Capítulo 2 - O Primeiro Sinal

Ao chegar em casa precisou inventar uma boa mentira sobre o guarda-chuva e sobre estar toda molhada. Sua mãe lhe daria uma enorme bronca se soubesse que deixou o guarda-chuva na calçada para proteger um gato de rua. Ainda mais um gato preto.

A Sra. Riedel não era uma pessoa ruim, mas era muito supersticiosa e Alice aprendeu a lidar com isso. Não concordava, mas tentava relevar. Seu pai, por outro lado, era completamente racionalista. Não acreditava em acaso, destino ou superstição. Achava que tudo isso era “coisa de louco”.

— Não quero saber! Vá agora mesmo para o chuveiro e tome um banho quente! – A Sra. Riedel ordenou assim que viu a filha entrar em casa ensopada.

Alice obedeceu e já no meio do caminho foi retirando as roupas molhadas, jogou a mochila (que por sorte era impermeável) num canto do quarto e se apressou para o banheiro.

Após o banho e o jantar, assistiu o jornal local com seus pais na sala e depois subiu para o quarto para fazer alguns deveres de casa atrasados. Sentou-se à escrivaninha com seus materiais espalhados e começou a luta contra a álgebra. A incansável batalha de X + Y que nunca dá o mesmo resultado registrado no livro.

Colocou uma música bem baixinho no rádio para ajudar a se concentrar, mas o infeliz do radialista anunciou sua atual música favorita (Demons – Imagine Dragons) e ela foi incapaz de ignorar isso. Começou a cantar e tocar usando os lápis e canetas como instrumentos.

Ao final de sua performance, um trovão sacudiu a casa e no mesmo instante a luz acabou. Seu coração ainda estava acelerado pelo susto quando sua mãe entrou no quarto e lhe entregou uma vela, que deixou no chão ao lado da cama.

Não tinha medo do escuro. Não mais. Só que a mãe insistiu tanto que acabou aceitando deixar a pobre vela lá queimando. Deitou na cama após guardar os materiais e ligou o 4G do celular para checar as redes sociais.

A internet não estava muito boa, mas logo recebeu uma mensagem de Liza pelo Whatsapp, perguntando se havia acabado a luz na casa dela também. As duas ficaram conversando até a bateria do celular de Alice acabar.

A garota deixou o aparelho de lado e resolveu finalmente tentar dormir, mas ao fechar os olhos sua mente fez com que se lembrasse repetidas vezes do olhar do gatinho preto em frente ao casarão.

A chuva está tão forte... será que ele está bem? Será que está molhado? Com frio? Com fome?

Não conseguiu parar de pensar no bichano e decidiu que, no dia seguinte, quando estivesse indo encontrar Liza para o colégio, daria uma passada para ver se ele continuava lá.

🐾

Acabou acordando mais cedo que o necessário, assim que a luz voltou. Estava muito adiantada, então resolveu se arrumar um pouco mais e após o banho colocou uma meia branca grossa por causa do frio, a saia vinho do colégio, a blusa branca de mangas compridas, que também fazia parte do uniforme, e uma jaqueta college vinho. Nos pés calçou os ridículos sapatinhos de boneca que faziam parte do uniforme do colégio e prendeu o cabelo num rabo de cavalo.

Fez uma maquiagem leve, porque as normas do colégio não permitiam nem que usassem maquiagem, e depois de tomar café e escovar os dentes, seguiu para a casa de Liza.

No meio do caminho, lembrou-se do casarão e retornou um pouco, parando em frente ao enorme e enferrujado portão de ferro. Como foi que nenhum morador de rua invadiu essa propriedade ainda?

Ficou por um longo tempo observando o jardim mal cuidado do casarão e a imponente construção ao fundo. Possuía três andares e arquitetura colonial. Estava faltando uma boa pintura, mas ainda assim impressionava.

Nenhum sinal do gato preto do dia anterior. Talvez ele simplesmente não more ali. Alice olhou para a tela do celular, buscando ver as horas.

— Miaaau!

— Aah! – E deu um pulo enorme ao sentir os pelos fofos de um gatinho branco se esfregarem em suas pernas.

— Miaaau!

— Oh! É só você. – Sorriu e ajoelhou para brincar com o bichano. — Ei, você por acaso sabe onde está o gato preto que perambulava por aqui ontem?

A garota não pôde deixar de se perguntar o que estava fazendo. É claro que muita gente falava com seus bichinhos de estimação, mas isso não queria dizer que obtivessem qualquer resposta. Por um breve momento, sentiu-se ridícula.

Então a pequena bola de pelos deu um pulinho e ficou parada em frente ao portão enferrujado. Olhava do portão para Alice e vice-versa.

— Ahn... o que você está querendo? Quer entrar? – Aproximou-se do portão e imediatamente o gato pulou para dentro, pelo vão entre as barras.

— Miau! – O bichinho sentou-se de frente para ela e ficou observando-a.

— Hum... tudo bem, então. Vou indo. – E começou a se virar para retomar seu caminho.

— Miaaaau! – O bichano miou ainda mais alto e pareceu bravo.

— O que?!? Não acha que vou entrar aí, não é?

— Miaaaau! – E virou o rabo peludo para ela, dando passos calmos em direção ao casarão e sempre a olhando por sobre o ombro, como se a convidasse a entrar.

— Ah! Esse negócio nem deve estar... – disse consigo mesma enquanto começava a empurrar o portão, que cedeu com facilidade. — Aberto? Está aberto?!?

Seu coração pulou no peito e acelerou. Será que aquele gato estava convidando ela a entrar? E se estivesse mesmo, deveria entrar? Sua curiosidade começou a gritar para que entrasse, mas algo dentro dela ainda estava com receio. Talvez... talvez se fosse só até o jardim.... E o portão estava aberto, afinal!

— Ok. Estou indo. – E passou pelo portão velho, sentindo algo estranho como se um arrepio corresse todo o seu corpo, mas não foi um simples arrepio.

Caminhou atrás do gato branco, que a guiou até a varanda do casarão, onde um guarda-chuva vinho estava repousando tranquilamente.

O gato sentou-se ao lado do guarda-chuva.

O seu guarda chuva. O mesmo que havia deixado com o gato preto no dia anterior.

Agora, um arrepio de verdade correu sua coluna.

🐾

Um agradecimento mais que especial para as primeiras leitoras de CATS - A Sociedade Secreta:

Os CATS estão mandando para vocês seus famosos lambeijos!! 😘😘

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