CONTO 1 | Namjoon | Capítulo 1
Esta não é uma quarta-feira de cinzas qualquer. Este é o primeiro dia de um novo Namjoon. Uma versão nunca antes vista e estranha até mesmo para ele. Um Namjoon apaixonado. Só que esse upgrade no sistema ainda não foi reiniciado porque, bem, depois de toda a farra dos últimos dias de puro carnaval, o homem ainda está meio lento. E, quando é assim, só tem uma coisa que resolve com ele.
O sininho da porta toca, chamando a atenção de Carol para o novo cliente entrando na cafeteria. Entrando, não, se arrastando. Parecendo que tinha sido pisoteado no caminho até ali, Namjoon grunhe um pedido ininteligível. Para a sorte dele, Carol está mais do que acostumada em preparar o seu queijo quente com as pontas tostadas, acompanhado de suco de laranja e uma xícara grande de café preto, sem açúcar.
Como sempre, mesmo com várias mesas disponíveis, ele se senta ao balcão. Também como de costume, Carol lhe entrega o pedido com um sorriso enorme, mas que desta vez passa despercebido pelo zumbi à sua frente.
Não que ele fosse mal-educado ou não fosse com a cara da barista, muito pelo contrário. Adorava tomar o café da manhã ali porque, justamente, para além da injeção de ânimo diária em forma de cafeína, conversar amenidades com Carol o alegrava antes do trabalho puxado como jornalista. A cafeteria ficava no térreo do prédio em frente ao escritório da revista onde ele trabalhava, facilitando ainda mais as suas frequentes visitas ao balcão que muitas vezes servia de consultório de terapia, ou muitas vezes como hoje, confessionário particular.
Só quando Namjoon chega na metade da xícara que sua alma parece aterrissar no corpo meio morto. Solta um suspiro satisfeito, sentindo-se revitalizado. Um largo sorriso ganha espaço no rosto do rapaz, exibindo duas covinhas profundas.
— Vai, me conta, o que aconteceu? — Carol pergunta com um ar matreiro.
A porta abre e o sininho toca. A pergunta dela teria que esperar, mas até que não era mal, pois assim Namjoon podia organizar melhor as ideias. Ele tinha um imbróglio para resolver e precisava pôr em ação a sua melhor arma, a perspicácia da amiga.
A barista termina de atender um casal de idosos e volta ao seu posto de confidente curiosa, esperando pela resposta com os cotovelos apoiados no balcão. Namjoon não consegue evitar de sorrir.
— Tô apaixonado. — revela, todo bobo.
— É mesmo? — ela responde com um ar contente.
— Só tenho que descobrir por quem.
— Como assim?
A mudança de semblante de Carol o intimida. Não sabe bem se pelos braços cruzados ou se pelo cenho franzido. Meio envergonhado ele explica como ficou com diferentes mulheres durante os dias de folia e, como tudo aconteceu rápido, regado a muito álcool, não tinha decorado bem os nomes delas. Agora não sabia quem era quem nos novos contatos no celular.
— Nem da que você se apaixonou? E as fotos do zap? — Carol pergunta, consternada.
— Eu tava muito mal e não lembro direito o que aconteceu. — ele diz cabisbaixo.
— E como você sabe que tá apaixonado, então? — ela ergue uma sobrancelha.
Ele já esperava por aquela pergunta. Na verdade, não sabia explicar como, mas tinha certeza que havia conhecido a mulher da sua vida. Podia não ter decorado o nome, mas talvez tenha sido porque estava mais focado em memorizar cada detalhe do corpo amendoado. A pele macia, o pescoço delgado com uma pinta grossa na ponta da clavícula. Os cabelos castanhos com as pontas louras, cheirando a camomila. Passou tanto tempo admirando a tatuagem por baixo da costela direita que poderia até desenhá-la.
Ou melhor, iria desenhá-la. E era agora.
— Eu só sei. — suspira, se esticando para apanhar a caneta para anotar pedidos presa à gola da camisa de Carol. — Parecia até que a gente já se conhecia, sabe? Foi tão fácil falar com ela, como se...Como se fosse alguém como você!
Ela ergue as sobrancelhas, desconfiada. Estava na cara como ela não estava acreditando na genuinidade daqueles sentimentos. E não era para menos, não tinham sido nem uma, nem duas as vezes que ele havia chegado ali contando sobre suas conquistas. Mas a curiosidade é um bichinho inquieto e acaba falando mais alto, a fazendo baixar a guarda.
— Tá bem, primeiro me explica essa história de "descobrir por quem".
— Então, quando o esquema é divertido, eu costumo guardar o número, sabe? Mesmo que não role mais nada. Acabei guardando cinco...
— Cinco! — Carol derrama um pouco de café da xícara que estava servindo.
— Sim. — ele diz com um suspiro, a ajudando a limpar com guardanapos. — Eu tenho cinco novos contatos no celular, mas não sei mais quem é quem. O porre de ontem foi dos grandes e bagunçou tudo.
— Mas você ficou com todas ontem? — ela mantém as sobrancelhas erguidas.
— Nããão, calma. Não foi bem assim.
— Me conta os detalhes, então. — ela suspira, desistindo de tentar achar sentido na conversa dele.
Inflando o peito, com o orgulho renovado, Namjoon se prepara para contar sobre as aventuras do fim de semana prolongado. Estava sempre tão à vontade em conversar com ela, que nem se preocupava em fingir pudor. Afinal, Carol era sua brother e, estava aberto a ouvir sobre qualquer assunto que ela também trouxesse para a mesa, ou melhor, para o balcão.
— Você lembra que eu tava de plantão sexta e sábado, né? — começa a falar e a rabiscar em um guardanapo ao mesmo tempo.
— Hum-rum. — ela responde enquanto se afasta para lavar a louça.
— Pois bem, fiquei de boa, só tomei uma cervejinha no final do turno, nada demais. Só que, sabe como é, nesses dias você não vai atrás da festa, ela vem atrás de você, né?
Na sexta, ele atravessou um bloquinho de axé para chegar em casa. Não tinha muito o que fazer, ou atravessava, ou esperava mais de uma hora para o caminho estar livre. E ninguém merece esperar mais de uma hora só para atravessar a rua, né?
Depois de muito empurra-empurra, algum saculejo ao ritmo da música e umas quantas apalpadas levadas por diferentes mãos, ele chegou à porta do prédio, sendo surpreendido por uma ruiva, vestida com girassóis da cabeça aos pés, colados em um collant e meias-calças coloridas. Aparentemente, ela tinha gostado do que tinha apalpado e, bem, ele já estava praticamente em casa e gostava do que via.
A folia nem chegou no quarto, foi ali mesmo no hall de entrada do apartamento e ela se foi, logo após gravar seu número no celular dele. A peruca ruiva ficou de brinde e ele não fazia ideia do que havia por baixo.
No dia seguinte, a expectativa dele para os dias de folga estava lá em cima. Só queria que o sábado passasse logo para poder se juntar aos amigos e, quem sabe descobrir como era o cabelo natural da ruiva, ou outras possibilidades. Afinal, era carnaval e ele estava no modus operandi* "ninguém é de ninguém".
Como estava agendado, foi cobrir os acontecimentos do bloco temático da Tropicália. O bom de ser jornalista, em ocasiões como essas, era ter acesso a lugares que não teria de outra forma. Assim, pôde subir no trio elétrico e meio trabalhar, meio curtir. Acabou o turno na casa de uma das dançarinas e, conseguiu cumprir o prazo da matéria, logo após entregar tudo o que restava de si em um banho demorado na companhia dela. Voltou para casa cheirando a shampoo e creme dove.
— Você tá bem ligado nos cheiros hoje, hein? — Carol comenta, enquanto passa pano nas mesas.
— Eu dou mó valor em um cangote cheiroso. — comentou com uma risadinha.
— Mas até agora, parece que a sua memória tá bem boazinha.
— É a partir de domingo que o caldo entorna.
Torcendo os lábios, Namjoon admira o desenho terminado. Umas linhas meio tortas formando uma cruz ao contrário, uns círculos por trás, como se fossem uma luminária, uns pontinhos meio indecifráveis pelo meio. Não era digno da beleza do original, mas era acurado o suficiente para identificar as formas. Por cima do seu ombro, Carol se aproxima e observa a imagem.
— Hum... Eu conheço esse quadro. — ela comenta, apertando os olhos.
Um largo sorriso ilumina o rosto do rapaz. Ele sempre soube que podia contar com ela.
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Glossário:
Modus operandi -- uma expressão em latim que significa "modo de operação". Utilizada para designar uma maneira de agir, operar ou executar uma atividade seguindo geralmente os mesmos procedimentos. Tratando esses procedimentos como se fossem códigos. (Wikipedia)
Crédito:
O quadro que aparece no início do capítulo é o "Jar and Plum Blossom," 1957, do artista coreano Kim Whanki. É um dos quadros já referenciados por Namjoon e que inspira a tatuagem da nossa musa misteriosa.
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Oi gente!!
Esse Namjoon aprontou no Carnaval, viu? E a gente ainda nem sabe da missa a metade. Coitada da Carol... Só ela pra aturar!
Mas e aí? Algum palpite do que aconteceu?
Se está gostando, não se esqueça de deixar a sua estrelinha e comentar! Eu vou adorar saber sua opinião, palpites e etc.
Beijo grande e até o próximo capítulo.
Ana Laura Cruz
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