💫 Concentrada em Você
"(...) Aqui há alguma coisa especial, alguma força sobre-humana que sustenta estas almas. Será isto o amor?"
– A Pianista, Machado de Assis
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Seu peito sobe e desce preguiçosamente sendo emoldurado pela camisa amarrotada, o tom alaranjado da hora dourada estampa até onde o pano tão branco quanto a neve bagunçado e desabotoado permite, e a janela está aberta, coberta por uma cortina fina, deixando a brisa entrar sem muitos impedimentos, a fazendo dançar tão suavemente que quase não se percebe.
Eu sinto seus dedos percorrerem caminhos no emaranhado alaranjado que chamo de cabelo, vez ou outra a sua voz surgia dizendo o quão quente o dia estava, mesmo que o ar-condicionado estivesse ligado e o ventilador girando, somente porque eu pedi por aquele som.
Estávamos jogados, cansados demais para agir depois de voltar de uma viagem longa, minhas pernas se perdiam entre as dele, o que facilmente me engolia.
Sua pele macia recebe um carinho das pontas dos meus dedos, onde eu faço uma espiral imaginária, criando paisagens por onde a estrela ilumina, idealizando a criação de mais um sol que em sua amável essência de só saber amar, jamais traria colapsos, porque ele me faz sentir que na ausência das nossas falas seu toque não se vai, ele continua irradiando luz, calor e vida, o segundo sol chegou e aquece cada pequeno esconderijo em mim, atende pelo nome do meu amor, se chama Taehyung.
Desviei os olhos para seu rosto e como quem conhece as possibilidades na palma de suas mãos, ele faz o mesmo e sorri, vencendo na convicção de que estou sempre à espreita, prestando atenção em como seus cílios se comportam ao fecharem-se.
— Amanhã você quer assistir o Sol ir descansar? — seus lábios quase não se movimentam, mas a sua voz já é o suficiente para me arrebatar.
— E o Sol descansa?
O vi fechar os olhos enquanto ria, fitou a janela com cuidado e negou em um gesto incerto, sem nem saber que perguntei pensando em como em todos os dias e noites eu estive sentindo o quanto ele me recarregava as energias, o quanto ele trazia ao meu corpo o que precisava para continuar funcionando, sem descanso, estando aqui comigo, do outro lado da cidade ou do mundo, eu consigo sentir a influência dos seus raios.
— Tá certa, nunca…
Me apertou um pouco mais em seus braços, um abraço deixando claro que ali era lar e beijei um pouco abaixo do limite de sua blusa, onde as pintinhas gêmeas fazem morada, seu arrepio ao ter meus lábios subindo até sua clavícula era meu deleite, seus suspiros ao senti-los arrastando de seu queixo até o canto de sua boca minha euforia.
Passei aquele fim de tarde perscrutando a paisagem onírica que ele é, agradecendo aos céus por poder morar em cada canto dele e sonhar acordada ao ser enlaçada por ele. Ainda traçava linhas por seu corpo quando a iluminação prateada invadiu o quarto, surrupiando a glória da luz dourada que deixava tudo claro demais.
Ainda que essa mudança de tonalidade causada pela troca de astros e a transferência do comando do céu, tenha ocorrido vagarosamente, sendo um acontecimento infinito dentro da finidade que os ponteiros denunciam, ainda que eu tivesse vislumbrado a transformação nas cores estampadas em seu rosto, pescoço e peito, sei que não prestei atenção no anoitecer lá fora, mas sim em como toda a alteração de tonalidades quentes e frias incidiam sobre ele, como o sombreamento das cortinas finas dançavam nele, acompanhando o sol desaparecendo mais uma vez em sua pele, vendo o alaranjado se tornar mais avermelhado e até que o azulado estampasse cada pedaço descoberto de seu tronco.
Assistir o dia se findando através de seu corpo era sempre mais bonito, ele virava a tela com suas pintinhas que poderiam muito bem ser pássaros voando em liberdade, as alianças que brilhavam ainda mais douradas em nossas mãos eram o segundo sol, um astro que deixava toda a composição ainda mais nobre em ser vivida e apreciada, nossa própria estrela que escolhemos fazer brilhar dia após dia.
Taehyung se mostrava tela para o pôr-do-sol e anoitecer, minha pintura preferida.
Ele nem mesmo se dá conta de que meus olhos correm sobre si de maneira semelhante às gotas perfeccionistas que correm sobre um corpo, onde elas puderem passar, dançam com toda a boa vontade de levar pelo menos um pouco de essência. E minhas íris dançam pelo modo em que seus olhos acompanham a legenda do anime, lendo cada frase com atenção sem ao menos perder os movimentos feitos pelos personagens da animação.
Eu sei que ele não precisa de legenda e só está lendo as palavras na parte inferior da televisão porque é automático, ainda que conheça bem o idioma é difícil não ceder à vontade que o cérebro tem de desvendar códigos, mesmo quando em segundo plano.
Os olhos dele parecem indecisos sobre o foco que pretende escolher, e quando ele direciona suas preciosidades para mim, sei que eu sou a vencedora. Seu sorriso envergonhado de quem não esperava estar sendo observado acorda mais uma vez toda a variedade de cor nas asas das pequenas borboletas, que de tão afoitas se instalaram além de meu ventre, as sinto passeando pelo interior de minha derme quando os dedos dele passeiam por meu antebraço, formigando recanto do meu interior, seguindo o toque lento dele, indo atrás do néctar que as pontas de seus dedos derramam sobre mim, arrepiando cada extensão de mim.
Sem dúvidas me sinto mais doce por onde o calor dele passeia.
— Para de me encarar... — A voz sai baixinha e sua fala sai oscilante, evidência do grande período que ficou calado, e ele ri enquanto me repreende. — Você me faz ficar tímido.
Seu ombro empurra o meu como se eu estivesse errando em algo, mas seu sorriso mal escondido e sua mão gentil que vai e volta em meu braço provam o contrário, me perco vislumbrando os movimentos dele mais uma vez, e toda vez me pego encantada em como seu corpo é sempre tão aconchegante.
— Eu faço isso por anos, já devia estar acostumado — assim como ele, minha voz sai risonha e tenho ciência de que ele encontrou pequenas porções de provocação.
— Meu bem, eu nunca vou me acostumar... — sua voz se perde quando ele deixa seu corpo pender em minha direção e esconde seu rosto entre meus fios, tornando um emaranhado de castanhos e ruivos, uma bagunça do seu liso e meu cacheado. — Seus olhos são demais pra mim, se eu os pego me observando, alguns segundos já são suficientes para minhas pernas virarem gelatina, ainda bem que não estou de pé — riu fazendo graça e tão rápido como só ele, seu semblante se tornou sério — Amo você.
Seus cílios em contato com meu pescoço me fazem cócegas e sua boca encostando tão levemente em minha pele me arrepia, não só aquela região, e sinto seu sorriso vitorioso contra minha clavícula, rio junto com ele por sua maneira baixa de me devolver.
— Ficou desconcertada?
Não o respondo, não porque ele não acertou, ele mirou e a flecha foi diretamente ao centro de seu alvo, meu coração parece querer escapar de mim.
Ele já não está com o rosto enfiado no meio da cabeleira alaranjada, seus olhos estão fixados nos meus, e não precisa de muito para que eles se conectem, sinto meus pares castanhos presos por algo invisível, o magnetismo dos olhos me faz refém dos movimentos certeiros que suas íris fazem, se deslocando, observando cada pedacinho meu e como presa em um encanto, que eu desejo nunca ser quebrado, reflito seus movimentos um pouco mais lenta, observando seus cílios superiores que quase não se tocam aos inferiores por ele estar atento demais, mais uma vez sinto seus dedos em mim, dessa vez em minha bochecha esquerda, quase não me toca e uma pequena impaciência de quem já está frente ao seu ponto fraco, prestes a tomá-lo, me atinge e se alastra por meu corpo, minhas mãos tremem quando eu as levo até ele, estão prestes a tocar em seu vício, ansiando por mergulhar em algo que sempre vou querer mais.
Taehyung me presenteia com um sorriso doce, daqueles que me tonteia e me rouba a noção do que se instala e tine a nossa volta, eu nem estou ligada em que ponto a trama está, já que eu estava o apreciando todo esse tempo, estudando os traços esculpidos e suas particularidades, olhar todas elas de tão perto ainda não me tira a sensação de fantasia utópica, ele tem beleza onde quer que eu procure.
Meus dedos ainda parecem surpresos quando tocam em sua pele, esperavam algum tipo de porcelana, esperavam tocar uma superfície frágil que poderia ser quebrada por minha falta de jeito, nunca esperam a pele morna e o macio de seu rosto, porque custa acreditar que eu estou sendo circundada por um abraço tão abrasador, até os mais crentes se perderiam ao sentir seus beijos com gosto idílio.
Ele é um sonho montado por um subconsciente brilhante demais para habitar nesta terra, está além das capacidades grandiosas e ainda assim ínfimas do mundano, ele fora idealizado sublimemente por Deus.
Por isso quando volta a se aninhar em meu colo preciso de ar, preciso de tanto oxigênio quanto é possível conseguir inspirar, eu não queria assistir aquela animação que me fazia chorar, meu coração pede para que eu fique vidrada nele, uma epifania em ter ciência de que só há um dele e esse faz morada em mim e eu nele, quero estar o investigando minuciosamente, competente no modo em que ele retira os fios castanhos da frente de seus olhos, na testa onde há uma espinha que ele nomeou.
— Onde você vai? — me remexi para me afastar, indo totalmente contra a vontade de minha pele que já protestava pela falta de seu peso sobre minhas pernas — Vai me abandonar? Achei que ia ser eu e você, assistindo juntos.
— Me perdoe, eu já volto — dei um selinho curto, não era ao menos suficiente para acalmar a corrente de agitação que crescia dentro de mim.
Corri nas pontas dos meus pés, queria chegar rapidamente ao meu destino e voltar o mais breve possível, minhas mãos estavam ansiosas para traçar as linhas dele e meu corpo precisava ficar pertinho do dele, era uma questão de sobrevivência, precisava dele, olhar e sentir tudo o que ele tinha para me oferecer.
O pequeno ateliê estava bagunçado, potes de tintas novas, ainda intocadas, dividiam espaço com outros potes mais antigos, haviam telas brancas apoiadas na parede e algumas penduradas, imagens surreais, que me arrebatavam a cada vez que eu invadia o espaço que compartilhava com Taehyung.
Eu consigo facilmente fantasiar nossa realidade, seu corpo protegido por um avental, ainda que não pudesse impedir totalmente de que fosse vítima de espirros de cores, ele sujava sua pele, o avental, o chão e o que tivesse vazio passava a ser policromático enquanto ele estivesse submerso em seu próprio mundo.
Além do quarto, ali nós nos tornamos indivíduos homogêneos que tinham seus modos de externar o que carregavam, sempre damos um jeito de nos introduzir no mundo um do outro, de experimentar um pouco de nossas particularidades, além de descobrir pela milésima vez cada pedacinho meu e dele, colorindo nossas dermes em batalhas cheias de beijos e sons que eram abafados pelo isolamento acústico do ambiente, tendo o chão como palco e os objetos como testemunhas de que dois seres humanos amando é arte pura.
Minhas coisas eram as mais organizadas, Taehyung costumava deixar tudo disponível para criar a hora que bem entendesse, enquanto eu precisava de tempo, silêncio absoluto e uma visão clara do que começaria a fazer. Peguei apenas uma prancheta, papel e lápis de grafite macio para fazer ele tomar forma no papel.
Voltei correndo para o ambiente meio escuro, ele ainda estava atento à tv, cada vez mais sonolento.
— Você voltou, bem quando Taki acabou de perceber que o vilarejo não existe!
— Ah, meu amor, se prepare para as lágrimas que virão — me sentei em uma cadeira, deixei as coisas sobre a mesa e fui até ele.
— Você vai desenhar, mas e o filme?
— Silêncio, estou observando! — ele riu abafado, revirando os olhos para em seguida consertar a postura, se sentando de frente para mim recebeu minhas mãos eu seu queixo, meu toque deslizava sobre a barba recém feita depois de tanto dizer que não sabia se continuava com ela, as linhas de seu rosto eram lindamente bem definidas.
Deslizei as pontas dos dedos sobre a delimitação de sua mandíbula, correndo devagar pelo canto de seu rosto, subindo para perto de sua orelha, esbarrando em pintinhas pelo caminho. Seus olhos estavam fechados, suspirou aproveitando-se das vezes que acariciei cada canto, mas seu sobressalto ao me ter sentada em seu colo revelou que ainda não estava dormindo, seu suspiro foi ainda mais dolorosamente audível, do jeitinho que me faz querer nunca mais me separar dele. Me faz querer deixar o emprego, aulas e tudo mais para trás e me trancar com ele dentro daquele apartamento, comer e dormir, comer e amar, somente eu e ele sendo um, bem juntinhos. Eu deveria aproveitar toda a intensidade que nossos momentos poderiam nos proporcionar, então senti cada relevo em seu rosto, reavivando em meus dedos a memória de como seu rosto movia arrebatadoramente a minha inspiração.
— Você precisa disso para desenhar? — riu e seus braços passaram por minha cintura, querendo me prender a ele — Por favor, não sai, fica assim coladinha comigo.
— Não vou a lugar algum, e sim, preciso disso para desenhar.
— Me explica seus motivos… Eu gosto de ouvir sua voz, principalmente enquanto está me tocando.
— Se você ficar rindo eu vou perder minha linha de raciocínio! — riu ainda mais alto e eu não consegui prosseguir até que ele parasse de mexer — Geralmente eu só desenho, algo surge em minha cabeça e eu idealizo os detalhes, me sento e pondero no que planejei, pesquisando por onde posso começar. Como quando vou desenhar flores, preciso decidir se começarei pelo caule, pelas pétalas ou até mesmo se inicio primeiramente os primeiros traços da sépala. Mas hoje eu não consigo, simplesmente não consigo somente idealizar, mesmo que a imagem esteja sempre em alta definição em minha cabeça, não consigo me decidir se começarei por suas sobrancelhas bagunçados — deslizei a unha por seu supercílio, e segui desenhando por cima dos pelos desordenados.
Eu gostava de estar me aprofundando em cada poro dele, parando para esquadrinhar cada rachadura rósea de seus lábios, mergulhando em cada fio castanho escuro de seus cílios, me agarrando a cada característica tão própria dele, apreendendo para mim a diferença perfeita de seus olhos, tocando e assistindo cada pedacinho de seu rosto, desenhando formas imaginárias em sua bochecha, querendo percorrer a ponte de seu nariz com toda a vagarosidade que o universo poderia proporcionar.
— Tenho necessidade de tocar na arte que não me sai da cabeça. Você me entende, né? Quando uma imagem não sai de sua cabeça até que você consiga colocá-la para fora... — os olhos estavam fechados como se fosse pegar no sono em breve, mas não deixou de murmurar uma resposta curta — Eu preciso desenhar você, mas dessa vez não conseguiria sem uma experiência mais… palpável. Quando estava aprendendo, bem no início de tudo, gostava de tocar nas esculturas que fosse desenhar para ter maior noção de onde deveria sombrear e detalhar com mais precisão. Agora, sinto que preciso fazer o mesmo, sentir a textura da sua pele tão profundamente quanto é possível, estar tão focada que consigo sentir os pelos faciais mais finos, como se eu pudesse, vivenciar com os olhos fechados sua temperatura, como se de alguma forma, eu fosse capaz de submergir em seu arranjo. Sinto que estou aprendendo sobre você, cada marca de expressão que já visitei e ainda assim parece que é a primeira vez que as vejo, as sinto. Estou conhecendo você mais uma vez, Taehyung, viciando meus sentidos aos seus detalhes e por enquanto estou tocando apenas seu rosto porque será um desenho de busto, nada muito grande, decidi que quero focar nos meus pedidos de oração antes de dormir, os seus olhos — ele os abriu, suas brilhantes me fitavam descobrindo cada pedaço dos meus. — Dessa forma sinto que estou amando você, conhecendo você, sentindo com meus dedos o que às vezes acho ser apenas uma criação do meu subconsciente. Promete que você não é um sonho?
— Amor, estou sentindo seu toque e só por isso tenho certeza de que você existe. Quando fecho os olhos, penso que pode ser um delicioso desvario — seu rosto estava próximo do meu, sua boca a milímetros longe da minha, apenas um beijo e eu não me desataria dele pelas próximas horas — Por Deus, eu estou loucamente apaixonado por você e eu prometo que sou real!
Ele carrega traços delicadamente marcados, a honra de arte que me faz delirar e podemos estar em um quadro e ele é o objeto principal, não seria uma loucura, porque nem as musas mais bonitas dos quadros que ele tanto gosta, se comparam a ele, que me olha... Mas contrariando sua quietude costumeira, não cansa de murmurar, e percebo que ele não para de se remexer.
— Tê, fica quietinho, por favor — beijei a pontinha de seu nariz, abençoando sua pintinha, depois indo até suas bochechas e beijando cada lado, para em seguida me demorar na testa morna e descer finalmente até seu queixo, deixando ali algo mais duradouro, grudando meus lábios como a promessa de que voltarei ali ainda esta noite — Estou concentrada em você!
Beijei o canto de seus lábios e tentei me levantar, mas ele me pressionou a continuar na mesma posição, fazendo bico e aproveitando da pirraça que conseguia me fazer desistir de me desatar a ele, mas não agora, agora eu preciso colocar no papel o que não sai da minha cabeça e que faz formigar meus dedos, então beijei sua boca, sem aprofundar nosso contato o fiz amolecer e em seu momento de deleite, fugi de seus braços e sentei triunfante na cadeira perto da luminária.
— Isso deveria ser crime — fechou a cara e o filme já estava em seu fim, o casal conseguiu reverter a situação do vilarejo — Me fez perder o filme, me fez ficar todo molenga por você, estou todo arrepiado e você simplesmente me deixa para ficar com um pedaço de papel!
— Para de reclamar, será você nesse papel — dei de ombros, começando a formar os primeiros moldes — Bom, uma representação, não vai ficar perfeito porque só Deus poderia dar forma a algo tão apolíneo. Mas darei meu melhor, prometo!
— Queria sua boca na minha, agora — se voltou para as cenas finais, se acomodando ao sofá, ainda bravo tentava não sucumbir ao sono — Isso sim, seria magnífico!
Passei algumas horas riscando com delicadeza e apagando linhas que representavam seu rosto, vendo Taehyung trocar de canal entediado enquanto eu bisbilhotava seus traços a fim de ter certeza de que ainda me lembrava das perfeições que o compõem. Desenhar ele era exercitar minha mente e corpo a nunca esquecê-lo, a deixá-lo aproveitar a morada que fazia em mim, me deixava à flor da pele para mergulhar em todo aquele sentimento surreal que ainda era difícil demais compreender, algo grande demais para um ser pequeno como eu sentir, que me extrapola e martela em minha cabeça.
Eu precisava aliviar a sobrecarga, a overdose de Taehyung para me intoxicar mais profundamente, era um ciclo vicioso que não matava, mas trazia vida, todo dia escolhendo me embebedar dele cada vez mais e eu jamais abandonaria aquilo.
A prova estava nas pilhas de rascunhos e desenhos dos olhos dele, com as curvaturas de sua boca, ele descansando e sorrindo, ele com os olhos profundos observando algo, caminhando ou sentado, eu precisava sentir e expressar com auxílio do meu corpo o que meu coração gritava.
Meu coração grita o nome dele, ontem, hoje e amanhã ainda terá voz para esgoelar-se, com uma entonação poderosa e mordaz, cantando todas as notas e evidenciando todas as letras que denunciavam a quem pertencia.
Terminei minha obra, sempre acho que posso melhorar quando é ele a minha musa, mas eu quase posso sentir a pele quente ao tocar nas linhas que tracei, ele estava em meu coração, em meus papéis, no meu ateliê, em cada cômodo do apartamento e eu estava pronta para me entupir de seu cheiro, varar a noite inteira ao seu lado, em cima ou por baixo, eu precisava me recarregar, para mais uma vez o bisbilhotar com liberdade, passear os dedos e olhos de maneira artística e devocionada, descobrindo novos relevos, cores e traços, redescobrindo caminhos que me levariam para ele.
— Tê… — me arrastei pelo sofá grande até subir em cima dele, o acordando com cafuné nos fios — Você está com muito sono? Agora eu realmente preciso de outro tipo de concentração.
— E precisa de mim agora, é?
— Bom, sempre…
— Ótimo, tirei uma soneca e estou revitalizado! — se espreguiçou, bocejou e logo beijou minha clavícula, agora era ele quem me desestabilizava, mas parou abruptamente — Primeiro diz de novo. Diz no que está concentrada daquela forma tão fervorosa que me fez tremer. Com esses olhos que não perdem nada, e mesmo assim, acreditam que não viram tudo. Diz que não é sonho, que esse olhar de labareda é real e eu não estou prestes a hiperventilar por causa de uma imaginação bucólica demais para se tornar real.
— Eu estou totalmente concentrada em você, e nós dois somos feitos de carne, sinta só — retirei seus fios da testa, fazendo cachinhos com os dedos — Somos bem reais, o que estamos sentindo ainda irá durar o bastante para que possamos levar para a eternidade como cúmplices de um eterno enlace.
Me beijou e dessa vez nenhum de nós iríamos nos afastar, nossos cabelos já estavam virando confusão, o sofá era uma farra de tecidos e pele, e eu percorri todo o caminho que outrora havia aprendido, com ciência de que eu conquistava cada pedaço de derme dele, tocando e sentindo todas as texturas de Taehyung, compenetrada em cada gesto e minuciosidade dele, totalmente encantada e concentrada no amor que me arrebata.
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