Capítulo 7 _ Maksin



— Os professores bem que podiam facilitar minha vida e parar de mudar meus horários.

—  O sistema dessa escola é uma droga, não sei para onde vão todas as inversões que eles fazem com o dinheiro que nossos pais pagam.

— Comida, alojamento com água, luz, rede de televisão, telefone e internet para mais de quinhentos alunos não é algo necessariamente barato, e se você considerar o salário dos professores e funcionários, os eventos da escola, os gastos dos clubes, a manutenção geral dos prédios...

— Tá, tá entendi, existem diversos insumos, mas não pode refutar que eles precisam de mais logística nesse local, o diretor não tem estratégias financeiras para aplicar corretamente o montante que recebe, o que nos prejudica de várias formas.

— Não diminui o fato de que são demasiados os gastos.

— E ratifica o fato de que é necessária uma intervenção de alguém com as faculdades necessárias para gerir a situação, é a lei da oferta e da procura, se o diretor não consegue fazer seu trabalho corretamente, ele deve achar alguém que o faça ou o mandamos substituir.

— Você fala como se fosse simples, as capacidades necessárias...

— Argh! Chega, que inferno! — Dani nos interrompe.  —  São as putas sete e quinze da manhã, caralho! Eu tenho aula de matemática e vocês estão conseguindo me dar mais dor de cabeça do que ela. Se vão discutir por um assunto idiota, ao menos façam isso em uma língua que eu entenda!

— Mas se estamos falando português...

— E daí? Precisa ser de forma tão culta? Parece que eu tô andando ao lado de dois velhos... ou melhor, nem os velhos falam assim, parece que eu tô é caminhando com duas redações do ENEM ambulantes.

— Só porque cê não é culto eu tenho que parecer um idiota discutindo?

— Exatamente! Agora vamos lá sabichão, se chegarmos atrasados, o senhor Mendel corta nossos pescoços. — Dani diz, guiando Arthur para a sala mais ao fundo do corredor, ele acena para mim antes de voltar a trocar farpas com nosso amigo.

Ainda acompanhando o teatrinho dos dois com os olhos, entro na sala de aula da senhora Prince, a professora de inglês, e me deparo com uma cena que esfria meu humor.

Parecendo desesperado, ao mesmo tempo que com medo, Erick está aprisionado em seu lugar. O colega detrás dele, pressionou a mesa contra a cadeira do pobre coitado fazendo com ele ficasse impossibilitado de sair, afinal a parte da frente era bloqueada por ele....

Allysson estava sentado em cima da carteira do outro, as pernas uma de cada lado do rosto suado e aflito do garoto duas vezes menor, que se contorce, inutilmente, tentando pegar seu caderno que está erguido no alto pela mão de Allysson.

— Por favor, me devolve meu caderno? — ele pergunta tremendo.

— É só vir pegar.

— Não dá. — Ele fala quase chorando, e não dava mesmo, o que para qualquer um seria de extrema facilidade sair, para o garoto magro e franzino seria impossível. — Não consigo.

— Então a gente faz o seguinte, você me empresta suas anotações da semana passada e assim que eu terminar de copiar eu te devolvo.

— Eu até faria isso, s-sem problema nenhum, mas e s-se a professora descobrir?

— Tem razão, eu sou péssimo copiando as coisas de forma diferente, e se a gente fizer assim, eu te devolvo o caderno, mas em troca tu responde as atividades passadas para mim?

—- M-mas, mas...

— Uh! — ele fala com um sorriso de lado. — Demorou demais, agora vai ser as da semana passada e as dessa também.

— P-por favor....

— Você quer seu caderno, não quer?

— Eu quero, mas... — o garoto parece estar prestes a chorar a qualquer momento.

— Mas o que? É o seguinte, cê pode fazer o que eu quero ou pode num ver mais o teu caderno, decide aí pô.

O garoto emudece, abrindo e fechando a boca em nervosismo.

— Ihh, tô achando que você não quer ficar com o teu caderno, e isso bem quando a professora ia distribuir pontos extras.

— Não! Olha, eu só queria dizer que...

— Tudo bem, tudo bem, eu te devolvo... — a expressão de alívio do garoto muda abruptamente quando um sorriso malicioso surge no rosto de Allysson. — Mas não inteiro.

E dito isso, Allysson faz suspense segurando a capa do caderno por alguns segundos antes de começar a puxá-la.

O garoto parece estar prestes a ter um mini infarto, o que vem do fato de ele ter TOC e ser extremamente perfeccionista, Allysson rasgar seu caderno seria como o levar ao cúmulo, a um surto, e pelo meio sorriso sagaz do meu colega de quarto ele sabe muito bem disso.

— Já chega. — Falo, arrancando o objeto da mão de Allysson e o entregando ao menino, que se aferra ao mesmo desesperado.

— Qual é o seu problema, Petrov?

— O meu problema é você ser um maldito bullying, Gonzales.

— Bullying? Acho que cê tá vendo coisa onde não tem, eu e meu querido amigo Elvis estávamos apenas tendo uma conversa de amigos, não é mesmo, Elvis? — questiona ao garoto, que levanta o olhar tremido para ele completamente aterrorizado e sem saber o que responder.

—  Em primeiro lugar o nome dele é Erick, não Elvis. — Falo puxando o rosto de Allysson para que ele pare de focar sua atenção no garoto, que por sua vez, me encara com admiração. — Em segundo lugar qualquer um com olhos, ouvidos e o mínimo de sensatez perceberia do que se tratava a situação Gonzales.

Allysson bufa em exaspero, o rosto contraindo em raiva e algum outro sentimento que não consigo identificar, ele afasta minha mão com um leve tapa, e quando percebe que não me retraio, grunhe e desliza os dedos pelos cabelos em irritação, desfazendo assim alguns dos belos e gordos cachos, que se partem em dois e três, o que agrega volume a todo o conjunto.

E pronto...

Os cabelos caindo por sob a testa, as bochechas levemente mais escurecidas, o cenho franzido, e os lábios se pressionando em um biquinho, com tanta força, que podia ter certeza que quando abrisse a boca eles estariam mais vermelhos e carnudos que antes...

Mas não é essa a questão.

Os braços cruzados, junto ao biquinho, e esses malditos cachos, o fazem parecer quase que fofo. Quase me engasgo com a só possibilidade de imaginar essa palavra sendo associada a ele, Allysson pode ser tudo menos fo...

Ele contrai um dos lábios para lado e vejo uma covinha. Nunca tinha percebido que ele tinha uma covinha, nunca nem sequer notei.

Mas ele tem, e é funda, e é linda. E deixa todo o conjunto ainda mais fofo. Por Deus, Allysson sim é fofo. E lindo.

Ele é lindo. Claro que é lindo, quando contamos a aparência, ele pode ser considerado muito bonito, e quando faz biquinho, parece um cachorrinho que acaba de ser pego fazendo bagunça, fico divido entre a vontade de seguir xingando-o e apertá-lo.... Apertá-lo?! Não, não, não, absolutamente não, não vou sentir pena de Allysson, nessa situação, só porque ele é capaz de fazer uma carinha fofa.

Ele é um fodido bullying, um idiota inconsequente, um babaca sem limites e uma pessoa extremamente desconsiderada. Já vi demais das atitudes dele para saber que ele pode ser qualquer coisa, absolutamente qualquer coisa, menos fofo.

— Escuta aqui, Petrov... — ele não consegue terminar a frase, aperto seu braço e arrasto-o para fora da sala, ignorando seus protestos, bato a porta com força atrás de mim, antes que seus amigos possam vir tentar defende-lo, levo-o para além do corredor, para a sala da zeladora e tranco a porta atrás de mim.

— Sério? Um esconderijo às escuras? Que sexy Petrov. — Ele sorri descarado, já eu, lhe entrego um pigarro de nojo.

— Vim até aqui para falarmos seriamente, Gonzales, então guarde seus ridículos comentários para si mesmo.

— Ridículos? Que cruel... eu diria algo como... — fala, mas o interrompo, já perdendo as estribeiras.

— Só um aviso, estou tentando falar sério aqui, mas minha paciência está por um fio. Se pensar em dizer qualquer coisa com o mínimo de cinismo eu te estrangulo aqui mesmo. — Ameaço, mesmo que minha mente me alerte sobre esse não ser um bom caminho, o que é estranho, pois é como eu tomo normalmente as coisas quando se trata de pessoas que passam do limite ou cometem algo tão asqueroso como bullying.

Mas ele não pode se enquadrar nesse todo, Maks, não depois do que aconteceu no quarto. Minha mente rebate a si mesma, me levando a razão, passe o que passe não quero ser um gatilho para Allysson.

— Que que adianta? Pra você qualquer coisa que eu disse tem cinismo, e olha que eu nem sei direito o que essa palavra significa. — Eu até diria que sua voz continha uma pontinha de magoa, mas descarto a ideia quando o vejo abrir aquele sorriso de arrogância infernal.

O quarto, lembra o que aconteceu no quarto. Passo a imagem gravada em minha mente e isso faz com que eu contenha a vontade de desbravar minha raiva, e minha voz não saia tão carregada quanto antes.

— Por que não começa falando que vai pedir desculpas a Erick?

— Uai, porque não vou, não fiz nada de errado!

— Pelo amor de Cristo, será que você pode ser um pouco menos idiota? Olha o que você fez, o garoto tava tremendo de medo.

— Isso é porque ele é frangote demais, nem cheguei a bater nele.

— Mas o aterrorizou. — Ele parecia prestes a me interromper, mas o impedi. — Vai dizer o que? Foi só um caderno? Ele é exagerado?

— Sim.

— Nada disso, as coisas tem a importância que você dá a elas, para esse garoto, notas perfeitas, um caderno perfeito, é o mais importante, você sabia disso e usou contra ele, porquê?

— Porque ele é um porre, esse lero-lero todo é irritante.

— Está mentindo, ele tem TOC, vai no terapeuta duas vezes na semana para tratar, e nem mesmo você seria tão baixo a ponto e usar algo como isso como justificativa, então te pergunto mais uma vez, Gonzales, porquê? — falo, próximo de seu rosto, encarando os olhos café, tentando assim ver a verdade por trás deles.

— Eu preciso das respostas, ok? Se afasta de mim, cara. —A resposta me vem como um baque, não que eu esperasse, ou quisesse, que ele se abrisse e me contasse a fonte de ser um bullying. Mas, respostas? Quando eu claramente lhe ofereci ajuda? Ele realmente preferia cometer atos tão ridículos ao invés de aproveitar boas oportunidades?

Faço o que ele pede, e ele praticamente desfalece na parede, ele esconde seu rosto entre as mãos, mas ainda assim consigo ver o vermelho tentando tomar conta da pele morena a deixando ainda mais dourada.

— Eu retiro o que disse. —  Digo, quando ele parece se recuperar, parcialmente. — Você é muito baixo, Gonzales.

Nem tento ocultar o desprezo em minha voz, e ele retorce a cara em raiva pura.

— Foda-se o que você pensa, eu faço o que me der na telha. E daí que o pobre coitado tem TOT, TOP, TOB, ou o quer que seja essa merda aí, se ele não consegue resolver sua deficiência não é meu problema, é escolha dele.

Definitivamente, o ser humano mais desprezível nessa face da terra.

— Para de ser tão babaca Gonzales, em primeiro lugar você sabe muito bem que é TOC, e também sabe que se trata de algo sério e involuntário, e o cara já está fazendo tratamento.

— Então se não tá melhorando é porque não quer, isso não é problema meu.

— Ele está em um processo! E você vai desestabiliza-lo, não consegue ver que pode acabar levando o sujeito à depressão?

— Custo benefício, aí ele vai e faz uma terapia dois em um de uma vez só.

— Não acredito que disse isso. — Falo sem ocultar o nojo na minha voz.

— Pois foi o que eu disse. — Ele tromba o ombro em mim tentando sair, esquecendo-se da porta trancada. — O cara é um molenga, se ele sabe das próprias fraquezas e as deixa de bandeja assim... como pode me culpar por usá-las contra ele?

Sua risada exacerbada, me enche de uma raiva descomedida. Antes que ele possa abrir a boca de novo, o lanço contra a parede, deixando-me dominar pela raiva e sem raciocinar uso força demais. Se faz ouvir um baque surdo quando o corpo dele vai de encontro ao cimento frio, e de imediato ele se encolhe cambaleando, agachado e segurando a própria cabeça.

— Então vai partir pra violência? — Pergunta cínico quando finalmente se recupera, mas sua postura não me engana, ele ainda está meio encurvado temeroso, e seus olhos não ocultam seu temor.

— Bem que você merece. — Falo me aproximando ameaçante, e como eu suspeitava ele recua como se tentasse de alguma forma, se fundir na parede. — Mas não vou, é algo ridículo utilizar-se de violência e perseguição para resolver problemas, só lhe relembrarei o que disse no início do ano.

— Que me expulsaria? Cê fala muito e não faz nada, é balela.

— Sério? Porque hoje mesmo eu vou começar, espere por uma advertência até o final do dia pelo que fez a Enzo.

— Cê nem provas tem.

— Mas tenho fatos, muita gente apesar de não te confrontar diretamente por medo de Renan ainda poderia sigilosamente te denunciar para o diretor e eu, utilizando minha conduta e minha própria influência com o corpo docente, além da minha amizade como a secretaria e a direção posso dar as cartas para que ganhe no mínimo uma suspensão.

— Petrov... — ele fala receoso, mas não sei se é pela ameaça do que eu falei, ou por não ter entendindo as palavras. Vou considerar que foi a primeira opção.

Pelo amor de Deus que seja a primeira opção.

Se bem que... se tratando de Allysson, bem que podia ser a segunda... Mas não é possível que exista alguém tão lerdo assim, certo? 

É o Allysson, você jura que não pode esperar isso dele?

Minha mente questiona, e é verdade, mas quer saber? Para a merda então, vou fingir que ele entendeu. 

— Você seria um alvo, Gonzales, poderia perder seu cargo no time, ou melhor não ganhar um cargo no time, além disso os professores te observariam o tempo todo, no primeiro vacilo uma ocorrência, no segundo outra suspensão, quantas mesmo você precisa ganhar para ser expulso? — me aproximei dele enquanto falava, agora estávamos praticamente cara a cara, peito a peito.

Conseguia escutar sua respiração ofegante, seu rosto novamente assumia uma tonalidade levemente vermelha, deixando o dourado da pele em tons mais iluminados e levemente escurecidos. Dessa vez não havia temor nos olhos castanhos, apenas receio e outro sentimento que não faço questão de tentar desvendar.

— Quantas mesmo, Gonzales? — falo me aproximando um pouco mais.

— Já entendi, Petrov. — Ele murmura rápido, e devia o olhar do meu. — Pode me deixar em paz agora?

Afasto-me, ignorando a parte em mim que está desgostosa, mas antes que eu abra a porta para sair volto meu rosto em sua direção.

— Você não passa de um covarde, persegue quem é mais fraco que você, os humilha e zomba, mas não consegue fazer nada quando se trata de alguém que possa te rebater ou vencer, quando é assim você nem sequer tenta enfrentar, e isso não ocorre apenas em situações de força física, em qualquer âmbito da sua vida você é um mesquinho medroso, nos seus estudos, no futebol e no seus relacionamentos, você apenas faz o que te convém e o que sabe fazer, na primeira dificuldade, no primeiro empecilho, você corre. — Balanço a cabeça com desgosto. — Tenho pena de você.

Ele reage as minhas palavras como se fossem socos, a cada uma delas ele se encolhe mais e mais, quando termino ele nem sequer tenta responder, apenas permanece na mesma posição com o rosto na direção do chão e os ombros encurvados.

O silêncio orbita na sala, ele não fala absolutamente nada e eu apenas marco minha presença para fundi-lo ainda mais na própria vergonha, o que lhe prometi no início do ano foi verdade, eu não deixaria que ele e seus colegas tacassem terror na escola inteira, uma pitada de bom senso, mesmo parecendo cruel, é o tipo de coisa que ele precisa.

Pelo que percebi, das poucas vezes em que o observei, Alysson é extremamente mimado por todos, que passam a mão em sua cabeça quando erra, ou simplesmente fazem para ele o que ele não consegue fazer. Desde ontem à noite, notei que meu colega de quarto não é exatamente uma pessoa ruim, e mesmo que eu não queira me aprofundar em sua vida, não desejo destruí-la, mas um tapa de realidade não faz mal para ninguém, certo?

O barulho de saltos altos pelo corredor é um forte indício de que madame Prince está indo para sala de aula, ela é minha professora favorita, e desde que entrei nessa escola nunca precisei receber uma bronca dela por atraso e não ia ser hoje que isso ia acontecer.

Já a reação do meu acompanhante é um estremecer, ele é a senhorita não tem uma boa relação aluno-professor. Aliás é a única classe que ele não pula, ou chega atrasado.

— Vamos? — falo abrindo a porta e segurando-a para que saia primeiro.

Ele murmura algo que não consigo escutar, e segue ainda de cabeça baixa e passos rápidos para fora do corredor, no caminho acaba trombando com um do primeiro ano, ele abaixa-se de imediato para ajudar, o que não pe característico dele, mas acho que deve estar um pouco tocado por minhas palavras.

Contudo isso não é o mais surpreendente, quando ele ergue a cabeça, consigo vislumbrar um marejo contido em seus olhos café, a imagem me persegue durante toda aula, e acabo levando duas broncas da senhorita Prince. Mas, não fazia diferença, como uma pintura ela ficou gravada em minha mente, e com ela vinha sensações que eu não conseguia explicar.

Estou começando a me cansar de como as imagens chorosas dele, assombram minha mente. 

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