maratona capítulo 2/2

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AMELIE PARISI

terça-feira, canada race week

Era sempre a mesma sensação. Aquele frio na barriga de estar entrando em um jatinho particular, algo ainda um pouco diferente para mim, mas tão cotidiano para Charles. Ele já estava acostumado com tudo isso - as viagens, a atenção, o luxo. Para mim, ainda era algo um pouco estranho.

- Vamos logo, Amelie. - Charles chamou, com aquele sotaque francês carregado que fazia meu coração dar um pequeno salto. - Andrea não gosta de atrasos.

Ele carregava sua mochila e mais uma mala enorme, caminhava rapidamente. Andrea, por outro lado, já estava parado na porta do jatinho, com os braços cruzados e uma expressão séria, parecia impaciente.

- Se atrasou porque estava esperando sua namorada? - Andrea perguntou, lançando um olhar para nós dois. - Esse atraso eu posso perdoar.

Charles revirou os olhos tão dramaticamente que quase pude ouvir o suspiro que ele queria soltar.

- Andrea, já dissemos isso mil vezes. Não estamos juntos. - Ele resmungou e me ajudou a entrar no jatinho.

- Somos apenas amigos. - Falei, dando um sorriso para Andrea.

- Hum, claro. - Andrea respondeu, mas o sorriso no rosto dele entregava o que ele realmente pensava. - E eu sou o próximo piloto da Ferrari.

Sentei em um dos assentos ao lado de Charles, tentando fingir que aquele comentário não tinha me deixado nervosa. Era sempre desconfortável quando alguém insinuava algo sobre nós, mesmo que... talvez não fosse tão absurdo assim.

- Podemos falar de outra coisa, por favor? - Charles pediu, passando a mão pelos cabelos e mudando de assunto.

- Claro. - Andrea respondeu,. Ele sentou a frente e apontou para Charles com seriedade fingida. - Na verdade, podemos falar sobre você. Precisa voltar aos treinos pesados na academia.

Charles fez uma careta.

- Eu estou treinando. - Ele disse.

- Corrida no simulador não é treino físico, Charles. - Andrea retrucou, cruzando os braços. - Você anda pegando leve demais, e se não quer que eu te arraste para a academia feito um saco de batatas, é melhor me ouvir.

Charles riu, mas eu sabia que ele levava aquilo a sério. Andrea era o tipo de pessoa que podia brincar com ele o tempo todo, mas quando o assunto era preparação física, ele não deixava espaço para desculpas. E na última semana, Charles estava fugindo dele.

- Eu vou voltar aos treinos. Só precisava de um tempo para... - Ele pausou, procurando a palavra certa.

- Para fugir. - Andrea completou, negando com a cabeça.

- Para relaxar. - Charles corrigiu, lançando um olhar quase infantil para o preparador físico.

- Relaxe correndo na esteira, então. - Andrea rebateu, fazendo com que eu desse uma risada.

Os dois olharam para mim, e eu ergui as mãos em sinal de paz.

- O que foi? Ele tem razão. - Falei apontando para Andrea, que sorriu vitorioso.

- Ah, você também vai ficar do lado dele agora? - Charles perguntou, fingindo uma indignação.

- Só estou dizendo que, talvez, ouvir o Andrea seja uma boa ideia. - Eu disse, ainda sorrindo. - Imagino que não seja fácil para um piloto manter o físico em dia.

- Loira traidora. - Charles murmurou, mas sem conseguir segurar a risada.

- Se não vai ouvir a mim, ouça a sua namorada. - Andrea provocou. - Somos dois contra um.

Charles virou a cabeça para Andrea com uma expressão de quem não estava nada animado com a ideia, mas era evidente que sabia que não tinha escolha.

- Vocês venceram. - Ele resmungou, fazendo uma careta. - Começamos quando chegarmos no Canadá.

Andrea deu uma risada alta e eu me vi olhando pela janela, tentando me distrair com a paisagem que se estendia abaixo. Não sabia o porquê, mas estava com um terrível pressentimento sobre essa corrida do calendário: Canadá, Circuito Gilles Villeneuve.

Até mesmo a energia da semana que mal começava, já parecia um pouco pesada.

[...]

Eu desci do carro, sentindo a brisa fria do Canadá me envolver à medida que me aproximava da entrada do hotel. Charles tinha se afastado logo após a chegada para ir direto para o treino, e eu estava sozinha, com o tempo para descansar um pouco antes de vê-lo de novo. O saguão do hotel estava movimentado, com fãs e jornalistas reunidos em um canto, provavelmente esperando por Charles ou algum outro piloto. Eu puxei meu casaco para mais perto do corpo, tentando passar despercebida, mas claro que não funcionou.

- Amelie! - Uma voz animada me chamou, e eu me virei para encontrar uma garota.

A encarei e ela provavelmente estava em seus vinte e poucos anos, segurando um pequeno embrulho em mãos. Ela parecia nervosa, mas determinada a falar comigo.

Por segundos até me questionei como sabia meu nome, mas rapidamente lembrei-me de que estava sempre com Charles e da postagem que ele fez.

- Oi! - Respondi, oferecendo um sorriso educado.

- Você é... tipo, muito linda pessoalmente. -Ela disse corando levemente. Antes que eu pudesse agradecer, ela continuou, estendendo o embrulho para mim. - Você poderia dar isso para o Charles? É só um presente pequeno, nada demais... Eu sou muito fã dele!

Peguei o presente com cuidado, notando que era embrulhado com papel vermelho e uma fita dourada, algo simples, mas evidente o carinho, pois estava até perfumado.

- Claro, posso entregar para ele. - Respondi, sorrindo para ela de volta.

A garota parecia aliviada, mas sua expressão logo mudou para uma mistura de curiosidade.

- Mas... vocês estão juntos, né? - Ela perguntou, dessa vez mais baixo.

Não posso negar que a questão me pegou de surpresa, mas, ao mesmo tempo, já esperava algo assim. Respirei fundo, tentando manter a calma.

- Não, não estamos juntos. - Falei, mantendo o sorriso firme. - Somos amigos.

Ela estreitou os olhos, claramente não acreditando em mim.

- Ah, não precisa mentir! Todo mundo já sabe. Dá pra ver nas fotos, nos vídeos e na nova matéria postada sobre vocês. - Ela respondeu. - Vocês combinam tanto.

Matéria? Iria ver isso depois.

Eu ri, mais de nervoso do que de qualquer outra coisa.

- De verdade, somos só amigos. Mas fico feliz que você ache que combinamos. - Forcei um sorriso para ela. - Obrigada.

- Amelie, não esquece do presente, por favor?! - Ela pediu.

- Não vou esquecer. - Prometi, dando um aceno antes de seguir para o elevador.

Enquanto subia, encarei o embrulho em minhas mãos. Era estranho, mas por mais que negássemos, as pessoas pareciam ter decidido por nós. Talvez fosse pela forma como Charles olhava para mim quando pensava que ninguém estava vendo. Ou pela forma como eu tentava não sorrir demais toda vez que ele tentava tirar algo de mim com suas cantadas ruins.

Talvez todos eles vissem algo que nós ainda não tínhamos coragem de admitir.

[...]

se preparem viu !!!