Cap. 17 - As Marcas
Saí na sacada encolhida por causa do frio e da brisa gelada que me embalavam. Pensando melhor depois, me senti uma completa idiota por não levar nenhum objeto que pudesse ser utilizado para me defender. A noite era escura, as estrelas haviam abandonado o céu e a pouca claridade provinha da lua cheia parcialmente encoberta por nuvens cinzas. Meus olhos já tinham se acostumado com a escuridão e por isso consegui ver a silhueta da pessoa que estava parada em cima do beiral me observando.
— Por que não veio ao encontro? — Minha voz era baixa e tentava não demonstrar tristeza, apenas preocupação.
— Não pude... — notei o movimento de seus olhos e era como se procurasse algo que pudesse atacá-lo a qualquer momento. Um arrepio correu minha coluna. Estávamos em perigo? Ele estava em perigo?
— Por onde andou? Por que não disse nada a ninguém? Queria ficar sozinho? Por que se fosse isso, poderia ter dito ao invés de nos deixar preocupados!
— Não devo satisfações a eles. — Seu olhar era frio.
— Deve sim! Eles te salvaram! — No mesmo instante pulou em minha direção, parando a apenas alguns centímetros e fui obrigada a erguer a cabeça para conseguir fitar seu rosto.
— Você me salvou. — Outro arrepio desceu minha coluna me fazendo estremecer. Rezei para que pensasse ser o frio. Ele sentia frio?
— Não... — gaguejei um pouco antes de me recuperar da proximidade. — Eu apenas chamei a ajuda. Além do mais, se não fosse por mim você nem precisaria de ajuda...
— Pode até ser. — Deu de ombros. — Mas se não fosse por você, ainda teria uma vida monótona.
— Não era isso o que você queria?
— No começo sim..., mas mudanças acontecem o tempo todo e acredito que essa tenha sido para melhor. Além do mais, precisamos nos adaptar as mudanças, sejam boas ou ruins. — Sua voz não passava de um sussurro e se aproximou um pouco mais para ser ouvido.
— Por que veio aqui? — Tentei controlar minha respiração e a tremedeira que tomou conta do meu corpo.
— Vim te entregar uma coisa. — Tirou uma caixinha do bolso e a abriu. Dentro havia uma pulseira prata com o pingente de uma rosa aberta pendurado. A corrente era simples, mas o pingente era todo trabalhado como se estivesse em 3D, parecia ter entalhes cavados em dourado e a base em prata. Era lindo!
— Não posso aceitar... — empurrei a caixinha para ele novamente, confusa com o presente.
— Pode sim, mas não mostre a ninguém nem diga que fui eu quem te deu. Entendeu? — Me devolvera a caixinha de veludo vermelha e sustentou meu olhar, fitando meus olhos com a expressão séria e preocupada. Assenti, mas acho que pôde ver a confusão em meus olhos. — Não posso dizer o motivo disso, mas faça o que pedi, por favor.
— Sim. Não se preocupe. — Encontrei minha voz novamente e tentei controlar minhas emoções desesperadamente. — Sua irmã e os meninos estão preocupados com você.... O que está havendo? — Sustentei o olhar dele por um longo tempo, até notar que não estava olhando para mim, mas sim além de mim. Virei-me para tentar ver o que estava olhando, mas no mesmo instante me abraçou forte, embalando meu corpo com o dele, formando uma espécie de escudo, e virando de costas para o lugar que estava olhando antes, me protegendo de seja lá o que for. Por um momento a noite brilhou em vermelho e no instante seguinte senti um leve empurrão, o brilho desapareceu como mágica e Shane me soltou novamente.
— Você está bem? — Falou e meu coração estava acelerado. Não conseguia compreender o que havia acontecido.
— Estou. — Tentei recuperar o ar, estava muito próximo ainda. — Por que fez isso?
— Nada. — Notei que sua expressão estava sombria e vi um lampejo de preocupação em seu rosto. Quando endireitou a postura, percebi que sua camiseta havia ficado larga de repente e esvoaçava com o vento que começara a soprar.
— O que houve com a sua camiseta? — Lançou-me um olhar assustado.
— Nada.
— Diga, por favor. — Pedi num sussurro, estendendo a mão em sua direção. Ele desviou de mim e senti um aperto inexplicável no coração. Percebi um pouco tarde que minha garganta doía por estar segurando lágrimas que nem havia percebido que tinham se formado. O que estava havendo?
— Não é nada. Preciso ir. — Beijou o alto da minha cabeça rapidamente e passou por mim saltando em direção ao beiral e consequentemente virando de costas, nesse instante a lua foi descoberta e pude ver as marcas. A pele de suas costas estava sangrando, havia marcas de garras finas e poderosas da altura dos ombros até quase o fim da coluna. Reprimi um grito. Isso tinha acontecido agora? Não.... Havia algumas cicatrizes entre os dez sulcos sangrentos que se formaram. Eram finos, mas pareciam profundos. Aquilo eram mesmo garras ou... pareciam marcas de... unhas?
— O que é isso? — Falei sem conseguir disfarçar a expressão de assombro. Ele me olhou por sobre o ombro e apenas balançou a cabeça antes de fazer crescer as asas de morcego e sair voando pela noite, meio cambaleando. Senti o veludo da caixinha em minhas mãos e meu coração pareceu se comprimir ainda mais, meu estômago estava embrulhado e sentia que iria vomitar. Voltei para dentro e fechei as janelas por causa do frio. Coloquei a caixinha ao lado da cama, na cômoda, e não consegui decidir se usaria a pulseira ou não. Ele me pedira para não mostrar a ninguém.... Por que me dera algo tão visível, então? Peguei a caixinha e a coloquei debaixo do travesseiro, virei-me com as costas no colchão e passei a fitar o teto. O que havia acontecido? O que estava acontecendo? Precisava contar a alguém sobre as marcas.... Será que deveria? Isso ajudaria ou atrapalharia? Fechei os olhos e sem perceber caí no sono.
Parecia que dormira meses a fio quando finalmente acordei, mas sabia que não haviam passado mais que cinco horas. Acordei com a claridade que vinha de fora, não fechara as cortinas e ralhei mentalmente comigo por causa disso. O sol brilhava forte no céu e me perguntei onde estariam as nuvens cinzas e o frio da madrugada. A primavera estava chegando, com certeza. Era minha época favorita do ano por causa da floração, já que a maioria das flores só floresce na primavera. A estação em que o romance paira no ar, levado pela leve brisa juntamente às pétalas das flores.... Levantei-me e comecei a arrumar a cama, então encontrei a caixinha de veludo e lembrei-me de ontem à noite com um aperto grande no coração, embora tentasse me lembrar dos detalhes havia alguma coisa sobre ontem que não conseguia recordar.... Saí pelo corredor depois de um banho e roupas limpas. Encontrei Ally e Mari no corredor e sorri da melhor maneira que pude, enquanto seguíamos para a cozinha. Tia Annie de alguma forma notou que havia algo errado e não deixou isso escapar.
— O que houve, querida? — Falou enquanto servia meu prato com os biscoitos que havia acabado de fazer.
— Como assim? — Tentei me fingir de desentendida.
— Ele veio aqui ontem, não foi? — Estava de costas para nós, arrumando algo na pia quando perguntou isso e por esse motivo, fiquei encarando as costas de seu roupão amarelo claro.
— Ele quem? — Falamos as três juntas.
— O irmão da Ally. — Se virou e piscou para ela.
— ELE VEIO AQUI? — Ally bateu as duas mãos na mesa, fazendo tudo se sacudir como num terremoto. Depois pediu desculpas e voltou seu olhar semicerrado para mim. — Por não disse nada?
— Foi uma visita rápida, querida. Não é mesmo? — Fez mais uma afirmação do que uma pergunta.
— Sim. Quase não nos falamos. — Passei a fitar os biscoitos.
— Por quê? — Perguntou me analisando, que percebi pelo canto do olho.
— Estava com pressa e preocupado com alguma coisa.
— Preocupado com o quê? — Ally parecia um pouco mais calma agora.
— Eu não sei. Ele não me disse, mas.... Tia, como sabia que ele veio aqui ontem?
— Estava na sacada do meu quarto, querida, e vi vocês dois conversando. Sinto muito pela invasão de privacidade, mas achei curiosa a visita.
— Tudo bem. Mas, estávamos falando tão alto assim? Desculpe incomodar...
— Não estavam, mas tenho a audição muito boa. — Sorriu e voltou a fazer alguma coisa na pia. Comemos em silêncio e me surpreendi por Ally não tentar perguntar mais nada.
Tia Annie foi atender um telefonema. Decidimos que iríamos à casa dos rapazes para contar da visita de Shane ontem à noite e para perguntar se sabiam de mais alguma coisa. Terminamos o café e trocamos de roupa para nossa "missão" secreta. Assim que descemos, minha tia nos abordou e inventamos que iríamos atrás de algumas flores para o chá das flores que havia planejado. Quase me esquecera da história dos desenhos e ao me lembrar disso, soube que estava em uma bela encrenca, agora que Shane não poderia mais me ajudar por estar sumindo com tanta frequência.
— Obrigada pela gentileza, meninas! Vou pegar o dinheiro para vocês, volto em um minuto. — Pegou o dinheiro em uma bolsa que estava pendurada no cabideiro e nos entregou, guardei no bolso da calça e saímos com mais facilidade do que pensei.
Tivemos que andar bastante e tomar muito cuidado ao passar perto da rua onde ficava minha casa, mas conseguimos chegar ao bosque sem problemas. O sol tornava o percurso um pouco mais cansativo, mas não estava esquentando tanto como deveria e isso era uma vantagem. Não pude deixar de sentir calafrios ao entrar novamente no bosque e pela maneira como Ally havia esfregado os braços, imaginei que também sentira. Mari não deixou de perceber nossa reação.
— Algum problema, meninas?
— É que...
— Das outras vezes que estivemos aqui as experiências não foram muito boas. — Interrompi Ally sem querer.
— Por quê?
— É melhor não saber agora, pode ficar assustada. — Abri a boca para falar, mas Ally foi mais rápida.
— Tudo bem. Concordo com você. Ally, antes de entrarmos você não quer checar se está sentindo alguma coisa estranha ou fora do normal?
— COMO ASSIM? — Mari nos encarou assustada.
— Depois a gente explica, Mari. Ally precisa se concentrar. — Fiz uma pausa. — Ally?
— Não... não sinto nada. Podemos ir.
— Ok.
Depois de andarmos pela trilha principal, que era mais clara e visível, viramos à direita onde estava a trilha escondida, que nos levaria até a clareira de onde poderíamos seguir por um caminho que esperava que Ally soubesse, porque não me lembrava.
— Vocês têm certeza do caminho? — A voz de Mari era baixa e caminhava encolhida.
— Não se preocupe, sei para onde estamos indo. — Ally afirmou tirando mais alguns galhos para liberar a passagem.
— Você não lembra, Ani?
— Não. Estava assustada porque havia sido atacada e fui carregada até lá de olhos fechados a maior parte do caminho...
— Quem te carregou? — Mari parecia curiosa e Ally estava rindo.
— Por que não conta, Ani? — Provocou e senti meu rosto corar.
— Quem foi? — Mari repetiu ainda mais ansiosa e curiosa.
— Chegamos na clareira! — Mudei de assunto tentando me livrar da resposta.
— Não mude de assunto! — Ally fingiu estar brava. — Mas, sim, chegamos. É por ali. — Apontou a direção e a seguimos.
— Diga, Ani! Por favor!
— Conta, Ani... — Ally estava com um sorriso malicioso no rosto.
— Foi o irmão da Ally que me salvou. — Abaixei a cabeça para que não vissem meu rosto enrubescer.
— Jura? Como te salvou? Ele é bonito? Desculpa, Ally...
— Relaxa. — Sorriu. — Meu irmão a pegou nos braços e quando aparecemos a pessoa já havia ido embora. — Ally explicou por mim.
— Sério? — Mari não conseguia disfarçar a empolgação.
— Sim.
— Acho que chegamos. — Ally me livrou de dar uma resposta mais elaborada ao dizer isso.
— Será que estão casa? — Disse após pedir para Mari parar de elogiar a casa.
— Não sei. Deve ter alguém. — Ally deu de ombros.
— Eles têm turnos de caça.... Alguém deve estar aí. — Me aproximei da porta e bati uma vez.
As outras subiram na varanda de entrada e encararam a porta enorme do casarão. Bati outra vez, um pouco mais forte. Nada! Bati uma terceira vez e estava quase tentando arrombar a porta quando ouvimos o barulho das chaves no trinco. Não percebi que estava prendendo a respiração até a porta se abrir e Bryan encarar nós três com cara de sono. Não pude deixar de lembrar das vezes que me atacou e isso me fez ficar com receio de entrar. Por isso perguntei se havia mais alguém em casa, mas Ally não esperou a resposta e nos arrastou para dentro. Sentamos os quatro no sofá e Bryan nos informou que estava sozinho. Jamie estava caçando, Shawn e George investigando o paradeiro de Shane.
— Não tivemos qualquer progresso ainda. — Disse.
— Então talvez gostem de saber que ele me visitou ontem à noite. — Me controlei para falar normalmente apesar do medo.
— Entendi. — Curvou um pouco a postura e encarou o chão. — Mais alguma coisa? Estão me atrasando, preciso caçar. — Até acharia seu tom grosseiro se já não o tivesse visto com muita sede.
— Estava estranho e parecia com medo ou preocupado com alguma coisa. Talvez até abatido... — desviei o olhar quando Bryan passou a me encarar. — E.... Por algum motivo que não me recordo, sua camiseta estava rasgada quando foi embora de repente e suas costas estavam feridas por algo como garras ou unhas.
— Primeiro, POR QUE NÃO ME CONTOU ISSO? — Ally berrou comigo. — Segundo, a camiseta rasgou "do nada"? — Ela e Bryan trocaram um olhar cúmplice e sorriram de canto.
— No que estão pensando? Pelo amor de Deus! Não fizemos nada disso! A visita foi tão rápida que nem daria tempo! — Senti meu rosto quente e sabia porquê.
— Certo, certo. Descreva melhor essas feridas. — Bryan estava mais rouco que o normal. Parecia que sua garganta estava seca e tossiu um pouco antes de continuar. — Seja rápida.
— Pareciam arranhões feitos por garras ou unhas. Eram fundos, mas não muito largos, como um arranhão humano, só que nenhum humano conseguiria arranhar um vampiro dessa maneira, certo?
— Sim. — Apoiou os cotovelos nos joelhos e cobriu o rosto com as mãos. As meninas apenas observavam em silêncio. Esperei ele continuar. Tornou a erguer o rosto após um tempo e me encarou arqueando a sobrancelha. — Talvez arranhões de alguma mulher?
— Nenhuma mulher seria capaz de... — então me passou pela cabeça que talvez essa mulher não fosse humana. Bryan estava fitando minhas unhas longas pintadas de preto e voltou a fitar meu rosto em seguida. — Não fui eu! Não pode estar desconfiando de mim!
— Não estou, mas essa mulher deve ter unhas compridas como as suas. — Deu um sorriso fraco. — Temos suspeitos e acho que um deles se enquadra nesse caso.
— Quem? Quem vocês acham que é? — Disse angustiada.
— Por que tanto interesse?
— Ele é irmão da Ally, que é minha amiga! Ele também é meu... — Bryan estava segurando o próprio pescoço com uma expressão de agonia. — Bryan? Você está bem?
— NÃO! — Disse entredentes e com uma das mãos apontou a porta. — SAIAM! AGORA.
— O que você tem? — Ally tentou chegar perto dele, mas a detive. Sabia o que estava acontecendo.
— Vamos. — Puxei as duas em direção à porta.
— O que ele tem? — Ally parecia assustada e Mari não estava muito diferente.
— Sede. — Abri a porta e as empurrei para fora. Saí em seguida e tudo que ouvimos foram o barulho de móveis se arrastando e a voz de Bryan gritando para que corrêssemos. Estava se descontrolando de novo e sabia o que faria em seguida. Caçar. E nós éramos os alvos mais próximos. Instruí Ally e Mari a correrem ainda mais rápido e deixei que fossem na frente.
— Ele vai nos caçar? Como assim? Não era do time dos bonzinhos? — Mari estava ofegante.
— Está com muita sede e somos um prato cheio. Não tem culpa, nós o atrasamos. — Falou Ally.
— Mais rápido! — Comecei a sentir a garganta arder, meus pulmões estavam quase explodindo e minha pulsação dava para sentir latejando na cabeça.
— Ele já está vindo? — Ally gritou e olhei para trás, mas não vi nada.
— Não sei!
— Estamos indo para onde? Estão prestando atenção? — Mari falou aflita.
— Não sei para onde estamos indo! Estamos perdidas! — Ally choramingou, mas não diminuiu a velocidade.
— Não temos chance! Ele é um caçador! — Mari gritou desesperada.
— Precisamos ter calma! — Berrou Ally. — E agora, Ani?
— Continuem correndo! Não olhem para trás! Parem de gritar! Tentem encontrar o Jamie! Ele estava caçando e acho que é por aqui. — Eu já tinha bolado um plano e esperava que Ally não notasse antes de estar bem longe de mim. — Tente telefonar para algum dos meninos!
Comecei a diminuir o passo e segui para outra direção, rezando para que Bryan preferisse seguir a mim e não a elas. Afinal, já havia sentido o cheiro e o gosto do meu sangue e era mais fácil me rastrear. Ouvi movimentos ao meu redor e sabia que não adiantaria mais correr, mas poderia enrolar com conversas e talvez alguém aparecesse para me ajudar. Esperei o ataque atenta a qualquer movimento. Nenhum ruído. Nenhum som de passos. Nada de animais. Nada de vento, nem mesmo uma leve brisa. Comecei a ficar com medo que Bryan tivesse seguido as duas e não eu. Tudo que ouvia era minha respiração ofegante e meu coração batendo forte. Finalmente ouvi passos apressados, mas a pessoa não estava correndo em desespero como pensei. No entanto, fazia muito barulho para ser um caçador, mesmo um faminto como Bryan estava. Tentei identificar a direção do som e percebi que não havia como ser o Bryan. Comecei a me sentir mais calma, mas não tinha certeza se era a reação certa. Poderia ser um amigo ou não. Por que Bryan perdia tanto o controle? Mais até que um recém-criado?
O silêncio imperava novamente e comecei a me sentir nervosa. Não sabia o que aconteceria em seguida. Deveria fugir ou ficar? Deveria lutar ou me render? Sem perceber, fechei os olhos e deixei que o quer que fosse se aproximasse. Não tentaria lutar ou fugir. O que tivesse que acontecer, aconteceria. Então lembrei que Ally e Mari ainda estavam por ali e precisava desviar qualquer perigo delas. Comecei a correr na direção em que viera antes e me vi novamente sozinha, fugindo de alguma coisa no meio de um bosque. No fundo, sabia que ainda tinha esperanças de escapar, mesmo desesperada do jeito que estava e tendo consciência de que minhas chances em comparação às de alguém que conhecia o bosque eram praticamente zero. Talvez não fosse o Bryan, mas então quem seria? Tive vontade de parar de correr e desvendar logo esse mistério. Diminuí o passo até parar novamente. Meu coração e minha respiração estavam acelerados além do normal, o som dos passos me acompanhava novamente. Virei-me para encarar o perigo de frente e por entre as árvores a figura de um rapaz moreno, com cabelos escuros e olhos cor de âmbar surgiu transformando meu desespero em calma, alegria e alívio.
— O que está fazendo aqui? — Sua voz soava como música para meus ouvidos e a descarga de adrenalina começava a baixar.
— Posso perguntar o mesmo a você. — Tentei não demonstrar que estava tão feliz por vê-lo, mas sabia que era inútil.
— Você estava em perigo.
— Sim. Espera! Como sabia disso? — Não estava apenas surpresa, estava em choque.
— Eu senti. — Parecia levemente desconfortável ao admitir isso.
— Sentiu? — Me forcei a deixar de lado a curiosidade e decidi que precisava de outra abordagem. — Sua irmã e uma amiga minha também estão em perigo! Precisamos salvá-las.
— Não estão. Jamie me telefonou dizendo que as encontrou e que estavam bem. Bryan foi caçar em outro lugar hoje, depois de ser encontrado por Jamie e... detido. — Seus olhos assumiram um brilho que não consegui identificar.
— Por que Jamie ligou para você? Você estava desaparecido!
— Minha irmã mandou. Ela sentiu minha presença e sabia que estava por aqui.
— Ah... ela pode fazer isso?
— Se eu deixar. — Deu de ombros. — Coisa de laços de sangue.
— Ah.
— O que faziam aqui?
— Fomos na casa dos meninos... — tentei parar de encará-lo, mas não conseguia. A verdade era que queria me jogar em seus braços e esquecer qualquer outra coisa.
— Prossiga. — Cruzou os braços em frente ao corpo acabando com minhas chances de abraçá-lo.
— Fomos contar que me visitou ontem.
— E...?
— E sobre as marcas nas suas costas...
— Eu não te pedi para não dizer nada a ninguém? — Não parecia estar bravo, mas com certeza feliz não estava.
— Você pediu foi para não mostrar a pulseira e não dizer nada sobre ela.
— Ok. Erro meu. Você tem razão. — Deu uma pausa curta em que parecia tentar escolher as palavras que iria dizer. — Da próxima vez, se tiver uma próxima vez, não diga nada. É perigoso.
— Você está em perigo? — Tentei controlar minha voz.
— Não. Você está. — Seu olhar era sombrio e distante. — Principalmente se eu "errar".
— Errar? Errar o quê? Está fazendo uma espécie de teste?
— Sei que parece loucura. — Chegou tão perto que prendi a respiração. Sua voz era apenas um sussurro. — Estou tentando te proteger, e não é de mim.
— De quem, então?
— Não. — Balançou a cabeça negativamente e em seguida fitou meus olhos fixamente, mas não de forma assustadora, como se sentisse... desejo? Um lampejo de dúvida passou por sua expressão e me vi novamente prendendo a respiração. Notei que também sentia desejo de alguma coisa. De que? Eu queria... beijá-lo? Sim. Queria isso, mas era um pouco covarde demais para dar o primeiro passo agora e de certa forma, sabia que ele não faria isso. Não porque não quisesse, mas por que não podia.
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