02. pé na estrada
O ar-condicionado da SUV do Sr. Henderson era o único som audível dentro do carro. A brisa silenciosa e fria era relaxante, mas Alia apenas respirou, verdadeiramente aliviada, quando o Sr. Henderson desceu a rua e fez a curva, se distanciando da casa dos pais dela.
O dia estava quente para as 10 horas da manhã. Crianças corriam pelo parque, brincando debaixo das árvores com as mães e as babás, passarinhos cantavam em fontes e músicos de rua tocavam sua melodia alegre pelas esquinas. O dia estava lindo, mas Alia Nazario estava prestes a atear fogo a si mesma.
Alia não conseguia olhar para o rosto dele. Não com aquela marca de batom vermelho ali, a encarando como se fossem cúmplices de um crime. Ela ignorou a bochecha direita do Sr. H., tentando pensar em outra coisa, mas sua mente maligna puxava seus olhos para a maldita marca de batom como um ímã. Tão logo o carro parou no semáforo vermelho, Alia engoliu em seco.
— Sinto muito pela minha mãe — disse ela. A marca de batom ainda brilhava no rosto bem barbeado do Sr. Henderson como um troféu de guerra. Ele lançou uma olhadela confusa a Alia antes de voltar a atenção à rua. — Digo, todos os abraços, beijos e... e perguntas sobre nossos... nossos futuros bebês.
— Sua mãe é uma mulher muito carismática, Alia. E seu pai...
— Sinto muito por ele, também — disse ela, antes que ele continuasse. — Ele é muito... sinto muito.
— Não sinta. Seus pais são incríveis. — Ele sorriu antes de franzir o cenho por um momento. — Apesar de eu ter achado que seu pai estava prestes a me matar quando você me apresentou...
— Ele é um pouco... superprotetor às vezes. Sinto muito. Se não fosse pelo problema de encanamento no meu apartamento não precisaríamos ter de, o senhor sabe, mentir ou... ou falar sobre bebês e casamento. Eu realmente sinto muito, Sr. Henderson.
O encanamento do banheiro dela decidiu dar problema justo na noite anterior, quando tudo o que Alia queria era tomar um banho quente após o longo dia de trabalho e propostas esquisitas. Quando nada além de água fria e escura saiu de seu chuveiro, Alia ligou para os pais — quase chorando — e perguntou se não poderia passar a noite com eles. Como sempre, eles a receberam de braços abertos e com um prato repleto de quipes dominicanos deliciosos.
E quando o Sr. Henderson apareceu na manhã seguinte para buscar Alia, a mãe dela ficou tão feliz em conhecer o novo namorado da filha que o forçou a entrar, tomar uma xícara de café e a responder perguntas insistentes sobre a família dele. O pai, por outro lado, encarava o novo genro com braços cruzados e uma carranca duvidosa. Apesar de o Sr. Henderson ter segurado sua mão o tempo todo, sorrindo e sendo encantador diante de perguntas tão íntimas e constrangedoras, Alia só quis cavar uma cova e morrer.
Principalmente quando a mãe não parou de falar em como Alia nunca havia apresentado um namorado à família antes. Ou como o Sr. Henderson ficaria lindo num smoking, esperando por Alia na outra ponta do altar.
— Tudo bem, Alia. — Ele riu, girando o volante. Com um olhar divertido, o Sr. Henderson deu de ombros. — Estamos namorando há um dia e já conheci seus pais para falar de bebês e casamento. Será que estamos indo rápido demais?
Ela escondeu o rosto nas mãos, mortificada demais para formular qualquer frase. O Sr. Henderson riu, fazendo Alia se sentir pior. Quando pensou que, um dia, seria a piada do próprio chefe? Vivendo e aprendendo.
— Realmente não sei o que dizer. Só que estou muito, muito, muito sem graça.
— Seu pai quase quebrou minha mão quando me cumprimentou, mas me parece um bom homem — disse ele, sorrindo. Os olhos castanhos do Sr. Henderson a miraram de relance. — Ah, e devo dizer que você está...
— Espere. Só me deixe...
Incapaz de se conter por mais um segundo, Alia ergueu a mão e limpou a marca de batom na bochecha dele com o polegar, deixando escapar um grunhido irritado. O Sr. Henderson permaneceu atento ao trânsito, as costas eretas e os olhos fixos na rua. Ele cheirava a chá de menta, creme de barbear e algo mais amadeirado, que ela reconheceu como a última fragrância da Hugo Boss.
O que, convenhamos, não era de todo ruim.
— Minha mãe ama deixar marca de batom nas pessoas. Isso é tão irritante — reclamou ela, ainda esfregando a bochecha dele. — Ela costumava fazer isso quando eu estava na faculdade, e uma vez...
Alia se calou quando percebeu um sorriso se desenhar nos lábios do Sr. Henderson. Meu Deus, cale essa boca. Sem graça, ela sorriu e se virou para a janela escura do carro. Tinha acabado de esfregar a bochecha do próprio chefe para tirar uma marca de batom. Muito profissional da sua parte, Alia.
Eles permaneceram em silêncio, ouvindo o ruído do ar-condicionado perturbar a paz gelada do interior do carro. O Sr. Henderson inclinou a cabeça — exatamente como um desses lordes ingleses teria feito — e disse:
— Como eu dizia, Alia, você está... diferente.
— Diferente como?
— Suas roupas. — Ele olhou de relance para os shorts jeans e a blusa folgada que Alia usava, uma bata hippie estampada, com um sorriso nos lábios. — Estou acostumado a vê-la usando camisa branca, saia e saltos, Srta. Nazario.
— Bem, o senhor me disse para vestir algo confortável — disse ela, sentindo-se melhor com a mudança de assunto. — E olhe quem está falando. O senhor está usando bermuda e All Star, Sr. Henderson.
— Estou tentando parecer... relaxado e aventureiro. — Ele deu de ombros, sorrindo. — E você é obrigada a concordar que terno e gravata não combinam com a praia.
— Praia? — perguntou ela, erguendo as sobrancelhas.
— Sim, o casamento será no East Hamptons. Não mencionei? Pensei ter deixado claro no contrato...
Ela assentiu, de repente atacada pela lembrança da menção de uma casa nos Hamptons nos inúmeros post-its fluorescentes tomando as páginas bem redigidas. Alia sorriu.
— É claro. Sinto muito. Ainda estou preocupada com o problema do meu apartamento.
— Entendo. Ah, e quase me esqueci — disse ele, esticando a mão direita para pegar um objeto no banco de trás. — Aqui. Acho que será... bom pensar em algo assim.
O Sr. Henderson deixou no colo de Alia um calhamaço de pelo menos 200 páginas envolvido por papel amarelado grosseiro e atado com laços na lombada. Um manuscrito de livro. Ela franziu o cenho ao ler as palavras NOSSA HISTÓRIA estampadas na capa. Devagar, Alia abriu o manuscrito, rindo e recebendo um olhar nervoso do Sr. Henderson como resposta.
— Bem, você não precisa ler agora, é cla...
Mas já era tarde demais. Enroscada no banco, Alia navegou os olhos pelas linhas. Rindo, foi incapaz de manter a passagem para si:
— "Ania era uma visão. Seu cabelo negro estava solto pela primeira vez, e sua pele escura brilhou contra o sol enquanto ela lambia aquele sorvete de framboesa. Ela lambia, lambia, e eu a imaginei completamente nua, lambendo seu sorvete e cavalgando meu..." — Alia parou, erguendo as sobrancelhas. — Essa foi meio... rápida. Quem escreveu isso?
O rosto do Sr. Henderson adquiriu um tom avermelhado intenso.
— Pedi a um amigo, um escritor, para escrever uma história de amor para nós. — Ele olhou de relance para ela, mas Alia estava lendo outra vez, absorvida pelas linhas. — Eu, hm, você não sente enjoo ao ler no carro? Porque eu...
— Espere. Eu sou Ania? — Alia riu, virando a página. — E o senhor é... Coltin. Seu amigo não é muito criativo para nomes. Espero que não tenha pago por isso. A escrita é muito amadora.
— Na verdade, o autor é Harry Ellington.
Coltin estava prestes a morder o lóbulo da orelha de Ania, mas Alia ergueu os olhos do livro. O Sr. Henderson permaneceu olhando para frente, um sorriso contido dançando em seus lábios. O breve som do silêncio preencheu o interior do carro. Alia apertou os olhos.
— Harry Ellington, o escritor best-seller?
— Isso. Por quê?
Ela não soube o que dizer. Harry Ellington estava em todos os canais de televisão, programas de rádio e tomando conta da internet por ser o autor do momento. Era impossível escapar às entrevistas onde ele comentava sobre seu ultra novo processo criativo. Harry Ellington era uma celebridade do mundo literário, e apesar de Alia odiar o trabalho dele, não se podia negar que ele parecia um cara legal com aqueles óculos quadrados e gravatas-borboleta coloridas.
Bem, e não era todo dia que um autor best-seller baseava um personagem nela.
— Ele é meio... ruim. — Alia deixou uma risada assoprada escapar, sentindo-se mal e fechando o manuscrito. O Sr. Henderson sorriu. — Não me entenda errado. Ele parece ser um cara bacana, mas a escrita dele é péssima, especialmente no último livro. Ele é meio obcecado por... por vaginas, não?
— Bem, e não somos todos? — O Sr. Henderson riu antes de perceber o que havia dito e se calar, corando como um menino. Alia riu, franzindo o cenho. Você é engraçado, quem diria? Ele descansou o cotovelo na porta e a cabeça na mão esquerda, evitando mirá-la. Ainda desconfortável, o Sr. Henderson disse: — Eu não sabia que você era... amante da literatura.
— Gosto de ler. Não os livros de Harry Ellington, mas gosto de livros no geral. — Ela deu de ombros, voltando a atenção para o manuscrito. — Mas como é nossa história?
Alia percebeu que as pontas das orelhas do Sr. Henderson ficaram rubras. Ambas as mãos dele estavam de volta ao volante, e foram necessários alguns momentos antes que o Sr. Henderson limpasse a garganta e respirasse fundo.
— Você é minha vizinha, mas nos conhecemos numa sorveteria. Você se apaixona pelo meu gato e temos muitos momentos de... de sexo extremamente gráfico em uma grande variedade de locais, incluindo um balão de ar quente. — Ele fez uma pequena pausa. — Mas você tem um namorado malvado, então quando você termina com ele as coisas se complicam, e ele acaba sendo preso por agressão. Você chora o tempo todo, e eu fico ao seu lado. No final, peço sua mão nos letreiros da Times Square e nos casamos no Central Park, no auge da primavera.
O Sr. Henderson respirou fundo ao terminar o resumo. O zumbido do ar-condicionado era o único som preenchendo o interior do carro antes de Alia explodir numa crise de riso. O Sr. Henderson olhou-a de relance, segurando o riso.
— Isso é péssimo! Ninguém irá acreditar nessa história — disse ela, balançando a cabeça. — Pelo amor de Deus. Eu sabia que Harry Ellington era uma porcaria, mas não uma porcaria tão grande assim. — Alia se calou quando se lembrou com quem estava falando. — Ah, sinto muito. Ele é seu... amigo.
— Não se preocupe. Ele é muito... como você disse? Porcaria? — perguntou o Sr. Henderson num tom divertido. Sem graça, ela sorriu. Ele franziu o cenho. — Mas por que você acha que ninguém vai acreditar? Só porque transamos num balão de ar quente...
— Não é só isso. Odeio sorvete, prefiro cães, sou alérgica a pólen e morro de medo de altura — disse ela, rindo. — Eu provavelmente passaria a transa no balão e o casamento no Central Park porque estaria no hospital com um ataque de nervos ou uma alergia. Ou os dois ao mesmo tempo.
O Sr. Henderson permaneceu num silêncio perplexo por três segundos.
— Como você pode odiar sorvete e gatos? O que é você, Srta. Nazario? — perguntou ele, olhando para ela com o mais puro assombro. — Um robô?
Ela ficou em silêncio por exatos três segundos. O homem que redigia um contrato para pedir a sua secretária que fingisse ser sua namorada a acusava de ser um robô. Ah, a ironia. Alia franziu o cenho antes dizer:
— Todos sabem que sorvete nada mais é do que gordura congelada com sabor e que cães são mais amáveis e receptivos do que gatos. É pura ciência.
— Ciência? — repetiu ele, confuso. — Como pude escolher você para ser minha secretária? Vou pedir ao RH que adicione questões assim nas entrevistas. Odiar gatos e sorvete. Isso é inaceitável.
Ela riu, reabrindo o manuscrito. Os olhos de Alia vagaram pelos parágrafos sem prestar atenção em nada até o Sr. Henderson pigarrear. O semblante dele era ansioso.
— O que você sugere, Alia? Para nossa história. Vamos precisar inventar algo.
— Talvez algo menos hollywoodiano? Estávamos num bar, o senhor me pagou uma bebida, conversamos e depois... começamos a namorar? Sem sexo em balões ou casamentos na primavera.
Ele fez uma careta. Entravam no Queens Midtown Tunnel quando o Sr. Henderson disse:
— Talvez não. Jane sabe que odeio bares e que eu nunca pagaria bebidas a uma mulher.
— Por que não? — perguntou ela, franzindo o cenho.
O Sr. Henderson pareceu confuso pela pergunta. Sua expressão gritava que a resposta era óbvia, mas Alia esperou.
— Porque é terrivelmente inapropriado — disse ele. — Se a mulher em questão não estiver interessada, corro o risco de parecer um tarado insistente.
— Para alguém que propôs na Times Square, eu diria que o senhor é um pouco tímido, Sr. Henderson.
Ele riu.
— Eu nunca faria tal coisa, e é exatamente por isso que Harry escreveu. Confessar meu amor na frente de desconhecidos seria um pesadelo. Além de beirar o ridículo.
— Só porque o senhor não é romântico...
— Eu sou romântico, Alia. Apenas detesto aquelas declarações idiotas em filmes, status de Facebook e fotografias de Instagram. — Ele fez uma pausa irritada, buzinando para um sedã azul que não sinalizou a troca de pista. — Transformaram tudo num espetáculo. O que aconteceu com enviar um cartão, flores e uma caixa de chocolates? As pessoas hoje em dia têm as piores ideias sobre o amor.
Alia permaneceu em silêncio, mas algo sorriu dentro de si. Ela entendia o Sr. Henderson. Nas redes sociais todos eram felizes e apaixonados. Como o chefe, ela acreditava que a necessidade de escancarar o amor e de compartilhar tudo acabava com a intimidade, mas quem era Alia para dizer o que era certo ou errado? Irritado, o Sr. Henderson resmungou para o sedã, e ela decidiu voltar ao assunto.
— E que tal um restaurante japonês? Nos esbarramos, você manchou minha blusa com saquê e se ofereceu para pagar minha conta da lavanderia e um jantar.
— Isso se parece com algo que eu faria. — Ele sorriu, abaixando o volume do rádio. — Mas você tem certeza de que quer cortar o sexo no balão de ar quente? É tão... relaxado e aventureiro.
— Por que o senhor é tão obcecado por ser aventureiro? — Alia riu, ajustando o cinto de segurança.
Ele pensou por um momento.
— Quando Jane terminou comigo, ela disse que eu era pedante e metódico, e que toda mulher quer um homem aventureiro, divertido e relaxado. Bem, e que essa também tinha sido a razão pela qual ela havia me traído com Edward Macklin. Porque ele se parecia com um homem, e não com... Um robô sem sentimentos guiado por rotinas inflexíveis criadas pela própria mente.
Puta merda. O Sr. Henderson permaneceu olhando para frente, uma expressão pensativa em seu rosto bem barbeado. No banco do carona, Alia não soube o que dizer porque A) ele era o chefe dela e B) ela não queria se meter nos relacionamentos do Sr. Henderson, tampouco soar fria e desinteressada. Alia baixou os olhos, admirando os carpetes bem aspirados do carro e disse a única coisa que surgiu em seu cabeça.
— Sinto muito.
— Não sinta. — Ele olhou para ela de relance com um sorriso agradecido, porém melancólico. — O problema, veja você, é que eu amei Jane. Que ainda a amo apesar de tudo. Uma palavra de Jane, Alia, e eu desistiria de tudo para ser o homem dos sonhos dela. Sinto muito se estou...
Ele corou, sua voz sendo engolida pelo ronco baixo do ar-condicionado e dos acordes rápidos da música folk que tocava no rádio. Ela sorriu, mirando o adesivo do Mickey Mouse colado na traseira de uma picape enlameada.
— Tudo bem. Pelo menos o senhor tem uma namorada agora. Uma namorada falsa, mas ainda assim uma namorada.
— Acredito que nunca poderei agradecê-la o suficiente — disse ele.
Sou eu quem deveria estar agradecendo, ela pensou, mas se reservou o direito de não dizer. O Sr. Henderson havia dado a ela a oportunidade de conhecer Sagger, seu ídolo, algo que ela nunca, nem em sonhos remotos, considerara possível. Pelo menos não nessa vida. Alia estava salvando a reputação do Sr. Henderson, mas ele estava, sem saber, salvando o sonho da vida dela do esquecimento.
Conversavam sobre pessoas interessantes que atenderiam ao casamento de Jane — modelos, estilistas, artistas e cantores — quando o Sr. Henderson sorriu e olhou para ela. Alia percebeu uma faísca travessa em seus olhos castanhos de Golden Retriever.
— Acho que você vai conhecer Sagger antes de o feriado acabar. Ele estará no casamento, na verdade.
— Sem chance! — disse ela, quase imediatamente. O Sr. Henderson riu, e Alia não se importou por seu vocabulário ser o mesmo de uma adolescente perto do chefe. Ela estava ocupada demais tentando se lembrar do último trabalho de Sagger com Jane.
— É claro. Ela estava na passarela dele no último verão! E antes disso... antes disso Jane promoveu a coleção dele inspirada em temas brasileiros. Jesus, aquele vestido que a Gisele usou era incrível!
— Gisele? — perguntou o Sr. Henderson, franzindo o cenho e desligando o rádio.
— É. Gisele Bündchen — explicou ela, excitada demais com a notícia para entrar em detalhes. Alia ia conhecer o ídolo, seu herói do mundo da moda. Meu Deus, não consigo sentir minhas mãos. — O senhor tem certeza de que ele vai?
— Ele me ligou ontem à noite para reclamar de Festas de casamento idiotas em praias idiotas, então sim, acho que ele estará lá. — O Sr. Henderson riu. Após um breve silêncio, ele perguntou com um olhar furtivo: — O que há entre você e Sagger?
— Ele é meu ídolo. Ele e...
— Zelda? — perguntou o Sr. Henderson, sorrindo.
Alia ergueu as sobrancelhas, surpresa por ele saber.
Zelda Miller era a esposa de Sagger e uma das maiores estilistas do milênio de acordo com a Vogue e todos os nomes importantes do mundo da moda. Junto ao marido, Zelda era conhecida por ser o gênio criativo do estúdio, apesar de o trabalho pessoal dela ser focado em vestidos de noiva, véus e fragrâncias únicas.
O Sr. Henderson riu de volta quando Alia o pressionou com um olhar pela explicação.
— Nos conhecemos na faculdade. Sagger era meu colega de quarto, cursando Economia Política, mas sempre teve um olho para moda. Quando ele começou a sair com Zelda, os dois largaram a faculdade e criaram o estúdio. São pessoas incríveis. Somos amigos há anos, na verdade.
Alia assentiu, incapaz de formular um pensamento concreto. Claro que eles são pessoas incríveis. Eles são William Sagger e Zelda Miller, ela disse para si, animada por vê-los ao vivo, em carne e osso. O Sr. Henderson mirou-a outra vez.
— Além do mais, contei a verdade a eles. Sobre nós. Espero que não se incomode.
Alia sorriu e assentiu porque ela contou tudo a Natalie, a segunda secretária do Sr. Henderson e sua melhor amiga, tão logo voltaram da cafeteria. Alia se lembrava do silêncio chocado e dos olhos arregalados da amiga, que soltou uma gargalhada gostosa antes de dar de ombros e dizer que Pelo menos é uma história de amor melhor do que a do Crepúsculo, querida.
— Hm, posso fazer uma pergunta, Sr. Henderson?
— Claro, Alia.
— Por que fazer isso? — Ela fez uma pausa, escolhendo as palavras cuidadosamente. — O senhor acredita que... que exista alguma chance de Jane desistir do casamento?
— Sinceramente? Não — confessou ele, caindo em silêncio reflexivo. O Sr. Henderson suspirou, e Alia percebeu que as orelhas dele queimavam. — Você vai me achar... imaturo.
— Tente.
Ele pigarreou e ergueu as sobrancelhas, como se reunisse coragem para dizer palavras difíceis.
— Quero que Jane veja que estou bem, que minha vida pode seguir sem ela e que... que sei ser engraçado e excitante. Que posso conseguir outra namorada.
E lá estava ele. Um dos cérebros da maior indústria de comunicações sem-fio dos Estados Unidos, o três vezes vencedor do Prêmio Ernst & Young de Empresário do Ano, o chefe dela, mentindo para a própria ex porque queria parecer... legal.
Alia assentiu e se virou rápido demais para espiar pela janela. O Sr. Henderson percebeu o gesto e, com o canto dos olhos, ela viu o cenho dele se franzir. Não olhe para ele.
— Você não me acha engraçado e excitante.
Não era uma pergunta. Alia não desviou o olhar da janela, sabendo que explodiria em gargalhadas se o encarasse. Se limitando a dar de ombros e a observar o lado de fora, Alia disse:
— O senhor é meu chefe.
— Posso ser engraçado e excitante, se eu quiser.
— Se o senhor está dizendo...
— É sério.
— Tudo bem.
— Você está sendo sarcástica, Srta. Nazario?
— Sinto muito. — Ela riu. O Sr. Henderson tinha as costas coladas ao banco, dirigindo e lançando pequenos olhares na direção dela. Alia deu de ombros novamente. — O senhor é meu chefe, e eu sei de todos os passos do seu dia. E o seu dia não é exatamente... engraçado e excitante.
Na maior parte do tempo, quando não estava trancafiado no escritório assinando papéis e verificando as tabelas de produção e recursos que Alia lhe passava, o Sr. Henderson se encontrava com investidores e empresas clientes, além de participar das longas reuniões do conselho administrativo. Os dias dele eram planejados e seguidos à risca, com poucas alterações no cronograma.
Todos aqueles livros eróticos onde os CEOs passavam a maior parte do tempo transando, sendo idiotas e deixando os outros cuidarem dos negócios não poderiam se parecer menos com a realidade do pobre e atarefado Sr. Henderson. Não se conseguia prêmios e reputação no mercado viajando para resorts de cinco estrelas e transando com dezenas de mulheres.
O Sr. Henderson sorriu.
— Ora, que absurdo — exclamou ele, fingindo estar ofendido. — Desde quando reuniões intermináveis com investidores não são engraçadas e excitantes? — Alia riu, e o carro caiu no silêncio novamente. Com um olhar de relance, ele perguntou: — Mas e você? O que você faz para... para se divertir?
Alia pensou por um momento. Se não estivesse no trabalho, programando as reuniões do Sr. Henderson e atendendo a ligações, ela provavelmente estaria enroscada no próprio sofá, assistindo America's Next Top Model com Natalie, bebendo vinho tinto barato e trabalhando em seus croquis. Ou lendo livros e saindo com os pais. Isso não soaria nada divertido, mas era a realidade. E era... meio esquisito ter aquele tipo de conversa com o próprio chefe.
— Bem, faço o que todo mundo faz. Fico em casa, assisto TV, visito meus pais, leio. Não sou divertida.
— Nada de balada? — Sem graça, ele adicionou: — Vez ou outra posso ter... escutado a Srta. Jensen a convidando para... sair.
Natalie vivia chamando Alia para as melhores festas da cidade, e ela geralmente dizia que compareceria para que a amiga se calasse e voltasse ao trabalho. Alia amava Natalie de todo o coração, mas a energia da amiga para passar a noite em bares e boates era demais para ela.
— Estou ficando velha, Sr. Henderson — disse ela. — Baladas são o mesmo que uma amostra do inferno na minha idade.
— Eu não poderia concordar mais. — Ele riu. Breves momentos de silêncio se seguiram antes de o Sr. Henderson perguntar: — Nada de... namorado?
Alia sorriu, virando o rosto quando as orelhas e bochechas do Sr. Henderson adquiriram a coloração de um pimentão maduro.
— Não. Quer dizer, eu tinha um, mas terminamos.
— Ah, sinto muito.
— O senhor teria gostado dele. Bernard era engraçado e meio... aventureiro. Era biólogo do Greenpeace, na verdade.
Ela conheceu Bernard Welsh num bar, e seu coração bateu por ele durante o breve período de seis meses. Bernard era lindo, alto, loiro e alegre, porém incapaz de conduzir uma conversa sem mencionar moluscos, baleias ou os Altos índices de poluição marinha dos Estados Unidos, meu amor.
— Que interessante. Não se vê isso todo dia — comentou o Sr. Henderson.
— Pois é. Bernard costumava sair em expedições para salvar baleias e pinguins. Ele era um cara legal, mas...
— Mas...
— Ele estava sempre longe, sempre no mar. Não foi surpresa nenhuma quando nosso relacionamento afundou.
Ele ficou em silêncio, e ela se sentiu idiota.
— Esse foi um ótimo trocadilho, na verdade — admitiu o Sr. Henderson. Os dois riram. Outro silêncio, desta vez mais leve, cresceu. O Sr. Henderson pigarreou. — Ainda precisamos polir nossa história de amor. Se importa de começarmos agora?
Ela sorriu. Quanto antes começassem, melhor.
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