos e o Ego é um equilíbrio dos dois, geralmente o que rege nossas ações.

Shane estava ansioso por algum motivo, sua presença estava inquieta novamente. Ah! Deduzi que a tal presença que sinto é na verdade a aura das pessoas em forma física, uma espécie de reflexo da alma. Sentou na cama e começou a falar comigo após um tempo. "Oi, amor. Não sei se consegue me ouvir..." Pareceu um pouco constrangido. "Eu te amo." Não sabia se estava falando comigo, mas concluí que fosse e deixei minha energia se expandir um pouco. "Sei que não aguenta mais ficar aí. Temos um plano para salvá-la, mas preciso que resista até o Baile de Outono. Você também vai precisar aprender a canalizar a energia que está sentindo para utilizá-la quando for o momento certo. Espero que descubra. Vou ajudá-la a se fortalecer, mas preciso que minta para que Alana não perceba isso. Vou tentar agir mais como antes e fingir que a amo, mas saiba que não é verdade. Boa noite, meu anjo."

As palavras dele eram o que me mantinha viva, me mantinha forte e me ajudava a lutar contra a pressão de Alana ao meu redor. Calculei que toda a esperança e energia que ainda provinham de mim só poderiam estar no coração, por isso foi esse ponto para onde canalizei minha força. Estava preocupada com o plano deles, pois sabia que seria muito arriscado. Não queria que ninguém se arriscasse por mim, principalmente Shane, mas sabia que se fosse para me salvar, ele faria. Senti medo por ele. Estava ansiosa e angustiada. Tinha consciência de que o que dissera era verdade e não aguentava mais ficar presa aqui. Concentrei-me ao máximo em me lembrar de atuar para enganar Alana, mas... como faria para canalizar minha energia ao coração? Como posso fazer isso?

Foquei minha mente em imaginar uma luz passando pelo meu corpo espectral, em direção ao único lugar em mim que ainda se mantinha de fato vivo, o coração. Tentei inúmeras vezes e fiquei muito cansada. Acabei desperdiçando boa parte da minha energia ao tentar isso e senti uma forte exaustão tomar conta de mim. Adormeci imediatamente.

Os dias passavam rápido apesar da minha ansiedade, atuava durante todo o dia e descansava à noite. Era cansativo, mas valia a pena. Todas as noites, Shane me fortalecia com suas palavras e me empenhava em canalizar minha energia. Algumas vezes tive receio de que não conseguisse energia suficiente e precisava me controlar ao ouvir as palavras doces que Shane dirigia a Alana. Doces, porém, falsas, dizia para mim mesma.

Minha situação era estranha e cruel, mas precisava confiar que tudo daria certo. Precisava confiar nele, pois era a minha única chance de sair daqui. Mais uma dúvida veio assombrar minha mente: o plano deles funcionaria se não fosse eu quem estivesse no controle da minha alma? Se o plano falhasse, morreria e, se desse certo, estaria livre. Como poderia fazer para controlar minha alma?

Faltavam apenas quatro dias para o baile quando finalmente me ocorreu uma solução. Imaginei meus olhos fechados, após Alana ter adormecido e Shane ter me fortalecido outra vez, e tentei concentrar o máximo de força possível, pensei em uma marionete com a aparência de Alana, mas em forma de espectro e me imaginei no controle. Aparentemente não deu certo, então, de repente, abri meus olhos e ouvi minha voz mental dizer as seguintes palavras: "Ex Anima!".

Senti uma forte onda de energia tomar conta do meu corpo fantasma como se uma avalanche poderosa passasse por mim, só que internamente. Senti o poder. Senti cada partícula de energia. A força sobrenatural que possuía. Conseguia controlá-la e novas palavras surgiram em minha mente, algo como "Veim Vertentes". Era estranho me ouvir dizendo isso, mas no mesmo instante senti minhas forças se reagruparem e se dirigirem para diversos pontos do meu corpo, se acumulando não apenas no coração dessa vez. A sensação era como se no lugar do sangue, corresse eletricidade pelas minhas veias. Pequenos choques eletrocutavam meu corpo espectral, mas isso não causava dor, apenas me aquecia e fortalecia. Toda essa agitação fez com que adormecesse sem nem perceber que o fazia.

Dois dias antes do baile, Shane entrou pela sacada novamente e deitou-se ao meu lado. Aquele tinha sido um dos piores dias desde que fui capturada. Alana o fizera beijá-la tantas vezes que parei de contar para que não acabasse me enfraquecendo ou fazendo com que liberasse minha força de uma vez. A cada dia era mais difícil controlar toda a energia que fluía em mim, era como tentar colocar mais água em um recipiente que já estava saturado. A pressão ao meu redor também estava mais forte, Shane fortalecia a nós duas para que nenhuma de nós morresse. Depois de tudo que tinha feito, pensava que não me importaria se ela morresse, mas não queria ser a causa disso. Se fosse para acontecer, faria isso pessoalmente.

Shane vinha me mantendo informada e descobri que o Senhor Helsten estava fazendo do tudo para nos ajudar, já que não tinha mais esperanças de salvar a filha, da maldade em que a mesma havia se metido. Além do mais, o amor dele e da tia Annie vinha crescendo a cada dia e queriam poder se amar de verdade, sem o medo de Alana fazer alguma loucura.

Um dia antes do baile, pude sentir o nervosismo de Shane e queria poder conversar com ele, mas acabou desabafando comigo sem que pedisse. Me explicou que encontrara meu corpo na floresta e que levara para Tia Annie, mas que ainda não havia o visto outra vez, até ontem. Ele parecia sorrir ao descrever como estava sendo cuidada. "Você está ainda mais bonita..." Ele fez uma pausa, parecia envergonhado. "Sempre que chego perto de você vejo uma luzinha fraca ao seu redor brilhar em branco, dourado, azul e roxo. É linda. Contei para sua tia, que disse que posso ver sua aura e que reage a mim." Ele fez outra pausa curta. "Estamos preocupados porque sua tia nos informou que quando libertarmos sua alma é necessário que seu corpo esteja perto para você conseguir se unir a ele outra vez." A voz dele parecia tensa. "Seu corpo está guardado em um caixão de vidro, como na história da Branca de Neve. Ally, Ellen, sua amiga Mari e a Tia Annie estão cuidando muito bem de você. Sua tia costurou um vestido lindo e as meninas ajudaram a vesti-la. Parecia uma princesa." Cada palavra dele parecia uma carícia que podia sentir em minha alma, mesmo quando parecia preocupado, pois estava preocupado comigo. Isso provava que me amava mesmo. "Já sabemos como trazer seu corpo. Não se preocupe. Ah! Não se assuste, pode ser que quando você acordar sua memória esteja um pouco afetada e talvez demore um pouco para se curar. Preciso tentar dormir, minha princesa. Boa noite." Encostou a boca na de Alana e sabia que aquele beijo não era para ela, me esforcei muito mais para controlar a força que tomou conta de mim naquele momento, mas consegui. Queria chorar, não de tristeza, de alegria. Ele me amava! Amanhã teria minha chance de ser livre outra vez. Rezei para que tudo desse certo e adormeci ainda um pouco agitada pelo momento e pela ansiedade.

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