Solitário

— Como foi o primeiro dia, Olie? Fez muitos amigos? — minha mãe perguntou assim que entrei no carro.

— Ótimo. Fiz treze amigos maravilhos. — respondi sarcasticamente.

— Sério? — ficou incrédula, enquanto eu puxava o cinto de segurança e travava-o.

Olhei-a com uma cara de tédio e desinteresse e ela captou a minha mensagem.

— Ninguém? — pôs a chave na ignição.

— Mãe, entenda: as únicas pessoas das quais eu conversei foi a diretora, a moça da lanchonete para pedir um hambúrguer, a minha professora de francês e a Srta. Roz. — expliquei, assim que ela acelerou.

Srta. Roz? — repetiu. Eu abri a janela e deixei o vento bater em meu rosto e bagunçar os meus fios pretos do cabelo.

— Longa história, Mary. — respondi, olhando para a rua.

— Como não conseguiu socializar, Oliver? Tem vários adolescentes da sua idade lá...

— Pois é. Acontece que nenhum deles estavam interessados em socializar comigo. — fez-se alguns segundos de silêncio. — Posso ligar o rádio? — estiquei o braço e apertei no botão "on", ligando o aparelho.

— Não. Você vai conversar comigo sobre isso. — ela desligou a rádio e soltei sem querer um palavrão baixinho por conta de saber o que ouviria a seguir. — O que falou, Oliver Kennedy? Eu não ouvi três palavras feias saindo da sua boca, ouvi?

— Na verdade... Dependendo da frase, "que" e "pariu" não são consideradas palavras feias... — dei de ombros e senti aquele olhar dela perfurar o meu corpo junto com a velocidade do carro diminuindo.

— Você está de brincadeira, garoto? — perguntou a minha mãe.

Me lembrei de meses atrás, quando o diretor da minha antiga escola a chamou para conversar e contou que eu não havia feito amigos. Ela havia arqueado o cenho e perguntado: "Você está de brincadeira, Diretor?".

De modo algum, Srta. Kennedy. Seu filho, Oliver, não fez nenhuma amizade em um trimestre de aulas e temo que isso possa ser prejudicial para o seu psicológico como adolescente. Peço que um psicólogo o acompanhe nesse quesito, pois não é comum pessoas da idade dele não ter nenhum amigo em uma escola tão grande e cheia como essa. — imitei a voz do Diretor Ross, que era o diretor da minha antiga escola.

Minha mãe parou o carro no acostamento e me fitou, com uma certa expressão de pena e dor ao mesmo tempo.

— Oh, Oliver... — me puxou para um abraço forte e deslizou a mão para dentro do meu cabelo, me fazendo um cafuné gostoso. — Eu sinto muito...

Minha mãe se sentia culpada por eu ser o recluso, o solitário. Ela achava que, como mãe, deveria me arranjar uns amiguinhos a quem eu pudesse brincar. Mas eu havia crescido, não tinha mais sete anos quando todas as crianças da rua estavam brincando e eu apenas estava sentado no balanço que tinha no nosso jardim, observando os risos e brincadeiras. Minha mãe havia gritado para me incluírem na brincadeira, e eles tiveram que me aceitar, até porquê a minha mãe havia dado balas para cada um, pelas minhas costas, é claro.

Eu me senti mal ao saber que fui comprado, ao saber que todas aquelas crianças fingiam estar gostando de brincar comigo porque foram subornados com balas de morango e maçã.

Mas como eu disse: eu cresci. Minha mãe não poderia chegar na escola e oferecer balas para quem fizesse amizade comigo. Ela já não podia tentar, e isso a deixava mais culpada. Ás vezes eu acho que ela sofria mais que eu sobre isso, o que me machucava demais.

Quando eu tinha treze anos, cheguei em casa dizendo que havia feito um amigo. Ele se chamava Sunny, e não passava de uma mentira para eu agradar a minha mãe. Eu me lembro do quão ela ficou feliz e fez uma mini festa para comemorar, para comemorar a existência de um novo amiguinho imaginário de Oliver. Era terrível mentir.

Até que um dia ela foi para a minha escola e me viu sozinho no intervalo. Perguntou para um funcionário onde estaria Sunny, então ouviu-o dizer que não conhecia nenhum Sunny na escola. E ela não parou aí, perguntou para diversas pessoas sobre Sunny e nada. Até que a secretária pesquisou no sistema e não havia nenhum aluno com aquele nome matriculado na escola. Tive que contar a verdade para ela, e depois daquele dia prometemos não mentir um para o outro outra vez.

"Goodbye, Sunny" estava escrito no glacê da torta de maracujá que a minha mãe fizera (fora a terceira, já que as outras duas anteriores haviam queimado) para se despedir de Sunny.

— Estou bem, mãe. — me afastei após um tempo. — Estou bem.

— Eu queria que tivéssemos um acompanhante para o jantar, assim você não se sentiria tão sozinho.

— Eu tenho você, mãe.

— É. Mas é só eu e você desde... — deixou o silêncio responder o "... a morte de seu pai" — Bem... Eu queria que pudéssemos ser menos sozinhos, Olie.

Lembrei então de alguém, mas a minha mãe nunca o deixaria entrar em casa. No entanto, ela estava um pouco abalada com tudo aquilo e poderia topar com um pouco de drama, é claro.

— Podemos chamar o sr. Dust. — eu propus.

— De jeito nenhum, Oliver. — negou com a cabeça.

— Tudo bem. — fingi ceder e fiquei olhando pela janela.

— Vou pensar sobre essa hipótese. — decidiu, ligando o carro outra vez e acelerando.

Eu assenti, mas eu abri um largo sorriso para a rua, a fim de minha mãe não poder ver.

Agora só bastaria convencer Henry Dust também, o que era uma tarefa difícil já que pouco tínhamos intimidade e não nos conhecíamos direito.

Tive que pensar um pouco sobre a minha vida no caminho de volta para casa. Afinal, o que era realmente ser solitário?

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