[f(27) = 54 - x] Minha chance
Olá, nenês. Espero que esse capítulo ajude a trazer pelo menos uns momentos de descanso pra mente de vocês!
Hoje não vamos usar a hashtag no twitter, ok? E vamos evitar falar sobre a atualização por lá! Boa leitura! <3
🔮
— Pai?
— Aqui, Jungkook!
Eu coço meus olhos sonolentos, seguindo pelo corredor em direção à cozinha iluminada pela luz do sol.
Meu pai está aqui, vestindo seu calção velho de ficar em casa e uma blusa toda puída. De costas para mim, ele prepara algo no fogão.
— O que o senhor está fazendo? — Questiono, junto a um bocejo, quando me sento numa das cadeiras.
— O café da manhã para meu mulherão e para meus dois meninos — Responde, antes de me olhar por cima do ombro e lançar uma piscadela brincalhona. — Hoje é um dia especial, Jungkook.
— É? — Disparo, em confusão. Aliás, que dia é hoje? — Especial por que?
— Porque você, meu filho, está apaixonado de verdade pela primeira vez!
— Que história é essa?! — Repreendo, tomado pela vergonha.
— Você vai descobrir o que eu senti por sua mãe lá no começo de tudo e eu te juro... a sensação é insuperável. Você já anda até mais feliz, não percebeu?
Sem falha, Jimin me vem à memória. Sua presença única, sua voz, seu jeito de me tocar e de me fazer rir.
Ele é, certamente, parte do motivo.
Mas como meu pai sabe? Eu acabei de admitir para mim mesmo que estou me apaixonando por Park Jimin. Como meu pai já percebeu?
— Vocês tiveram anos difíceis, não foi? — Depois de segundos de silêncio sob minha ponderação, ele questiona. O tom torna-se mais baixo, preocupado, entristecido. — Porque eu não estava aqui. Você, sua mãe e seu irmão sofreram muito. Eu vi, Jungkook.
Ele não estava aqui.
Quando voltou?
Não importa. O que importa é que ele voltou, que está aqui novamente.
— Eu senti sua falta, pai... — Confesso, com o coração dominado por esse alívio de tê-lo por perto mais uma vez.
— E eu sinto sua falta todos os dias. Sinto falta de todos vocês.
Eu abaixo meus olhos, atordoado pela sensação. Um sorriso nasce, porque eu tenho tudo, agora.
Minha mãe. Meu irmão. Novos amigos. Um primeiro romance. E, de volta, meu pai.
— Lembra de quando eu e sua mãe trabalhávamos até tarde e você e Junghee deixavam o jantar servido para nós dois? — Relembra, de repente, sempre de costas para mim. — E vocês sempre tiravam da própria comida aquilo que não gostavam. Cebola e ervilha. E colocavam nas nossas porções.
— Mãe come minhas ervilhas até hoje...
— Ela também não gosta de ervilhas, sabia? — Meu pai confessa, junto a uma risada. — Nunca gostou, mas também nunca gostou de jogar comida fora. Come sem fazer careta. Um mulherão, não é?
Ela é. Minha mãe é a mulher mais incrível que existe no mundo, ainda mais agora que sei que ela também não suporta ervilha.
— É disso que eu mais sinto falta, Jungkook. — Ele continua. A luz que vem do sol é calorosa, ilumina a cozinha em tons suaves de um branco pacífico que me acalma a alma, enquanto ouço: — Das coisas simples da nossa família. Dos jantares que me esperavam à noite, quando você e Junghee já estavam dormindo...
— Na noite em que você se foi, nós deixamos seu jantar servido. Cheio de ervilhas e cebolas. — A lembrança me atinge, dolorosa.
— E de acompanhar vocês de ônibus até a escola — Ele prossegue, como se não quisesse dar fim às lembranças boas para dar espaço à pior de todas. — De ver os desenhos de Junghee e ouvir você falar apaixonado sobre matemática e sobre a música que estava escrevendo.
— O senhor nunca ouviu... era para você...
— De beijar sua mãe, antes de ir para o trabalho. Eu sinto falta, Jungkook.
— Nós sentimos sua falta também. Muita, pai. Dói até hoje. Não vai mais embora, por favor...
— Eu sei. Eu sinto sua dor, filho... e me dói também. Mas você está indo bem. Todos vocês estão. E eu tenho muito orgulho de cada um de vocês, minha família linda.
— Não vai... — Eu peço, desesperado, quando vejo seu corpo virar para mim e seu rosto exibir esse sorriso calmo. Quando vejo que ele está indo. — Por favor, pai...
— Eu preciso ir, meu menino. — Ele diz, com um sorriso triste. — Eu fiz omelete. Com muito queijo, como você gosta. Porque hoje é mesmo um dia especial, não só porque você finalmente se apaixonou por alguém...
— Pai...
— Mas porque hoje nós finalmente podemos nos despedir, Jungkook. Eu fui embora sem dar um adeus. Já estava na hora de mudar isso, não é?
— Não vai de novo, por favor. Por favor. Por favor.
O sol não parece mais tão quente. Eu não sinto mais aquela sensação gostosa. Tudo que eu sinto é desespero. É saudade.
— Eu preciso ir. Mas Jungkook? Canta aquela música para mim. Eu estou longe, mas vou ouvir. Eu vou ouvir, filho.
Eu fico de pé, tentando alcançá-lo, mas sua figura familiar e acolhedora não está mais aqui. Eu estou sozinho na cozinha, o cheiro da omelete feita sendo minha única companhia, junto ao último fio de voz que escuto:
— E não desistam dessa chance. Vocês vão conseguir. Eu confio em vocês.
E assim, ele me deixa mais uma vez. A cozinha iluminada desvanece em instantes de escuridão, interrompida quando eu inspiro mais fundo e abro meus olhos, percebendo que estou em meu quarto. Em minha cama.
E tudo foi um sonho.
Mas acho que esse é o problema dos sonhos bons. Nós não sabemos que eles não são reais, enquanto sonhamos, e precisamos nos deparar com a realidade quando nossa mente é trazida de volta à consciência plena.
Agora, dói. Deitado em minha cama, dói. Eu sinto a dor se alastrar, a saudade esmagar meu coração como uma enorme mão impiedosa.
Eu sonhava com ele frequentemente, depois de sua morte. Acordar era sempre uma tortura; dormir, também. O estresse começou a se acumular, guerreando com a dor. Acho que por isso comecei a fumar. Busquei, na nocividade dos cigarros, algum acalento.
Tinha dezessete, quando comecei. Era difícil comprar, sendo menor de idade. Não deveria ter tentado, mas descobri meus meios, ainda que soubesse de todos os riscos. Fui irresponsável, mas me responsabilizei por cada consequência.
Eu queria um alívio. E funcionava, ao menos naquele instante. Eu me sentia anestesiado. Mas era um paliativo. Temporário. Logo, todas as sensações voltavam e me envenenavam junto à nicotina, adoecendo corpo e alma.
Com o passar do tempo, os sonhos pararam. Os cigarros, ficaram. A dor, a raiva, também.
Não fosse Junghee, com toda sua apatia da época sendo interrompida pela tristeza de me ver fumando cada dia mais, eu provavelmente não estaria tentando parar. Não fosse ele me pedindo, eu continuaria.
Agora, com a mente nublada, o coração cheio e a alma machucada, o pedido ao qual sempre me agarro para rejeitar a vontade, perde força. Meu corpo implora por um cigarro, um maço inteiro.
Mas não tenho nenhum, aqui comigo.
Então me conformo. Saio da cama, atordoado pelo horror de começar uma segunda-feira desse jeito, e sigo ao banheiro. Quando me apronto para o início de mais uma semana, vou à cozinha.
Minha família está aqui. Parte dela, nunca mais o todo.
— Bom dia, fedorento — Minha mãe diz, com os olhos curiosos quando me vê parado no mesmo lugar, observando Junghee servir a mesa do café da manhã.
E meu estômago embrulha, quando vejo.
Assim como meu pai, no sonho, ela preparou omeletes.
— Hyung? — Junghee chama, preocupado, quando falho em esconder a reação. Quando meus punhos se apertam, fechados, meu maxilar trinca, meu coração dispara.
— Fedorento, o que foi? — Minha mãe, mais uma vez. A curiosidade foi encoberta por preocupação, que se atenua em seu rosto quando eu recuo, antes de sair daqui.
— Estou sem fome. — E é tudo que digo, antes de seguir para fora de casa.
Encostado em Belinda, apenas à espera de Junghee, meu pé se agita. Minha bota se move, acelerada, em minha própria inquietação. O movimento frenético apenas se encerra quando meu irmão sai pela porta da frente, apressado e preocupado, com uma vasilha em mãos.
— Hyung, tá tudo bem? — Ele pergunta, enquanto eu diretamente me apresso em montar em Bee.
— Sobe logo, Junghee.
— Hyung...
— Anda.
Ele continua parado no lugar. Segura a vasilha com as duas mãos, antes de se aproximar com algum receio. Antes de montar em Belinda, ele para de pé, ao meu lado, e abre a mochila em minhas costas para guardar o pote que trouxe de casa.
— Seu café da manhã, hyung. Pra você comer quando ficar com fome.
Eu arrumo meu capacete, sem dizer nada. O pequeno gesto cuidadoso de meu irmão se funde às sensações que carrego, agora, e isso me silencia enquanto ele, em igual silêncio, coloca o próprio capacete antes de subir em Bee.
O caminho até a Haeundae é rápido, mas Junghee demora para descer, quando paro em frente à escola. Ele guarda o capacete, depois olha para mim, com esses olhos grandes e redondos à espera de algo. De coragem, para perguntar:
— Você sonhou com ele de novo, não foi?
Minha expressão endurece, sob o capacete. Ele sorri com tristeza, antes de dizer:
— Você sempre ficava assim quando sonhava com ele. E depois sempre fumava.
— Vai para sua aula, moleque. — É tudo que digo, voltando o rosto à frente.
Antes que possa acelerar e sair daqui, ele me toca o braço. Me segura, me faz olhar para seu rosto familiar, que compartilha traços em comuns com o meu.
Seus olhos parecem assustados, preocupados.
— Não fuma hoje, hyung. Por favor. Por mim.
Seu pedido e sua preocupação não calam o que meu corpo parece implorar, mas dá nova voz à minha decisão de não mais ceder ao desejo.
É por isso que posso dizer, apesar de tudo, com sinceridade:
— Eu não vou fumar, moleque.
Ele sorri. Grande mesmo, todo aliviado. Fofo demais.
— Vai logo. — Eu digo, antes que ele fale mais algo. — Venho te buscar no horário de sempre — E, sem esperar qualquer nova resposta, sigo meu caminho.
Eu gostaria de dizer que, gradualmente, a manhã melhorou. Mas, honestamente, é impossível quando a primeira aula do dia é de Jang Jitae.
Piora quando Jimin abandonou a matéria de uma vez, em seu protesto que veio em minha defesa. Sora, também nunca voltou. Woo-ri nunca se matriculou nessa turma.
Não há sequer um rosto amistoso nesse auditório, tornando-me vítima única dos comentários inescrupulosos do professor que, hoje, me causam ainda mais impaciência.
Eu sei que meu jeito de falar é agressivo, na maioria das vezes. Meus trejeitos são bruscos. Mas eu não sou realmente a favor de violência. Durante toda a aula, no entanto, me pergunto se sou mesmo tão contra assim.
Porque, cacete, que vontade de quebrar esse cara no soco.
— Ei — Para piorar, no fim da aula, Jinhei para em minha frente.
Eu lanço uma olhadela pouco paciente e pouco interessada em sua direção, antes de voltar a arrumar meu material para poder me mandar daqui. Em resposta, dou apenas um murmúrio de má vontade.
— O prazo para enviar o projeto de Redes era até ontem. — Relembra, com esse tom meio nojento, como se sentisse superior. Tenho certeza de que ele se acha incrível, a última coca-cola do deserto. — Você enviou?
— Yep.
— Pelo sistema? — Insiste, com desconfiança. — Eu não recebi a confirmação do professor.
— Nem teria como receber. Não coloquei seu nome no projeto.
— Como é? — O babaca aumenta o tom de voz, cheio de raiva. — Eu sou sua dupla, Jeon!
— E você fez alguma coisa? — Devolvo, com as sobrancelhas arqueadas em mesmo tom de desafio. — Eu fiz sozinho. Então recebo a nota sozinho.
— Puta merda, Jeon, eu não acredito! Eu preciso da nota!
— Eu te avisei quando comecei a fazer. Se precisava tanto, que demonstrasse interesse no trabalho, então. — Comento, já de pé. Com a mochila nas costas, aponto: — Mas essa é a primeira vez que você fala sobre ele comigo. Foi mal, mas a culpa não foi minha. Gente folgada não tem vez comigo, não.
Era só o que me faltava. Eu estou literalmente lutando contra o universo, me apaixonando, ajudando meu irmão com seus estudos e mantendo os meus na linha. Mesmo assim, fiz o diabo do projeto inteiro, sozinho, e Jinhei nem uma justificativa deu. Se tivesse ao menos inventado uma desculpa, eu ainda metia o nome dele no trabalho, mas simplesmente esperou que eu fizesse tudo e ainda garantisse nota para ele.
Na moral.
Não sei como Jimin aguentava esse cara. Me dá arrepios pensar que aquela boca gostosa já beijou a desse cara que só fala merda.
Eu, como não aguento e não estou disposto a continuar ouvindo, simplesmente traço meu caminho para fora do auditório. Ou tento. Inconveniente como o babaca que é, Jinhei propositalmente interrompe minha passagem. Para de pé em minha frente, com um sorriso que parece tentar passar alguma ironia, mas na verdade passa muito mais raiva que qualquer outra coisa.
— Você se acha muito superior, não é? É porque tem notas boas? Ou porque se acha muito malandro com essas tatuagens ridículas que te fazem parecer um marginal?
Alguém está aprendendo a repetir as palavras de Jitae, pelo visto.
É hoje que eu dou fim à minha política de não-violência. Juro por deus.
— Ou — Ele comenta. O sorriso se amargura mais, quando supõe: — é porque você acha que Jimin te escolheu?
Claro que ele ia mencionar Jimin. Estava até demorando.
— Supera, cara. Na boa mesmo. — É tudo que eu digo, com a voz muito mais branda que meu humor azedo. — Deixa Jimin fora disso.
Mais uma vez, tento seguir para longe dele. Dessa, ele me impede ao pressionar o indicador em meu peito.
— Eu vou te lembrar uma coisa, Jungkook — Jinhei se aproxima. A voz abaixa e o sorriso some, dando lugar ao que vem em seguida: — Tudo que Jimin fez, faz ou vai fazer com você, ele já fez comigo. Várias e várias vezes. Então não se sinta especial. Você é só mais um.
Não foi esse o assunto que iniciou nossa trágica conversa, que me faz borbulhar em ódio puro e genuíno. Mas é com esse assunto que Jinhei encerra, imediatamente virando as costas para mim e pisando fundo quando sai da sala.
Eu fico para trás, sob a atenção de uns outros curiosos que perceberam a tensão na conversa, e sinto meu coração disparar furiosamente contra meu peito.
É impossível. Inacreditável que Jimin tenha passado tanto tempo com esse cara.
Tempo suficiente para eu saber que, apesar de tudo, ele tem razão. Todos os beijos que Jimin me deu, a forma como nos tocamos em sua cama... sim. Jinhei teve tudo isso antes, repetidamente.
E eu não entendo como. Nem quero entender, menos ainda quero desperdiçar minha energia pensando nisso, mas não consigo me livrar da sensação que não encobre a raiva, mas está aqui, martelando no fundo.
Ciúmes.
Não gosto desse sentimento. Honestamente. Queima, irrita e machuca. Porque eu sei que Jimin teve sua parcela de envolvimentos, assim como eu tive. A ideia dele com outros não é a minha favorita, então eu simplesmente não penso nisso. Não me torturo visitando pensamentos assim, sobre algo que não é passível de mudanças e, ainda que fosse, de forma alguma foi errado.
Mas é diferente quando a situação é como essa. Quando Jinhei joga em minha cara as palavras que me disse. O incômodo nasce e eu não consigo apagá-lo agora, então o que faço é engolir a sensação, arrumar a alça da mochila em meu ombro e descer todos os degraus do auditório até a saída com passadas furiosas.
— Meu deus, que cavalo — Ouço um cara resmungar, assustado e sussurrado, quando abro a porta com um gesto que exala toda a minha raiva nesse instante.
Eu poderia devolver um olhar furioso, talvez uma resposta enraivada, mas sou tirado da órbita assim que meus olhos veem Jimin recostado na parede à frente, à minha espera.
Os olhos pequenos, em fendas únicas, se fecham quando ele sorri apenas um instante depois de me ver. Os lábios se abrem, o nariz se esparrama inteiro, meu coração expande.
Jimin sempre foi tão bonito assim?
Ele parece ainda mais bonito, agora.
— Oi, gracinha.
O encontro desavisado me faz perder a reação por um instante. Acho que ele percebe a falta de jeito genuína e seu sorriso cresce em uma risada sincera e gostosa que me atrai como o pólo positivo do meu dia, até então tão negativo.
— O que você está fazendo aqui? — Pergunto, assim que paro em sua frente. Não o toco, apesar de querer.
— Vim ver meu querido amigo Jinhei. — E juro que essa é a resposta.
Que cacete do inferno de dia ruim do caralho.
— Ele já foi. — É o que digo, me elevando ao máximo do esforço para não demonstrar o quanto fico ressentido.
Percebendo ou não, Jimin ri mais uma vez. E, assim como desejei, me toca. Me segura pela cintura, amassa meu moletom entre os dedos e me puxa, até me cumprimentar apropriadamente ao encostar sua boca na minha, assim que me tem perto.
— É brincadeira, Jungkook-ssi. Obviamente. Vi que ele saiu furioso do auditório.
— Ah.
— Eu vim te ver. Fiquei um dia inteiro longe de você, gracinha... estava com saudade.
Num gesto inevitável, recolho meu olhar ao chão, fugindo do seu. Tão inevitável quanto é o sorriso que me tem, que nasce forte, diante de sua confissão.
Eu me senti meio ridículo. Troquei mensagens com ele durante todo o domingo e, ainda assim, senti falta da sua presença física, do seu toque, dos beijos, do cheiro.
Achei que tinha sido o único a me sentir assim e transformei a realidade de um dia inteiro, em segredo. Guardei para mim, desejando esconder de minha própria consciência o que senti.
Mas, agora, libero o sentimento. E o desejo de tocá-lo ganha força e se expande até guiar minha mão, que o toca pelo pescoço, puxa com cuidado, até trazer sua boca à minha mais uma vez. E ele sorri, contra o novo selar suave, que assim se mantém até encerrar.
— Eu só vim dizer um oi — Ele anuncia, com os olhos fechados, a testa na minha, as mãos em meu abdômen; a minha, acaricia seu rosto. — Você tem outra aula agora, não é?
— Tenho. E você? — Devolvo, logo sentindo o menear suave que traz a negativa.
— Reservei a sala de ensaio pelas próximas duas horas. Vou ensaiar para a apresentação do festival.
— Beleza.
Ele se afasta um pouco. As sobrancelhas se contraem em claro gesto de estranhamento, talvez preocupação, e os dedos me tocam a face com cuidado.
— Você parece meio chateado hoje, Jungkook-ssi. Achei que era efeito colateral da aula de Jang Jitae, mas... aconteceu mais alguma coisa?
— Só não estou com muita cabeça. — É o que digo, sem detalhar os infames acontecidos até então. — Deveria ter ficado em casa.
— Se não estiver se sentindo bem, você pode voltar para casa, Jeon. Eu te levo, se não quiser pilotar. Ou você pode ficar comigo na sala de treino.
— Posso? — Sem que eu perceba, o questionamento foge.
Ele sorri. Me rouba mais um selinho, depois gesticula com a cabeça num chamado manso, a mão entrelaçada na minha para me ter junto na primeira passada.
— Claro que sim. Vem.
Sem peso na consciência, eu facilmente me agarro à proposta de fugir de uma aula. Claro que passar esse tempo com Jimin é apelativo em maneiras e intensidades que sequer preciso esclarecer, mas o motivo maior, primeiro de todos, é essa agitação incômoda em meu peito que me dá a certeza de que ir para a aula será o mesmo que nada.
Então eu sigo com ele. No silêncio dos dedos entrelaçados, que se unem uns aos outros assim como nossos caminhos se ligaram.
Ou será que estiveram interligados desde o início?
É difícil saber, agora, e não estou pronto para grandes reflexões. Apenas esvazio minha mente, caminho ao lado da pessoa que sempre quis longe, mas agora quero cada vez mais perto, e me abrigo na solidão da sala de treino quando a ela chegamos.
Já não é minha primeira vez aqui, então tomo a liberdade de seguir diretamente aos colchonetes empilhados no canto. Pego um para mim, outro para ele, e posiciono ambos em sequência, recostados à parede.
— Ei. Gracinha?
Eu olho por cima do ombro quando ouço o chamado que carrega a voz de Jimin, encontrando-o com preocupação mesclando-se à beleza dos olhos.
— Qual foi? — Devolvo.
É meu jeito quase natural de responder verbalmente ao que me cerca. Dessa vez, apesar da costumeira escolha de palavras poucos cordiais, meu tom é manso. Meio manso. Eu acho.
E a resposta dele vem em uma nova pergunta:
— Nós estamos sozinhos aqui. Você não quer me beijar?
É estranho perceber que a resposta sincera é um não. Eu não quero beijar Jimin agora.
Estou tentando manter afastadas de mim as sensações que começaram a se acumular ainda durante o sono, no sonho, mas estas se agarram às paredes da minha consciência de tal forma que me percebo quase apático.
— Realmente aconteceu alguma coisa, não foi? — Diante do meu silêncio que, por si só é a resposta, Jimin pergunta.
Eu viro as costas para ele. Deixo minha mochila ao lado dos colchonetes e me preparo para ocupar um lugar no acolchoado, mas meu corpo perde o impulso quando ele complementa a suposição:
— Ou você passou o domingo refletindo sobre o que aconteceu no sábado e concluiu que, na verdade, não me quer?
Sério?
Sério mesmo?
Sem precisar de comandos racionais, eu giro em torno de meu próprio eixo imediatamente. Minhas sobrancelhas contraídas anulam a necessidade de qualquer aviso verbal para deixar claro o quanto sua suposição é maluca.
Ainda assim, insisto:
— Eu sei que sou meio merda quando preciso demonstrar o que sinto, mas é sério que você vai continuar acreditando que eu não te quero? Depois daquele encontro?
Ele continua com a expressão neutralizada por instantes que se arrastam até que seus lábios pareçam lutar contra um sorriso que, no fim, vence e nasce junto a uma risada.
— Pior que foi uma brincadeira, Jungkook-ssi. Você ficou bravo de verdade só de pensar que eu acho que você não me deseja tanto assim?
Fiquei, cacete.
Com um breve revirar de olhos, eu já estou pronto para virar as costas mais uma vez, mas Jimin se adianta e gesticula, me pedindo para esperar. Depois de pendurar a bolsa de treino no gancho, ele conecta o celular às caixas de som embutidas. E é aí que o inesperado acontece.
— O que eu acho é que aconteceu algo que te deixou tão chateado. — Ele diz. Toca minha mão, guia meu corpo, que vai mesmo sem entender. Ele me puxa até pararmos diante do espelho que recobre a parede. Virado para mim, conclui: — E o que eu sei é que você dificilmente vai se abrir sobre isso comigo.
— E o que eu não sei é por que você me puxou até aqui.
— Porque eu quero que você se sinta melhor. Estou te convidando para dançar comigo.
Eu arregalo os olhos, simultaneamente contraindo as sobrancelhas mais uma vez numa combinação que até me deixa meio tonto, por um instante. Assim que seu desejo é processado em minha mente, eu começo a recuar e Jimin explode numa gargalhada, já me segurando pelo braço.
— Vai, Jungkook... juro que vai te ajudar a se sentir melhor.
— Nem com o cacete.
— Por favor, gracinha. — Ele insiste, em meio à gargalhada gostosa. — Eu só quero ver seu sorriso lindo.
— Não. Nem pensar. Dança aí sozinho, eu prefiro ficar assistindo mesmo.
— Se você não dançar comigo, eu não vou dançar sozinho.
— Ok. — É minha decisão final, acompanhada de um movimento que captura o corpo de Jimin quando passo um braço por baixo de suas pernas e outra sob seus ombros. Assim que o ergo em meus braços, ele explode numa nova risada e se agarra ao meu pescoço enquanto eu o carrego de volta comigo até os colchonetes. — Então fique aqui deitado comigo.
— Meu deus — Ele ofega, surpreso, quando me ajoelho no chão e o coloco sentado sobre o acolchoado, sem precisar de muito esforço. — Você me carregou como se eu não pesasse nada.
— Você é pequeno.
Ele me lança uma olhadela furiosa, reafirmando que esse é, de fato, seu ponto fraco. Sem perceber, eu deixo uma risada fraca escapar quando engatinho por cima de seu corpo, até ocupar o espaço livre ao lado.
— Você que é forte. — E devolve. — De um jeito estranhamente apelativo e atraente.
— Se você diz... — É a única coisa que consigo responder, antes de puxar minha mochila e deitar com a cabeça em cima dela, continuamente ao lado de Jimin.
Ele continua em silêncio, sem fazer menção de sair daqui. Os alto falantes continuam reproduzindo a música que ele escolheu, seus olhos continuam atentos a mim, seu sorriso continua manso e preocupado.
Não sei exatamente o que me leva a fazer o que faço, em seguida. Não sei se é sua preocupação silenciosa, sua percepção e respeito sobre a minha dificuldade em verbalizar certas coisas, seu jeito manso de lidar comigo, até de me fazer sorrir sem perceber quando acreditei que, hoje, sorriso nenhum nasceria em meu rosto. Pode ser tudo isso. Pode ser muito mais.
A única coisa que sei é que vem. Com meus olhos mirados no teto branco e iluminado, a pergunta foge:
— Você disse que quer ser meu namorado quando tudo isso acabar. Até lá, não somos namorados. Isso quer dizer que nós podemos ficar com outras pessoas, não é?
Eu não acho que Jimin entende verdadeiramente a motivação da minha pergunta. Sua expressão, de surpresa, vai a sofrida. Mas ele tenta disfarçar com um sorriso.
— Tecnicamente. Eu já disse que não quero mais ninguém, mas isso não te obriga a se privar de nada. Se você estiver interessado em alguém, eu...
— Eu só quero você, Jimin-ssi.
É assim. Fácil, direto, sem sílabas atrapalhadas ou bochechas vermelhas. A verdade vem, de uma vez por todas.
— Eu só quero você e isso é estranho feito o cacete.
— É sério? — Ele pergunta. Mal parece acreditar. Olhos arregalados e tudo. — É sério, Jungkook?
Eu olho para ele. Lentamente, capturo seu rosto com minha mão, esmagando as bochechas gordas entre os dedos, até que seus lábios se projetem num bico que, em conjunto com os olhos desacreditados, deixa sua expressão impagável.
— Pois é. — E digo, enfim.
À medida que o sorriso de Jimin cresce, suas bochechas empurram meus dedos, que afrouxam o toque, mas continuam tocando-o quando ele sorri inteiro. Porque Jimin não sorri só com os lábios. É com a boca, o nariz, as bochechas e olhos. Seu rosto inteiro reage a cada sorriso dado e eu, sinceramente, acho que essa é a coisa mais bonita que já vi.
A confissão e sua reação a ela parecem aliviar a dor das garras das sensações ruins. Só um pouco, mas o suficiente para eu me sentir um tanto melhor. Para sentir que minha resposta à sua pergunta anterior, agora, mudou.
Eu quero beijar Jimin. Eu quero beijar Jimin como nunca quis beijar outra pessoa em minha vida.
Ainda segurando seu rosto, polegar em um lado, indicador e médio do outro, eu trago sua boca para mim. Beijo seu sorriso, sinto-o em meus lábios, com minha língua, despedaço-o em um suspiro com meus dentes, ao mordiscar o volume do lábio superior.
A mão de Jimin toca meu pulso. Seu corpo vem para perto, o peito toca o meu, a perna desliza entre as minhas. São lábios, línguas, pernas e caminhos entrelaçados. É um beijo, mas é muito mais.
Quando minha mão desce de seu rosto, percorrendo seu pescoço, peito e abdômen assim como minha boca percorre a sua, eu deslizo sua blusa um pouco mais para cima. Meus dedos tocam sua pele tatuada, correm pela cintura, chegam às costas, descem às reentrâncias acima do quadril, descem um pouco mais. A palma serpenteia para dentro de sua calça de treino, eu sinto sua nádega, massageio a carne que enche minha mão.
Jimin sorri, mas seu sorriso se perde no beijo que ainda reivindico.
Ele me beija de volta. Sua mão agarra meu braço, descendo todo o caminho enquanto o massageia suavemente, sentindo os músculos. Desliza os dedos, sorrateiramente. Por minhas costas, desce o toque até minha bunda, mas não se demora. Sua palma vai ainda mais para baixo, até se alojar na parte posterior de minha coxa e puxá-la até que minha perna se dobre em seu quadril.
É beijo. É toque. E é certeza.
Eu posso ter ido muito além com outras pessoas. Contraditoriamente, com elas, não fui nem à metade do que faço com Jimin.
O sexo não foi íntimo com são esses toques, a ansiedade de explorar seu corpo, os sorrisos que nascem em meio ao beijo. Então eu posso ter beijado e transado com outras pessoas, mas é diferente. Com Jimin, é diferente.
E essa é minha certeza, enquanto ele me tem. Jinhei não faz ideia do que está falando.
Eu não sou só mais um.
Talvez não seja o único.
Mas o que eu e Jimin estamos construindo, isso é algo só nosso. Não importa as pessoas que vieram antes. Não importa se houve sentimento, ou não. O que importa é o aqui, o agora. E aqui, agora, queremos apenas um ao outro.
É a essa sensação que me agarro, sem precisar de esforço. Não às provocações de Jinhei. Eu me agarro à sensação de estar me apaixonando por alguém que também é apaixonado por mim.
A certeza é dada quando eu interrompo o beijo. Quando devolvo minha mão às costas de Jimin, acariciando-o sob o tecido fino da blusa e sua mão acaricia minha perna respousada em seu quadril. Quando o carinho é natural, silencioso, sem cobranças.
Ainda em silêncio, ele desliza um braço sob minha cabeça. Eu vou me aninhando nele, usando-o como travesseiro até deitar minha testa contra seu peito, com meus sentidos invadidos por seu cheiro suave enquanto seus dedos brincam com meus cabelos.
Seu beijo é tão gostoso quanto frango frito. Mas isso aqui também é.
Involuntariamente, meu braço envolve seu corpo com um pouco mais de força, enquanto o meu se curva para caber nessa posição.
Na calma desse instante, sob a música mansa que é reproduzida aleatoriamente em sua playlist, Jimin ri suavemente. Seu peito balança sob minha testa, mas não me faz afastar.
— Você vai dormir, gracinha?
— Eu não consigo dormir abraçando alguém — É a resposta dada, abafada contra seu peito.
— Entendi... — E, assim, ele encerra a breve troca de palavras, nos devolvendo apenas ao som da música, ao carinho que faz em minha cabeça e recebe em suas costas enquanto eu o seguro perto.
Os instantes passam na sequência de canções reproduzidas que, ainda que não seja o verdadeiro intuito, me fazem conhecer mais um pedaço de Jimin quando sou apresentado às músicas que ele gosta de ouvir.
São boas, aliás, mas é só quando reconheço a melodia de Read my mind que meu sorriso nasce enquanto meu rosto continua pressionado contra seu peito.
A minha favorita. A favorita dele, também.
— Eu estou prestes a decretar Read my mind como nossa música. — Ele revela, junto a uma breve risada. — Deu para sentir seu sorriso assim que ela começou a tocar.
Eu recuo um tanto mais sobre seu braço, até dar a ele a visão de meu rosto. Não sei há quanto tempo estamos deitados assim, mas pressuponho que seja bastante, diante da quantidade de músicas que já tocou.
Segurando sua cintura com um tanto mais de força para que ele não entenda isso como um convite para sair de perto de mim, digo:
— Achei que você ia ensaiar.
— Ia. Mas pareceu que você precisava de um pouco de carinho.
Eu não sabia que precisava. Se me fosse perguntado, eu diria que claro que não precisava de carinho, cacete. Não é isso que procuro quando minha mente fica cheia. Eu faço o oposto. Me afasto, usando a agressividade acentuada como forma de repelir quem tenta se aproximar.
Não foi o que aconteceu aqui. Sorrateiramente, Jimin ficou perto e me deu o que eu nem sabia que queria tanto assim.
— Os outros alunos não vão ficar com raiva? — No lugar de transformar tudo em palavras ditas, no entanto, é isso que pergunto.
— Ah, vão, sim. Muita raiva. — Ele ri. — Tem um cara, o nome dele é Yukwon. Se ele descobrir que eu reservei a sala e fiquei aqui deitado... talvez eu não fique inteiro para a apresentação no festival.
Meus olhos piscam de maneira tão preguiçosa quanto o sorriso pequeno que desenho no canto dos lábios.
— Então vá treinar.
— Não. — Ele nega, rapidamente. Seu braço me envolve pela cintura com mais força e os olhos bonitos diminuem, quando o sorriso aumenta. — Ficar assim é mais gostoso.
Eu não vou reclamar. Estou prestes a voltar minha cabeça ao seu peito, aliás, mas sua voz me interrompe antes que o faça.
— Eu só tenho uma reclamação a fazer. Sua cabeça é pesada. Deve ser pelo tamanho do seu cérebro, o que tem um charme inegável — E revela, junto a uma risada sincera. — Mas meu braço está doendo, gracinha.
— Ok. — É a resposta dada antes que eu role até deitar com as costas no colchonete e a cabeça sobre a mochila. Jimin parece prestes a fazer uma nova reclamação, mas é calado quando eu me curvo até segurar sua cintura, a parte posterior de sua coxa e, assim, puxá-lo até que ele esteja deitado sobre meu corpo, seu peito no meu, um sorriso surpreso e satisfeito no rosto.
— Bem melhor. — E diz, ainda se desfazendo em uma risada mansa.
Ele é fofo.
Meu deus. Jimin é surpreendentemente fofo com esses olhos que se fecham a cada riso, o nariz que se abre para os lados, as bochechas gordas que se desenham como molduras rechonchudas para os sorrisos bonitos.
Com toda a atitude confiante demais, a quantidade surreal de tatuagens e o olhar ferino que parece esmagar a alma, eu nunca imaginei que ele também pudesse ser tão adorável assim.
Meio sem saber o que estou fazendo, eu fecho meus braços ao redor de seu corpo e inclino minha cabeça até alcançar a sua, que paira sobre a minha. E, ao invés de beijar sua boca, beijo sua bochecha.
Demoradamente, sentindo a maciez da pele, percebendo como Jimin relaxa um pouco mais. E beijo de novo, o outro lado. Mais uma vez, com selares rápidos que se distribuem ao longo do rosto único, até que ele traz voluntariamente a ponta do nariz ao meus lábios, pedindo um beijo ali, que eu sou incapaz de recusar.
— Eu nunca diria que você é do tipo que gosta de dar beijinhos assim, Jungkook-ssi... — Ele diz, totalmente entregue a um sorriso.
Com um cotovelo apoiado ao lado de meu pescoço, ele sustenta a cabeça ao descansá-la sobre a palma da própria mão.
— Eu não sou. — E respondo, sinceramente. — Deve ser só com você.
Ele parece sorrir ainda mais. Com a outra mão, me acaricia o rosto.
— E eu não diria que você é do tipo que pede beijos na ponta do nariz. — Devolvo, sob o carinho suave.
— Não sou. — Garante. E se utiliza de minhas próprias palavras: — Deve ser só com você.
Bem... isso é inesperado.
Eu nunca imaginei que estaria assim com alguém. Certamente, nunca imaginei que estaria assim com Jimin. Mas eu estou aqui, segurando-o contra meu corpo, sentindo o carinho que ele me faz no rosto antes de deslizar os dedos até minha orelha. Ele brinca com os piercings distribuídos ao longo da cartilagem e faz algo além. Sutil, mas que ainda assim não me passa despercebido.
Ele pressiona o pulso suavemente contra o canto de meus lábios.
Não é só na ponta do nariz que ele pede beijos, afinal.
Sem demora, eu subo uma mão por suas costas, depois desço por seu braço até trazer seu pulso à minha boca. Mais uma vez, demoradamente, beijo suas cicatrizes.
O nome de sua mãe continua tatuado logo ali. Amor acima da dor. E, agora, paixão também.
— Nunca pare de fazer isso — Ele pede, com o olhar carregado, a voz baixa, tomada pelo pedido sutil e silencioso que tão rápido foi atendido. — Por favor...
E lá vem mais uma resposta com uma péssima escolha de palavras:
— Tranquilo.
Mas é sincero. De verdade. E, a essa altura, já é certo que Jimin não põe grandes expectativas em minhas declarações verbais. Nem é isso, aliás. Eu acho que ele realmente gosta do meu jeito trágico de me comunicar.
Então o sorriso nasce mais uma vez em seu rosto, tão sincero quanto minha escolha indelicada de resposta.
Eu não sei mais o que mais gosto nele. O que exatamente faz parte do conjunto que o transformou na causa constante do meu coração acelerado, do meu desejo de estar por perto, da minha atitude de distribuir beijos carinhosos. Mas sei que isso, inegavelmente, faz parte da extensa e não desvendada lista de motivos.
E como abrimos mão da regra de dizermos algo bom depois de algum comentário indelicado, não espero motivo para revelar, em voz alta:
— Eu gosto de poder ser exatamente como eu sou quando estou com você, Jimin-ssi.
Ele parece pego de surpresa, mas a expressão não vacila por mais que um segundo. Sua felicidade que irradia como raios de sol, também não.
— Assim é bem melhor — Ele confessa, com a voz mansa. — Sem precisar de um pretexto para dizer as coisas boas. Assim é bem melhor, Jungkook.
— E você não vai dizer nada, não? — Devolvo, à espera de um novo motivo.
Jimin gargalha numa explosão sonora que faz seu corpo desabar de vez sobre o meu.
Bem, eu sou exatamente o que sou, sem medo, quando estou com ele. E isso, infelizmente, sou eu. Eu sou imediatista e impaciente. Acho que curioso também.
Ainda com o riso se infiltrando entre nós dois, ele rola o corpo para o lado, até deitar sobre o colchonete, mas mantém o rosto virado para o meu, o sorriso nos lábios, e a energia mais gostosa que frango, quando revela:
— O que eu mais gosto em você, é você. — E diz. — Você inteiro, Jungkook. Da cabeça aos pés, nos trejeitos mais bruscos até os mais delicados. Eu sou desesperadamente apaixonado por absolutamente tudo em você.
Para quem costumava citar aspectos da minha aparência, Jimin foi longe demais.
Eu me sinto explodir em falta de jeito, falta de resposta e, talvez, falta de circulação sanguínea no resto do corpo. Talvez todo o sangue se acumule em meu rosto, agora.
Sem saber o que mais posso fazer, eu limpo a garganta com um pigarro e me ponho sentado, puxando minha mochila para o colo. Finjo buscar algo dentro dela para não precisar olhar para Jimin, quando digo:
— Show.
Ele ri mais uma vez. Intenso, explosivo, genuíno, tão sinceramente que eu mesmo me percebo caindo numa risada provocada por meu próprio desastre verbal, até que os sons dos risos se mesclam num só.
Ainda preso na risada inesperada, na leveza que Jimin traz para mim apesar de igualmente me fazer sentir que posso desmaiar de vergonha, às vezes, minha busca desproposital na mochila logo me faz lembrar do que Junghee colocou nela. E aí meu riso reduz, até ancorar num sorriso.
Porque foi um gesto pequeno. Simples mesmo. Mas mostra quanto cuidado ele, o caçula, tem pelo irmão mais velho.
— Isso é sanduíche? — Jimin pergunta quando eu desencaixo a tampa da vasilha, os olhos curiosos enquanto se ergue até ficar sentado ao meu lado.
São dois sanduíches, acho que só com manteiga e queijo, muito provavelmente feitos às pressas porque o que tínhamos para o café era, na verdade, omelete. E deixo uma risada instantânea, suave e rápida escapar.
— Não é de carne — Aviso, rasgando em dois o papel toalha colocado aqui dentro. Depois, uso uma das metades para pegar o primeiro sanduíche e entregá-lo a Jimin. — Mas toma. Pode comer um.
— Obrigado. — Ele nem faz cerimônia, antes de aceitar. — Eu acabei saindo de casa sem tomar café.
— Eu também. — Confesso, pegando o outro sanduíche para mim. Um só não me satisfaz e Junghee sabe, por isso deve ter feito dois. Mas eu não me importo de dividir com Jimin. — Ainda bem que o moleque enfiou isso na minha mochila.
— Junghee é uma gracinha. — Jimin pondera, com um sorriso carinhoso. — Vocês dois são.
Eu concordo com um movimento distraído e a boca cheia de pão e queijo.
— Aliás, — Mais uma vez, com as pernas dobradas e as duas mãos segurando o pão, ele diz. — se sua tatuagem está certa e minha memória não falhou, o aniversário dele está chegando, não é?
— Falta menos de uma semana. Faz dezesseis nesse domingo.
— Um dia depois da minha apresentação no festival. — Ele aponta, com uma breve surpresa. — Como vocês vão comemorar?
— Não sei. Ele não falou nada.
— Nós deveríamos fazer alguma coisa. — E anuncia. — Ele gosta de desenhar, não é? Deve gostar de exposições de arte, também. Eu posso procurar algo assim. Ou talvez fazer uma festa surpresa? Eu posso...
Eu rio suavemente, interrompendo-o com um breve movimento negativo. Engulo toda a comida na boca, antes de explicar:
— Junghee é mais do tipo que só quer estar com as pessoas de quem gosta. Ele não faz questão dessas coisas mais elaboradas, não, e tem pavor de ser o centro das atenções. Uma festa surpresa vai fazer o moleque se cagar inteiro e depois eu que me lasco pra limpar a sujeira.
Jimin cobre a boca para não deixar nada escapar dela quando engasga numa risada.
— Sem festa surpresa, então. — Ele aceita, sem discussão. — Mas se eu fizer parte das pessoas de quem ele gosta, eu gostaria de passar o dia com ele. Só para não passar em branco. Você acha que ele ficaria feliz me tendo como convidado?
— Jimin, — Dessa vez, falo de boca cheia mesmo. — Junghee gosta tanto de você que até me irrita. É claro que ele vai ficar feliz mesmo que você só esteja lá para passar o dia assistindo animes com a gente.
— Então eu estarei lá. — Garante, sem esconder o sorriso de felicidade diante da descoberta. — E eu também gosto muito dele, Jungkook. Então gostaria que ele viesse com você no sábado para me assistir.
— Se eu chamar Junghee, ele vai abrir aquela boca grande e minha mãe vai querer vir junto, quando descobrir.
— E eu vou ficar muito feliz se vocês três estiverem aqui. De verdade. Vocês vêm?
— Vou confirmar com eles dois, mas eu já disse que venho, Jimin-ssi. Com ou sem eles.
Ele sorri. Finaliza o sanduíche ao enfiar o último pedaço inteiro na boca e, ainda com ela cheia, se inclina em minha direção e pressiona os lábios em minha bochecha, antes de ficar de pé.
— Então melhor voltar a treinar. Quero que você veja a melhor apresentação possível. Tudo bem? Você aguenta ficar sem meu chamego enquanto eu ensaio?
A pergunta vem mesclada a um riso que, sem falha, resgata o meu.
— Chamego? — Repito, antes de fazer um breve movimento de negação e me arrastar sobre o colchonete até sentar com as costas apoiadas na parede. — Relaxa. Eu gosto de te ver dançando.
Ele finalmente começa os alongamentos, com um sorriso atravessado no rosto, quando diz:
— E, sem querer, você acabou de me conquistar mais um pouco, gracinha.
— Quem disse que foi sem querer?
Os braços de Jimin param, apontados para o alto. Seus olhos se comprimem suavemente, num quê malicioso e o sorriso se concentra no canto dos lábios antes que sua postura se aprume e ele pondere, com esse tom sorrateiro:
— Então você sabe flertar também sem citar equações matemáticas, não é?
— Não foi um flerte. — É claro que a negativa é descarada. Foi um flerte, sim. Muito mal calculado, aliás.
De impensada e impulsivamente dizer coisas que reafirmam o quanto Jimin me fazia desejá-lo longe, agora estou aqui impensada e impulsivamente dizendo, em outras palavras, que quero que ele se apaixone cada vez mais por mim.
Por essa eu não esperava.
— Claro que não foi. — Ele não discute, apesar de, ou talvez exatamente por saber que flertei, sim, meu deus do céu.
Jeon Jungkook flertando. Que universo mais bizarro.
Mas foi o contexto inesperado da vida que levamos aqui que me trouxe a esse momento. À possibilidade de estar em companhia de alguém que respeita cada uma das minhas limitações e, dentro delas, demonstra seu cuidado por mim. À possibilidade de estar aqui sentado, em silêncio, hipnotizado do instante zero ao movimento final da coreografia que ele repete exaustivamente enquanto dá vida a um cisne gracioso, mas dolorido, aprisionado.
Certamente, o encontro de minha vida à vida de Jimin não encobre a perda da vida de meu pai. São contextos completamente distintos, incapazes de se anular. Assim, acompanhando a sensação de estar com Jimin, vê-lo e apreciar o preto e branco de sua dança, vem também aquela ruim, intensificada pelo último sonho que tive.
A sufocada dentro de mim, porque nunca consigo falar sobre nada que envolva meu pai. Não encontro acalento ao verbalizar a saudade que sinto, a dor que doi fundo, porque não consigo transformá-las em palavras.
Agora, não é diferente. Isso, nem o universo em colapso foi capaz de mudar.
— Ei — É no torpor das sensações conflitantes que digo, quando a música se encerra pela quinta vez. — Eu acho que vou para a próxima aula. Já vai começar.
Jimin está ofegante e me olha pelo reflexo do espelho, antes de girar em torno do próprio eixo e me lançar um instante de atenção, ao assentir.
— Certo. — Ele responde, com gotículas de suor deslizando sobre a pele enquanto desliza os passos em minha direção. Enquanto eu junto minhas coisas e fico de pé, ele joga água na própria boca antes de suspirar e sorrir. — Te vejo no almoço?
— Sim. Pode ser.
Ele assente novamente. Deixa a garrafa de volta na mochila e depois, num gesto já natural e que não espera a criação de contextos favoráveis, me toca o rosto e me beija a boca, suave.
— Só quero saber uma coisa, antes de te deixar ir — E diz, antes de deslizar as mãos à minha cintura e me abraçar com cuidado, mantendo seu rosto aqui perto. — Está se sentindo melhor?
Eu toco no alto de seu braço, deslizando a mão para baixo, depois alternando os movimentos num carinho desproposital. E selo seus lábios com os meus, antes de fazer um breve movimento de confirmação, que, apesar de tudo, é sincero.
O sorriso dele, em resposta, também é.
— Que bom. Eu espero que um dia você consiga falar comigo sobre as coisas que te machucam. Mas eu vou estar aqui mesmo que você não fale, mesmo que prefira o silêncio. Certo?
Meu sorriso é frágil, fraco, mas tem verdade. E é num movimento um tanto carente que eu busco sua testa, deitando a minha sobre ele enquanto simultaneamente toco seu braço e acaricio seu pescoço.
Na sequência de sua confissão, faço meu questionamento genuíno:
— Como eu consegui odiar tanto logo você?
— Bem... talvez tenha sido essa a causa do colapso do universo.
Ele ri da própria suposição. Eu sorrio também, apesar de não achar tão cômica assim. Talvez tenha sido mesmo por isso.
— Hora de arrumar a bagunça que fiz, então. — E digo em voz alta. — Talvez...
— Talvez...? — Ele afasta brevemente o rosto, à espera do desfecho. É mais difícil falar quando seus olhos ferinos recaem diretamente sobre os meus, mas vou até o fim.
— Talvez você deva sair de novo comigo.
— Não sei se é isso que vai arrumar nossa bagunça... — Ele pondera, junto a um sorriso. — Mas que se dane. Se não for, pelo menos eu vou ter um segundo encontro com Jeon Jungkook.
Eu não sei por que, mesmo facilmente tendo meu pedido aceito, eu ainda me sinto completamente prestes a ter uma síncope nervosa.
Será que eu nasci com defeito?
— Depois da sua apresentação? — Sugiro, como se não estivesse prestes a hiperventilar. — Sábado à noite. Pode ser?
Nós não sabemos se o sábado à noite chegará. Nada nos garante que o tempo não acabará antes disso. Ainda assim, pergunto. Ainda assim, ele responde:
— Sábado à noite, Jungkook-ssi. E como prometido, faremos algo que não precise de muito dinheiro. Até porque — E com esse sorriso dissimulado, desliza os dedos sobre a gola de meu moletom. — não gastamos um centavo enquanto estávamos em minha casa e foi muito gostoso, não foi?
Eu umedeço meus lábios, tentando espantar a lembrança quase automática do que fizemos. Não que eu tenha me arrependido, pelo amor de deus, não. Foi gostoso feito o cacete. Mas a retomada das cenas, dos toques, de nossos corpos se estimulando... é melhor deixar para um momento mais reservado.
Jimin está fazendo coisas inimagináveis com meu corpo agora que estou conhecendo a diferença entre desejar sexo e desejar alguém.
Numa repreensão por ele me despertar a lembrança e junto uma pontada ainda inofensiva de tesão, eu aperto sua nuca exatamente como faço com Junghee, até que Jimin se desmancha numa risada acompanhada de um leve tapa de retratação que deixa em meu peito.
— Tchau, Jimin. — E digo, sem mais cerimônias antes de me afastar.
Ainda com sua risada deixada para trás, ele diz:
— Tchau, gracinha.
E eu me vou. Sigo de volta ao meu departamento. No caminho para a nova aula, encontro Jinhei. E não perco sequer um segundo de meu tempo com ele.
Assim, a segunda que começou tão desastrosa encontra seu caminho para a leveza, que se firma no almoço em companhia de Jimin e Yoongi — mas não atinge o ápice, já que Hoseok, mais uma vez, não veio para a universidade.
Tá tudo bem?? (13:01)
É a mensagem que envio para ele quando a preocupação reivindica seu lugar, ainda antes do fim do almoço.
Tudo bem, neném! Só acordei indisposto (13:04)
Você ficou preocupado com seu hyung? (13:04)
Nem. Só avisa se precisar de algo (13:06)
E é assim que encerro a conversa quando garanto que o universo não veio com mais uma de suas loucuras punindo Hoseok por uma bagunça na qual ele sequer deveria ter se envolvido. Ele deveria ter sido poupado dessa merda toda.
Sem muito que eu possa fazer sobre isso, eu vou com Yoongi até a biblioteca, depois do almoço. Aqui, adianto a matéria do dia enquanto espero a hora de buscar Junghee na escola.
— Hoseok não oficializou o convite para o encontro. — De repente, no meio do meu raciocínio, o piromaníaco dispara.
— Problema seu, ué.
— Por que ele ainda não oficializou?
— Eu lá tenho cara de quem lê mentes, cacete? O bruxo aqui é você.
— Não sou eu que interajo com minhas próprias versões em realidades alternativas. — Devolve, numa alfinetada.
— Pois é — Sinceramente, nem faço grande caso. — Talvez seja meu superpoder. Mas ainda não leio mentes. Pergunta pra Hoseok ou oficializa você mesmo o convite.
— Talvez seja mesmo seu superpoder. — Ele pondera com o tom dolorosamente sério.
Eu até ergo os olhos, diante do seu silêncio posterior, e vejo sua expressão complexa antes que suspire, consternado, e tente encobrir sua declaração com um novo questionamento.
— Como foi que você juntou coragem para convidar Jimin para sair?
— Juntei, não. Quase me borrei todo e desmaiei de nervoso. Mas é tranquilo. Tenta.
Ele revira os olhos. Eu reviro os olhos de volta. E então voltamos aos nossos respectivos materiais de estudo até que o alarme em meu celular me lembre que é hora de ir à Haeundae e, sem atrasos, o faço.
Junghee não está mais fugindo das aulas. Não está mais aparecendo com o uniforme sujo e com machucados no corpo. Definitivamente, parece mais feliz. Mas acho que, no fundo, eu ainda tenho medo que de repente ele volte a sofrer nas mãos dos outros garotos.
Por isso, ainda que eu não expresse tão bem, é sempre um alívio quando chego em frente à escola e o vejo feliz e tranquilo em companhia de Taehyung, como acontece agora.
— Jungkook-ssi! — Moleque-ssi dispara assim que paro Belinda perto dos dois. — Como foi o encontro com Jimin-ssi, hein?
Eu rolo os olhos num gesto entediado, mas meio constrangido também. Junghee precisa mesmo ser tão fofoqueiro assim?
— Anda, moleque. — É tudo que digo para meu irmão, que já se desmancha numa risada diante do questionamento sem cerimônias de seu amigo.
— Até amanhã, Tae — Ele diz, batendo na bunda seca para limpar a calça quando fica de pé. — Obrigado por esperar comigo de novo.
— Imagina, Hee. — Moleque-ssi diz, despreocupadamente.
— Quer que a gente espere seu ônibus passar? — Eu pergunto. Não seria a primeira vez. Certamente, não será a última.
— Você é fofo, Jungkook-ssi. Mas não precisa. Tem um menino muito bonito que está pegando o mesmo ônibus que eu. Acho que ele já deve estar no ponto. Vou aproveitar pra paquerar um pouco.
Junghee pega o capacete. O sorriso perde força por um instante, diante do relato enérgico de Taehyung. E é com o sorriso morno que diz:
— Boa sorte, Tae. Avisa quando chegar em casa, tá?
— Tá bom! — E todo animado, moleque-ssi pendura a mochila nas costas. — Tchau, Hee! Tchau, Jungkook-ssi!
Eu não faço mais que gesticular preguiçosamente, enquanto Junghee continua parado no mesmo lugar com esse sorriso meio fragilizado ao ver Taehyung se afastar.
— Ei. Moleque. — Chamo, quando o percebo quase em transe, preso nos próprios pensamentos. — Junghee! — Insisto, mais firme, e ele tem um breve sobressalto que logo traz sua atenção a mim.
— Oi, hyung. Desculpa.
— Qual foi? — Questiono, desconfiado. — Ficou viajando por que?
Ele reforça o sorriso morno, que ainda parece pouco natural. E é fácil perceber porque, apesar das diferenças entre nós dois, temos semelhanças também. Uma delas, já revelada, é que seu sorriso sincero, assim como o meu, não se restringe à boca. Quando é sincero, o sorriso chega antes aos olhos. Depois, aos lábios.
Agora, os olhos de Junghee não estão sorrindo.
— Não foi nada, não, hyung. — Então sua garantia vem, mas sei que é mentirosa.
— Mexeram com você de novo, foi? — Insisto, desconsiderando sua resposta, e lá vou desmontando de Bee. — Diz quem foi! Eu vou descer o cacete no arrombado e vai ser agora!
Aquele lance de aversão à violência tem um certo limite. E quando a situação envolve alguém machucando esse cabeçudo, os limites definitivamente foram ultrapassados.
— Credo, hyung, você não vai bater em ninguém! — Ele me interrompe ao me empurrar pelo peito para que eu não siga em frente. — Eu, hein?
— Então diz logo o que foi. Na hora de abrir essa boca grande e fofocar sobre minha vida você não é todo misterioso assim, é?
Ele enfia o capacete na cabeça, recusando-se a responder porque sabe que eu tenho razão.
Fofoqueiro.
— Eu só tô preocupado com você, ok? Você acordou chateado — E diz, ajustando o fecho abaixo do queixo.
Fofoqueiro e mentiroso. Bandido.
— Eu vou descer o cacete é em você pra parar de mentir. — Digo, olhando-o com desconfiança.
Junghee não se assusta nem por um instante. Tirando os tapas no pescoço e afins, eu nunca seria capaz de machucar o moleque de verdade. Dou um soco em minha própria cara antes de levantar a mão para ele. E o malandro sabe disso.
— Só anda logo, hyung. — Ele pede, sem demora em me dar as costas. Mas para e vira novamente, com a expressão levemente transformada. Já sei que vai pedir alguma coisa. — Aliás... posso pedir um favor?
Não disse?
— Que é?
Ele hesita. Com a cabeçona envolta pelo capacete, torce os lábios pequenos. Demora bem uns quinze segundos, juro por deus, para que ele finalmente fale:
— Nós podemos ir na MoonMoon?
Ah. Isso explica sua hesitação.
Ainda que eu estivesse alinhado com a ideia de finalmente voltar naquela lanchonete, esse não é o melhor dia para me pedir isso. Não depois do sonho. Não agora que a saudade voltou a bater tão forte, violenta e irreparável.
O não facilmente escala por minha garganta, ressoa em minhas cordas vocais, ecoa em meu peito, na certeza da resposta a ser dada, quando verbalizo:
— Ok. Vamos.
Não foi esse o planejado, mas Junghee e seu olhar ansioso e esperançoso é páreo para a parte de mim que volta a se recusar a ir para aquele lugar.
Jimin não é o único capaz de me fazer pisar na lanchonete novamente. Eu fui até lá num gesto desesperado para tentar resolver a confusão criada entre nós dois. E talvez a influência de Junghee, na especificidade dessa situação e a ligação íntima com as memórias felizes de nossa família, seja incomparavelmente maior.
Porque não há nada em jogo aqui. Se eu optar pelo não, sei que o moleque vai ficar meio chateado, mas vai entender. Ainda assim, sua esperança em algo que parece tão pequeno é o suficiente para me convencer. E minha resposta é o suficiente para fazê-lo sorrir intensamente.
Então montamos em Bee. Meu coração desacelera enquanto Belinda acelera sobre o asfalto, cortando todo o caminho familiar até que os pneus rolem sobre os pedregulhos do estacionamento.
Eu desligo o motor. Junghee desce. Eu desço em seguida. Nós dois tiramos nossos capacetes, mas eu visto uma armadura imaginária numa tentativa de me proteger dos sentimentos que podem ser resgatados nos próximos instantes.
— Vai ficar tudo bem, hyung — Ele diz, quando me vê hesitar por tempo demais. Meu olhar desce até ele que, com esse tamanho, se propõe a cuidar de mim.
Sei que minha expressão é distante, talvez fria, de alguma forma. Certamente, incapaz de refletir o que acontece aqui dentro. O caos silencioso que, não sei como, Junghee é capaz de amenizar quando segura minha mão num gesto inocente e fraternal, exatamente como costumava segurar quando ainda não tinha tamanho para atravessar a rua sozinho e se segurava em mim, confiando cegamente no irmão mais velho para levá-lo ao outro lado, enquanto eu me sentia no topo do mundo por poder cuidar dele.
Dessa vez, é ele quem guia. Quem decide quando dar o primeiro passo, nos levando do estacionamento à calçada e, pela calçada, à porta. É Junghee, no lembrete de que três anos se passaram desde a última vez. Que muita coisa mudou, ele cresceu e não precisa mais de todos os meus cuidados, ainda que eu queira cuidar do meu irmão para sempre.
Aqui dentro, eu olho ao redor. Inspiro as lembranças de quando éramos três a atravessar essa porta, não apenas dois.
— Eu sei que machuca, hyung — Ele diz, com os olhos grandes apontados para mim. — E eu sei que você sonhou com ele de novo. Mas você não tá com cheiro de cigarro, como ficava toda vez. Então acho que alguma coisa já mudou. Né? A gente consegue.
Eu solto sua mão para subir a minha até sua cabeça. Um sorriso suave, natural, nasce no canto minha boca quando bagunço seus cabelos, antes de empurrá-lo pela cabeça em direção a uma das mesas.
Ocupar um dos lugares é mais um dos desafios, mas eu o venço. Sento de frente para meu irmão, que sorri. Mas não é a mim que seu sorriso genuinamente feliz se dirige.
— Oi, mãe! — Ele diz, olhando para ela. — A gente veio te ver!
Ela se aproxima. Traz o cardápio, o bloco para anotar os pedidos e um sorriso grande que ressalta as rugas ao redor dos olhos gentis.
— Meus bebês — E ela quase sussurra, quando para atrás de mim. Me toca o ombro, faz carinho, com o toque e com o olhar. — Não acredito que vocês estão aqui.
— Você me prometeu toda a batata frita do mundo. Vim cobrar.
Ela não faz nada além de rir suavemente, feliz, do jeito que gosto de vê-la, do jeito que merece sempre estar.
— Toda batata frita do mundo e o que mais? — Questiona enquanto Junghee, em sua alegria contida, puxa o cardápio para analisá-lo como se não o conhecesse de cor.
— Eu quero o cheeseburguer. — Ele diz. — E uma coca da grande, mas sem gelo que é pra render mais.
— Eu quero aquele sanduíche de sempre mesmo. — Incapaz de analisar o menu, como se essa fosse mesmo uma tarefa trabalhosa, eu anuncio. — Coca sem gelo também.
— Certo. — Com os pedidos anotados na comanda, ela guarda o bloco e a caneta no bolso do avental e me lança um olhar carinhoso, significativo, antes de se abaixar e beijar o topo de minha cabeça. Depois, toca o rosto de Junghee através da mesa e se inclina para beijá-lo carinhosamente também. Sem qualquer outro aviso além do olhar carregado de sentimento, ela diz: — Mãe ama vocês. Mais que tudo.
Quando ela sai, com o sorriso irradiando em toda mínima parte de seu corpo, Junghee também deixa o próprio sorriso crescer.
— Ela tá muito mais feliz depois que você voltou a se reaproximar da gente, hyung.
Um breve movimento de lábios fechados e sobrancelhas arqueadas é o que dou em resposta, antes de esfregar uma mão na outra, sob a mesa, e desviar o olhar num gesto agitado. Não procuro nada em específico, mas, assim que minha atenção recai nas banquetas altas do balcão, vejo o velho mirrado que, com o rosto enrugado, os olhos envelhecidos e a curiosidade estampada, me olha de volta.
Junghee percebe, sem demora.
— É o velhinho do hamburguer, né? — Questiona, todo curioso como o fofoqueiro que é. — Você sempre fingia ficar cheio só pra dar metade dos sanduíches pra ele.
— É. — Digo, apenas, antes de impulsivamente acenar para o senhor, gesticulando para que ele se aproxime. Antes, era o dinheiro suado de meu pai quem pagava meus sanduíches. Eu não me sentia bem em pedir que ele tirasse do pouco que tinha para pagar um lanche a mais, mas me sentia pior em ver o senhor sentado do lado de fora, de mãos vazias. É por isso que eu sempre dividia meu sanduíche em dois e, mesmo com fome, fingia estar cheio só para dar metade.
Agora, o dinheiro é meu. Então posso oferecer um lanche só para ele, ainda que isso signifique precisar economizar na gasolina esse mês. Nada trágico.
— Vai querer o que? — Assim que ele se aproxima, eu pergunto. — Senta aí.
As mãos, recobertas por luvas de dedos vazados, seguram uma xícara com o que me parece chá. Certamente, algo que não está no cardápio. Algum funcionário deve ter preparado com material próprio, já que faz cada vez mais frio lá fora.
Junghee se adianta em empurrar a cadeira para estimulá-lo a sentar e o senhorzinho sorri gentilmente antes de aceitar nosso convite e sentar ao lado de meu irmão.
— Obrigado pela companhia. — Ele diz.
— Nada. E a comida?
— Eu comi não faz muito tempo. — O velho, que Jimin chama de Namoo, anuncia. — Aquele rapaz simpático, Jimin, comeu comigo. Ele vem toda segunda-feira.
— Ah. — Devolvo. Não é novidade. Eu sei que Jimin vem todas as semanas, às vezes em mais de um dia. Hoje, ele parecia ter a tarde meio corrida, mas ainda assim deu um jeito de vir fazer companhia ao velho.
Não acredito que ele fica cada vez mais fofo.
— Rapaz... — O velho me chama. Os olhos são curiosos, por trás das marcas do tempo. — É você, não é? A pessoa de quem Jimin gosta.
Essa pergunta, sim, me pega de surpresa.
— Acho que sim. — Respondo, meio sonso.
Namoo sorri. Junghee segura a risada.
— Jimin ficou por pouco tempo, hoje. Mas só sabia falar sobre você. Ele está muito feliz.
— Eles tiveram até um encontro! — Lá vem Junghee fazer fofoca. Aponta para mim, o cara de pau: — Ele ficou sorrindo até enquanto dormia, depois.
— Isso é bom... — O velho diz. — Vocês todos pareciam ter muitas dores. Agora parecem mais felizes. É bonito de ver.
Não sei se é sua entonação, talvez seja delírio meu, mas me vem a certeza de que Namoo não está se referindo somente a Jimin e eu. Ele parece falar sobre minha mãe. Sobre meu irmão. Sobre tudo que mudou em nós desde que nossas relações se fortaleceram.
E ele não está errado. Desde o primeiro vinte e um de outubro, muito mudou.
Então é inevitável. Eu me pergunto quantas vezes isso aconteceu. Quantas vezes minha família se fortaleceu. Quantas vezes comecei a me apaixonar por Jimin. Quantas vezes esqueci tudo, para começar novamente.
Em todas as noventa e oito chances? Em todas elas, eu conquistei tudo isso? Eu esqueci noventa e oito vezes sobre os sorrisos que sorri?
É dolorido pensar nisso. É dolorido pensar que, talvez, não demore para que as lembranças dessa chance também sejam arrancadas de nós.
— Senhor Baek? — Tempo demais já se passou quando uma das garçonetes se aproxima.
Ela é mais nova que minha mãe. Tem um sorriso simpático e bochechas gordas desenhadas ao redor das covinhas que aparecem a cada mínimo movimento de sua boca.
Namoo olha para ela, percebendo-a com um agasalho por cima do uniforme e uma bolsa pendurada no corpo.
— Vamos? Hoje eu quem vou te acompanhar até o abrigo!
O senhor sorri e assente. Meu hambúrguer já foi devorado, assim como o de Junghee. As bandejas vazias descansam sobre a mesa, enquanto o sol descansa longe do céu visível, escuro pela chegada da noite.
Não era a intenção ficarmos por tanto tempo. Mas, em companhia do velho mirrado, mal percebemos o tempo passar. Agora, somos os únicos clientes, enquanto os funcionários se preparam para ir embora.
— Boa noite. — A garçonete que acompanha Namoo diz, sorridente, em despedida. O velho também sorri. Deixa o braço magro ser enlaçado pelo braço da mulher ao lado, antes que ele gesticule com a mão numa despedida trêmula.
— Tchau, senhor Baek — Junghee diz, todo cativado pelo velho.
Ele, por sua vez, diz:
— Espero que vocês possam sorrir sempre.
E vai. Agora, apenas alguns funcionários estão aqui e não deve demorar para que minha mãe venha nos expulsar.
— Anda, moleque. Vamos embora. — Decido, então, sem cerimônias ao ficar de pé, juntar os lixos da bandeja e jogá-los na lixeira, antes de levá-las, vazias, ao caixa.
— É por minha conta — Minha mãe diz, tocando cuidadosamente no ombro da mulher atrás da caixa registradora.
— Não precisa, mãe.
— Não discute, fedorento.
Eu reviro os olhos, enfiando a carteira de volta no bolso, depois meto um tapa na cabeça de Junghee para que ele me acompanhe.
— Hyung! — Ele grita, cobrindo a testona com a mão, antes de me seguir com essa pose toda brava. Assim que passamos para o lado de fora, percebo a temperatura mais fria e me encolho dentro do moletom, puxando o ar entre os dentes num gesto incomodado.
— Que frio do cacete.
— Não quer esperar mãe sair, não? — Também todo encolhido de frio, Junghee pergunta. — Ela só vai ajudar a limpar e já vem. Aí a gente pode ir tomar um chocolate quente em outro lugar.
— Tá achando que a gente é rico, é, moleque? E você acabou de comer um lanche inteiro. Tenha noção.
— Só sugeri... — Ele resmunga, com essa careta inconformada enquanto eu, apesar da resposta, solto o ar numa lufada impaciente ao ocupar um lugar no banco ao lado da entrada da lanchonete.
Talvez acostumado demais com meu jeito, ele nem se dá ao trabalho de questionar a incoerência entre fala e ação. Apenas vem, esfregando uma mão na outra antes de sentar ao meu lado, desconfortavelmente próximo.
— Sai de cima, moleque!
— Eu tô com frio! — Rebate, até batendo os dentes. Depois, abaixa o tom de voz, todo sonso: — Se fosse Jimin hyung você não estaria reclamando...
Eu não faço nada além de revirar os olhos e esconder minhas mãos dentro das mangas compridas, permitindo que ele mantenha seu ombro pressionado contra o meu, em silêncio.
Mas não por muito tempo.
Quando Junghee vai segurar essa língua grande por mais que dez segundos?
— Hyung. — Ele chama, com o tom meio sério, dessa vez. Mantém os olhos voltados para a frente, quando pergunta: — Você acha que eu forcei muito a barra em relação a Jimin hyung?
— Que?
— Sabe... insistindo pra você ficar com ele. Eu sei que no começo não era recíproco. Você acha que eu forcei muito?
Eu aperto meus olhos, as sobrancelhas, e gesticulo em indecisão, com a cabeça.
— Acho que não. Sei lá. — Mais uma resposta para a coleção das trágicas. — Por que essa preocupação agora?
Ele hesita. Remexe os próprios dedos, com a inquietação crescendo exponencialmente, assim como minha curiosidade. Estou prestes a estapear sua nuca para que ele desembuche, mas não é necessário.
— É que eu acho que queria que você gostasse de um menino... pra eu parar de me sentir estranho por... também gostar de um...
É o que?
Eu me movo sobre o banco, mirando minha atenção em Junghee, que parece prestes a perder toda a cor do rosto.
— Junghee, você...?
Ele assente, timidamente.
— Eu achei que você estava gostando de uma menina. Taehyung disse. Uma da sua sala.
— Eu menti. — Confessa, completamente envergonhado. — Porque eu não queria que ele desconfiasse. Não queria que ninguém desconfiasse. Eu fiquei com muito medo quando percebi, por isso... por isso eu menti.
— Então... de quem você gosta?
Junghee fica sério. Suspira. Abaixa o olhar. E diz:
— Jimin hyung.
Eu juro que minha alma parece fugir do corpo. Perco completamente a reação, dominado pelo choque de sua confissão repentina, e o desespero começa a nascer com força avassaladora um instante antes de Junghee explodir numa risada.
— É brincadeira, hyung. — Ele diz, perdido no próprio riso. Dessa vez, não tem escapatória. Eu meto um tapa nessa cabeça.
— Que merda, Junghee! Que cacete!
— Eu só não quero dizer ainda quem é! — Ele se defende, sempre rindo. — Desculpa!
Eu reviro os olhos antes de me recostar violentamente no banco, bufando furiosa e sonoramente enquanto o som da risada do moleque vai perdendo força. Não demora para que o silêncio volte a nos envolver assim como o frio. E se prolonga, mais um pouco, e ainda mais.
Então Junghee volta a me olhar. Com os olhos ansiosos, pergunta:
— Isso muda alguma coisa, hyung? Eu gostar de meninos... muda alguma coisa pra você?
Meus olhos se comprimem novamente. Ele segue:
— Todo mundo começou a me tratar muito mal só porque eu sou amigo de Taehyung. Me apelidaram de coisas muito ruins e me bateram por isso, hyung. Eu achei que era errado. Que eu era errado. É muito ruim, mas o pior é se você ou mãe mudarem comigo.
Eu respiro fundo. Que pergunta sem noção.
Nem tanto, aliás. Imagino o quanto todas as provocações e agressões deixaram Junghee assustado.
— Mãe já disse que não importa. Ela ama nós dois. Você ouviu, moleque.
— E você?
— Lembra que você descobriu recentemente que tatuei sua data de nascimento? Que essa foi minha primeira tatuagem?
— Lembro. — Confessa, nervoso, provavelmente sem saber até onde essa confissão vai dar. E eu revelo:
— Eu tatuei porque é a data mais importante para mim, Junghee. Porque eu amava nossos pais, mas acho que já nasci amando os dois. Aí você nasceu. E foi ali... naquele dia, que eu senti o amor nascendo também. Pela primeira vez.
Ele fica sem reação, por um instante. Eu estou quase prestes a desmaiar por confessar, com todas as letras. Mas sigo:
— Nossos pais foram as primeiras pessoas que eu amei. Mas você foi e ainda é a minha primeira lembrança de como é sentir o amor nascendo.
Junghee pisca, meio abobalhado. Ainda não sabe o que dizer. Mas eu sei exatamente como encerrar essa conversa:
— Eu te amo desde antes de você ter um nome, moleque, porque aqueles dois não escolheram antes de você nascer. Então não vem com essa merda de me perguntar se vai mudar alguma coisa por conta de quem você gosta ou deixa de gostar, porque não muda. Nunca vai mudar.
Junghee sorri, simultaneamente usando as costas das mãos para secar os olhos antes de se desmanchar numa risada desajeitada e me pegar de surpresa num abraço completamente torto.
— Eu também te amo desde antes de ter um nome, hyung. Eu te amo muito mesmo.
Eu umedeço meus lábios. Cacete de moleque emocionado, todo chorão.
E eu aqui, com esse tamanho todo, sigo o mesmo caminho. Meus olhos ardem, com a vista embaçada por lágrimas que não escorrem, e eu acaricio suas costas enquanto ele continua me abraçando.
Quando ele se afasta, mais uma vez seca os rastros úmidos pelo rosto. E, com o maior sorriso, diz:
— Quando eu fizer dezoito, vou tatuar sua data de nascimento, hyung.
Eu reviro os olhos, tentando não me entregar ao fungar discretamente.
— Deixa de ideia, moleque.
— É sério!
— É sério o que? — É minha mãe quem pergunta, simultaneamente segurando a porta da MoonMoon aberta quando passa por ela.
Junghee me lança um olhar com um pedido silencioso. Eu logo entendo que não é hora de falar para ela, ainda. Nem mesmo sobre a tatuagem.
Ela quase desmaiou quando eu apareci com a primeira. Imagina pensar que Junghee, na véspera dos seus dezesseis, já está pensando em se tatuar também.
— Que eu quero chocolate quente. — E aí o mentiroso diz, dissimulado mesmo.
— Vocês acabaram de comer um monte. Eu botei quase o dobro de batata frita na bandeja de vocês!
— Oh, mãe... — Ele pede. E quem resiste a Junghee tentando ser fofo?
Eu, não. Mãe, menos ainda.
— Certo... mas eu faço em casa. Nada de ficar comprando na rua, é muito caro.
— Você é a melhor mãe do mundo! — Ele comemora, saltando do banco para abraçá-la, e só então percebo que Junghee já chegou à altura dela.
Aquele bebê feio que me transformou num irmão mais velho está mesmo crescendo.
E eu quero continuar acompanhando o crescimento de Junghee. Suas descobertas, seus novos sorrisos, destruir quem arrancar novas lágrimas de tristeza.
Eu quero ouvir minha mãe dizendo que me ama. Quero seu carinho, a relação reconstruída entre nós dois.
Quero a amizade de Yoongi, de Hoseok, a agitação de Taehyung.
E quero Jimin.
Eu não quero esquecer absolutamente nada disso. Eu não quero esquecer nada do que vivi com cada um deles, dessa vez. Mais que isso, não quero que eles esqueçam. Não quero que apaguem as lembranças boas que finalmente podem ter comigo.
E eu não vou. Não importa o que eu precise fazer. Eu não vou deixar que eles esqueçam.
Noventa e nove será meu número da sorte. Noventa e nove será minha chance final.
↬ Continua no próximo capítulo.
Olá, nenês! Como vocês estão? ):
Eu imagino que muita gente tá se sentindo sobrecarregado. É muita coisa acontecendo ao mesmo tempo, né?
Hoje eu pedi que evitássemos usar o twitter pra falar sobre a atualização porque ele tá sendo uma fonte de informação e mobilização gigantesca pra tudo isso de tão importante que tá acontecendo. Então, agora, eu prefiro respeitar esse espaço, sabem? claro que cem chances não tem tamanho pra ofuscar o que está acontecendo, tá infinitamente longe de ter, mas eu ainda sinto que é o melhor a ser feito
E por mais que seja difícil acompanhar, por mais que às vezes a gente se sinta emocionalmente esgotado, é importante que a gente se mantenha informado. Precisar de um tempo e tentar prezar o restinho de saúde mental que a gente é completamente válido, é justo com nós mesmos, mas também é importante perceber o que tá acontecendo no mundo. então leiam, falem, aprendam sobre todas as pautas que estão sendo levantadas, porque são importantes numa dimensão que eu não sou capaz de colocar em palavras. vamos cuidar de nós mesmos e cuidar uns dos outros, certo?
Eu espero que, com esse capítulo, eu tenha sido capaz de cuidar um tantinho de vocês. Dar pelo menos um instante de relaxamento, de descanso pra alma
Eu dei uma choradinha escrevendo as cenas com o Junghee, mas eu tô chorando por tudo esses dias então nem sei dizer se a cena ficou realmente emocionante a esse ponto D:
Vocês gostaram? Vamos usar esse parágrafo aqui pra conversar um pouquinho mais sobre o capítulo? Eu realmente quero saber o que vocês acharam!!
Sobre hemisférios, a atualização seria ontem, mas eu realmente tô meio desregulada com tudo que tá acontecendo. então fica pra amanhã, certo? <3
Fiquem bem e fiquem fortes. Eu amo vocês <3
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