26 mars 2020; jeudi

ACORDO ÀS nove e meia da manhã, o Nate não está mais na cama, provavelmente já está na faculdade. Eu ouvi o despertador, mas decidi ficar em casa com a Vieve. Preciso tomar conta dela hoje, um dia a menos na faculdade não vai me fazer falta — não essa semana, no caso.

Vou tentar fazer algumas coisas agora de manhã, coisas que eu não preciso resolver na faculdade, mas mesmo assim tenho que ir às três horas para a Editora.

Pego o meu celular e confirmo o jantar que a minha mãe quer fazer amanhã. Ela reservou um restaurante aqui perto do meu apartamento e quer saber se o Nate vai estar livre.

Cher: Vou ver com ele e te aviso ainda hoje. Te amo!

Deixo o celular em cima do aparador ao lado da cama. Levanto e faço o meu alongamento matinal, pego o meu colchonete e faço um pouco de Yoga. Fico uns bons minutos, até que já me sinto relaxada o suficiente. Abro a janela do meu quarto e uma chuva bem fininha cai, estamos no início da Primavera, então deve estar uns dez graus agora. 

Vou até o banheiro e tomo um banho bem quente, tento limpar a minha cabeça dos meus pensamentos que me deixaram acordada basicamente a noite toda. Eu dormi extremamente mal e tive uns sonhos muito estranhos, acordei suada e com a respiração pesada.

Saio do box com uma toalha enrolada no cabelo e uma no corpo, busco no guarda-roupa uma peça confortável: um moletom. Me troco e seco o cabelo com a toalha mesmo; escovo os dentes e penteio o cabelo.

Passo no quarto de visitas, abro a porta lentamente e observo Vieve dormindo como um anjo, eu dei para ela um remédio que eu uso para dormir, me ajudava também com as minhas poucas ressacas, ela vai acordar descansada e sem dor de cabeça. Infelizmente ainda vai acordar grávida.

Eu não tenho nada contra gravidez, mas essa minha aversão de agora é justamente porque a minha melhor amiga pode realmente estar gerando uma vida dentro dela, uma vida que vai nascer, crescer e depender dela. Vieve não é psicologicamente estável para criar uma criança. Como eu já citei, faltam três meses para a formatura, como ela vai arranjar um emprego estando grávida, e mesmo que ela arranje, em breve ela vai precisar da licença, a empresa não vai contratar uma mulher grávida que vai precisar sair em poucos meses para cuidar da criança. E futuramente, como ela vai fazer se o pai não assumir, se ela não tiver com quem deixar para ir trabalhar?

Eu estou pensando tanto nisso que a minha cabeça começa a doer.

Fecho a porta do quarto dela e vou para a cozinha, coloco um pouco de água para esquentar e escolho um chá de frutas vermelhas. Preparo alguns waffles que eu tenho prontos. Arrumo a mesa e começo a tomar o meu café da manhã perto das dez e vinte.

Tomo meu café enquanto assisto televisão, recebo uma mensagem do Nate.

Nate: Oi. Como vão as coisas? Se precisar fico aí com a Genevieve enquanto você vai para a Editora. Te amo.

Cher: Oi, está tudo bem por enquanto, acho que ela vai dormir a tarde inteira ainda. Agradeço se puder mesmo ficar com ela.

Nate: Claro, daqui a pouco saio da aula e vou aí.

Cher: Obrigada, amor.

Sorrio depois de digitar amor, eu não falo isso com frequência e namorar de novo me possibilita viver tudo de novo. Viver esse amor está sendo uma das coisas mais incríveis que aconteceu comigo durante a faculdade.

Saio dos meus devaneios e guardo as coisas do café, lavo a louça e busco o meu notebook no quarto. Abro o meu e-mail e têm algumas coisas da faculdade e da Editora.

De: [email protected]
Para: [email protected]
Assunto: Atualização de dados para estágio

Bonjour¹, mademoiselle² Brunet, estamos enviando este e-mail com um anexo, é uma ficha que deve ser preenchida com seus dados atualizados para darmos andamento no seu banco de horas do estágio na Assouline. Bonne journée³.

Cordialement⁴, 
Sorbonne Université 

Abro o anexo e é apenas uma ficha para preencher, deixo salvo para responder depois e vou ver o e-mail da editora.

De: [email protected]
Para: [email protected]
Assunto: Reunião

Bonjour, mademoiselle Brunet, sou a Camille, gostaria de avisar que você tem uma reunião com o senhor Styles hoje às 16:30h, não se esqueça de trazer os documentos que eu lhe pedi ontem.

Cordialement,
Camille Assouline.

Não respondo esse, apenas anoto no meu planner que eu tenho essa reunião. Definitivamente trabalhar na Assouline não tem apenas prós, mas não é como se eu pudesse mudar isso.

Finalmente, depois de preencher as coisas da faculdade e enviar e fazer mil coisas aleatórias na internet, eu crio coragem e me levanto. Vou organizar as minhas coisas e enquanto estou trocando de roupa ouço a porta abrir.

— Cher? — chamo, assim que ouço barulho.

— Oi — Nate diz, entrando no quarto.

— Oi! — Dou um selinho nele.

— Tudo bem?

— Até que sim. — Sorrio. 

— Já está saindo?

Olho no celular, são duas e meia.

— Sim, até eu chegar lá já são três horas. — Pego a minha bolsa. — Tem algumas bolachas e sucos, quando a Vieve acordar vê se ela quer comer, fala que eu chego perto das dez horas.

— Claro. Tenha um um bom dia. — Ele deposita um beijo na minha testa.

— Obrigado. A gente se vê depois.

Me despeço dele e pego tudo o que eu preciso. Saio do apartamento e desço pelas escadas, porque o elevador está em manutenção. Desço até o estacionamento e entro no meu carro, arrumo tudo e dou partida. Chego na Editora faltando dez minutos.

— Boa tarde — cumprimento a Camille.

— Boa tarde. — Ela retribui com um sorriso.

Vou em direção à minha sala e começo a fazer as minhas coisas. Não é que eu não tenha idealizado tanto trabalho, mas realmente são muitos artigos para editar, as seis horas que eu passo aqui são quase insuficientes. Eles estão buscando mais estagiários, mas preferem os de último semestre, mas a maioria já está estagiando em outro lugar, então, por enquanto, somos em três.

— Com licença, senhorita Brunet — Camille entra na minha sala.

— Pode me chamar de Cher — digo, ela assente.

— A sala de reunião já está pronta — ela avisa.

— Obrigada, eu estou indo.

Ela sai da sala, ajeito a minha roupa e pego a minha pasta, saio da minha sala com as mãos tremendo e caminho passo à passo até a sala. Toco o trinco que parece estar congelando.

Entro na sala, ele se encontra na ponta da mesa, observando alguns papéis.

— Com licença — digo, entrando e fechando a porta logo em seguida. 

Ando em direção à e me sento, ele ergue o olhar e me observa, desvio o meu olhar para a minha pasta.

— Como você está? — ele pergunta, engulo em seco.

— A nossa reunião é sobre documentos — explico, deixando o meu cabelo para trás.

— Cher...

— Por favor, não vamos fazer isso.

— O quê?

— Se não temos nada sério para conversar, eu posso me retirar. — Fico em pé, lutando contra a vontade de deixar meus olhos se encontrarem com os dele.

Ele não diz nada, apenas dá uma risada debochada e eu pego as minhas coisas, ando até a porta e toco o trinco gelado novamente.

— Você nunca me esqueceu, Cherry — ele diz, por fim, toda e qualquer parte do meu corpo treme.

— Eu não lembro de você há um bom tempo.

Respiro fundo e deixo a sala de vez. Vou para a minha sala e me seguro para que as lágrimas não tomem conta de mim. Abro o próximo artigo para editar e preciso ler dez vezes até ter certeza de que está tudo certo e seguindo as regras.

 O meu celular vibra em cima da mesa, olho de relance.

Nate: Oi, quer companhia para jantar?

Não respondo, preciso desses trinta minutos de pausa, preciso ficar sozinha. Tento manter a calma e focar em tudo o que eu tenho para fazer.

As horas passam voando depois da minha pausa de trinta minutos. Alguns artigos urgentes para amanhã surgiram e eu me dividi em cinco para terminar, com sorte, às 21:30h eu dou enter no último e-mail.

Eita, parece que a Cher ficou um pouco abalada.

¹Bonjour: Oi / Bom dia

²Mademoiselle: Senhorita

³Bonne journée: Tenha um bom dia

⁴Cordialement: Atenciosamente