Beijos
Eu jurava que aquilo tudo era um sonho. Um sonho bom. Um maravilhoso sonho.
Mas no meio da noite, Sky recebeu uma ligação e teve de atender. Eu acordei, porque ela ficou agitada e bem irritada também. Eu não sabia quem era, mas ela estava tentando explicar algo para esse alguém, sentada na cama e tentando resolver um cubo mágico.
Minha mãe sempre disse que esse "joguinho maldito" não fora feito para pessoas impacientes e irritadas. Falou que perdeu as contas de quantas vezes os quebrou por raiva, jogando-os na parede, pela janela do sexto andar (ela já fez isso!) e destruindo-o com o martelo velho do pai dela.
Quando contou-me isso, Mary estava fazendo ioga e tentava dizer com uma voz calma e relaxada. Uma amiga a indicou fazer esse tipo de exercício, antes de nos mudarmos. O nome dela era Sarah, e ela era uma "maluca solteira" (como minha mãe a chamava).
Sarah vivia perdendo o controle da televisão, gostava de reality shows e suco de maracujá era a sua droga mais poderosa. Vivia na nossa casa, nunca gostava de sair. Conhece a minha mãe desde que me entendo por gente e até era amiga do meu pai. Quando ele se foi e eu fiquei deprimido, ela me fez rir quando disse que "Se a minha melhor amiga não fosse casada com ele, acho que eu o pegaria loucamente, pois vale a pena investir em machos como ele". Sim, com essas mesmas palavras.
Ela não praticava ioga, e se cansava só em ir para a padaria e voltar. Mas tudo que ela não podia fazer, mas queria, indicava para a minha mãe e ela fazia. Ioga, caminhada, ler algum livro e até mesmo aprender uma receita nova. O problema é que minha mãe sempre fora ruim na cozinha, e só uma coisa ou outra que saem direito, ou com um pouco (muito) de sorte para a receita dar certo.
Eu estava suado, pois estava com calor e a brisa noturna que vinha da janela aberta não era suficiente para me refrescar. Me levantei e andei até o banheiro, então tirei a minha camisa suada e lavei o rosto. Olhei-me no espelho, mas aquilo nada mais era que uma mania minha: me encarar.
A porta do banheiro se abriu, e eu dei um salto para o lado, assustado. Sky jogou o cabelo para trás e lavou o rosto rapidamente, depois enxugou-o e olhou para mim, já que eu estava observando-a.
— O que foi? — me perguntou, com aquela voz maravilhosa dela e que nunca me enjoava.
Eu gostava de ouvi-la falar porque, ao contrário de algumas garotas, Sky tinha uma bela voz e controlava o tom. Me perguntava coisas, eu respondia e ela me escutava. Às vezes fazia piadas, mas sempre eram ruins e eu acho que isso é o mais engraçado. Então sempre ficávamos em silêncio, para depois ela retomar a conversa sobre qualquer coisa.
— Nada, é só que... É que... Você me assustou — eu disse.
— Sou tão feia assim? — ela riu e inclinou vagarosamente a cabeça para o lado esquerdo.
— Não quero dizer isso. É que foi repentina essa sua abordagem. Só isso — me calei.
A garota segurou a minha mão e me tirou do banheiro. Me fez sentar na cama e se afastou, para pegar duas cartelas de adesivos infantis de dentro de uma gaveta do criado-mudo.
— O que vai fazer? — eu perguntei.
Ela não me respondeu, mas o que fez já dizia a resposta. Se inclinou para frente, destacou um adesivo e grudou-o no meu rosto.
— Sério, Sky? Isso?!
Eu a deixei grudar vários adesivos no meu rosto, até ele estar coberto e eu reclamar por a minha mãe sempre reclamar sobre isso.
Ela me contou sobre quando era pequena e fazia isso com os amiguinhos dela, e dizia que os pais sempre mandavam bilhetes à professora, pedindo que "faça-a parar de colar esses troços grudentos" na face de seus filhos. Eu disse para ela que a minha mãe faria o mesmo, mas não por bilhete, pois Mary não é de recadinhos.
— Olha — tentei imitar a sua voz —, sua filha desgovernada está colando esses negócios aqui na cara do meu filho! Não é, Oliver? É sim! Sabia que essas armas transmitem câncer? Sim! Saiu uma pesquisa de uma Universidade, vi no New York Times! — eu fiz uma pausa e ri, pois era uma boa imitação e com certeza mamãe falaria aquilo. Além do mais, ela nem lia o New York Times e mesmo assim mencionaria. Porque ela é Mary — Se meu filho aparecer com uma doença de pele, a culpa será dessa jovenzinha mal-educada que anda por aí matando as pessoas. E se tiver uma substância tóxica nessa cola? Ou pior: radioativa? Se meu filho morrer...
Sky não me deixou terminar, pois riu e me deu um empurro, que me fez deitar na cama.
— Sua mãe realmente... Re... — ela não conseguia falar de tanto rir — Realmente falaria isso?
— Sim! Ela é meio exagerada... — eu falei, tentando não assustá-la. Eu não queria apressar as coisas, mas vai que ela decide não convidar a minha mãe para o nosso casamento, por ter medo dela?
✖️✖️✖️
Nunca havia dormido tão bem na minha vida como naquela noite. Aliás, não me lembro de ter adormecido outra vez, só de rir com Sky e deitar cansado, conversando sobre a minha família.
Para falar a verdade, nem me lembro do que exatamente falei para ela, eu estava bastante sonolento; era a mesma coisa de eu estar bêbado.
Só escutei um grito assustado, que me fez acordar e sentar-me na cama, perplexo. Sky fez o mesmo, e ambos nos deparamos com Cass, Alec, Zach, Styles e Taylor.
Maravilha...
— Vocês... Transaram? — fora a pergunta de Styles, cujo estava com os olhos arregalados e segurava a mão de Cass.
Eu não sabia em que posição eu estava antes com Sky, e talvez fosse melhor eu não saber mesmo. Mas acho que aparentava algo que não aconteceu.
— Não... Não, de jeito nenhum. — Sky disse, se levantando da cama e caminhando pelo quarto, enquanto vestida do seu pijama meio justo que não me permitiam desviar os olhos. Droga.
— O que foi isso, Oliver? — Alec estava bravo, deu um passo para frente com os punhos cerrados. Pensei que iria me bater, mas não sabia bem o motivo.
— O que... Sky? Não, Alec... — eu estava com dor de cabeça, porque não fui acordado do jeito certo. — Apenas dormimos abraçados.
— Ah, sim, claro... — foi sarcástico.
Fiquei em silêncio, parado, olhando para eles. Zach fazia bolhas com o seu chiclete, Cass e Styles estavam de mãos dadas, esperando eu dizer algo mais, enquanto Taylor estava com os braços cruzados, com uma expressão de tédio e ao mesmo tempo de divertimento. Ele era um sujeito confuso de se entender.
O clube estava em choque.
Sky nem mais no quarto estava, pois fora para o banheiro se vestir. Eu estava odiando ter a atenção toda em mim, e odiaria abrir a boca para falar uma besteira ou tentar explicar algo inexplicável. As coisas estavam piorando. Eu ia fazer outra besteira.
— Eu sou gay, Alec. Sou cem porcento gay e gosto de garotos. Gosto de pessoas cujos cromossomos são XY, entendeu? Gosto garotos. — me levantei da cama, apenas de calça jeans, e fitei-o. — Eu sou gay.
Alec hesitou por um tempo, depois me abraçou forte. Styles e Cass suspiraram aliviados, Zach estourou a própria bolha com o dedo indicador direito e Taylor saiu do quarto, revirando os olhos e resmungando: "Pensei que iria ter briga!"
Por cima do ombro de Alec, olhei para o banheiro. A porta estava entreaberta, dando-me um pouco de visão do que seria uma possível Sky olhando para nós dois, pelo reflexo do espelho. Quando viu o meu olhar, desviou, fechando a porta em seguir. Respirei fundo, e apertei Alec contra mim.
Eu gostava dele, mas sentia que amava Sky.
✖️✖️✖️
Escutávamos Do I Wanna Know de Arctic Monkeys, que era o som de chamada do celular de Styles e ele não queria atender. Era o pai dele, mas ambos brigaram. Styles estava meio revoltado, não queria conversar com ninguém.
Eu ainda estava só com a calça jeans, sentado na calçada, vendo a rua, junto com os garotos e Sky ao meu lado. Na trilha de Arctic Monkeys, Taylor fumava, Zach continuava mascando a sua goma, Styles estava com o braço ao redor dos ombros de Cass, Alec segurava a minha mão e Sky estava com a cabeça pousada em meu ombro, assim como a sua mão estava sobre a minha. Um ao lado do outro, olhando para o outro lado da rua mas ao mesmo tempo não olhando exatamente nada. Meu rosto ainda estava com adesivos, e aquela música demorou um século para terminar. Eu ainda estava com sono, mas a respiração de Sky me fazia acordar. Ela era a minha estrela de dia, e o meu Sol à noite.
— Eu quero tanto chorar... — sussurrou Styles, mas eu pode escutar.
A música retomou, e Taylor soltou um palavrão pesado, implorando para ele desligar "a droga desse celular e deixar todos em paz." Ele assim fez, e jogou o celular no meio da pista.
— Endoidou de vez, garoto? — Taylor reclamou, se levantando e indo pegar o celular.
— Ah, cala a boca, Taylor! — falou Cass, puxando Styles para um abraço de lado e segurando o seu rosto com uma mão. — Você é insensível!
Eu não estava entendendo direito, mas eu estava me sentindo meio anestesiado. Não sentia exatamente nada, era como se eu estivesse em outro lugar e ao mesmo tempo ali. Mas eu vi uma caminhonete se aproximar e girei um pouco a cabeça para o lado. Ela parou em nossa frente, e um homem furioso desceu dela.
— Eu comprei a droga desse celular para quê, Styles? Para quê, hein? — ele gritava, com passos firmes vindo em nossa direção.
Mais entorpecido que eu, estava Styles. Ele estava inclinado, com as mãos nas laterais da cabeça e olhando para frente, como se aquele carro não estivesse estacionado ali e tampouco um homem estivesse gritando com ele.
— Eu estou te ligando há quase uma hora! Está escutando isso, Styles? — ele continuava, e todos estavam agindo como se ele não estivesse ali e eu me perguntei o porquê. Sky fungou em meu ombro, Alec apertou a minha mão mais forte e eu pude perceber que eles sabiam do que estava acontecendo, e sentiam. — Por que você não é como Paul? Por que você não está na escola? O que há com você, Styles?
— Eu não sou a droga do Paul!! — ele se levantou — Eu não sou ele! Nunca vou ser! Por que você simplesmente não para de me cobrar coisas que nem você é capaz de fazer? Por que simplesmente não me leva para tomar um sorvete, me dá um um boné de um time de beisebol qualquer e depois me deixa na esquina de casa? Por que quer sempre que eu seja o seu reflexo?
— Ah, é isso que você quer? — o homem, que tudo indicava se tratar do pai de Styles, cruzou os braços.
Eu me levantei daquele chão, porque estava muito quente e os meus glúteos já estavam queimando. Entrei na Terra do Nunca e segui para o quarto onde eu e Sky dormimos. Fechei a porta e suspirei, cansado. Minha cabeça doía, eu precisava de um banho. Chequei o meu celular: 58 ligações perdidas de Mamãe. Mandei uma mensagem dizendo que falaria com ela depois, e não parei para ler as setentas mensagens com preocupações e dramas de Mary.
Baguncei meu cabelo, e me perguntei o que estaria acontecendo lá fora. Afastei pensamentos ruins da mente com uma bela sacudida da cabeça, depois abri a minha calça jeans e a tirei. Enquanto a dobrava, cantarolei uma música. Até escutar a porta bater e me virar para ver o que raios havia acontecido.
— Desculpe, eu não sabia que... Você estava nesse estado — Ben me olhou de cima a baixo, e largou a maçaneta da porta já fechada.
— Bem... — eu não sabia nem o que dizer.
— Tudo ficou bem lá fora. Isso sempre acontece. Estão abraçados agora, e provavelmente Styles esteja chorando. — falou, caminhando na minha direção. — Não estou bêbado agora, Oliver, mas eu quero te beijar.
— Oh, bem... Eu... — pigarreei, e ele estava se aproximando mais — Eu meio que...
Eu estava me odiando naquele momento, porque eu estava sendo tão estúpido e aquilo iria acabar ruim de qualquer jeito. O ponto era: quão fundo eu iria me afundar naquela porcaria toda? Porque estava doendo. E por mais que eu fosse sincero comigo mesmo em relação a Sky, ela tinha namorado! O que eu iria ser, senão um super-hiper-maravilhoso-mega-ultimate-amigão para ela? Droga, Alec Benjamin estava ali e ele queria me beijar! Eu estava confuso, mas talvez eu também quisesse beijar ele. Eu não poderia dar tudo de mim em algo sem futuro, sem noção. Eu namoraria com Sky, mas não sabia se ela namoraria comigo.
— ... Eu posso fazer mais, Ben.
Eu nem acreditei que tinha feito aquilo, que tinha empurrado Alec na cama e que meu corpo estaria sobre o dele, e que beijaria tanto os seus lábios que seria capaz de estarem vermelhos quando quiséssemos terminar com aquilo. Eu nunca havia feito isso com um garoto, eu nunca havia beijado alguém daquele jeito, de um modo quente mais ao mesmo tempo romântico.
— Estou me controlando para não tirar a sua roupa — ele sussurrou para mim — Quer dizer, a sua única peça se roupa.
Eu ri.
— Você é tão quente... — ele sussurrava, enquanto eu beijava o seu rosto — Você me faz ficar quente...
Olhei Alec nos olhos, ele estava sem os óculos e eu pude sentir meu coração apertar, porque quando eu o olhava, eu percebia que ele gostava tanto de mim, enquanto o meu amor estava lá fora, do outro lado daquela porta e conversando com outras pessoas. Eu gostava muito dele, mas não era a mesma coisa que Sky. Eu estava me sentindo culpado.
— Cala a boca, Alec — ordenei, beijando-o outra vez.
O engraço era que nem eu mesmo sabia o que eu estava fazendo e o que deveria. Não podia conversar com ninguém sobre aquilo, tinha medo de ser julgado. Mas eu estava sendo gay, eu podia ser um gay. Eu estava em cima de um garoto, numa cama, num quarto de uma casa na Califórnia. A garota que eu gostava pensava que eu era gay, e talvez eu fosse. Ela tinha um namorado babaca e eu tinha um cabelo cor-de-rosa, e quando bebia Jack Daniel's ficava parecendo um unicórnio drogado. Além de uma mãe maluca que odiamava o meu vizinho escritor e uma paixão louca por sorvete de flocos; mas não mais que Sky. Não mais que a minha vontade de beijar Alec naquele momento, e eu estava me odiando mais ainda por estar por estar beijando aqueles lindos e doces lábios, enquanto pensava em outra pessoa, a qual, achava eu, não estava pensando em mim.
— Oliver, nós... — era ela na porta, mas não esperava nos ver naquele momento. Assustada, fechou a porta e concluiu: — Vamos sair todos com o pai de Styles. Vocês vêm? — estava mais para um sussurro.
— Sim, Céuzinha. — respondeu Ben, quando eu saí de cima dele e comecei a vestir a minha calça.
Eu estava em pânico.
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