Capítulo 1
Março de 2024, 51 anos depois.
Muriaé - MG
Estar atrasado é sempre uma droga, de fato. Ainda mais quando você já tem o costume de ser pontual. Tive de ir para a faculdade com a bicicleta de um amigo naquela vez, pois meu carro estava em uma revisão de rotina na concessionária.
Pedalei freneticamente rumo à BR 116, a rodovia em que se localizava a Unifaminas. Em um dos semáforos, um carro quase me atropelou. Na verdade, fui em tese atropelado, mas como mal encostei no veículo, apenas considerei um esbarrão.
– Ei! – O motorista gritou, buzinando. – Olha para frente, seu p***!
O carro ficou intacto mesmo depois que bati no capô dele. Me ajeitei na bicicleta, pedi desculpas e saí pedalando. Não tinha tempo para aquilo.
Sempre que eu ia para a faculdade, colocava alguma música no som da minha Ford para representar um pouco da minha vibe. Como não poderia escutar nada no momento, o rádio na minha cabeça começou a tocar Runaway, do Bon Jovi, no volume mais alto o possível.
Depois de todo esse caos, cheguei no meu destino inteiro e em segurança. Coloquei a bicicleta junto com as outras e pus uma tranca na roda para ninguém roubá-la.
Segurei a mochila pelas alças para ela não balançar muito nas minhas costas e corri como um doido faculdade adentro. Subi algumas escadas e fiquei com falta de ar, mas já estava quase chegando.
Bati na porta da sala de aula e abri uma frestinha.
– Olá, Micael – O professor Anderson disse, surpreso.
– Me perdoe pelo atraso, senhor – Falei, ainda esperando na porta.
Ele sorriu.
– Pode entrar. O que aconteceu? Até me assustou, já que você nunca falta.
– Só fiz alguns cálculos errados – Expliquei, me sentando na segunda fila de carteiras. – Tive de vir de bicicleta dessa vez.
Anderson assentiu, ajeitou os óculos e se virou para escrever algo no quadro branco.
– Hoje iremos revisar alguns tópicos sobre projeto e análise de máquinas. Como estão chegando as primeiras provas do ano, é o melhor a se fazer no momento... não é, Gilles?
Meu amigo tirou os olhos do celular e deu de ombros, constrangido. Senti um pouco de sua vergonha só por olhar o jeito que ele colocou o telefone na pasta de couro.
– Okey, quinta classe – Meu professor debochou. – Engenharia mecânica não para qualquer um, sabemos disso. Temos de ser o mais qualificados. Vidas podem estar nas nossas mãos em um futuro próximo, e não podemos vacilar quanto a isso. Tal aviso serve para todos vocês, sem exceção.
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No final da aula, arrumei minha mochila para ir embora. Gilles se aproximou da minha mesa.
– Estava conversando com a namoradinha, Gi? – Falei, antes dele poder pensar em dizer “oi”.
Meu amigo fez uma careta engraçada.
– E se eu estivesse?
Coloquei a mochila nas costas.
– Aí é problema seu com o professor.
Ele riu.
– Você não presta, Micael.
– Só descobriu isso agora?
Gilles revirou os olhos enquanto tentava dar uma arrumada no cabelo. Ele era moreno, da pele bem bronzeada e olhos castanhos escuros. Em questão de “boniteza”, eu com certeza perderia por dez a zero para meu colega se for o caso de alguém nos comparar.
– E o que você resolveu lá? – Perguntou, mudando de assunto.
– Então – Suspirei. –, não tenho coragem de chamá-la para sair.
Nós deixamos a sala de aula.
– Entendo bem essa situação – Ele disse, compreensivo. – Você não é a pessoa mais social do mundo, é introvertido, constrangido... mas olhe só, esse pontapé inicial foi difícil até para mim.
– Teria alguma dica para me dar?
Ele parou de andar e deu de ombros.
– Chamar ela para sair, talvez?
Fingi estar sério. Mas, na verdade, eu queria rir muito.
– Há-há – Debochei. – É nisso que estou com dificuldade.
Gilles olhou para os lados, de jeito que não parecia ser aleatório. Parecia procurar por algo.
– Já volto, Mick – Ele foi na direção dos banheiros e me deixou lá. – Rapidinho.
Me encostei na parede e comecei a mexer no meu celular. Liguei os dados móveis para ver se alguém havia me mandado algo
E realmente foi o caso. Era uma mensagem da minha mãe.
“Meu bem, vim avisar que o Lukas está tentando falar com você há horas. Por um acaso, o bloqueou!?”
Suspirei, fundo. Abri o WhatsApp, no contato dele.
“Olá, filho. Tudo bem?”, me enviou, em alemão.
Ele só havia mandado aquilo. Apenas.
“Sim, tudo. E com o senhor?”
Escutei alguns passos vindo pelo corredor, mas não me importei.
“Que bom. Eu estava pensando em dar uma passadinha aí para te ver. Quer ir no kart nesse fim de semana?”
Ótimo, tinha mais aquela ainda. Pelo menos uma corrida de kart me ajudaria a acalmar os ânimos agitados daqueles últimos dias.
“Pode ser”, respondi, sentindo algo parecido como claustrofobia.
Fechei os olhos e respirei fundo.
– Oi, er... Micael?
Arrumei minha postura em um estalo ao escutar tais palavras. Nem era o que elas significavam, mas quem estava falando.
– Caramba! – Falei, tentando esconder a surpresa. – Boa noite, Esther.
Ela sorriu, ajeitando uma mecha daqueles seus cabelos negros como a noite.
– Você está bem?
– Sim, estou – Escondi o celular, como se ela pudesse ter alguma ideia de com quem eu estava conversando. – E a senhorita?
– Senhorita? – Levantou as sobrancelhas.
Percebi que poderia ter feito uma cagada, uma bem feia.
– Perdão – Disse, envergonhado. – Eu...
– Relaxa – Esther riu, seu semblante me iluminando aos poucos. – Gostei disso.
“Meu Deus, ela gostou”, pensei, lutando contra a vontade de sorrir na frente dela.
– Gilles disse que estava me procurando, é verdade?
Tive a vontade de cavar um buraco e me jogar dentro dele, ou pelo menos me tacar escadaria abaixo.
– Não estou sabendo disso, não – Dei de ombros, tentando soar confiante e bem humorado.
Quando vi Gi vindo em nossa direção, senti esperança de que ele fosse resolver aquilo.
– Uai, então... – Ela tentou dizer, mas foi interrompida pela chegada de meu colega.
O fitei do mesmo jeito que havia feito em um dia que estávamos andando na rua e percebi que meu celular não estava no meu bolso. No fim, ele estava no dele.
– E aí? – Gilles disse, com um sorriso de lado.
– Você não me disse que o Micael precisava falar algo comigo? – Esther perguntou.
– Pior que sim. Está aflito porque não consegue te chamar para um rolê.
– Meu Deus – Falei, perdendo as estribeiras de tanto constrangimento. – Gilles! Seu.. seu..
Esther apenas riu. Provavelmente aquilo significava alguma coisa boa.
– Nossa – Falou. – Bem, agora eu entendo.
No fundo, eu queria pegar Gilles pelo pescoço... mas também abraçá-lo.
– Er... então...
– Tudo bem – Ela disse, simpática. – Ah, você ainda gosta de Fórmula 1, correto?
Me senti um pouco mais confortável, mas só um pouco.
– Sim, eu ainda acompanho bastante – Sorri, tímido.
– Bom, vai ter o GP da Austrália domingo que vem. Podemos assistir juntos?
Meu coração acelerou, arrancando como o carro do Dom Toretto quando a largada era dada naquelas corridas de rua do Velozes e Furiosos. Mas tinha um pequeno problema:
– Olha, eu não sei. Meu pai que mora longe meio que vai vir me visitar nesse fim de semana. Posso tentar ajeitar com um pouco de jogo de cintura, mas nada confirmado.
Ela fez um muxoxo.
– Bem, amanhã irei visitar aquele centro de pesquisa novo. Consegui um passe-livre lá, então terei de ir antes que ele expire. Podemos na segunda? Tomar um açaí, talvez?
Coloquei as mãos na cintura, sem muito saber o que fazer com elas.
– Sim, claro – Falei, vendo que a situação estava ficando sob controle. – Mas quanto a esse lugar que vai amanhã... será que eles me deixariam entrar se fosse o caso de você querer ser acompanhada?
Nem acreditei que havia conseguido falar aquilo. Até Gilles ficou um pouco surpreso.
– Bem, já que é meu colega de turma e também está no último ano, acho que sim. Vou ligar lá e passar a saber.
Abri um sorrisinho bobo. Ficamos nos fitando por alguns segundos, em completo silêncio. Senti ternura no jeito que ela olhava para mim.
– Você não vai pedir o número novo dela, não!? – Gilles interrompeu o clima, me fitando de jeito travesso. – Tipo, já fiz a minha parte aqui. Tome atitude.
Eu ri. Já havia entrado no joguinho dele.
Esther tirou o celular do bolso em um instante e me deu. Estava aberto no aplicativo de contatos.
– Prontinho... te mando mensagem logo quando eu chegar em casa.
Digitei meu telefone, empolgado.
– Okey – Lhe devolvi o smartphone. – Muito obrigado.
– Não por isso – Ela sorriu, dando uma olhadinha no horário. – Me perdoe por não poder ficar mais. Preciso ir pegar o ônibus.
Assenti com a cabeça, mas sem querer parecer exagerado demais.
– Tranquilo – Cruzei os braços, otimista. – A gente se vê por aí.
Esther se despediu de nós dois e desceu as escadas, com pressa.
Olhei bem na cara de Gilles.
– Como você pôde!?
Ele gargalhou alto.
– Eu te conheço, Micael. Já que não iria conseguir sozinho tão cedo, decidi dar um "empurrãozinho".
Suspirei, segurando a risada.
– Cara, é incrível o quanto eu quero te abraçar e te dar um soco ao mesmo tempo.
– Uau – Ele fez uma careta engraçada.
Umedeci os lábios, voltando ao foco.
– Muito obrigado, mesmo.
– Não me agradeça por isso – Ele imitou Esther e me deu um toquinho no ombros, logo começando a descer as escadas.
Fiquei parado, ainda encostado na parede.
– Você não vem, não... seu animal? – Gilles disse, uns quatro degraus abaixo.
– Caramba, é verdade – Tive uma crise de riso enquanto o alcançava.
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PRIMEIRO CAPÍTULO LIBERADO, IHUU! Cara, eu tô muito feliz. Vocês não tem noção.
Peço perdão por censurar os palavrões com asteriscos. Não gosto de falar e escrever palavras de baixo calão de jeito explícito, então sempre escrevo com censura ou deixo a palavra na metade (tipo aqueles cortes secos que vemos em memes).
E sim, outro Gilles. Já falei que amo esse nome? É memorável, sei lá... só acho bonito.
O que acharam até então? Vou amar ler o feedback de vocês ❤️
Obs: ainda preciso revisar melhor esse capítulo, então pode haver mudanças nele posteriormente.
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