Capítulo três
Tudo perdeu o controle a partir daquele momento. Vinícius levantou da sua cabeleira com a cabeça um pouco mais baixa e começou a dizer do amigo secreto com a voz tensa. Eu ergui as sobrancelhas, desde quando ele ficava nervoso nessas horas? Por que estava assim?
— Meu amigo é alguém bem... divertido e que gosto muito. Ele tem cabelo e olhos castanho, é um bruxo, gosta de anime como eu e também... — Nessa hora todo mundo estava gritando meu nome. — Ama comer lasanha com arroz e...
As pessoas apontavam para mim, outras gritavam e algumas estavam com o rosto irritado quando falavam que aquilo era "marmelada". Eu não consegui mover um músculo de meu corpo. Parecia que virei uma estátua viva.
Quais eram as chances disso acontecer?
Puta que pariu, eu precisava fazer alguma coisa. Todos estavam olhando para mim, esperando alguma reação minha. Fiz o melhor para tentar esconder meu desespero quando forçava meus pés a moverem até Vinícius. Eu não esperava por aquilo. Não me preparei para o momento. Eu precisava ficar feliz. Eu estava feliz. Porra, Vinícius me tirou! Ele me tirou e deve ter dado o melhor presente de todos! Ele sabia o que eu queria de Natal. Sabia muito bem sobre cada detalhe meu.
Aumentei o sorriso quando o abracei e peguei a sacola que ele trouxe com o presente. Vinícius permaneceu um pouco tenso dentro do meus braços e forçou um sorriso quando distanciou de mim. Ele estava tão nervoso quando eu.
Todo mundo gritou para eu abrir a sacola e tive que soltar um riso nervoso enquanto tentava controlar minhas mãos trêmulas. Dentro tinha uma blusa dobrada de qualquer jeito e algo escondido abaixo delas. Puxei a blusa primeiro com o coração fora de controle.
Ele deve ter comprado uma daquelas camisetas com ilustração ou de alguma série que eu gostava. Meu deus, ele sabia o tanto que eu estava doido por uma blusa de Game of Thrones. Eu mostrei para ele a camiseta que vi em uma loja no shopping quando fomos juntos ao cinema. Tinha que ser ela. Ele me disse que um dia iria comprar de presente para mim.
Aumentei mais o sorriso. Minhas bochechas estavam doendo. Eu sentia como se vários fogos de artifício coloridos explodia dentro de mim.
Eu estava em transe e, quando abri a camiseta para olhar, tive que esperar alguns segundos até meu cérebro voltar a raciocinar e perceber o que estava de frente aos meus olhos.
Meu sorriso vacilou. Não era uma blusa de Game of Thrones, ou de qualquer outra coisa que eu gostava — e pelo menos conhecia. Não tinha nada disso. Era blusa que tinha uma frase no centro que não havia nenhum sentido: Eu tomo danoninho sem colher.
O que isto queria dizer? Eu nem gostava de danoninho. Mas a pior parte não era essa. O pior era o tamanho da blusa era bem menor do que eu. Aquilo não caberia nunca em mim, era óbvio. Todo mundo ao redor percebeu.
Por que ele me deu aquela blusa? Devia ter sido de propósito. Não conseguia mais sorrir. Meus lábios congelaram. Era o pior presente que já recebi, ainda mais vindo de alguém que eu tanto gostava. Não podia mentir e dizer que não era decepcionante.
Lancei um novo olhar a sacola e notei que tinha mais alguma coisa no fundo. Puxei já com esperanças de que fosse melhor que a blusa, mas quando meus olhos se deparar com ele, acho que foi mais frustrante do que a blusa. Era uma cenoura. É sério, isso?
Tudo bem que eu gostava de cenouras, mas não fazia sentido dar essas coisas no amigo secreto. Porra, parecia que ele havia pegado a primeira coisa que viu na casa. Eu não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Nunca imaginei que Vinícius faria uma coisa dessas, ainda mais comigo! Seu melhor amigo! Me senti humilhado. Um idiota. A pessoa mais trouxa de todo o universo.
A sala estavam em completo silêncio e eu não tinha coragem de levantar os olhos. Se ele estava querendo mostrar por aqueles presentes que não gostava mesmo nem um pouco de mim, ele conseguiu. Acho que nunca me senti tão humilhado como naquele dia. Não tenho coragem de dar o meu presente para ele.
Queria poder voltar para casa e dar o pior presente de todo. Desse jeito, ele provaria um pouco do próprio veneno.
Merda, eu só queria desaparecer da face da Terra e nunca mais voltar. Fugir em algum planeta e fingir que nada daquilo estava acontecendo.
— João Vitor, é sua vez — disse a voz do professor. — A aula já está acabando, precisamos terminar isso antes do recreio.
Nao consegui me mover. Não queria mais participar do amigo secreto estúpido.
— João? — O professor continuou.
Olhei para ele. Ele estava me encarando com pena. Na verdade, todos estavam. Aquilo era pior ainda. Eu não queria ser visto com pena.
Puxei o presente que eu trouxe dentro da mochila com as mãos trêmulas e já disse de uma vez quem tirei. Não tinha mais paciência de fazer o joguinho para as pessoas adivinharem. Só queria acabar aquilo logo.
Vinícius me olhou com os olhos arregalados. Bem, desse jeito talvez ele se sentia tão humilhado quando eu. Quando ver o meu presente incrível, vai se sentir culpado pelo que fez. E foi isso que me motivou a ir até ele e entregar o presente.
Ele hesitou por um bom tempo antes de abrir. Estava com medo, era óbvio. Todo mundo ao redor parecia ansioso para ver o que era. Eu também estava doido para ver qual seria a expressão que ele faria.
Era o que me mantinha firme para não desabar chorando.
Vinícius engoliu em seco e desembrulhou o presente. A sala ficou em silêncio quando ele puxou a carta e uma caixa com o boneco colecionador que comprei a ele. O que ele tanto queria e falava na minha cabeça que era o sonho da vida dele. Ele sabia o tanto que aquilo era caro, todo mundo sabia. E uma tensão começou a crescer ao redor da sala.
Eu não consegui olhar quando ele começou a abrir a carta. Até aquele momento consegui aguentar, porém, vê-lo ler o que escrevi, já era demais para mim. Peguei minha mochila e saí da sala sem olhar para ninguém. Até mesmo deixei os presentes que ele me deu para trás, sem me importar. Queria que ele percebesse o tanto que me magoou. Tinha que notar o tanto que meu coração estava destroçado.
Corri para o banheiro e me tranquei em um dos boxes quando minha respiração já estava acelerada. Comecei a chorar sem precisar mais esconder minhas lágrimas. Chorei até meus olhos arderem e as lágrimas acabarem. Não conseguia continuar mais com aquilo. Eu precisava ir para casa.
Sai do banheiro e fui até a entrada da escola para pedir a secretária ligar para minha mãe. Menti dizendo que estava passando muito mal, prestes a vomitar em qualquer momento. O que não era mentira, eu sentia a crise chegando cada vez mais próximo de mim. E quando ela chegasse, isso poderia acontecer. A secretária assentiu e discou o número da mamãe. Esperei até que pudesse falar com ela. Minha voz estava embargada e eu custei a falar com ela sem que desabasse.
— O que está acontecendo, João?
Funguei.
— Eu estou com muita dor de barriga, vem aqui logo, por favor.
Ela começou a ficar preocupada e disse que chegaria em alguns minutos. Me senti mal por estar fazendo isso com ela. Mamãe odiava ser atrapalhada quando estava trabalhando, mas não consegui impedir. Eu sei que estava sendo egoísta, mas eu precisava dela para conseguir sair daquela escola.
Suspirei e sentei na sala de espera enquanto segurava as lágrimas. Ela precisava chegar logo antes que Vinícius viesse até aqui. A raiva ainda fervilhava dentro de mim. Era tão inacreditável tudo que estava acontecendo. Quando cheguei na escola estava confiante e naquele momento saia como se um trator tivesse passado em cima de mim.
Eu era tão idiota e trouxa. Eu não devia ter dado atenção às cartas. Eu me iludo mais do que qualquer outra pessoa. Estava desesperado e quando encontrei algo que queria ouvir, acabei aceitando como verdade.
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