Cap. 10 - Aproximação

Ally me puxou para a parte de trás da sala, onde ficava uma porta que dava para a cozinha (juro que não consegui entender porque vampiros precisavam de uma cozinha) e caminhamos até a porta, do outro lado da cozinha, que nos permitia conhecer o jardim nos fundos da propriedade. Ao sairmos, pude notar que o jardim era tão extenso e esplendoroso quanto a enorme casa às nossas costas. Possuía uma diversidade incrível de árvores de pequeno e médio porte, flores de todas as cores imagináveis e uma cerca viva de um tom de verde tão vivo que em dias de sol, talvez fosse capaz de cegar alguém, pensei. No centro do jardim, só que um pouco mais próximo da casa, existia uma piscina grande e retangular, parecia ser bem funda, mas isso poderia ser apenas ilusão de profundidade por causa da água. Havia algumas fontes jorrando água, mas o que predominava era mesmo a diversidade de espécies de flores: tulipas, lírios, jasmins, margaridas, copos de leite, rosas de todos os tipos, entre outras variedades que não soube reconhecer. Uma das flores que mais me encantou, e que não sabia o nome, foi uma pequenina, em forma de coração cor de rosa e me aproximei para vê-la melhor. Ficava perto das roseiras e da cerca viva a direita do jardim e produzia um contraste muito interessante.

— Ally, veja essa flor! — Virei-me para puxar minha amiga para mais perto da flor. — Ally? Onde você está? — Havia desaparecido.

— Está no segundo andar. — Era Jamie que estava ao meu lado e isso me causou um pequeno sobressalto.

— Como chegou aqui?

— Andando? — Deu de ombros com um sorriso divertido.

— Se tivesse andando normalmente teria visto.

— Esqueça. Gostou da flor?

— Sim. É linda! Você sabe o nome dela?

— Na verdade não..., mas algum dos meninos deve saber, depois pergunte para eles.

— Posso tirar uma foto ou desenhá-la?

— Claro, pode desenhar, mas não fotografar.

— Por que não?

— Porque esse jardim contém magia e você poderia danificar o elo mágico se tirasse uma foto dele.

— Ah... — tentei fingir que entendi ou acreditei. Realmente não entendi, mas foi mais fácil acreditar do que pensei. Afinal, ali haviam flores de diferentes estações, mas todas estavam floridas e nem todas estavam na estufa, que ficava um pouco mais aos fundos do jardim.

— Quer que pegue papel para você desenhar?

— Não precisa, minha mochila está... — senti meu coração acelerar um pouco. — Onde está minha mochila?

— Mochila? Você não chegou com nenhuma mochila...

— Ai meu Deus! Será que deixei cair no bosque? — Comecei a sentir um desespero tomar conta de mim.

— Posso procurá-la para você. — Sorriu, tentando me acalmar. — Fique aqui e tente desenhar a flor, tem papel e lápis na estante ao lado da mesa de jogos.

— Puxa! Muito obrigada, mas não prefere que vá com você?

— Não, não precisa.

Voltei para o interior da casa e encontrei a estante na sala, procurei nas três primeiras prateleiras, mas nelas só encontrei alguns livros, objetos de decoração e uma miniatura do Coliseu romano. Procurei, então, na quarta e lá encontrei um caderno de desenho ao lado de um lápis, abri o caderno enquanto caminhava de volta para o jardim, mas ao começar a folheá-lo pude notar que pertencia a alguém, estava cheio de desenhos. A pessoa que desenhou retratou de maneira belíssima alguns lugares da Itália, algumas pessoas, uma moradia que parecia muito com essa casa e várias das flores que se encontravam no jardim. Parei na porta entre a cozinha e o jardim, quando encontrei o retrato da flor que pretendia desenhar.

— Quem deixou você pegar meu caderno? — A voz vinha de trás e virei-me imediatamente.

— Desculpe. — Disse olhando fixamente o caderno em minhas mãos. Não sabia porquê não conseguia encarar direito o irmão de Ally. — Jamie disse que poderia pegar papel na estante e não percebi que pertencia a alguém até começar a folheá-lo. — Estendi o braço para que o pegasse de volta e o fez meio grosseiramente, mas mesmo assim agradeceu.

— Por que queria papel? — Não consegui notar qualquer emoção em sua voz, mas finalmente observei seu rosto e percebi que seu olhar era atento e curioso.

— Eu ia tentar desenhar essa flor. — Apontei a página aberta do caderno.

— Gostou dela?

— Sim. É perfeita. — Sorri sem graça. Ele segurou a folha, arrancou-a com um pouco mais de força e estendeu em minha direção.

— Pode ficar. — Disse dando de ombros.

— Sério? — Não consegui disfarçar a surpresa.

— Acha mesmo que arrancaria a folha por nada?

— Você desenha muito bem. — Resolvi aceitar a folha para que parasse de me encarar.

— Você não deveria ter folheado o caderno. — E fechou-o abruptamente.

— Tem razão. Desculpe. — Achei melhor não discordar e dizer que não era vidente para saber se o caderno era ou não de alguém antes de folheá-lo.

— Onde está o Jamie?

— Saiu. E se quiser saber, sua irmã está explorando a casa, acho. — Dei de ombros.

— Saiu? Para onde ele foi? — Shane pareceu um pouco alterado.

— Foi procurar minha mochila no bosque. — Não pude evitar me encolher.

— Você não deixou sua mochila no bosque. — E apontou para o canto ao lado da estante, do outro lado da sala, apertei os olhos um pouco e notei que minha mochila estava ali, ao lado da mochila de Ally. Como não havia visto? Como Jamie não havia visto?

— Mas como...?

— Minha irmã trouxe para você.

— Mas o Jamie disse que não havia visto... Jamie! — Finalmente entendi o plano dele.

— Acho que ele mentiu...

— Sim, e Ally sumiu. Estão com certeza tramando alguma coisa. — Cerrei os punhos com raiva.

— O que acha que estão tramando? — O brilho de curiosidade de volta ao olhar dele.

— Querem que me aproxime de você sem medo, acho.

— E está funcionando?

— Talvez...

— Então vamos entrar no jogo também. Quer ir lá fora? Sei o nome de algumas flores diferentes e posso mostrá-las para você.

— Como sabe os nomes das flores?

— Minha mãe costumava ter um jardim.

— Entendi. Bem, acho que não tenho escolha mesmo.... Vamos!

— Você tem escolha, sim. Se não quiser caminhar comigo lá fora é só dizer que não quer.

— E você me deixaria em paz?

— Não. — Esboçou um sorriso. — Você está completamente sozinha e essa casa é perigosa.

— Ally também está sozinha.

— Não. Acredito que ela e Jamie estejam juntos.

— Ah!

Andamos por todo o jardim e ele foi me apresentando cada uma das flores, também me contando um pouco do que sabia sobre as plantas, de acordo com o que a mãe dele dissera.

— Gostaria de ver a estufa? — Aceitei. Segurou minha mão, mas ao fazer isso não pude deixar de estremecer com o toque e ele a soltou.

Entramos na estufa que ficava entre duas árvores de porte grande, que não havia notado antes e notei que tinha o formato de uma cúpula de vidro. Lá dentro havia uma quantidade realmente grande de flores, mas eram todas como as do jardim. A única diferença eram as cores exóticas e impossíveis para flores normais. Havia uma rosa com o cabo e as folhas congelados, exibindo um tom lindo de azul cristalino e suas pétalas eram rosa choque, vibrantes e delicadas. Ele pediu para que escolhesse uma e não pude evitar minha verdadeira paixão: uma rosa vermelha escura, quase cor de vinho, com o cabo verde musgo e as folhas de um tom de verde ainda mais escuro. Ele pegou o alicate e a colheu. Depois tirou os espinhos e me entregou.

— Eu sempre quis uma rosa vermelha. — Sorri admirando a flor.

— Imaginei que se apaixonaria por uma das rosas.... — Deu de ombros.

— Obrigada.

— Não agradeça, quero um favor em troca. — Sorriu de canto me observando e meu sorriso desapareceu quando meu coração começou a pular no peito.

— O que você quer? — Minha voz saiu mais baixa do que planejei.

— Quero que me deixe desenhá-la segurando a flor. — E abriu o caderno, que segurou durante todo o percurso, tirando o lápis do bolso da calça preta que vestia.

— Ah.... Claro. Sem problema, mas não desenhe meu rosto, por favor.

— Certo, mas por que não?

— Não quero.

— Ok.

— Como é o nome daquela flor que me deu o desenho? — Disse tentando fazer com que o silêncio fosse quebrado.

— Ela se chama Bleeding Heart, que quer dizer "Coração Partido". — Falou se concentrando no papel e no lápis, enquanto me desenhava com a flor. Tentei não me mexer muito.

— Que nome triste para uma flor....

— Certa vez li que a beleza vem acompanhada de muita dor e sofrimento. — Seu tom de voz era sombrio e tentei ignorar meu estômago se revirando.

— É verdade... — tentei ignorar a sensação de tristeza e medo que se apoderava de mim e não sei como juntei coragem para fazer a pergunta seguinte. — Quem é Alana Valentini?

— Quem te falou esse nome? — Sua cabeça ainda estava voltada para a folha, mas notei que seu olhar se erguera para me observar.

— Não é importante. — Tomei a defensiva. — Quem é ela?

— Ninguém importante. — Voltou a observar o desenho e sorriu quase imperceptivelmente.

— Foi ela quem me perseguiu na floresta?

— Não sei. Chega de falar sobre isso, está bem? Não é importante. — Imitou minha voz no final da frase e tentei ignorar a tensão que tomou conta do ar na estufa após suas palavras. Apenas assenti com a cabeça e permaneci em silêncio. Ainda insatisfeita com a resposta, passei a observar a estufa. — Terminei. — Anunciou me entregando o desenho para analisar. — Está mal-acabado, eu sei, mas vou tentar usar como base para pintar num quadro. O que acha?

— Está maravilhoso! Jamais seria capaz de desenhar algo assim! — Estava completamente encantada e não pude evitar de sorrir ao entregar o caderno a ele. — Você vai pintar um quadro?

— Não... não sou bom com tintas, mas espero que encontre alguém que seja. — Estava novamente com uma expressão indiferente, mas seu olhar desmentia isso, estava parecendo feliz. — Você voltaria para ver o quadro?

— Com certeza!

— Ótimo, quando estiver pronto te chamo para ver. Agora é melhor voltarmos para casa antes que os outros retornem. Você e minha irmã precisam voltar para suas casas também.

Fechou o caderno de novo e tornou a guardar o lápis no bolso. Caminhamos pelo jardim de volta para a casa. Ao chegarmos, abriu a porta para mim e senti-me completamente sem graça. Depois, me ofereceu o braço para segurar de maneira quase cômica e imaginei que estivesse brincando e por isso aceitei a oferta. Mas quando tomou meu braço e começamos a adentrar a casa dessa forma, me arrependi de ter aceitado. Seu toque ainda me causava arrepios e ao que parece, percebeu isso.

— Está com frio?

— Não. Estou bem. — Falei rápido. Entramos na sala de estar ao mesmo tempo em que George e Shawn chegavam pela porta da frente. Jamie e Ally estavam sentados no sofá e no instante que nós quatro entramos em cena pensei ter notado nos dois, expressões de espanto.

— O que está acontecendo aqui? — George estava com os braços cruzados em frente ao peito e nos encarava irritado. Shawn não estava muito diferente.

— O que vocês dois estão fazendo juntos? — Jamie e Ally perguntaram em uníssono como se não soubessem de nada.

— Eu é que quero saber! — Gritou George. — Não mandei ficar de olho nela?

— Não sei o que eles estão fazendo juntos. Juro! Pensei que Shane estivesse no quarto e Analice, passeando pelo jardim. — Jamie tinha uma expressão de confusão e inocência que convenceria qualquer um.

— Tudo bem, rapazes. Ela está inteira. — Ally arriscou rir um pouco da situação, mas isso foi um erro.

— Você pensa que é brincadeira? — Shawn a encarava com a sobrancelha arqueada.

— Não, mas acho completamente injusto meu irmão não poder chegar perto dela. Ele já provou que se controla muito bem. — Ally empertigou a coluna e corrigiu sua postura ao se dirigir a ele novamente.

— Isso é verdade... — Jamie comentou baixinho e George o observou ainda mais irado.

— Jamais atacaria alguém da forma como vocês pensam. Principalmente ela! Foi ao salvá-la que me tornei vampiro! — Shane parecia alterado e isso não era bom para provar aos outros o que estava dizendo.

— É verdade. — Concordei para tentar ajudar de certa forma.

— Espera! Foi meu irmão quem te salvou, Ani? — Ally parecia chocada e por um momento não soube o que dizer.

— Foi. — Shane respondeu por mim e tentei inutilmente me afastar dele, ainda estava com o braço junto ao meu.

— Por que não me contou, Ani? Não pensou que ficaria com raiva, não é? — Parecia chateada.

— Na verdade, foi exatamente isso. — Baixei a cabeça ao responder. Ally levantou e vinha em minha direção, mas George foi mais rápido.

— Chega! Agora vocês duas precisam voltar para casa e você! — George apontou diretamente para mim ao nos separar. — Você precisa libertar o Bryan do seu porão.

— Tudo bem. Você está certo. — Concordei antes que começasse a gritar ainda mais alto. Peguei Ally pelo braço e a arrastei até a porta depois de pegar nossas mochilas.

— Tchau meninos! — Despediu-se.

— Até outro dia. — Disse.

Jamie saiu conosco e nos levou de carro até nossas respectivas casas, primeiro Ally e depois eu. Assim que estacionou em frente à minha casa, o agradeci e saí do carro depressa, fechando a porta e dei a volta para chegar ao portão.

— Ei! Não vai me chamar para entrar?

— Jamie!!! — O repreendi.

— Filha? — Minha mãe chamou abrindo a porta de casa. Já era.

— Mãe! Oi! — Forcei um sorriso.

— Olá! — Jamie acenava de dentro do carro preto e luxuoso (que não sei o nome do modelo) e tive vontade de socá-lo.

— Oh! Olá! — Minha mãe parecia surpresa. — Como você está? — E se dirigia até a extremidade do quintal, onde Jamie estacionara o carro.

— Estou bem, obrigado. E a Senhora?

— Ótima, muito obrigada. Gostaria de entrar e almoçar conosco? — Assim que a ouvi dizer essas palavras, arregalei os olhos incrédula. Ninguém percebeu minha reação.

— Eu adoraria! Onde posso estacionar o carro? Acho que os vizinhos não vão gostar se estacionar aqui....

— Só um minuto. Filha abra o portão maior! — Gritou para mim e depois se dirigiu a Jamie. — Pode estacionar na grama mesmo. — E voltou para casa dizendo que prepararia outro lugar na mesa. Eu a obedeci e logo Jamie deslizou o carro para dentro do nosso quintal. Assim que saiu, grudei em seu braço e sussurrei entredentes:

— No que está pensando? Você não come! Lembra?

— Quem disse isso?

— Eu li!

— Não deveria acreditar em tudo o que lê... — riu de leve e começou a me puxar para a casa. — Nós só não sentimos o gosto da comida, mas podemos comer. Por que não queria me deixar entrar?

— Porque é perigoso.

— Não se preocupe. Nada vai dar errado. — Segurou minha mão ao chegarmos na porta e a abriu. — As damas na frente...

— Pare já com isso. — Sussurrei o mais baixo que consegui, com a raiva substituindo meu sangue nas veias.

— Por quê? — Parecia estar se divertindo. Não consegui responder, pois minha mãe nos interrompeu.

— Vamos almoçar?

— Com certeza! O cheiro está ótimo! — Jamie respondeu se dirigindo a cozinha. Tentei recordar a aula de biologia e tinha quase certeza que olfato e paladar estavam relacionados. Como podia sentir o cheiro e não o gosto? Segui bem devagar para a cozinha e quando estávamos todos servidos notei que meu irmão não estava ali.

— Mãe, onde está o Renan?

— Está na casa da minha tia. Ele conheceu uma menina da idade dele e ficaram brincando por lá. Ela é vizinha da tia Annie.

— Como é o nome da menina?

— Mina. — Respondeu minha mãe.

— Perdão, Senhora, pode repetir esse nome? — Jamie havia parado com o garfo entre o prato e a boca e encarava minha mãe.

— Mina Becker. Por quê? — Minha mãe estava com uma expressão confusa.

— Nada. É só que eu a conheço. É irmã de um amigo meu... — Jamie passou a me encarar assim que minha mãe virou de costas e tentou me dizer algo sem usar palavras, só gesticulando. Tentei gesticular para demonstrar que não entendia e então ele moveu os lábios bem devagar: Shane.

— Pronto! Agora sim, havia esquecido a salada! — Minha mãe tornou a sentar-se na mesa e nós tentamos nos recompor.

Minha mãe fez diversas perguntas a Jamie e não sei como conseguiu inventar tantas mentiras tão rapidamente. Terminamos o almoço quase ao mesmo tempo e então minha mãe pediu licença para telefonar à casa da nossa tia e ver se estava tudo bem por lá. Aproveitei a deixa e segui para a pia. Jamie me acompanhou e passamos a sussurrar.

— Meu irmão está brincando com a irmã do Shane?

— Sim. É a irmã mais nova dele, que mora ao lado da casa da sua tia?

— Eu não sabia! Não reparei que era a casa da minha tia quando visitei Ally! Espera! Se a Ally é vizinha da minha tia e lá também é a casa do Shane... Ele não foi para casa hoje, não é?

— Não. Hoje não. Por quê?

— Minha tia e meu irmão correriam perigo se fosse para lá, certo? Pode até estar acostumado com o cheiro do meu sangue, mas vocês disseram que sangue de criança é mais difícil de resistir!

— Sim. Até que você não é tão ingênua... — tentou dar um tom brincalhão na conversa.

— Devo agradecer? — Soei irônica.

— Não precisa. — Riu.

— Filha, tenho que buscar seu irmão. Parece que ralou o joelho enquanto brincava e agora está chorando sem parar. Fiquem à vontade, mas juízo, ok? — Minha mãe já estava na porta e fiquei boquiaberta com a atitude dela. Ela nem conhecia Jamie direito e me deixaria sozinha com ele?

— Quer que leve a Senhora? — Falou ele correndo até a porta.

— Não precisa...

— Já estava indo para lá mesmo, eu te levo! — Jamie saiu e ouvi o som da porta sendo trancada. Sozinha em casa....


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