Você procura o sentido da vida ou a glória do eu?
Eu tenho um atestado médico de inteligência. Aquilo é literalmente um atestado médico de inteligência. Nos entregaram um papel escrito: Altas Habilidades - Superdotação. Mas com certeza deu algum erro, eu tenho tanta dificuldade para fazer algumas coisas. É como se eu funcionasse diferente. Seria patético dizer que sou diferente das pessoas, porque todos são diferentes de todos, mas para além disso eu funciono diferente. Mas não é isso que significa dizer que todos são diferentes? Em partes sim, mas algumas coisas são comuns a maioria.
Eu nunca entendi como as pessoas conseguem se conhecer e se dar bem, pessoas que nunca se viram, se conhecem na vida adulta e em pouco tempo são como melhores amigos de infância, têm piadas internas, abraços apertados, palavras de carinho, e de repente acaba a amizade, o relacionamento, acaba tudo, acaba tudo que se construiu quase do nada, tudo acaba e essas pessoas se afastam.
Pensar sobre isso me fez querer ler um livro chamado Amor Líquido Sobre a fragilidade das relações humanas. Eu cheguei a comprar este livro junto com alguns outros. Eu comprei também Precisamos falar sobre Kevin, Felicidade Clandestina, A via Crucis do Corpo, Mentes Perigosas, Mentes Que Amam Demais e algum outro da Clarice Lispector cujo título eu não lembro porque nunca cheguei a ler.
Comecei lendo um capítulo de Amor Líquido e um capítulo de Felicidade Clandestina e preciso dizer que Clarice me pegou pelo coração e eu devorei Felicidade Clandestina sentindo cada descarga de dopamina inundar meu cérebro. Na ânsia por aquela sensação de ser compreendida e encontrar quem me leia, porque é o que a Clarice faz, nós não a lemos, mas ela nos lê, como se já soubesse o que aflige a maioria das pessoas e escrevesse nessa perspectiva, eu catei o livro A Via Crucis do Corpo, e cadê? Onde está a minha dopamina? Cadê aquela sensação boa que eu queria? Não tinha. Cheguei à conclusão de que não tinha entendido a obra, até perceber que não estava lendo um livro de Clarice Lispector, mas lia Clarice Lispector com sua escrita honesta e quase despretenciosa, seus textos que não obedecem a um escopo, seu corte repentino de raciocínio e a lacuna que deixa ao final para nosso próprio entendimento, era assim que Clarice lia as pessoas, fazendo com que leitores generosos olhassem para dentro de si com a mesma bondade com a qual liam seus autores favoritos.
E eu, que buscava o sentido da vida que sempre esteve à minha disposição, encontrei a glória do eu ao conseguir ter compaixão de mim mesma.
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