Capítulo 2

“Sonhe como se fosse viver para sempre. Viva como se fosse morrer amanhã.”

— James Dean

Chaplin uma vez disse que a beleza é a única coisa preciosa na vida. Pena que hoje não consigo ver essa beleza na minha vida. Há anos ela foi tirada de mim. Hoje vivo um dilema constante que impedem que os dias ensolarados se façam presentes novamente.


Há dois anos e meio venho lutando contra a escuridão. Tem sido difícil, mas estou aqui. Ainda que desanimada, sem expectativas, sem sonhos. Essa é a realidade de quem está a anos na fila de transplante renal.

Às vésperas da minha tão sonhada mudança, na qual eu iria morar com minha única melhor amiga, passei muito mal com o resultado, mas confiante que daria tudo certo. Afinal, sempre me considerei uma mulher abençoada. Eu tinha fé.

Mas, quem dera aquele exame tivesse sido minha única preocupação. Os problemas só começaram a surgir uma semana depois. Para quem não está entendendo, vou explicar.

Há mais de dois anos, fui diagnosticada com doença renal crônica ou, como os médicos me, disseram: eu estava com a
TFG normal ou próxima do normal, mas com evidência de dano renal; ou era alteração no exame de imagem. Assim, poderia ter sido um erro e mandaram eu repetir com uma semana todos os exames novamente.

Porém, para minha total falta de sorte, foi confirmado doença crônica. Para melhor estruturação do tratamento dos pacientes com doenças renais crônicas é necessário que, após o diagnóstico, todos os pacientes sejam classificados da seguinte maneira: dos estágios 1, 2 e 3 estão na pré-dialise, e os dos estágios 4 e 5 que podem ser chamados de não diálitico ou dialítico.

Eu estava no estágio 3 e fui submetida a fazer diálise peritoneal; feita diariamente em casa por quase três meses. Ela não era tão desconfortável pois é procedida por meio da inserção de um cateter flexível no abdome e era sempre no horário da noite.

Sendo assim, fiquei aos cuidados do meu pai que até pediu licença médica para cuidar de mim. Fiquei muito mal por está naquela situação; não só por isso, mas mais pelo meu pai. Durante sua vida inteira ele se dedicou aos seus pacientes e sua clínica, mas agora estava afastado por minha causa.

Com tempo eu começei a me animar, afinal, já não me incomodava tanto o cateter. Já conseguia, inclusive, dormir tranquilamente.

Porém, como nada dura para sempre, fui acometida por uma febre muito alta e para completar, meu pai tinha ido para uma conferência em São Paulo e só voltava no outro dia. Como não queria preocupar ainda mais a minha mãe, não disse nada.

Subi para meu quarto e fui direto para o banheiro, a fim de lavar o rosto, quando senti um tontura muito forte. Tentei me segurar na pia mas uma ânsia subiu e comecei a vomitar. Não tinha forças nem para gritar. Foi quando minha mãe foi ver como eu estava e me encontrou desmaiada. Ela me acordou mas logo uma nova ânsia começou novamente, juntamente com uma dor abdominal muito forte.

Resultado? Desmaiei outra vez e minha mãe quase foi junto; só não foi pior porque logo minha mãe ligou para meu tio Gustavo que chegou rápido, ajudando ela a me socorrer. Fui levada de maca para o hospital.

Depois de horas meu pai chegou e foi logo se inteirar do que tinha acontecido. Vindo depois falar comigo.

— Filha? Como você está se sentindo? — Meu pai perguntava passando a mão no meu cabelo.

Seu semblante abatido e as olheiras denunciavam sua preocupação e falta de sono. Me doía vê-lo naquele estado.

— Só um pouco tonta pai. E o senhor? Parece preocupado? Está tudo bem? — perguntei.

— Infelizmente não, filha! — Foi aonde eu estava, pegou uma cadeira e sentou ao meu lado, segurando minha mão.

Sabe aquele momento que alguém pega na sua mão para transmitir força? Foi isso. Meu coração parecia que ia sair a qualquer momento da minha caixa torácica.

— Fala logo, papai! Está me deixando agoniada. — Minha mãe que assistia de longe se aproximou e beijou minha cabeça, ficando atrás de mim.

— Filha, você passou mal porque está com peritonite e por causa disso você terá que encerrar a diálise. — Eu sentia a angústia dele ao falar comigo.

— Mas o que diabos é isso? — falei exaltada.

— É uma infecção causada pela presença de bactérias, por isso o líquido estava turvo. — Eu tinha reparado naquilo há alguns dias, mas achei que fosse normal. Agora sei que não era, e que tinha um grave motivo para tal.

— Isso significa que vou tomar medição oral ou injetável? Né? — perguntei preocupada. Desde que descobri essa doença renal, só algo era capaz de me deixar preocupada: não ter tratamento.

— Não minha filha. Você não irá fazer uso de medicação porque seu quadro se avançou. — Minha mãe falava com a voz embargada.

— Como assim? — Fiz que ia levantar porém meu pai me deteve.

— Filha, fica calma. Você pode passar mal novamente. — Papai falava.

— Só quero que vocês me digam o que está acontecendo! — exclamei, já sentindo as lágrimas marejarem meus olhos.

— Você não fará, porque precisará de um transplante. — E foi aí que meu coração errou a batida e eu já não ouvia mais a voz dos meus pais. Nem respirava. Tudo parou.

Fui levada de volta para alguns meses atrás quando meu caminho cruzou com de Víctor, um menino que conheci assim que descobri essa doença. Ele tinha 17 anos. Tão alegre e brincalhão! Graças a ele os dias que passei internada foram mais tranquilos.

Porém, quando ele me falou que estava há mais de 2 anos esperando por um doador, me senti muito mal por ele na época. Infelizmente ele não conseguiu mais esperar e acabou falecendo. Agora, imaginar que toda a MINHA vida podia se perder, assim como a de Víctor se perdeu, fez uma dor latente se formar dentro de mim.

— Filha, você é forte. Conseguirá! — Minha mãe tentava me consolar.

Eu estava arrasada. Com uma dor tão profunda que era capaz de me rasgar de dentro para fora.

Eu chorava por minha vida. Pela de Víctor.

— Oh! Querida, se eu podesse trocar de vida com você...! — Mamãe chorava abraçada à mim.

Papai socava a parede. Não queria demonstrar, mas ele também sofria.

— Vai dar tudo certo, filha. Ligarei para todos os hospitais. Qualquer coisa iremos para o exterior. Não se preocupe, amanhã você iniciará com a hemodiálise; até que ache um doador.

— Terei que fazer hemodiálise? — pergunto, com esperança de que não fosse obrigada.

— Sim, filha, infelizmente faz parte. Seus rins não são mais capazes de funcionarem sozinhos. Mas aqui você terá um ótimo atendimento. — Mamãe falava me acalentando.

— Oh, meu Deus! Não acredito que ao invés de um escritório, passarei meus dias dentro de um hospital — falei chorando copiosamente.

Daquele dia em diante, começou então minha sina três vezes por semanas. Uma porção de medicamentos que me deixavam enjoada, tonta e sem apetite.

Guardei todos os meus livros de direito. Redecorei meu quarto, tirando tudo que me lembrava dias felizes. Hoje, com mais de dois anos, perdi a Fé.

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