Capítulo 19
Estou nervoso.
Não estou me aguentando.
Você pode pensar que esse não seria o caso, uma vez que Sam está espremido em um assento econômico ao meu lado, a barriga do avião cortando o vento abaixo de nós, mas acontece que ele não estava errado. Será difícil nos vermos depois disso, especialmente com o papel passivo ao qual ele está se apegando.
Gosto que Sam seja um cara de alta fibra moral, realmente gosto. Não me sentiria tão atraído por ele se ele fosse desprezível. É adorável, mas também é um obstáculo. Ele está totalmente convencido de que uma distância um pouco maior matará meu interesse por ele e, embora uma hora seja ótimo no grande esquema das coisas, não será a interação diária a qual estou acostumado. Porque ele está muito determinado a “fazer a coisa certa” não fará nenhum esforço para diminuir nossa distância. Se eu não fizer esse esforço, provavelmente nunca mais o verei, nem mesmo ouvirei falar dele depois que nos separarmos no aeroporto.
É muito ruim.
Sei o quanto ele gosta de mim. Ele é tão fácil de ler quanto um livro de “as primeiras palavras do bebê”. Ele simplesmente não age porque é um maldito mártir. Não seria um problema se frequentássemos a mesma faculdade ou morássemos juntos, mas não temos isso. Não terei como acompanhá-lo ou ver com quem está passando o tempo. Isto não é onde Judas perdeu as botas em Illinois. É o estado progressista e inovador da Califórnia. Sam é lindo e, embora eu acredite nele quando diz que não gosta de mulheres, ele estará cercado por muitos idiotas intelectuais, bonitos e nepotistas. Eu transei quase exclusivamente com garotas antes de Sam, então não é exagero pensar que ele quebrará mais algumas escalas de Kinsey*. (*NT: A Escala Kinsey é um instrumento da psicologia usado para "medir" comportamento sexuais, resultando em uma posição na escala que revela o grau de interesse sexual de uma pessoa para além da visão tradicional binária de heterossexualidade e homossexuailidade)
Quem vai entretê-lo se eu não estiver por perto? Ele não considera que estamos em um relacionamento. Em sua mente, é apenas uma aventura. Isso está me deixando louco só de pensar. Ele me deixa louco. Nunca tive problemas de controle como agora. Quero… colocar um microchip nele. Instalar uma pequena câmera na porra dos seus óculos, qualquer coisa.
Se tivesse que colocar um alfinete na linha do tempo, diria que entre o começo do primeiro semestre e o final do nosso primeiro ano será o mais difícil. Depois disso, quando ainda estiver agarrado a ele como a craca mais persistente do mar, ele não terá escolha a não ser admitir que estava errado sobre meu interesse ser temporário.
Não posso soltar o acelerador, nem por um segundo. Se não jogar duro para conseguir e deixar a distância acontecer, ele não começará a me perseguir de repente como um estudante desesperado. Ele vai acreditar que estava certo e me deixar ir. Sam é meu, porra. Olho para ele e merda, basta olhá-lo. Ele está lendo e suas longas pernas estão cruzadas na altura dos joelhos, está vestindo um moletom verde-escuro com um decote que não faz nada para tampar sua garganta e clavícula gostosas. Seus óculos caem no nariz pequeno e suas sardas parecem que Deus jogou tinta em suas maçãs do rosto. O verde brilhante de seus olhos brilha hesitantemente sob cílios longos e grossos, e ele coloca um cacho saltitante atrás da orelha.
Gostaria de ter sido um estudante de inglês melhor. Queria ter prestado mais atenção às aulas dele, a Hawthorne. Gostaria de ter palavras para descrever o quão lindo é. Ele nem está fazendo nada, está apenas sentado, lendo, mas mal consigo respirar. Eu o amo para caralho…
— Dean, não concordei em pegar esse vôo com você para que você pudesse derreter minha cara — murmura, sem tirar os olhos do livro.
— Você queria se juntar ao clube do sexo nas alturas, certo? Você está uma delícia.
Isso gera uma bufada envergonhada e fico com frio na barriga ao vê-lo tentar matar um pequeno sorriso. Ele lança um olhar provocador pelo canto do olho.
— Com você? Nunca. Você fode como um touro numa loja de porcelana.
Oh! Essa foi absolutamente a pior coisa a dizer a um bastardo ciumento e excitado como eu. Me inclino sobre o apoio de braço, mais fundo em seu espaço do que ele jamais se sentiria confortável em público, mas ele não se afasta. Ele inclina o rosto em direção ao meu, mas sem tirar totalmente os olhos do livro.
— Só eu? Por mais baixo que tente gritar meu nome, todo o avião ouviria.
Ele fecha o livro com um suspiro, virando o rosto na minha direção.
— Parece que nós dois fomos banidos do clube então.
Meia polegada e nossos lábios se tocariam. Não quero nada mais do que romper essa distância, mas por mais paquerador que ele esteja agora, não deixaria isso acontecer. Ele poderia quebrar meu nariz com uma cabeçada. Recuo com meu próprio suspiro triste. Devemos pousar no aeroporto internacional de Fresno em quarenta e cinco minutos, o que é muito pouco. Sam insistiu no aeroporto de Fresno para facilitar para mim, alegando à sua mãe que o custo da viagem seria mais barato. Ela virá buscá-lo e estou proibido, sob ameaça de castração, de chegar a menos de cem metros dela.
Isso não significa que não possa… observar discretamente.
Meus nervos zumbem como moscas quando pousamos, desembarcamos e acompanhamos grupos de viajantes impacientes na esteira de bagagens. Não quero deixá-lo ir, não quero que saia da minha vista nem por um segundo. Sam, por outro lado, parece tão emocionado quanto se estivesse comparando marcas de pasta de dente na mercearia. Ele não parece nem um pouco incomodado, mas se há uma coisa que tem a seu favor é que ele tem uma pokerface impressionante.
Ele se manteve muito bem durante o ano letivo, quando me sentava na primeira fila de sua turma e o observava com todo o fascínio de um frequentador assíduo de um clube de strip. Quando o Sr. White quase nos flagrou, ele passou do pânico à expressão normal em cinco segundos. Ele só é vulnerável e fácil de ler quando estamos sozinhos.
De repente, é hora de nos separarmos, e não posso simplesmente ir…
Pego a mala de sua mão e vou em direção aos banheiros.
— Dean, o que…?!
Naturalmente, ele segue.
Não entro no banheiro, apenas coloco a bolsa dele no chão do lado de fora.
— O que está fazendo? — Pergunta, franzindo a testa para mim. Quero tirar o franzido entre suas sobrancelhas, então o faço. Surpreendentemente, ele permite o contato depois de apenas uma rápida e nervosa olhada ao redor. Ninguém está prestando atenção num lugar tão movimentado como este.
— Sam, antes de ir, me escute por um segundo.
— Ah… ok — concorda lentamente.
— Você não vai me abalar — começo, e ele sabe o que estou insinuando. Seu olhar fixo e curioso muda desconfortavelmente para o lado. — Responda às mensagens. Atenda o telefone quando eu ligar. Reserve um tempo para mim, se não, eu mesmo cuidarei disso. Entendeu?
Ele achata seus lindos lábios vermelhos em uma linha concisa, mas devolve meu olhar. Depois de um momento de hesitação, ele assente.
— Farei isso.
— Bom.
Baixo minha cabeça rápido demais para que ele recue, seguro seu rosto em minhas mãos e tomo sua boca em um beijo mordaz. Ele estende a mão para agarrar meus antebraços, soltando um pequeno ruído. Se alguém estiver olhando, é melhor que tenha assuntos mais importantes para cuidar. É um beijo muito sujo para ser dado em público, então não o prolongo. Lambo o interior de sua bochecha como se fosse sorvete escorrendo pela lateral de uma casquinha, e ele tem espasmos contra mim. Então acabou. Antes de me endireitar completamente, não posso deixar de avisá-lo.
— Não faça isso com ninguém além de mim.
Ele faz uma careta, embora tenha mais a ver com seu constrangimento devido à demonstração pública de afeto do que com o meu aviso.
— Entre a aula e você explodindo meu telefone com mensagens e ligações, realmente acha que terei tempo para entreter algo ou alguém?
— Espero que não, porque vou encontrar tempo para espancá-los até a morte.
Realmente tentei fazer com que parecesse uma piada. Tentei sorrir, dizer isso com uma risada. Ele recua, porque não foi nada disso. Saiu tão sério quanto eu quis dizer. Saiu como se cada sílaba fosse um pedaço de gelo cortante. Me pergunto o que ele vê no meu rosto e espero que se lembre disso. Ele respira fundo para se acalmar, algo que faz muito quando está agitado, e pega sua bolsa do chão.
— Você não terá que se preocupar com isso, Dean. Eu prometo. Por favor apenas faça o seu melhor, ok?
Como que para me aplacar, ele fica na ponta dos pés e dá um beijo breve e leve em minha bochecha. É cerca de 100.000 vezes mais difícil deixá-lo ir embora depois disso, mas ele o faz. Eu o sigo discretamente depois de um minuto ou mais, porque quero ver que tipo de senhora é a sua mãe. Seu nome é Jane, o que aprendi em aventuras anteriores de espionagem. Ela está esperando no terminal, então deve ter estacionado o carro no convés adjacente. Meu primeiro vislumbre dela é como… olhar para o futuro. Jane se parece com Sam, ou… acho que ele se parece com ela. Cabelo escuro encaracolado até o meio das costas, com mechas brancas. Levemente sardenta.
Merda, ela está até usando um par de óculos de tartaruga.
Ela é muito mais magra que o filho, quase a ponto de parecer doente, mas isso não diminui seu charme de bibliotecária. Os pés de galinha e as linhas de expressão sugerem maturidade, e imagino o rosto de Sammy envelhecendo e se transformando em algo atemporalmente belo, assim como o dela. Eles se abraçam por um longo minuto e ele não tem medo de sorrir amplamente. Posso contar nos dedos de uma mão às vezes que ele sorriu assim para mim. Sinto uma pontada de ciúme antes que eu deixe para lá, porque essa é a porra da mãe dele, não uma rival romântica.
Desta distância, a partir de cinco minutos de observação, o relacionamento deles parece saudável. Ela parece emocionada ao vê-lo, e ele parece relaxado na presença dela, sangrando pela tensão que criei. Penso em ignorar seus avisos e aparecer entre eles, me apresentando. Sei que causaria uma boa impressão. Sou um filho da puta encantador e, mesmo que afirme ser um ex-aluno, eu a conquistaria. Com Sam, porém, nosso relacionamento voltaria à idade da pedra. Ele provavelmente bloquearia meu número.
— Ah! — O som é uma explosão quente que sai da minha boca quando me viro.
É difícil.
Meu peito está latejando. Me afastar dele, mesmo que seja apenas temporariamente, é doloroso. Não há sensação de segurança que torne isso mais fácil. É como querer, precisar de algo tão desesperadamente, mas ser constantemente instruído a esperar. Sinto como se estivesse rastejando por quilômetros de deserto com uma boca tão seca que minha língua não se solta do palato duro e meus lábios racham e sangram. Ao longe, há uma fonte de água fria, cristalina e cintilante, mas não importa o quanto eu arraste meus ossos pela areia, ela não chega mais perto. Zumbificado, continuarei rastejando. Por que, quando eu finalmente chegar à beira da água? Quando eu tomar o primeiro gole e perceber que tudo está certo no mundo? Não há nada melhor. Recebi um sussurro dessa sensação na primeira vez que transamos, e não deixarei isso desaparecer da minha vida. Não deixarei que ele seja uma lembrança triste e amarga daquele que escapou.
Não há como querer tanto algo sem fazer nada a respeito.
É um primeiro mês difícil.
Já sabia disso, mas ser um “estudante atleta” na faculdade está muito longe de ser como no ensino médio. São dois empregos de tempo integral e sem remuneração. Claro, claro, mensalidades, alojamento, alimentação e cuidados de saúde estão cobertos, mas sem dinheiro vivo, não posso me dar ao luxo de fazer merda nenhuma fora do campus. Não posso economizar para comprar um carro, nem gasolina para abastece-lo. Pensei em voar de volta para Illinois para dirigir minha caminhonete.
Meu velho assumiu o fardo da minha conta telefônica — graças a Deus. Mas estou preso aqui e, se não gostasse tanto do jogo, seria mais miserável do que já é. Ainda não sou titular dos ilustres Bulldogs, mas não deve demorar muito.
Sou um dos quatro signatários da escola de fora do estado, um dos vinte do time de futebol. Para minha surpresa, também sou um dos maiores caras em campo. Há apenas alguns de nós com mais de um metro e oitenta ou mais de dois e quinze. Sei que sou um cara grande, mas este é um time universitário. Não sei, acho que só esperava… gigantes ou algo assim. Francamente, estou preocupado em ficar preso como atacante devido ao meu tamanho e, para evitar tal destino, faço questão de lançar alguns dos passes mais limpos e precisos deste lado do Mississípi. O treinador principal é um homem chamado Jeremy Nelson, e tenho certeza de que é um ex-sargento. Eu o li muito rapidamente, e não é do tipo que se deixa influenciar pela personalidade. Ele se importa apenas com duas coisas:
Talento e habilidade.
Só contei minha primeira piada para o cara após lançar o passe longo mais preciso para Nash Kelly — um de nossos Wide receivers — para um touchdown. Ele esboçou um pequeno sorriso, enquanto normalmente faria um homem chorar. Tenho me dado muito bem com os caras do time, seja titular ou não. Alguns deles são idiotas natos, o tipo de cara que só é bom para você se você for uma cópia. A inconformidade não é vista com bons olhos, o que não é nenhuma surpresa. Para todos os efeitos, pareço estar em conformidade. Não me importo de deixá-los pensar isso por enquanto. É melhor me estabelecer no topo da cadeia alimentar antes de anunciar uma fraqueza.
Fui convidado para vários eventos dentro e fora do campus, a maioria deles disfarçados de sessões de cursinho, embora só tenha participado de dois para manter as aparências. Mesmo que quisesse me envolver na experiência clássica da faculdade, não haveria tempo para isso. Não pensei muito em uma especialização, então, por enquanto, estou matriculado no mínimo em quatro cursos para um Bacharelado em Administração de Empresas. Entre essas três aulas, há um regime rigoroso e demorado de prática, treinamento e condicionamento. Acordo às quatro, finalizo às nove.
Tenho certeza de que você pode adivinhar onde quero chegar com isso.
Sinto falta de Sam até a morte. Ele está a apenas uma hora de distância, mas parece que está a anos-luz. Não percebi o quanto seria prisioneiro de meus próprios horários. Mando mensagens sempre que tenho um segundo livre, e há tão poucos deles durante o dia. Felizmente, ele sempre responde, embora o faça de acordo com sua própria programação. Suas respostas também não são curtas. Posso dizer que ele está se esforçando para me dar o tempo que pedi, sendo transparente sobre o que está acontecendo em sua região. Mesmo que demore apenas cinco minutos antes de dormir, conversamos por telefone ou FaceTime todas as noites.
Ele parece tão exausto quanto eu, e me sustento em sua voz sonolenta, ecoando pela linha como migalhas jogadas pelas grades de uma cela. Trocamos fotos agora também. Claro, fui o instigador. Enviei a ele fotos do meu reflexo no espelho da academia, selfies lisonjeiras de mim mesmo sorrindo brilhantemente com a melhor iluminação que pudesse encontrar. O colar que ele me presenteou, eu uso religiosamente, e isso não é exagero. Rezaria para o maldito se achasse que faria algum bem. Não tirei desde que coloquei: banho, sono, academia, treino.
Ele está atraído por mim fisicamente, então estou aproveitando isso tanto quanto possível. Demorou um total de três semanas implorando antes dele ceder e começar a enviar fotos suas. Ele parece amordaçado de vergonha em cada uma delas, mas porra, ele é tão fotogênico. Ele fica bem em qualquer luz, de qualquer ângulo.
Ele se recusa a enviar qualquer coisa provocativa, então me contento com o que recebo. Posso dizer que há uma foto que ele tirou às pressas, pois está em público. Ele está apertando os olhos contra o sol do meio-dia que entra pelo que parece ser a janela de um café, sem óculos. Seus olhos são tão verdes e brilhantes. O cabelo dele ficou mais comprido no pouco tempo que estivemos separados, e ele está tirando-o do rosto. Tem o sorriso mais minúsculo e fofo, e suas bochechas estão um pouco rosadas, seja devido ao brilho do sol através do vidro ou por sua própria mortificação ao tirar uma selfie.
Já bati uma para essa foto umas dez vezes.
Voltarei a isso, mas deixe-me apresentá-lo ao meu colega de quarto. Voltando à primeira semana no campus, conheci o cara quatro dias após me mudar para o dormitório. Estava começando a ter esperanças de ter o espaço só para mim, mas vejam só, quinta à noite apareceu um novo rosto batendo na porta, com a bagagem no reboque. Não queria assustá-lo, só…
— Agh, puta merda! Sinto muito… desculpe, merda!
Quase não tenho vergonha, então deslizar a toalha para longe da nudez não foi o fim do mundo que ele parecia pensar que era.
— Tudo bem, cara. Vou me trocar no banheiro.
Pego minha pilha de roupas da cama e volto ao banheiro comunitário adjacente com rapidez para poupar o pobre rapaz de mais constrangimento. Ele está olhando fixamente para a parede oposta, estudando-a como se a Monalisa estivesse pendurada ali. Levo meu tempo vestindo minhas roupas, escovando os dentes, isso e aquilo. Saindo do banheiro, o companheiro de quarto — já que ainda não descobri seu nome — está remexendo em sua bagagem aberta. O avalio por trás. Ele é alguém com quem devemos ter cuidado? Concorrência? Confiável? Interessante?
Não, nada disso.
Análise completa: dolorosamente, agressivamente mediano.
Um metro e setenta centímetros de altura. Nem acima do peso, nem abaixo do peso — o físico subdesenvolvido que a puberdade lhe conferiu. Moletom liso, jeans liso, sapatos lisos. Sem acessórios. Não é feio, mas também não é bonito. Seu cabelo ruivo foi cortado com apenas um pedido: “Não me importo, apenas mantenha-o longe dos meus olhos”. Não há nenhuma tentativa de estilo. Ele não cheira a nada além do leve almíscar do esforço e de qualquer marca de amaciante jogado na roupa. Mesmo no conteúdo de sua bagagem e mochila, não há indícios de hobby, personalidade ou toque feminino de uma namorada. Ele é como… a personificação viva e vibrante do pictograma na porta de um banheiro público masculino. Sem rosto, anônimo e esquecível.
Há uma coisa, porém, que desperta meu interesse: as chaves do carro.
Como se sentisse o escrutínio, ele se vira com o que poderia ter sido um sorriso, mas parece mais uma careta estranha.
— Eu… sinto muito por isso. É tarde, deveria ter batido.
Soltando uma risada, deixo-me cair na beira da minha cama muito pequena. Sei que isto é uma habitação comunitária, mas o tamanho é um crime.
— Cara, relaxe. Este é o seu quarto também. Meu nome é Dean, prazer em conhecê-lo.
— Ah, John. Prazer em conhecê-lo.
Cristo, até o nome dele é mediano. Mordo o interior da bochecha para conter um comentário sagaz.
Em vez disso, digo:
— Você deve ser daqui, né? Veio dirigindo?
— Huh? Ah, sim, sou de Bakersfield. E você?
— Illinois.
— Nossa, isso é muito longe. Você é... um estudante atleta, certo? É por isso que está aqui?
Bufando, olho ao redor do meu lado da sala. Não é preciso ser um Sherlock moderno para descobrir isso. Shakes de proteína secando de cabeça para baixo em uma pequena toalha. Bolsa de ginástica com a marca Bulldog enfiada no meio da minha cama. Jersey pendurada nas costas da minha cadeira.
— Sim, pacote completo.
— Uau — John assobia. — Mesmo sem todas as, uh… evidências, você está em… forma. Você já é titular?
Conversamos por mais alguns minutos, aprendendo o básico sobre a pessoa com quem devemos dividir o quarto durante o ano. John está cursando uma bolsa acadêmica e, embora não seja uma bolsa integral como a minha, isso reduziu uma boa parte de suas mensalidades e despesas de subsistência. Em última análise, ele planeja fazer um doutorado em psicologia, e estou um pouco chocado com esse objetivo. Pela minha vida, não consigo imaginar esse cara diagnosticando uma depressão, muito menos algo mais complexo do que isso. Tenho certeza de que, para John, sou tão idiota quanto pareço, totalmente preocupado com a questão da educação.
Outra coisa interessante sobre ele é que sua família é dificilmente o padrão americano de trinta anos atrás. Em vez de “mamãe, papai, dois filhos e meio e um Golden Retriever chamado Buddy”, John é adotado por um casal de lésbicas abastado na casa dos cinquenta. Elas o adotaram ainda criança, há vinte anos. Tenho que me lembrar de que esta é a Califórnia, um porto seguro para quem não é padrão. Estou muito chocado por ele contar a alguém como eu, especialmente durante nossa primeira conversa. Até agora, é a coisa mais interessante sobre ele, e tenho que me perguntar se ele faz de tudo para ser a personificação humana de um wafer insípido e incolor para compensar a estranheza de sua educação. John me garante que ele é estritamente heterossexual.
— Isso não importa para mim, cara — rio.
Obviamente, funciona a meu favor.
Meu alarme toca dez minutos após a sessão do quebra-gelo. São 8h30, então Sammy está oficialmente disponível.
— Ah, desculpe, preciso fazer uma ligação.
Ele acena com a cabeça, voltando para o que sobrou de sua bagagem. Coloco um par de fones de ouvido e inicio a chamada. Sammy costuma atender no terceiro ou quarto toque, e desta vez não é diferente. Ele resmunga na linha.
— Ei.
É como se John deixasse de existir.
— Quem bateu na sua bunda? Esse é o meu trabalho.
Sam bufa, e posso imaginar o sorrisinho que ele tenta afastar do rosto.
— Estou corrigindo trabalhos de merda para um curso de Composição e Retórica. Juro, são uns vinte trabalhos escritos por você.
— Droga, vinte notas 10?
Isso rende uma risada de verdade, e meu peito se aperta com o som forte e irrestrito.
— Deus, eu queria. Inglês não era sua melhor matéria, Dean.
— Ei, trabalhei muito naquela aula.
Ele ri de novo, é possível se apaixonar mais por alguém cada vez que ela ri?
— Pare de falar da minha bunda. Ela está em recuperação.
— Aproveite o intervalo enquanto dura, Sammy.
— Ugh, não faça isso parecer uma ameaça. Nunca vou te contar onde moro.
— Você não precisa me dizer, tenho meus métodos.
Há uma pausa e, quando Sammy fala novamente, sua voz treme com os resquícios de uma risada contida.
— Você não é... tão legal quanto pensa que é. Isso foi tão brega, Dean.
Sorrindo, inclino a cabeça para trás e fecho os olhos.
— Você só fala. Sei que está sentindo minha falta, sempre posso ouvir isso em sua voz.
— Faz apenas uma semana… — diz baixinho, e isso não é uma negação. Fico rígido com o tom vulnerável, olhando para a tela do meu telefone. Meu coração de repente é um beija-flor em meu peito, vibrando. Tenho que resistir a me agarrar na tentativa de acalmar a arritmia.
— Uma semana é muito tempo. Você pode dizer isso, certo? Você vai me ajudar durante o resto do mês se me disser que sente minha falta. — Não percebo que mudei minha voz para algo baixo e sugestivo até que um ruído abafado passa pelo receptor. Ah, porra, sexo por telefone seria tão…
— Eu… sinto sua falta.
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