Gray
Depois da primeira reportagem ter feito um recorde de vendas para o Planeta Diário, Dianna era a escalada para registrar as melhores fotos do Superman. Ela chegou a receber propostas de outras empresas do ramo da mídia, além disso era sempre chamada para emergências pois, segundo o diretor de redação, suas fotografias faziam qualquer um chorar.
Infelizmente, com o decorrer do tempo, o diretor e alguns do grupo de redação começaram a questionar a conduta do herói e o discurso midiático produzido pelo Planeta Diário começou a ter uma linha um tanto quanto distorcida da realidade e estava influenciando na opinião dos leitores que tomavam partido sem refletir sobre o que lhes era apresentado.
"Superman: a salvação ou a destruição?" era o título da matéria de Julho, seria a primeira capa de novo, e lá estava a foto mais recente que ela tinha do Superman sobrevoando a cidade.
Ao ver o rascunho da redação, Dianna mal conseguiu terminar de ler as palavras da jornalista Lois Lane. Amassou o papel com uma das mãos e marchou novamente até a sala do chefe. Passou pelo corredor dos redatores e ao chegar na sala do diretor, encontrou a porta aberta e entrou com o papel amassado em mãos.
Lá dentro o chefe parecia estar em uma discussão calorosa com outro funcionário, um homem alto com camisa xadrez, óculos com um rosto perfeitamente esculpido em uma expressão de descontentamento contido.
-Não me interessa, Kent! Quero essa matéria na primeira capa amanhã, é uma ótima matéria. -O chefe levantou o tom de voz para homem a sua frente e só então encarou Dianna do outro lado. -O que diabos você está fazendo aqui?
Dianna abriu o papel em suas mãos e mostrou a matéria como se o motivo fosse óbvio.
-Não quero minha foto nessa porcaria de matéria.
O chefe se levantou batendo as mãos na mesa com um berro.
-Quem é o chefe dessa merda?! Sou eu! Eu escolho que matéria e fotos serão publicados. Se estão descontentes tirem essas bundas moles dessa empresa! -Então ele se calou e encarou os dois, Kent e Dianna.
Ela ficou feliz por ter deixado a câmera em cima da mesa do outro lado do andar, poderia ter de fato quebrado a máquina na cara do chefe. Iria acabar sendo indenizada, ou pior, ter que comprar uma nova câmera.
-Eu entendo que nem sempre concordem com o que é apresentado pelo jornal, afinal temos várias opiniões aqui dentro. -O diretor falou com a voz mais branda. -Valorizamos o trabalho de vocês, mas nem todos veem o Superman como herói e temos que apresentar isso também.
Dianna permaneceu calada e Kent rígido como mármore.
-Preciso de vocês para a cobertura das finais hoje. Os Lakers contra o Chicago Bulls. Temos lugares especiais, vai ser bom para fotos exclusivas e os detalhes do jogo. -O chefe voltou a se sentar. -Preciso que estejam lá hoje à noite, a matéria sairá na seção de esportes. -Então ele voltou a encarar a tela do computador como se o assunto estivesse resolvido.
Dianna saiu bufando da sala com Kent logo atrás.
-O Planeta Diário mostrar várias opiniões? Devíamos mostrar a verdade. -Murmurou Kent ao seu lado, mais para si mesmo do que pra ela.
-Eu concordo. -Ela suspirou. Então ele parou no corredor e tocou no braço dela fazendo-a a parar e olhar para ele.
-Suas fotografias são incríveis. Eu vi as outras matérias. -Ele disse com a voz serena, um leve sorriso nos lábios que trouxe novamente a sensação de reconhecimento incômoda. -Sinto muito que nem sempre as usem da maneira que você gostaria que o mundo visse.
-Obrigada, Kent... -Ela devolveu o sorriso com o agradecimento sincero. O elevador parou no andar e Dianna entrou.
-Me chame de Clark.
-Então te vejo no jogo, Clark. -Ela respondeu e as portas do elevador se fecharam.
À noite, a fotografa seguiu para o seu trabalho da vez que consistia em registrar os dribles e cestas de caras altos e suados. Sentia-se desanimada, o que mais queria era ter a imagem espetacular, registrar um momento importante que fizesse as pessoas sentirem o momento ao olhar para a foto. Duvidava que fosse encontrar algo assim em um jogo de basquete.
Ainda assim entrou no estádio com o crachá de acesso especial, a bolsa com o seu material sempre pendurada ao ombro. Olhou para o ingresso e checou a fileira e a poltrona, seguiu para o acento na terceira fileira. Na poltrona do centro estava Clark Kent ajeitando os óculos com um tablet no colo.
Dianna se aproximou e sentou ao lado dele.
-Hey, Kent. -Ela cumprimentou e o olhou nos olhos ao se sentar. Ele sorriu e era o tipo de sorriso perfeito e seguro que geralmente deixavam as outras pessoas desconcertadas.
-Clark. -Ele corrigiu e mexeu-se na cadeira mudando de posição para inclinar o corpo na direção dela. O olhar dele pareceu durar um longo segundo.
-Clark. -Ela concordou e baixou os olhos para a sua bolsa, a abriu tirando a melhor câmera que tinha para a ocasião.
-Gosta de basquete? -Ele perguntou agora olhando para a plateia que se preparava para o início do jogo.
-Han... Não. -Ela suspirou passando a alça da câmera pelo pescoço. -Quer dizer, não ligo muito. Queria fotografar outras coisas.
Clark olhou para câmera e depois para ela.
-Outras coisas como o quê?
-Qualquer coisa que dê esperança. -Ela respondeu e o olhar de Clark mudou para uma expressão compreensiva e ele sorriu de novo. Foi um sorriso aberto e espontâneo, Dianna quis guardar aquele gesto e habilmente levantou a câmera e com o filtro preto e branco registrou o sorriso de Clark.
Ele franziu o rosto um pouco sem graça, mas a foto em tons de cinza destacando o seu sorriso já estava registrada.
A plateia explodiu em gritos e palmas quando os times entraram em campo. Clark e Dianna passaram a se concentrar no jogo, ela se sentiu bastante limitada sem poder levantar muitas vezes para escolher os angulos e Kent não parecia nada animado com as anotações que fazia de cada jogada.
Pareceram horas intermináveis, no intervalo Clark sugeriu que ela comesse alguma coisa, mas Dianna recusou e acabaram dividindo apenas um refrigerante.
O melhor momento foi quando o Lakers fizeram seu último arremesso, ela já estava preparada, deu o close certo e fotografou a marcação de cesta que levou o time à vitória.
Os torcedores explodiram de alegria enquanto ela e Clark explodiam de alívio, tinham sobrevivido. Saíram das fileiras e andaram pelo estádio junto a multidão na direção da saída.
-Não sabia que você era comentarista esportivo. -Ela comentou ajeitando a alça da bolsa em seu ombro, Clark caminhava ao seu lado com a jaqueta pendurada no braço e uma das mãos no bolso da calça jeans, ele riu.
-Não sou. Na verdade, o trabalho de hoje fui um castigo para nós dois. -Ele respondeu quando saíram da parte coberta e caminharam até o estacionamento.
-Espero que isso não aconteça toda vez que alguém defender o Superman. -Ela sorriu e tocou no braço dele. -Te passo as fotos por e-mail, ok? Boa noite, Kent... Digo, Clark.
Ela começou a se afastar, Clark apertou a chave do carro indeciso.
-Mas está tarde, Di! Posso te dar uma carona. -Ele ponderou, mas ela continuou andando e se virou com um sorriso.
-Não se preocupe, é rápido até minha casa. -Lhe informou já distante, o vento soprou forte e ela segurou o gorro. -Boa noite noite, Clark.
Ele assentiu a viu partir e seguiu até o carro.
Dianna caminhou para fora do estádio passando pelo portão. Era quase meia noite, mas cruzando duas ruas conseguiria pegar o metro a tempo. As ruas estavam quietas e vazias a não pelos restaurantes de 24h abertos, não havia comércio ou pedestres pelas ruas.
Ela caminhou com passos apressados, já conhecia as ruas como as linhas de sua mão. Sabia se virar já que não podia contar com um carro próprio ainda. O mundo parecia muito silencioso e o único som que Dianna conseguia distinguir era dos seus passos e a sua respiração.
Há alguns metros de distância, havia um grupo de quatro homens. Falavam baixo, só era possível distinguir os sussurros e a fumaça de hálito quente entre eles. Ela diminuiu o passo cautelosa, tentou pensar rápido no que poderia fazer. Não poderia correr o risco de fazer o caminho alternativo e perder o último trem.
Atravessou a rua para o lado contrário e continuou sem olhar novamente para o grupo do outro lado na esquina. Passou por eles e então ela ouviu as conversa parar, interromperam as falas e observaram ela passar. Um deles assoviou para chamar atenção, mas Dianna continuou com os passos firmes.
-Ei, por que não para pra falar com a gente? -Gritei um dos homens andando em sua direção. Ela acelerou o passo o deixando pra trás.
-Se acha bonita demais pra isso? -Gritou o segundo. Ela ouviu passos apressados atrás de si, percebeu que eles estavam vindo atrás dela.
Merda, pensou olhando para a frente, a rua estava escura. Talvez conseguisse correr.
Eles apressaram o passo atrás de si, Dianna começou a correr, mas um deles alcançou a sua bolsa e a puxou para trás. Imediatamente ela reagiu o chutando entre as pernas. Ele gemeu e se agachou.
Os outros três riram e se aproximaram.
-Essa é durona. -Disse o que segurava a garrafa, o bigode dele parecia encharcado de álcool. Dois começaram a cercá-la pela direita e pela esquerda.
-Passe a bolsa, vadia. -Resmungou o que se levantava com a mão entre as pernas. Dianna o acertou no nariz com raiva, foi sem pensar. Ela podia sentir o sangue fervilhar, sabia que não devia reagir, mas ninguém podia chamá-la de vadia!
-Olha garota, não reaja. -Disse o que estava à sua esquerda. -Passe a bolsa e vamos para o beco nos divertir.
Eles a cercavam e se aproximavam devagar, estava encurralada. Tentou se afastar, mas eles a estavam guiando para o beco escuro do lado esquerdo.
Dianna sentiu o pânico crescer em seu peito, o pulso tremia e o sangue martelava em sua cabeça. Não ia deixar que tocassem nela, preferiria morrer a deixar que acontecessem.
-Se querem as minhas coisas podem levar. -Ela murmurou tentando manter a distância, eles formaram um círculo ao seu redor. -Mas não toquem em mim.
O que segurava a garrafa riu e engasgou com o próprio riso. O que ele havia acertado entre as pernas balançou a cabeça.
-Nós só queremos nos divertir. -Murmurou o que estava na sua direita, ele havia se aproximado e sussurrado pra ela. Dianna sentiu a repulsa explodir dentro de si, girou a alça da bolsa e acertou ele na cabeça. O homem à sua esquerda se precipitou e agarrou o seu pulso, ela acertou o nariz dele com o cotovelo.
O que estava na sua frente avançou, ela ergueu a perna para um chute, mas ele estava mais atento e agarrou-lhe a perna e a puxou. Dianna perdeu o equilíbrio e caiu. Um deles a agarrou pelas costas e a ergue do chão, os outro dois tentaram agarrar os seus braços, ela pisou no pé do que segurava as suas costas e torceu os braços para se soltar dos outros dois. Em meio aos gritos dela e os socos que ela acertou, a câmera que estava em seu pescoço se soltou e caiu no chão.
Um flash estourou no ambiente quando a câmera chocou contra o concreto. A luz iluminou o beco por um instante, Dianna conseguiu ver a silhueta de alguém instantes antes de ouvir um dos homens gritar e o barulho de ossos se quebrar. Em seguida, o que estava a sua direta foi arremessado contra a lata de lixo.
Então ela o viu quando a luz do poste refletiu o símbolo em seu peito. Superman se aproximou dela, em instantes tinha derrubado os quatro homens num piscar de olhos. Ela respirou fundo aliviada.
Ele se aproximou devagar como se estivesse dando um tempo para ela perceber que ele estava ali para ajudar. O rosto sereno dele estava pouco iluminado, a vestimenta azul parecia preta com a pouca iluminação e capa vermelha parecia estar cinza tremeluzindo no beco.
-Você está bem? - Ele perguntou e a tocou no ombro. Ela balançou a cabeça, o alívio estava tomando conta do seu corpo, conseguia sentir o choque a deixar agora. Ele se abaixou e pegou a câmera do chão, se levantou e a olhou nos olhos, pareceu estar de fato preocupado.
-Espero que não tenha quebrado. -Ele colocou a máquina em suas mãos. Ela apertou a câmera até as pontas dos dedos ficarem brancas.
-Obrigada. -Sussurrou.
Ele estendeu a mão e acariciou o seu rosto afastando as lágrimas, só então ela percebeu que tinha chorado.
-Onde é sua casa? -Ele perguntou, a voz baixa e serena passava segurança. Ele era alto e musculoso, Dianna levantou um pouco a cabeça para olhar o seu rosto.
-Moro em um apartamento na parte sul, na rua Lincoln. -Ela respondeu ainda sentindo o rosto quente onde ele havia tocado. -Eu ia pegar o metro.
-Vou te levar pra casa. -O tom era decidido, ele não estava perguntando. Levou a mão até o braço dela e se aproximou. Passou a mão pelas costas dela e a ergueu, a outra mão segurando suas pernas.
Instintivamente Dianna segurou-se nele e o Superman voou. Ela teria gritado, mas perdeu o fôlego quando o vento atingiu o seu rosto. Podia ver o céu envolve-los e o ar frio soprar entre eles, Dianna inclinou de leve a cabeça e viu as luzes da cidade lá embaixo, pareceram tão minúsculas que só então ela deu conta do quão alto estavam voando. Sentiu o corpo tremer, mas o Superman apertou o abraço.
-Não olhe pra baixo. -Disse ele sorrindo para tranquilizá-la. -Qual é o seu prédio?
-É o mais antigo, cor de tijolos. O único prédio com sacadas. -Ela fez um esforço para olhar e apontou o edifício para ele. -Sou do último andar....
Então ele se curvou levando o corpo dela junto enquanto mergulhavam no ar em direção ao apartamento.
Dianna achou que ele a deixaria na calçada e partiria, mas ele pousou na sacada de seu apartamento, ela olhou para a porta de vidro fechada e para as suas velhas cortinas e depois para ele que tinha o rosto pouco iluminado pela noite.
Levou um longo segundo até que ele a deixasse descer de seu colo colocando-a no chão, a mão continuou pousando em sua cintura. Com uma das mãos ela segurava a câmera, a outra estava no braço dele.
-Obrigada. -Ela o olhou nos olhos. Naquele momento estava escuro e não podia ver os detalhes da cor dos olhos dele, mas sabia pela expressão que ele parecia estar apreciando o momento.
-Não devia andar sozinha tarde da noite. -Ele ergueu os sobrancelhas explicando o óbvio, Dianna sorriu. -Metropolis é uma cidade perigosa.
-Eu sei, mas acreditei que chegaria bem até o metro. -Ela explicou e então olhou para dentro do seu apartamento percebendo que ele havia acabado de salvar sua vida e ela devia pelo menos convidá-lo para entrar. -Você gosta de café?
Ele riu baixo e ela não soube o motivo, ainda estava aprendendo a ler ele.
-Vamos entrar! -Ela convidou com um sorriso e a voz era um doce sussurro tímido e isso fez ele sorrir abertamente e balançar a cabeça de forma negativa.
-Ah, qual é?! Aposto que mesmo os super heróis fazem pausa para o café. -Ela insistiu e se afastou virando-se para as portas de vidro da sacada, abriu afastando a cortina e entrou na sala acendendo a luz. Se virou para o Superman pronta para mais um argumento, mas ele já não estava mais lá. Ele partira em uma noite nublada.
Ela ainda correu até a sacada na tentativa de vê-lo uma última vez naquela noite, mas ele não estava mais por perto.
-Obrigada. -Sussurrou para o céu e voltou a entrar no apartamento.
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