Capítulo 10 - A seleção

Beatriz e Juan claramente não estavam acostumados com o mundo trouxa. Eles ficavam surpresos com tudo, incluindo a roleta do metrô, que eles pegaram para irem até o terminal rodoviário. Menina riu quando eles ficaram perdidos na baldeação para a linha azul e levaram meia hora para acertarem a rota pois Juan se recusava a pedir informação, mesmo com Beatriz insistindo para eles o fazerem.

Depois, na rodoviária, os três demoraram para achar onde que eram vendias as passagens para Santos. Dentro do ônibus, Beatriz explicou que era a primeira vez que eles se aventuravam nos costumes trouxas, pois ambos vinham de famílias bruxas, e, para aumentar ainda mais a dificuldade, Juan nem era do Brasil. Por isso, ela pediu a Menina para ter paciência com eles.

— Eu também não entendo muito — falou Menina com um sorriso de compreensão. — O que eu sei foi de observar as pessoas fazendo. É a minha primeira vez que pego um ônibus assim.

Beatriz riu.

— Você tinha que ver o ônibus bruxo, então.

A viagem até Santos levou mais de uma hora. Eles desembarcaram em um porto, onde Bia falou que haveria um navio para levar os bruxos da região Sudeste até a escola. Menina não tinha ideia do que aquilo significava, mas não teve tempo para perguntar, pois a visão do porto a deixou sem ar.

Menina nunca vira um navio antes, mas era óbvio que deviam ser aqueles monstros gigantes dentro da água. Ela ouviu Beatriz rindo ao lado dela, mas não prestou muito atenção. Seus olhos não conseguiram se desgrudar dos navios. Ela entraria em um daqueles?

— É gigante! — Exclamou ela.

— São cargueiros trouxas — falou Bia. — Levam produtos para todo o Brasil. Eles ficam nessas caixas gigantes de metal. Os de CasteloBruxo são menores... por fora. Para não chamar atenção no mar, claro.

— Por dentro devem ser o dobro desses aí — concordou Juan. — É a primeira vez que pegarei o navio brasileiro. Dizem que os lanches são melhores.

— Como se você aproveitasse alguma coisa... me disseram que você dorme a viagem inteira.

Juan fez uma careta.

— Talvez porque a nossa viagem demore dez horas, e não sete. É a única forma de matar o tempo. Mas eu não fico só dormindo. Eu estudo também.

— O único momento que não defendo os estudos é esse — Bia revirou os olhos. — É pra gente reencontrar os amigos e colocar o papo em dia, Juan. Vamos ter meses para estudar depois.

— Discordo — falou o garoto. — O momento de "colocar o papo em dia" é na hora da janta. O navio é ótimo para revisar algumas coisas.

Você não tem vida — murmurou Beatriz para si mesma, revirando os olhos.

Eles chegaram na entrada do Porto, que estava fechada para as pessoas. E não era por menos: caminhões e caixas gigantes de metal por todo o porto. Era assustador o tamanho daquelas coisas. Menina olhou para eles, confusa.

— Como vamos embarcar?

— Está vendo aquela caixa? — indagou Juan, apontando para uma a dez metros deles. Menina avistou algumas pessoas com malas se aproximando dela, olhando ao redor como se tivessem tentando ser discretos. — Os trouxas a chamam de contêiner. Esse aí é vazio e foi colocado desde a inauguração do Porto. Os bruxos mantêm ela sempre nova para que nenhum trouxa resolva tirar ela dali. É a nossa passagem.

Menina franziu o cenho, mas não disse nada quando eles se aproximaram.

— Não lhe demos a sua passagem, mas esse é o contêiner CBSU 186756-9. O último dígito é o mais importante, claro. Sua passagem marca que o seu contêiner é o 9, mas pode mudar nos outros anos. Então fique atenta a isso quando vier sozinha.

Menina engoliu em seco, mas assentiu.

— Vamos juntos — continuou Juan. — Esteja sempre atenta com os trouxas do outro lado da cerca. Eles não podem nos ver fazendo isso, ok?

— Fique tranquila, Menina, é bem tranquilo. Apenas siga em frente.

Juan ajeitou as três malas pesadas na entrada do contêiner e começou a entrar sem hesitar. Bia lhe deu um aceno de encorajamento, e Menina obrigou suas pernas a entrarem na escuridão total.

Ela não gostava do escuro. Era assustador. E naquele lugar ela não conseguia sequer enxergar as próprias mãos.

Felizmente, foram necessários apenas alguns passos. Ela ouviu Juan abrindo uma porta e então foram recebidos novamente pelo sol.

Menina não conseguiu evitar soltar um arquejo de surpresa quando se viu de repente em um Porto totalmente diferente! Diversos bruxos de todas as idades andavam de um lado para o outro. Havia um navio da cor verde claro e azul atracado, onde vários bruxos jovens embarcavam e se despediam dos adultos.

Juan ajudou as duas a entregarem as malas para o cargueiro antes de entrarem. Menina ficou um pouco triste por Yebá não poder ficar com ela no navio, mas Juan garantiu que ela ficaria bem.

Eles embarcaram sem dificuldades. Havia um hall de entrada com um carpete das cores do navio, onde alguns grupos de alunos mais velhos conversavam com evidente animação. O hall levava para quatro corredores longos, com diversas portas nas duas paredes.

— É aqui que nos separamos — falou Bia. — O corredor dos primeiristas é aquele. Você pode entrar em qualquer cabine que estiver com uma plaquinha azul. São quatro alunos por cabine, então, quando você estiver com outras três pessoas, vire ela para ficar verde. Significa que está cheia.

— Estaremos no fundo daquele corredor, que é o dos monitores. Pode ir lá se precisar muito de ajuda, mas se você seguir as instruções não terá dificuldades.

— Tudo bem — Menina sorriu fracamente. — Obrigada pela ajuda.

— Boa sorte!

Então Menina foi até o corredor apontado, procurando por uma porta com plaquinha azul. Não precisou andar muito, felizmente, e entrou na primeira que encontrou.

— Olá — ela ouviu uma voz feminina cumprimentar. Ela estava sentada na parte de cima do beliche da direita, que ocupava um terço da cabine. Havia um pequeno corredor que separava os dois.

— Oi — respondeu Menina. Ela olhou para a garota por alguns segundos antes da sua atenção ser atraída pela janela no fim do pequeno corredor. Ela se aproximou, e observou a paisagem. Era muita água. E ela não sabia nadar.

— Que cara surpresa — a garota riu baixinho. Sua risada parecia com a de um violão muito bem afinado. — Nunca havia visto o mar antes?

— O nome disso é mar? — indagou Menina, genuinamente surpresa. Nunca ouvira aquela palavra antes, nem mesmo nos livros que lera. — Pensei que o nome era rio.

— Rio tem água doce. O mar tem sal e é muito maior. Nosso planeta é praticamente mar — ela balançou a cabeça como se ainda não estivesse levando a sério a ignorância de Menina. — Todo mundo sabe disso.

— Bom, agora eu sei — respondeu Menina simplesmente, sem notar o tom maldoso. Ela se virou para a garota. — Qual o seu nome?

— Dominique — respondeu. — E o seu?

— Me... — ela se interrompeu, incerta. Tantos anos na rua desenvolveram um instinto em Menina sobre a natureza das pessoas. Ela sabia dizer quais tinham maior chance de lhe dar alguma coisa, e quais iriam caçoar dela. Dominique com certeza lhe parecia ser a segunda opção. — Júlia.

— Mejúlia? — Ela a observou de cima a baixo por um breve segundo, analisando as roupas claramente velhas de Menina, como se pudesse descobrir o porquê de um nome tão estranho.

— Não. Só Júlia — falou. O nome soava estranho em sua boca.

— Você tem onze anos mesmo? — indagou Dominique, e Menina deu de ombros. Já havia reparado que, provavelmente por causa da falta de comida, seu crescimento não foi nem um pouco adequado. Ela era bem menor do que as outras crianças e mais franzina, mesmo tendo engordado bastante no mês que passou com Tatá no apartamento.

— Sim. Só não cresci muito.

Dominique deu de ombros e assentiu, aceitando a resposta. Ela abriu a boca para falar outra coisa, mas a porta do quarto foi aberta por um garoto franzino.

— Oi..? Posso ficar aqui com vocês?

— Claro — respondeu Menina.

O garoto se chamava Lucas e parecia muito mais seguro do que sua aparência revelava. Não demorou muito para chegar mais um garoto cujo nome Menina esqueceu.

A viagem foi surpreendente agradável, e Menina descobriu que gostava do mar. Dominique reclamou por várias horas antes de pegar no sono, mas ninguém a julgou, pois assim que o navio começou a se mover, a pele da garota adquiriu uma coloração verde e ela realmente parecia muito enjoada.

— Meu irmão diz que só parou de ficar enjoado no quarto ano — falou o garoto de nome desconhecido. — Deviam fazer alguma coisa para reduzir o balanço.

— Eu gostei dele — contou Menina. — Me acalma.

— Eu sou indiferente — falou Lucas. — Mas posso entender Dominique.

Os três conversaram por um tempo. Na verdade, Lucas e o garoto conversaram e Menina apenas ouvia com atenção. Os pais de ambos eram bruxos e eles sabiam muitas coisas sobre a escola e o mundo da magia que deixou Menina de queixo caído.

Depois de horas conversando, os três decidiram sair da cabine para explorar o navio, que era enorme no quesito espaço, mas não haviam muitos lugares para ir. Havia uma sala grande onde vários alunos estavam conversando, mas quase nenhum da idade deles. Então subiram para o deck, que Lucas explicou ser bem menor do que o navio por não ter o feitiço do expandimento. Eles olharam o mar, e Menina ficou impressionada com a mistura do vento e do cheiro salgado. Ela decidiu que aquele era seu lugar favorito do navio.

Então permaneceram lá até ficarem com sono o suficiente para voltarem para a cabine. Menina usou o embalo do navio para dormir rapidamente, apesar da cabeça girar com o número de novas informações que descobrira com os dois garotos. Ela estava ansiosa para chegar em CasteloBruxo, e dormir era a forma mais rápida de passar o tempo.

— Ei, acorde, Júlia — Chamou Lucas, mas Menina, é claro não acordou. Por um longo momento, se esqueceu que as pessoas agora a chamariam assim. Precisou que ele a sacudisse para que acordasse e se colocasse em pé. — Estamos quase chegando. É melhor vestirmos nossos uniformes.

O coração dela parou algumas batidas. O uniforme!

Ela pegou a roupa da mala de mão e correu para o banheiro da cabine, ansiosa. Ela já o usara por alguns poucos minutos em casa, claro. Mas ficara com medo de sujá-lo e então guardou. Era igualzinho aos de Juan e Beatriz no dia em que eles se conheceram: a saia, camisa social com o brasão da escola, a capa com abertura para os braços... e a gravata verde com o brasão também.

Era a primeira vez que usava alguma roupa que não fora usada por ninguém antes. E a sensação da roupa nova era indescritível. Por um breve momento, ela se perguntou se Beatriz e Juan haviam usado um pouco do próprio dinheiro para não terem que comprar roupas de segunda mão para ela.

Bom, mesmo que fosse de segunda mão, Menina ficaria feliz. As roupas que sempre usou eram no mínimo de "quarta mão". Mas aquele uniforme... ele era de primeira!

Ela se sentia uma princesa.

Quando voltou, todos já estavam vestidos. Dominique usava seu uniforme como se fosse apenas mais uma roupa. Na verdade, percebeu Menina, apenas ela estava realmente animada com o uniforme. Ela se obrigou a parecer menos feliz. Lucas se ofereceu para a ajudar com a gravata, que Menina não conseguiu colocar de jeito nenhum. Ele a ensinou a fazer sozinha também.

— Escureceu — reparou Menina depois que Lucas se afastou.

— Sim. Estamos muito perto, então.

Ele mal acabara de falar quando ouviram uma longa buzina. Perceberam também que estavam diminuindo a velocidade.

— Alunos do primeiro ano! — era uma voz bem mais velha. — Formem uma fila no corredor! Alunos do primeiro ano, formem uma fila no corredor!

Os quatro saltaram de seus beliches e fizeram o ordenado. Fora da cabine era uma confusão de vozes animadas e alunos da idade de Menina. Todos se entreolhavam, curiosos, procurando possíveis pessoas para fazer amizade.

Menina não pensou muito sobre isso. Duvidava que alguém iria querer fazer amizade com alguém como ela: que não entendia nada do mundo da magia e que sequer atendia por um nome de verdade. Graças aos seus instintos, sabia que Lucas e o garoto não ficariam com ela depois que saíssem do navio. Dominique talvez, mas Menina não tinha como ter certeza, pois mal a vira acordada, de tanto tempo que passou enjoada.

O bruxo que chamou os alunos se apresentou sendo Oscar Murilis, o zelador de CasteloBruxo. Alguns monitores estavam atrás dele, incluindo Beatriz. Mas Juan não estava ao seu lado. Menina imaginou que era porque Juan deveria ajudar o navio uruguaio, não brasileiro.

Quando todos ficaram em silêncio, Murilis continuou:

— Venham comigo. Façam tudo o que os monitores disserem para vocês. Nós vamos desembarcar aqui. Em terra haverá carroças para vocês subirem. Cada uma aguenta quatro pessoas, então mantenham os grupos das cabines.

Devagar, eles foram guiados em filas até a saída. Menina ouviu alguns suspiros de admiração dos que estavam na frente e ela se empertigou para dar uma espiada.

Ela arquejou de susto.

Lá fora, presos às carroças estavam... Menina balançou a cabeça para clarear sua mente. Ela vira aqueles seres no seu livro de zoologia. Eram...

— Mulas sem cabeça — falou Lucas baixinho. — Uau. Nunca tinha visto uma antes.

É verdade. Menina agora se recordava de ter se encantado com a descrição daqueles animais, mas... pessoalmente era bem assustador. Eram como cavalos, só que no lugar das cabeças, havia uma labareda de fogo.

— A gente... vai ter que ficar perto deles? — perguntou Menina, sentindo sua voz fraquejar.

— É seguro — garantiu Lucas, que se mostrou extremamente paciente para as perguntas de Menina sobre o mundo da magia. — Eles foram domesticados há séculos. Não tem do que ter medo.

— Obviamente, só evite ficar muito perto da cabeça — completou o outro garoto com uma risadinha irônica.

— Ela nem deve chegar na metade da altura das mulas — replicou Dominique. — Não vai precisar se preocupar com as cabeças por uns bons anos.

— Que cruel — falou Lucas enquanto tentava segurar o riso.

Menina olhou para os próprios pés. Ela sempre gostou de ser pequena, pois lhe garantia maior velocidade e melhores lugares para se esconder. Mas, naquele momento, ela desejou ser um pouco maior.

Ela seguiu o grupo e subiu na carroça, que chacoalhava de um jeito bruto conforme andava pelo terreno irregular. Mas, quando o grupo de carroças entrou mais profundamente na floresta e tudo começou a ficar escuro e assustador, Menina se esqueceu de sentir medo: milhares de pontinhos amarelos surgiram ao redor deles, no ar, no chão e nas árvores. Era um brilho etéreo tão bonito e acolhedor que, por um momento, ela se esqueceu do susto inicial com as mulas-sem-cabeça.

— São fadalumes — informou Lucas. — Nunca vi tantas em um só lugar antes!

Nas carroças ao redor, Menina ouviu suspiros de admiração.

— Olha que mãozinhas pequenas!

— Caramba, que lindas!

— Meus pais nunca iriam acreditar!

As mulas-sem-cabeça continuaram o percurso tranquilamente. Não era necessário o uso de tochas pois, obviamente, elas já iluminavam a floresta. Menina nunca havia estado em uma antes, mas aquelas árvores aglomeradas lembravam vagamente os bosques de São Paulo. ... talvez um bocado mais densas e assustadoras.

Ela se encolheu involuntariamente com o pensamento, mas não deixou de observar as fadas ao redor. As carroças passaram por um riacho, onde Menina percebeu movimentos na água. Seriam aqueles os botos rosas que ela lera sobre no livro de zoologia? Ou temíveis Ipupiaras? Eles ficavam em rios, de qualquer forma?

Podiam ser apenas peixes também, e ela torceu para ser essa a opção.

A densidade das árvores começou a diminuir, e Menina fora tomada por um feixe de luz branca vindo da lua que penetrou por entre elas, como se desse boas-vindas aos novos alunos que finalmente estavam a poucos metros de CasteloBruxo.

Menina ouviu alguns soluços de admiração e surpresa vindos das carroças mais na frente. Seu coração se apertou e Menina se esqueceu como se respirava assim que seus olhos viram o castelo.

Era gigante! Maior do que qualquer prédio que tivesse visto! Era uma grande pirâmide dourada cuja ponta era plana para que a torre ainda mais dourada pudesse ficar em pé com suas colunas. A pirâmide maior estava ligada a diversas outras menores com a mesma ponta plana. Como era que estava no livro de Menina....?

Pirâmides maias. Sim. O castelo fora construído por diversos bruxos de toda a américa latina, fora o que ela lera, há muitos e muitos anos atrás, quando uma sociedade bruxa, chamada maias existiam ainda. Eles foram descobertos por trouxas e tiveram que debandar e abandonar a cidade deles.

Menina ainda não entendia por que eles simplesmente fizeram o que os trouxas mandaram. Se ela soubesse que era bruxa há mais tempo, não teria fugido tanto em sua vida.

Ela ouviu gritos e aplausos vindos de uma grande área aberta na frente da escola, onde estava uma fogueira enorme com muitos alunos em volta, cercados por algumas pedras retas.

As labaredas de fogo das mulas-sem-cabeça aumentaram como em resposta aos aplausos.

Menina sentiu a mudança do terreno: a carroça parou de sacolejar tanto e agora que estavam na grama baixa, quase não fazia barulho.

Então, ouviu música. E muitas conversas. Quando já conseguia distinguir os rostos, a carroça parou.

— Alunos do primeiro ano, saiam das carroças DEVAGAR e com CUIDADO! — o senhor Murilis gritou.

Dominique foi a primeira a pular, seguida por Lucas e o garoto que até agora Menina não decorou o nome. Ela foi a última a pular na grama macia e verde, e se apressou para alcançar os colegas, que já caminhavam em direção a um grupo maior de primeirstas que se formava.

Quando todos estavam reunidos, o senhor Murilis se posicionou na frente de todos, pedindo para que o seguissem. Quando eles passaram pelo círculo de pedras e se aproximaram do fogo, a música subitamente parou e as conversas se tornaram murmúrios.

O grupo parou na frente de uma mulher idosa que usava um chapéu pontudo verde. Ela era uma daquelas pessoas que daria alguns trocados para Menina, mas, mesmo assim, a pequena engoliu em seco. Os bruxos primeiristas dos outros países também se aproximaram e se juntaram ao grupo de Menina.

— Sejam muito bem-vindos à CasteloBruxo! — ela falou, e sua voz era a mais doce e a mais aveludada que Menina já ouvira em toda a sua vida. — Eu sou Olinda Souza, a vice-diretora. Nós esperamos que vocês gostem daqui e que façam vários amigos. Nós nos consideramos uma grande família, para falar a verdade. Hoje vocês serão selecionados para a suas tribos. Vocês podem ir para três: Bellatorum, Callidum ou Fugere — houve alguns poucos segundos de aplausos entre um nome e o outro. — E os alunos de suas tribos serão como o seu pilar aqui em CasteloBruxo. Vocês dormirão, estudarão e comerão na mesa de sua casa e serão com eles que passarão maior tempo. Mas não deixe que isso te impeça a fazer amizade com pessoas de outras tribos.

Ela olhou profundamente para os alunos mais velhos ao dizer aquilo.

— Quebrem alguma regra e perderão pontos para a sua tribo. Façam algo bom e receberão pontos por isso. No final do ano, a casa que tiver maior pontuação ganhará a competição. E é bom que levem isso a sério: todos daqui são muito competitivos.

Uma onda de aplausos e gritos tomou conta dos alunos mais velhos. Menina não se preocupou com aquilo. Pretendia passar o ano despercebida.

— Vou chamar vocês por nome. Quando eu disser o seu, quero que se aproxime da chama da verdade — ela apontou para a fogueira no centro do pátio. — e cuspam ou coloquem um fio de cabelo nela. Assim, a chama lhe dirá para onde ir.

Com um sorriso doce, Olinda olhou para cada rosto ali presente antes de continuar:

— Bellatorum é a casa dos guerreiros, pessoas criativas, entusiasmadas e de espírito-livre — gritos animados. — As pessoas dessa tribo usam laranja. Já Callidum é cheio de bruxos com força de vontade, confiança e astúcia. São naturalmente defensores e vocês usarão a cor marrom.

Menina olhou para os mais velhos para tentar ver as cores. Os uniformes eram todos verdes, é claro. Mas ela notou que o forro das capas eram de cores diferentes. Havia alguns alunos usando o laranja de Bellatorum, o marrom de Callidum e o violeta de....

— Fugere é a casa dos prestativos, organizados e que prezam inteligência acima de tudo. A cor desses alunos é o violeta.

A senhora Olinda colocou as mãos na frente do corpo e sorriu com orgulho.

— Como podem ver, cada tribo tem sua qualidade e todos são igualmente especiais. A fogueira é poderosa e não costuma errar. Por isso, acreditem nela e sintam-se em casa — ela pegou um pergaminho com a lista de nomes. — Vamos começar: Diego Ortiz.

Um garoto de cabelos encaracolados deu alguns passos à frente. Tímido, ele caminhou até a fogueira e tirou um fio de cabelo para jogar no fogo.

Ele deu alguns passos para trás quando a chama cresceu e mostrou um grande lobo de fogo. Menina sabia o nome dele. Era o Lobo Guará. Ela piscou. Não fazia ideia de como sabia daquela informação.

Várias pessoas aplaudiram antes da imagem mudar para uma vitória-régia e logo em seguida para um coelho. Diego correu até os alunos mais velhos com capas marrons.

— Um coelho? — Menina sussurrou para ela mesma.

— É o patrono dele — explicou Lucas. — E a vitória-regia é o símbolo da tribo dele junto com o lobo.

— O que é patrono?

— Um feitiço de proteção. Para...

— Dominique Dominguez.

Menina acompanhou os passos confiantes de Dominique. Estava curiosa para ver em qual casa ela cairia.

Ela jogou um fio de cabelo também e a chama cresceu até virar uma coruja. Novamente, gritos antes que a imagem mudasse para uma espinheira-santa e depois para uma águia.

Alguns nomes a mais foram chamados. Menina se surpreendia todas as vezes com aquela chama crescendo e mudando. Aos poucos, o grupo de primeiristas diminuía.

— Júlia Salmazi — Menina precisou de alguns segundos para processar que era a sua vez. Ela andou até a fogueira e tirou um fio de cabelo. Seu braço se aqueceu quando ela o aproximou da chama e soltou seu cabelo, que pareceu ser sugado pelo fogo.

A imagem de uma onça-pintada apareceu. Bellatorum, então, seria. Fazia sentido, no entanto, pois dava para uma menina de rua ser alguma coisa além de um espírito-livre? Mas e as outras qualidades? Menina não conseguia se ver em nenhuma delas.

A imagem mudou para o já conhecido cacto-venenoso e então um animalzinho engraçado que, de alguma forma, Menina sabia ser uma raposa. Seu patrono.

Ela se juntou ao grupo com capas laranjas, que a cumprimentaram com tapinhas no ombro e risadas. Menina tentou sorrir também, mas era tanta gente ao seu redor que ela inconscientemente ficou na defensiva.

— Thomas Ruhland — silêncio. Os alunos se entreolharam. — Thomas Ruhland? Não? Bom, ent...

— AH! — Um menino exclamou, alto demais, no meio dos primeiristas. Ele levantou o dedão e o dedinho da mão direita e foi até a fogueira. Ele preferiu cuspir e a chama tomou a forma da onça-pintada, do cacto-venenoso e então de um golfinho. Ou um boto. Menina não sabia diferenciar. Ele se aproximou de onde ela estava e foi recebido da mesma forma. Ele parecia muito mais aéreo do que ela, e Menina se perguntou se ele estava se sentindo bem.

O resto da seleção foi tranquila e ao mesmo tempo emocionante. Menina se viu torcendo para outras pessoas entrarem em Bellatorum e passou a bater palmas com os novos selecionados.

Quando o último nome foi chamado e o aluno, João Miguel, de Callidum se juntou à sua tribo, Olinda se colocou ao lado da fogueira.

— Novamente, sejam muito bem-vindos. Espero que a adaptação de vocês seja rápida e tranquila. A chama da verdade nunca se apagará, e vocês poderão vir pedir conselhos para ela a qualquer momento. Basta fazer a mesma coisa que fizeram aqui hoje e fazerem sua pergunta. Ela nem sempre é muito clara, mas não podemos esperar mais da magia do boitatá — ela olhou para a chama. — Agora, vamos festejar!


[dá uma estrelinha quem queria ser selecionado para uma tribo]

Ufa! Demorei pra postar, mas... que capítulo longuinho, hein? PORÉÉÉÉM agora temos uma tribo e um começo de ano letivo. Quais são as suas espectativas para essa nova etapa na vida da Menina? Já viram potenciais amigos? 

Eu estou ansiosa para ver esse desenrolar e eu espero que vocês também! Até mais, bruxõesss.

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