03
Alex
Sobrevivi uma noite.
Ontem eu estava tão seriamente pensando em colocar todas as minhas coisas de volta na mala, e ir embora. Mas não se deve ir embora de uma batalha sem ao menos lutar. Chegar até aqui já me trouxe surpresas. Primeiro, Olívia não se lembra de mim, e agora a casa ao lado vai ser vendida, o que é melhor do que vender aqui, mas lembro o quanto ela disse que os pais amavam aquela casa. Praticamente toda a geração da família dela morou ali, e a casa continua de pé.
O meu medo, e se eles colocarem um valor a mais para comprar aqui e eles acabarem aceitando. Mas eu preciso parar de me preocupar com isso, como dizem, devemos nos preocupar com coisas que tem solução, se não tem, não há motivo para se preocupar.
Agora estou pensando no que fazer durante esse tempo que vou ficar aqui, como posso me aproximar dela sem parecer estranho demais.
Deito na cama e fico mexendo no celular, enquanto o tempo não passava. Mas logo depois enjoei, e comecei a arrumar as minhas roupas no armário, mas logo depois as coloquei de volta na mala, não sabia quanto tempo eu ficaria por aqui, então não tinha muito o porquê de tirá-las. Quando verifico o celular vejo que chegou uma mensagem do Miguel.
“Já tá curtindo as suas férias”
“Acabei de chegar, então não. Como foi a reunião?”
“Não vou dizer, falei para você não se preocupar com o trabalho. Curta as suas férias, e agradeça a mim depois. Sua mãe te procurou, e eu disse que você está viajando a negócios. Depois me conta como foi reencontrar o amor da sua vida.”
Respondi resumidamente o que aconteceu, o que não foi muita coisa, e guardo o meu celular no bolso, e como já estava entediado de ficar no quarto, sai para fora, quem sabe não encontre algo para me entreter, ou tomar coragem para falar com a Liv.
Estava descendo as escadas, quando me deparo com a dona Júlia, sua expressão que era séria, passou para um sorriso ao me ver.
— Quando minha filha falou que você era o hóspede novo, eu não acreditei. Até pensei que fosse outra pessoa!
— Ah, a senhora está me confundindo com outra pessoa. — falo com a boca seca.
Olho ao redor procurando Liv, mas nada dela. Menos mal. Por um momento achei que ela também não fosse lembrar de mim, sei que passou alguns anos, e eu não mudei tanto assim.
— Pare de me enganar, eu lembro muito bem de você Alex. Como não esquecer do garoto doce que nem você? Estou feliz de você estar de volta. — ela me abraça, e eu fico sem reação por um tempo, mas logo a abraço.
— Por mais que eu tenha demorado ao voltar?
— Não ligo para o tempo. O importante é que você voltou. Por mais que tenha ido embora um pouco cedo demais, o que chateou a minha filha, sei que não foi sua culpa, vocês dois eram jovens, não donos de si próprios ainda.
— A senhora se lembra de mim? Mas a Liv.. quer dizer a Olivia, não lembra de mim, ou ela está muito brava comigo, para fingir que eu não exista.
O sorriso dela se desfez, e me chama para acompanhá-la até o lado de fora. Nós dois sentamos em um banco um tanto afastado da entrada. Eu não tive tempo para explorar novamente os lugares, mas parece que aqui também não mudou muito, lembro da época em que eu sentava aqui e passava a tarde com a Liv.
— Aqui te traz boas lembranças. — diz chamando a minha atenção.
— Me desculpe…
— Não, tudo bem. Pelo menos você continua lembrando dos momentos em que vocês tiveram, e isso é bom.
A olho sem entender, mas eu não digo nada deixando que explicasse.
— Olívia não lembra de você, porque ela sofreu um acidente. Depois que você foi embora, ela ficou triste. Ela só passava o dia fora, e um dia ela disse que ia naquela torre que vocês costumavam ir. Só que começou a ficar tarde, e ela não apareceu. Já estava começando a anoitecer estava chovendo, uma chuva que não parava, fiquei preocupada com o que poderia ter acontecido, ela não era de demorar tanto para voltar.
Odiei tanto os meus pais por termos ido embora, sem nem ao menos poder me despedir dela.
— Então fomos até a torre, e ao chegarmos lá... — ela suspira e pude ver um pouco de dor em seus olhos. — Ela estava caída no final da escada, naquele momento eu achei que poderia morrer. Levamos ela até o hospital, e descobrimos que ela teve uma contusão na cabeça. Sorte que não foi nada muito grave, mas quando ela acordou, não lembrava de nada do que tinha acontecido. Pensávamos que seria só temporário, os médicos disseram, mas faz dez anos desde então.
— E o que ela esqueceu?
— Pelo visto só lembranças que continham você, e algumas coisas que tinham acontecido naquela época.
Sinto uma dor no fundo do peito, ao sentir suas palavras. Percebo agora que vir aqui não foi uma boa escolha. Eu imaginava que ela está só não lembrando mesmo, ou brava comigo, mas não isso.
— Não fique chateado, não ache que isso é o fim só porque ela não lembra de você. — fala como se lesse a minha mente. — Você pode recomeçar, tornar-se amigo dela novamente, vocês foram uma vez, não vai mudar nada tentar novamente do começo.
— Então eu vou ter que continuar mentindo?
— Eu acho melhor, eu vi o quanto a minha filha sofreu com a sua partida. E já faz dez anos, como eu disse.
Não sei se mentir é a melhor opção, mas eu não sei o que fazer também. Contar tudo para ela como: “Oi, eu sou Alex que você conheceu com 16 anos, e fui embora do nada, e ainda fui a causa de um acidente seu, que me fez te esquecer.” E por mais incrível que pareça, a mãe dela quer me ajudar?
— Ontem a tarde, quando a Olívia estava na recepção. Chegaram três pessoas aqui, interessadas naquela casa. — aponto em direção ao lugar a alguns metros de distância.
— Sim, estamos vendendo — diz em um tom triste. — São as pessoas que estão interessados na casa, deve ser eles. É triste você ter que vender uma casa, na qual você passou quase a vida inteira. Mas às vezes temos que desapegar das coisas. Por mais que isso doa, pelo menos teremos as lembranças, os momentos.
— Oi, mãe. — Liv diz chegando, e eu nem reparei que ela estava vindo. — Vejo que já conheceu o Alex.
— Sim, eu e ele estávamos falando da propriedade — ela bate levemente em meus ombros. — Estávamos indo dar uma volta para o local, é bom para os hóspedes receberem um tour.
Ela olha para mim com cara de “sem perguntas”, e eu balanço a cabeça concordando.
Pela cara da Olívia ela estava um tanto surpresa, com nossa aproximação.
— Estava falando para a sua mãe que não precisava…
— Olívia, minha filha. Poderia fazer o favor de acompanhá-lo? Eu preciso resolver algumas coisas lá dentro.
— Claro — responde rapidamente. — Podemos ir Alex?
— Sim.
Me levanto do banco, a acompanhando. Olho para trás e a Dona Júlia acena e diz um aproveita baixo. Ao me virar para frente, quase me trombo com a Olívia.
— Já mostrei tudo lá dentro. Então vou te mostrar tudo o que eu puder aqui fora.
Todos os lugares, eu já conhecia, mas não importava em ver novamente. A ideia da mãe dela, foi boa, já que eu nunca teria imaginado em uma desculpa como essa.
— Não quero ser muito invasiva, você pode responder se quiser. Mas o que te trouxe aqui? — pergunta enquanto anda na minha frente.
— Como eu te disse, um amigo meu veio aqui uma vez, e sugeriu o lugar para tirar umas férias. Ele disse que aqui é bom para você esquecer dos problemas, e ficar perto da natureza, já que ficar direto só na cidade pode ser um tanto sufocante.
— Boa parte das pessoas tem o mesmo objetivo que você, quando vêm para cá. Muitas pessoas que migram do interior, campo, e vão para a cidade depois começam a sentir falta do contato com a natureza.
— Ou a maioria das pessoas, depois que se aposentam compram um lugar tipo esse. — complementei.
— Sim, é verdade. Eu mesmo tendo ido algumas vezes para a cidade, nunca trocaria aqui por nada. — ela sorri, e como eu amo ver ela sorrir.
— A cidade tem suas coisas boas, mas aqui é magnífico.
Ainda mais ao ter companhia que você gosta.
— Você trocaria a cidade por aqui? — pergunta.
— Não sei, acho que não. Eu não fiquei muito tempo aqui para ter uma certeza.
— Vamos deixar o tempo falar. Vamos ver se daqui para quando você for embora, você não mude de ideia. — sorri.
— Conseguiu vender a casa?
Estávamos passando perto dela, e não poderia esquecer do que a mãe dela disse a pouco.
— Infelizmente e felizmente ao mesmo tempo, sim. Não acredito que vamos ter vizinhos insuportáveis.
— Ah, então eles que vieram ontem é que vão morar aqui?
— Sim, mas não sem antes fazerem uma grande reforma. — diz com um semblante triste.
— A casa é linda pelo que dá para ver por fora, espero que eles cuidem bem do local.
— Eu também espero.
Nunca entrei lá, mas por fora, a casa parece tão bonita. O estilo combina perfeitamente com o local. Espero que não mudem muito.
O caminho pelo qual estamos andando, permite que andemos um ao lado do outro. Coloco minhas mãos no bolso da calça, sem saber o que dizer.
— Eu não costumo muito fazer tour com os hóspedes, eles normalmente descobrem aqui da própria forma. — diz.
— Desculpa, não precisamos continuar fazendo isso.
— Não, não foi exatamente o que eu quis dizer. Me desculpa, me expressei mal. Eu quero te mostrar mais aqui, e mostrar para você um pouco mais da natureza. Eu só quero dizer que fico feliz em te mostrar o lugar. Sabe, quando eu era criança passava boa parte aqui, explorando os lugares, ou imaginando.
— Você tinha muitos amigos na infância? — pergunto mesmo sabendo das respostas.
Lembro bem de quando eu cheguei e a peguei em cima de uma árvore, enquanto a mãe a procurava.
— Não, por isso que eu ficava imaginando que estava em uma aventura com outras crianças, ou super-heroína de uma cidade em caos. Mas na adolescência eu só ficava aqui sentada, pensando na vida, ou comendo alguma fruta.
Paramos em frente a uma árvore, que é um tanto familiar para mim.
“Dez anos atrás
Estava andando, procurando um lugar para ficar longe da discussão dos meus pais, e sentei debaixo da árvore, enquanto sentia um desconforto na garganta, e a vontade de chorar. Abro os meus olhos e olho para cima deixando-os bem abertos, para assim evitar chorar. Aprendi isso com tempos de prática. Estou cansado de tanto briga e discussão por parte deles. Sempre quando alguma coisa parece bem entre nós, alguma coisa bem mínima, vem para acabar com todo o pingo de felicidade existente.
Uma pancada forte na minha cabeça me assusta, e mordo os dentes pela dor, procuro na direção do que caiu, e vejo uma manga a alguns metros de mim. Olho para cima vendo se outra iria cair, e vejo uma garota com uma manga em mãos. Olho para a manga que caiu da minha cabeça e para a garota, e compreendo o que acabou de acontecer.
— Você poderia jogar de volta para mim? — ela pergunta se segurando no galho, e eu me levanto rapidamente.
— Você ficou maluca? Jogou essa manga na minha cabeça!
— Não, ela caiu. — diz calma.
— Sozinha que não foi!
— Eu não joguei, ela escorregou da minha mão. Agora você pode jogar de volta para mim?
Pego a manga do chão, e penso em não jogar para ela, e sim em um lugar mas longe para ela pegar, mas ela parecia ser sincera ao dizer que não foi ela quem jogou.
— Eu não posso jogar, pode acabar acertando você. — aviso.
— Então sobe aqui e me entrega.
A olhei como se estivesse louca.
— Não é melhor você descer?
— Ah não, aí vou ter que subir de novo.
— E eu não vou ter que descer depois também? — rebati.
— Se não quer me dar, deixa aí no chão então. — fala irritada e eu sorri.
— Você se irrita rápido em.
— O sujo falando do mal lavado, você é chato.
Com a manga na mão, eu escalo a árvore me apoiando nos galhos, sem olhar para o chão. Ao chegar próximo dela, olho para baixo vendo a distância que antes parecia ser tão pequena é tão alta daqui. Por um segundo minha mão escorrega do tronco, e eu perco um pouco do equilíbrio, sorte que a mão dela segura a minha, antes que fosse tarde demais.
— Obrigado pela manga. — diz soltando a minha mão, após eu conseguir me segurar de volta.
E eu pensando que ela estava com medo que eu caísse, ela estava se importando com a manga!
— Você é doida de subir aqui.
— Você também por aceitar subir aqui — diz sorrindo. — Sou Olívia, e você?
— Alex. ”
— Essa aqui é a minha favorita, até brinquei que ela era a minha casa na árvore quando mais nova. Além de ter uma ótima vista lá de cima.
— Ela certamente tem mesmo. A noite é mais linda ainda. — paro ao ver sua cara de confusa. — Falo isso devido ao tamanho, ver lá de cima as estrelas deve ser uma boa.
Depois daquele dia da manga, nós dois nos tornamos amigos, é claro que nunca mais subi na árvore, sempre ficava sentado embaixo da árvore enquanto ela subia lá em cima, é claro que deixei um balde sobre minha cabeça, para ela nunca mais derrubar uma em mim.
— Sim, ela é linda mesmo. Mas depois da minha adolescência, parei um pouco de ficar explorando, andando por aí, comecei a ficar mais no estudo, e cheguei até aqui, sem tempo para aproveitar muito... Eu deveria parar de falar, você não deve estar muito interessado em querer ouvir sobre a minha vida.
— Não, tudo bem. As coisas que você fala, eu gosto. Depois que termina a adolescência, as coisas mudam, a pressão de estudos e trabalhos, e sobre o que você quer ser na vida, é grande — ela assente.
Continuamos a olhar e em seguida voltamos para a recepção. Antes de subir as escadas, ela me chama.
— Alex, vai ter uma festa no povoado esse fim de semana, e caso você queria ir, está convidado.
— Tudo bem, eu estarei lá.
Me despeço dela, e me viro para subir as escadas, mas ela me chama novamente.
— Eu já vou te deixar em paz, mas eu só queria dizer que foi bom esse tour com você. Quando quiser um de novo é só me falar.
— Pode deixar.
Dessa vez continuo o meu caminho, subindo as escadas, no caminho cruzo com a Dona Júlia.
— Espero que tenha dado tudo certo, mas pela sua cara já diz tudo.
— Sim, foi um passeio agradável.
— Como eu disse, aproveite essa segunda chance. E vai dar tudo certo. — ela coloca a mão em meu ombro, e em seguida sai.
Ao chegar no meu quarto, sinto que as coisas estão dando certo, mas no fundo sinto que não é certo continuar mentindo para ela. E assim toda a minha felicidade vai embora, por conta de um maldito pensamento negativo.
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