Capítulo 23 _ Allysson


— Então, você ainda está transando com o Higor?

Não sei o que responder.

Tipo, não sei mesmo, e isso fica tãoooo estranho.

Um silêncio super incomodo entre nós deixa o lugar mais pesado, e mais pesado, e mais pesado, e ainda mais pesado. As coisas não terminaram bem entre nós dois, principalmente por culpa dele — o Augusto foi um grande cuzão — e aí ele começa o assunto justamente com o elefante da sala? Como se eu quisesse falar do treinador com ele.

Affs, ainda não descobri como responder à pergunta.

Mas, algo me diz, que ficar encarando esses olhos amarelo escuro não parece ser a melhor solução. Ou sequer uma solução. Tento desbloquear a garganta, pensando no que dizer até que finalmente solto tudo de uma vez.

— Jura? Bem direto, né? Quer mesmo começar por isso, fessor? Quer dizer, Augusto... professor Augusto? Merda isso é tão estranho. — Essa última parte falo mais comigo mesmo, porém seu sorriso amarelo me diz que ele escutou.

Dessa vez o silêncio estranho vem por parte dele. Ele batuca os dedos pintados de preto na bancada, a cabeça baixa. Fica assim por alguns segundos, até que a ergue mordendo os lábios. Não é sua expressão morde lábio sexy, e sim a pensativa.

Quando você passa algum tempo com as pessoas, começa a aprender a diferenças nesses detalhezinhos.

— Pode me chamar de Augusto, não sou mais professor. — Finalmente ele responde, depois de eu quase ter dado no pé três vezes.

Vejo alguém acenar para ele, pedindo atendimento, ele ignora e a bartender que eu até agora não tinha reparado estar ali, vai até os clientes.

— Claro, Augusto. — Falo quando desvio os olhos da pobre mulher super ocupada, (agora ainda mais, coitada) e então... nossa, falar assim soa estranho demais. — Então, professor, não vai rolar dizer seu nome não.

Isso arranca um revirar de olhos dele, que se inclina na bancada, acendendo um cigarro. Ele aspira e sopra algumas vezes antes de voltar a falar comigo.

— Para alguém que faz de tudo por quebrar regras, você se fixa demais em figuras de autoridade e poder, você sabe bem disso, não é?

Desaforado!

Metido a sabichão!

Intrometido e abusado!

Porém, ao invés de falar qualquer uma dessas coisas, resolvo ser razoável e não arranjar problemas.

— Agora deu de psicólogo, é? — Considero que isso seja o menos ofensivo, embora Maksin provavelmente diria que estou sendo sarcástico, cínico ou debochado.

— Não. Isto foi apenas um chute gracioso.

— Se não quer que eu chute outra coisa, vai parar com isso.

Ele solta uma baforada com o cigarro, a frustração tomando conta do rosto bonitinho.

— Você continua tão impossível quanto era naquela época.

— Claro que não! Eu mudei e muito! — Dessa vez que bufa sou eu, antes de inflar meu peito com orgulho. Porque eu mudei sim e para melhor!

Eu acho.

Será que não?

Ai, meu Deus, eu tô pior?

Ou só não mudei nadica de nada?

— É claro que mudou. — Apesar dele afirmar isso, seu olhar tem o conhecido pensamento: "Pobre e iludido garoto".

Eu poderia até discutir por isso, mas quem liga pros pensamentos? O importante é o que sai pela boca e ele não me ofendeu diretamente, então que se dane. Fico observando ele fumar, pensando na melhor maneira de cair fora dali quando percebo que não preciso justificar merda nenhuma.

Me levanto para voltar para pista, só que a voz dele me mantém no lugar, com as malditas seguintes palavras:

— E o Higor?

Gemo de frustração. Que ódio!

— Vai insistir mesmo em falar do treinador? — Soa como pergunta, mas tá mais para uma afirmação chorosa.

— Não sei, você vai insistir em me chamar de professor, ainda que isso seja uma recordação dolorosa de uma função que eu amava e nunca mais poderei exercer. — A última parte teve um tom de julgamento vedado, ou seria velado? Vedado. Que eu não gostei.

Como ele se atreve a me culpar?

— Foi você que dormiu com seu próprio aluno.

— E é você que tem um grande complexo com transar com gente mais velha que você, o que um dia ainda pode te trazer problemas, você também sabe disso, não é?

Maldito metido a sabichão!

— Só para você saber, eu estou apaixonado por alguém mais novo que eu! — Este argumento ele não pode vencer.

— Aposto que ele parece bem mais velho do que a própria idade.

Não gosto desse cara!

Affs, se não fosse pelo pau dele ser grande e ele ser bom de cama nunca teria transado com ele!

— Eu não diria beem mais velho. — refunfuno indignado. — Ele é meio careta, mas as vezes é genial e...

Eu até falaria de todas as coisas que me gustan em Maksin, mas quando olho para o professor ele encara o nada, completamente nem aí.

Babaca.

— Bom, já que quer tanto saber, o treinador ainda me odeia.

Isso capta sua atenção, ele gira a cabeça para mim, um sorriso enorme se abrindo em seu rosto. Mesmo que seus ombros ainda estejam tensos e seu olhar afiado para mim.

— Aquele idiota cabeça dura.

— Então, vocês não se resolveram? — Pergunto por educação, já que é meio óbvio. SE o treinador transasse mais ele não seria tão ranzinza.

— Ele nunca me aceitaria e você sabe bem disso.

— Pare de falar, "você sabe muito bem disso". — Resmungo. Ele me encara por um tempo, me analisando.

— Não seja um babaquinha, Allysson.

— Olha quem fala!

— O que eu fiz foi por desespero!

— Transar por desespero, comigo?! Eita como tu sabe elevar o ego de alguém.

Ele apaga o cigarro na bancada, soltando a última fumaça, antes de se inclinar mais ainda e ficamos olho a olho.

— Eu só preciso confirmar uma coisa, Allysson. E quero que dessa vez venha de você, cara a cara, na última vez que nos vimos... — Eca, cheiro de fumo! — Na última vez que nos vimos, ele disse que o que mais doía era que eu tivesse traído ele com você, o amante dele.

— Porra... Eu não era amante dele, não!

— Mas vocês transaram e você sabe bem disso!

— Você é bem irritante. — Comecei a reclamar, mas fui interrompido com um grito dele:

— Vocês transaram, não foi?!

— Eita, calma! — Ergo as mãos ao lado da cabeça como quem diz: Me rendo. — Olha não sei o que ele te disse, mas não foi bem assim, não. Nós transamos uma vez. Uma vez! Antes de ele saber que eu era aluno dele e vice-versa.

Isso parece alivia-lo, seu corpo deixa de ficar tenso e ele exala uma coisa boa. Como se tivesse guardado estas dúvidas por estes dois anos.

— Jura?

— Porque eu mentiria? Não sou aquele filho de uma égua. — Estalo a língua, indignado, as lembranças do treinador me deixando fulo. — E, transar com você fudeu minha vida também, ok?

— Como assim?

— Naquele tempo, antes dele descobrir que fomos flagrados, já tínhamos "rompido" há meses, eu até podia não ser exaltado por ele, mas não era maltratado.

Isso arranca outro sorriso satisfeito dele.

— Higor sempre foi meio possessivo.

— Se ele quer ser possessivo com você, porque não pega na mão e assume?! O que eu tenho haver com isso?! Aliás já se passaram anos, porque até agora ele não superou?

— Eu te avisei que era alguém com uma carga.

— Podia ter me dito que a carga tinha altura, CPF e era meu professor também! — Tomo a vodka que ele me oferece. — E o melhor! Podia ter falado na minha frente! E não por uma carta, sabe como foi chato ler aquele negócio?

Renan que leu para mim. Pelo visto Augusto se tornou o amante de Higor que estava noivo, na época, e não queria decepcionar a família. O treinador prometeu a ele que iria romper o noivado, mas logo uma das professoras da escola (amiga da noiva de Higor recebeu o convite de casamento).

Augusto ficou puto, mas ao invés de terminar com o "romance" pensou que se Higor podia ter dois, ele também. Foi nisso que acabamos nos envolvendo e quando Regbo nos flagrou e denunciou, o treinador ficou desconsolado. Augusto nunca se resolveu com ele, e vice-versa.

E o maldito possessivo resolveu descontar em mim.

Pelo menos a conversa de hoje me explicou porque o professor escreveu na carta que eu era um duas caras mentiroso pior que do que eles dois. (Pelo visto, ele deve ter conversado com o treinador e ele deve ter falado algo do tipo: "Allysson é meu amante também.)

— ...eu mandei um aviso para seu irmão com a provável dislexia, ele não procurou medidas médicas?

Pera, o quê?

— Um aviso sobre o quê?

— Dislexia. — Ele fala sério, no modo professor, estende a mão pedindo meu celular e eu entrego como um idiota que entrega o celular para quase conhecidos que dormi algumas vezes.

Ele digita algo e depois me devolve.

— Que que isso?

— Antes de ter minha licença cassada eu tinha acabado de completar uma pós em psicopedagogia. Procure um neuro, fale que está desconfiado das coisas que eu escrevi aí o telefone.

— Que seriam?

— Dislexia e TDAH.

— Você suspeita demais.

— Foi meu aluno por quase um ano, Gonzales, dá para notar o comportamento diferente do padrão.

— Tanto faz, você ainda foi babaca de só deixar uma carta e me xingar nela.

— Sim, fui.

— Não vai dizer mais nada?

— Dizer mais o que? Eu fui um idiota que em uma crise de ciúmes resolvi dormir com um dos meus alunos. Minha carreira foi para o lixo e o amor da minha vida jamais assumirá uma paixão por outro homem.

— Se te consola, ele não casou.

— Gostaria de estar satisfeito com isso, mas não estou.

— Sinto muito, professor.

— Não sinta, toda ação tem uma reação, eu estou tendo a minha, ele está tendo a dele.

— E eu também.

— Você tinha dezesseis anos Allysson, eu tinha vinte e seis, e Higor trinta e cinco. Definitivamente você foi um idiota, como todo adolescente, mas a irresponsabilidade foi nossa, nós éramos e somos os adultos.

— Eu já tenho dezenove!

— E é uma graça você achar que isso te torna um adulto, quando é apenas alguém atrasado para concluir o ensino médio.

— Tanto faz, só queria que o "Higor" me deixasse em paz.

— Bom, tem um jeito. De toda forma, acho que depois de tudo eu te devo.

— Qual forma?

— Só preciso do número de telefone dele.

— Claro! Valeu professor!

— Não me agradeça ainda. — Ele murmura — Antes vamos ver se vai dar certo.

Apesar do tom chateado, Higor ainda parece estar meio aéreo, como se estivesse feliz e leve. Acho que saber que o treinador não foi infiel a ele, quando já estava sendo (por causa da noiva), ajudou a tirar um peso de cima dele.

— Hum, parece que mais ex-alunos meus chegaram. — Ele fala olhando para um ponto fixo, sigo a direção de sua mirada.

Vestido com uma jaqueta de couro preto, jeans rasgados e com o cabelo escuro penteado com muito gel, está Thales. Ao seu lado, vestido todo de preto, como se isso fosse torna-lo sexy, está Regbo com seus odiosos cabelos platinados e, por fim, Maksin.

O cabelo loiro arrumado, a camisa social com todos os botões abertos, mostrando a definição perfeita daquele abdômen e calça preta. Como se não bastasse isso para chamar a atenção para todo ele, se mostra o princípio da tatuagem que lhe dá uma vibe meio que bad boy.

E... porcaria, pegada a seu ombro, uma garota. Uma garota linda!

Alta, de pele retinta, cabelos crespos e volumosos formando um penteado maravilhoso que dava foco a um rosto ainda mais maravilhoso! O pior de tudo é que se eu gostasse de mulher diria até que ela é gostosa.

Merda.

Merda.

Ela se aproxima dele, sussurra em seu ouvido. Maksin responde, um sorriso sacana em seus lábios.

Maksin sorrindo sacana! É tão gostoso! E não é para mim!

E então. Os lábios se tocam. Eles se beijam.

Ok.

Ok.

Respira.

E, de repente, esse dia é uma merda.

Maldito sea!

Uma merda fodida e completa.

Porra!

Continuo olhando fixamente para cena, realmente devo ser uma espécie de maçonaria para gostar de sofrer tanto assim.

— Aquele não é Maksin Petrov? — Professor Augusto/bartender pergunta seguindo meu olhar, mas o gosto ácido na minha garganta me impede de responder. — Ah, entendo, alguém mais novo com uma vibe mais velha.

— Cala a boca. — Murmuro ainda com a garganta apertada.

— Aí! — Ele fala fingindo-se de ofendido, antes de me estender uma dose de tequila. — Toma, vai te fazer sentir melhor.

Eu tomo.

— Não me fez sentir melhor. — Resmungo, tentando com afinco desviar os olhos da cena.

— Então, toma outra.

E eu tomo.

Mesmo misturados com a multidão, consigo vê-los. Maksin dança com a garota, pele a pele, ela o toca na barriga, nos ombros, passeia a mão por seus braços. Coisas que eu sempre sonhei! Eles riem e se pegam e, porra, não vi nada tão ridículo na minha vida. Ridículo.

Eles se beijam de novo. Quer saber? É demais para mim. Carajo eu puto, putasso, e nem devia estar assim! Porque nós não temos nada.

Mas que se dane eu gosto dele e posso me sentir mal sim! Respondo para mim mesmo.

Ainda assim, você e ele não tem nada, então aqueta esse tuim na cadeira.

Foda-se.

Falo para mim mesmo, pro professor, pra balada, pra porcaria do mundo.

Foda-se. Foda-se. Foda-se.

Eu não ligo.

Meus olhos que ligam, porque continuam observando eles que se aconchegam mais.

Eu nunca nem vi esta menina perto do Maksin antes, e se ele a conheceu agora? Então, ele a trouxe para cá e eles vão sair e foder, assim por assim. Esse gillipollas, sempre passou a sensação de que não era um cara de uma noite só, agora isso?

Desço mais uma.

Bom... a menos que ele conheça a menina faz tempos e chamou ela para assistir ao jogo e agora vai namorar com ela. Que ódio!

E vamos de outra dose.

O pior é que ele sempre pareceu gostar de Dani. Era tudo mentira? Eu sempre o vi como uma espécie de rival no amor, mas não era ele, era uma menina que eu desconheço?

Outra dose.

A menos que ele goste de dois ao mesmo tempo o que o torna um canalha! Canalha. Ele não traiu nem um dos dois, porque não namorou com eles. Mas ele é um canalha mesmo assim! Maldito gillipollas!

— Acho melhor você parar, Allysson. — Professor Augusto fala tomando o copo da minha mão.

— Eu ainda não bêbado. — Digo, apenas levemente arrastado o que comprova que o que eu disse é verdade.

— Tequila demora para subir, agora cai fora daqui.

— Não vou.

— Vai sim. — Ele afirma me empurrando.

Cambaleio antes de me firmar, mostro o dedo do meio pro professor chatonildo e ando procurando por Renan, já que, no meu estado, posso acabar fazendo alguma besteira.

Não é difícil achar meu amigo. Ele faz parte do clube de dança da escola, assim como eu, e manda muito bem. Na boate não iria ser diferente e, assim como nos filmes, uma rodinha se forma ao redor dele, dando mais espaço na fila para ele se requebrar.

Sob protestos de alguns, que tentam me impedir, entro no meio.

— Oii, Ally. — Ele me cumprimenta sem sair do ritmo, a música quase chegando ao fim.

— Oi, Renan. — Sussurro perto de seu ouvido, uma ideia surge em minha mente. E pode ser o álcool falando, mas vai ser incrível. — Se vai dar um show tem que ser direito.

Dito isso arrasto ele dali. Alguns caras protestam, mas não nos impedem de sair. Vou direto ao palco, naquele lugar, aquele que costuma ter uns paus grandes de alumínio pro povo fazer strip-tease. Que fica bem embaixo da cabine do DJ.

Só sei que eu tô animado, um pouco puto, nunca fiz isso antes — minto, já fiz, mas quando eu bebo demais sempre faço alguma merda — normalmente eu teria um pouquinho de vergonha, mas que se dane quem tá na chuva é pra se molhar.

E qual é o melhor método de chamar atenção, que não este?

— Toca sentadona, DJ. — Grito ali mesmo, algumas pessoas mais próximas escutam apesar da música e urram de alegria.

— Allysson, quanto cê bebeu? — Renan pergunta, mas não como se me julgasse, e sim no estado: Isso aí, nós vamos botar pra quebrar!!!

O DJ assente. Logo a música se inicia.

Fecho os olhos, sinto a música e sorrio, dançando conforme o ritmo e inspirado na coreografia. Há uma sensação esquisita como se alguém estivesse me encarando, e não estou falando da "plateia", mas sim de alguém que olha fixamente.

Não preciso procurar pra saber que vem do grupo em que Maks está e nem faço questão, se por um lado ficaria contente de Maksin estar me observando, por outro me daria asco ver Regbo fazendo o mesmo.

Ignoro meus próprios pensamentos e só deixo a dança fluir, até o último passo.

Terminamos sob gritos de tesão, de alegria e de luxúria.

— Tem um carinha ali que eu gostei. — Renan diz apontando para multidão. — Temos tempo para uma rapidinha no banheiro, nos vemos Ally.

Ele me dá dois tapinhas nas costas antes de cair fora, rápido demais para quem acabou de fazer vários quadradinhos abrindo espacate. Já eu, desço do palco cansando, desidratado, ferradinho. Tanto é que nem me importo quando mãos passam em mim, convites são sussurrados e eu quase que poderia fazer a mesma coisa que o Renan... quase, se não fosse por eu não ter desejo nenhum.

Saco! Maksin me quebrou!

E dessa vez não é literalmente falando.

Por falar nele, o procuro no amontoado de corpos, mas não o vejo.

Merda de dia frustrante!

Que que eu fui caçar fazer lá em cima?

Passar uma vergonha grande e receber cantadas baratas?

Volto para o bar, Augusto assobia assim que me vê, olhando para mim todo sacana.

— Que dança, hein?!

Reviro os olhos até o talo.

— Você não é apaixonado pelo Higor? Me erra!

— Uau! Alguém mudou de humor bem rápido.

De novo, viro os olhos para ele, pego meu celular procurando um uber para poder cair fora daqui. Tudo o que eu mais quero é...

— Ora, ora, ora, quem temos aqui? — Thales fala se aproximando, um sorriso cínico no rosto.

— Vai a merda, babaca.

— Quer mesmo começar assim? — Sei que ele tá me ameaçando de forma icônica (tenho quase certeza de que não é esta a palavra) sobre as fotos daquele dia.

Porém, hoje é o dia do "que se dane", então solto logo um:

— O que eu quero é que tu vá tomar no olho do teu cu.

— Se eu fosse você...

— Duas cervejas. — A voz de Maksin interrompe o início de uma discussão. É claro que a menina vem junto a ele.

— Agora você bebe? — Pergunto com deboche, já que esse "certinho" sempre me reprimiu por beber, fumar, viver.

— Normalmente não, mas me adapto a companhia.

— Que companhia? — Falo me fingindo de sonso.

— Lúcia. — Ele fala mostrando a menina que é ainda mais bonita de perto. — Lúcia este é o Gonzales.

— Seu nome é Gonzales? — Ela pergunta com um risinho, mas de forma cordial.

— No dia que sobrenome se tornar nome, quem sabe.

Isso faz com que ela fique constrangida, deu pra notar por causa da vermelhidão em seu rosto. Nisso, Thales solta um assobio chocado — do tipo: ele teve essa coragem? — e Maks me olha atravessado.

Er, era só uma brincadeira. — Lúcia fala com os lábios apertados num tom corvinal.

— Nem te conheço, menina, pra você chegar assim.

Dessa vez ela não fica envergonhada, ao invés disso franze as sobrancelhas parecendo estar com raiva. Chasquea a língua antes de praticamente grunhir:

— Você é bem rude, né?

— É o que parece.

— Mal educado!

Zorra!

— Hey! — A voz de Maks interrompe, ele se põe na frente da menina puto da vida. — Não sei qual a merda do seu problema, Gonzales. Mas não fale isso de uma mulher, nunca.

Quer saber?

— Vai tomar no cu você também.

Dito isso, e antes que ele responda qualquer coisa, marcho dali completamente emputecido. Não tenho saco para procurar os garotos, então mando uma mensagem avisando que tô caindo fora.

"Gente, acho melhor eu cair fora."

"Quer que a gente vá com você?" A pergunta vem de Lucas junto a um anexo com a imagem dele sendo chupado por alguém.

Que cabaré!

"Não, se divirtam, tô mesmo precisando tirar um tempo para mim."

O sangue esfriou.

Fui embora aos tropeços, com a absoluta certeza que minha cara tinha caído no meio da festa, de tanta vergonha que passei.

Só quero esquecer das merdas que fiz hoje: dançar, falar com Augusto, arranjar briga com estranhas e conhecidos (mandar o Maksin e o Thales tomar no cu — e sei que um dos dois vai me ferrar por causa disso). Eu quero esquecer, fingir que não aconteceu, juro, mas meu cérebro, como sempre, não quer deixar de ser uma mala para me ajudar nisso.

Affs, quer saber?

Que se dane, eu tô bêbado!

Saio para a noite quente, do lado de fora vejo os táxis parados em frente a balada. Não entro em nenhum deles, sigo em frente. Preciso de tomar um ar e caminhar vinte e cinco quadras até o hotel deve ajudar. Além disso eu não trouxe dinheiro, posso até não saber como chegar lá exatamente, porém como dizem: todos os caminhos levam a Roma.

Resolvo andar pelo lado da rua onde o motorista tinha nos deixado.

— Hey, garoto. Nessas horas da noite, tomar um táxi é mais seguro! —A voz de alguém se faz soar, mas não capto. Deixo bater e levar. — Este é um bairro perigoso!

Eu só dou um ok com a cabeça, sem de verdade processar a informação.

Ando até a boate deixar de ser um pontinho no horizonte, meus pensamentos girando entre a noite de hoje, minhas vergonhas e em como minha vida é uma completa, fodida, e absoluta merda.

O vazio da noite é quebrado pela vibração do meu celular. Maravilha! Na tela:

Alejandro Hermano.

Como se esse dia não tivesse como piorar ainda mais. Meus dedos tremem com a vontade de desligar. Resisto ao impulso e atendo.

— Oi, irmão.

— Sabe Allysson. — Alê fala com a voz arrastada e temblorosa. — Eu tava aqui pensando em você.

— Alejandro, você tá bêbado.

Não é a primeira vez que ele me liga assim, e essas são as piores ligações. Quando ele está bêbado, sincero e sem filtro. E não se importa em falar tido o que pensa sobre mim.

E o dia de hoje alcança o top três dos piores dias da minha vida.

— Maldito o dia em que aceitei você entrar na minha casa sabia?

Já sinto meus olhos queimarem, já sei o rumo dessa conversa. Meu coração aperta, minhas pernas tremulam e eu só desejo que isso pare.

— Alejandro. — Foi o único que pude sussurrar, já que não conseguia implorar para que ele parasse.

Parasse de me ferir assim. Eu queria gritar, colocar todos os meus sentimentos em palavras exatas, dizer o quanto aquilo me mata por dentro e como cada ataque seu apunhala uma ferida dolorosa que nunca vai se cicatrizar.

Mas ele já sabe disso.

— Você parecia tão inocente, precisava de mim, eu devia ter batido a porta na cara da nossa mãe.

Eu queria conseguir desligar a chamada, queria impedi-lo de falar, queria ao menos poder ter forças para reventar o maldito telefono em el puto suelo.

Pero no puedo. Não consigo me mexer.

Odeio essa paralisia que me impede de me rebelar, de falar, de fugir.

— Sabe que eu te amava, né? Meu pequeno e adorável irmãozinho, eu daria a vida por você.

— Por favor... — Suplico. Suplico por qualquer coisa, qualquer tipo de misericórdia. Suplico para que ele não dissesse as próximas palavras.

— Então você tirou o mais importante para mim. — Escuto seu choro desconsolado pelo celular. — Porque ele e não você, Allysson? Eu salvei você, mas se eu soubesse... se eu tivesse imaginado que eu não chegaria nele a tempo...

— Alejandro... — minha voz mal sai, as lágrimas impedindo minha garganta de se abrir o bastante.

— Eu te odeio tanto, Allysson.

Eu me odeio mais, muito mais.

— Minha vida teria sido mais feliz se fosse você e não meu preciso ángel.

E com isso escutei apenas o baque da chamada sendo cortada, mas a voz do meu irmão continuou correndo em minha mente sussurrando uma e outra vez me levando novamente a aquele dia.

Sem nem reparar corri, corri sem ver a direção. Tapei os ouvidos tentando não escutar a voz de Ângelo gritando por socorro, a voz do meu cunhado desesperado e chorando as margens do rio.

A água saindo de mim a arquejadas e a dor de abrir os olhos, lembro-me de não conseguir respirar ou falar direito. Então Alejandro saiu do rio desolado e desnorteado, avançou até mim e chorou, para logo me estapear.

— Porque você não cuidou dele???

Eu não conseguia responder.

Não conseguia falar.

Não conseguia respirar.

Não consigo respirar.

Tento puxar o ar, desesperadamente, mas não posso. Queima. É algo simples, porque não consigo fazer algo simples? Choro e isso entope ainda mais meu nariz.

Sinto que vou morrer, bem aqui, neste instante.

E talvez eu mereça, não sou uma boa pessoa, não sou bom em nada e além disso fui irresponsável e isso custou a vida do meu sobrinho. Sem contar que sou um merda e....

"Não deveria se menosprezar tanto, Gonzales."

Por algum motivo essas são as palavras que vem a minha mente, Daniel, quando éramos amigos sempre me dizia que nada daquilo era culpa minha e tentava elevar minha moral. Mas Maksin foi o único que disse para eu não me menosprezar, não sei quando, mas isso se tornou meu consolo em momentos como este.

Fico encolhido no chão por um tempo, até que consigo voltar a inspirar e expirar. É estranho fazer isso. Finalmente, recupero minhas forças e me ergo do chão. Olho em volta, estou num bairro com casas estranhas, velhas e caídas. Não tem luz direito, as casas todas escuras e na rua apenas um poste está funcionando.

Não tenho a menor ideia de onde eu parei.

— Hora, hora, hora o que temos aqui? — A voz é grave, viro e vejo que atrás de mim tinham pessoas que, provavelmente, viram tudo o que aconteceu. — Isso que eu chamo de show.

Era só o que me faltava.

— Mas que merda, me deixem em paz.

— Que gracinha, ele quer paz. — O cara riu, seguido dos seus comparsas. Ele parecia ser o mais velho, o cabelo fiando cinza e com entradas. — Se queria paz não deveria ter entrado no meu território.

— E por acaso vocês são o quê, cachorros?

Talvez, apenas talvez, esta não tenha sido a melhor coisa a se responder, porque eles avançaram, em grupo, na minha direção. Seis homens de trinta e poucos anos, com braços forte, tatuagens e pinta de que não são boa coisa.

Normalmente, normalmente eu sou um cara corajoso.

Mas até eu sei reconhecer que não é uma boa ideia provocar alguém quando se está sozinho, num local desconhecido e sem sinal de telefone.

Porém, é claro que a vida queria provar de forma física o quanto eu me ferrei.

Percebi no primeiro soco, que me tirou todo o ar e me fez vomitar tudo que eu bebi.

É, eu tô fodido.

Todos eles avançaram juntos.

Muito, muito ferrado, mesmo.

✨✨✨✨✨✨✨


Em uma semana? Acho que este foi meu recorde de menos tempo kkkkkkkk. 

O próximo capítulo já está sendo escrito. E me perdoem pelos erros de português! 😅😅😅

Não guardem muito rancor do Maksin, como sabem, pelo prólogo, vai ter volta do Ally kkkkkkk. 

O que acharam do Alejandro? E do motivo para ele odiar o próprio irmão? 

A história do passado do Allysson tá quase completa com isso. E a do Maksin está prestes a ser mais... detalhada.

Spoiler: Cenas picantes cada vez mais próximas.

Gracias por lerem! 🥰🥰🥰

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