6 - O Âmago Vivaz!
Juan e Beatriz chegaram no ponto logo após o meio-dia. Eles cumprimentaram Menina e Tatá e explicaram como as coisas funcionariam:
— A escola arcará com os custos de todos os materiais dela, mas não podemos comprar nada com esse dinheiro que não esteja na lista. Você está com ela? — Menina ergueu a carta que eles lhe entregaram no dia anterior. Ela lera algumas vezes, mas não conseguia entender a maioria das coisas. O que era um caldeirão? E para que serviria uma balança de latão? — Ótimo. Iremos com vocês até o Âmago Vivaz. Não se separem da gente. Lá pode ser um pouco... cheio e assustador. Mas, caso se percam, o nosso ponto de encontro vai ser a Viela Soturna.
Tanto Menina quanto Tatá não entenderam o significado daquela palavra, mas Beatriz não percebeu e logo emendou a fala do amigo:
— Não se preocupem. O lugar não condiz com o significado do nome.
— É, lá bem tranquilo — concordou Juan. Ele estendeu uma mão para as moças. — Vamos? Se começarmos logo, poderemos terminar tudo antes de escurecer.
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Era nítido que Juan e Beatriz não estavam acostumados com a Avenida Paulista. Eles andavam olhando tudo com uma curiosidade que Menina nunca vira antes e volta e meia reclamavam do calor e de como as pessoas pareciam sempre estar apressadas.
Menina já passara por ali várias vezes e nunca encontrou nenhum caldeirão para vender. Ela olhava para todos os lados como se estivesse vendo tudo pela primeira vez, perguntando-se onde ficaria o tal do Âmago Vivaz.
Então Juan virou para a esquerda e entrou em uma galeria que possuía diversas livrarias. Menina já passara por ali algumas vezes, mas nunca entrara de fato. Os donos das livrarias a expulsariam de qualquer forma. Tatá parecia receosa com o lugar também, como se a qualquer momento pudesse ser expulsa de lá.
Juan as guiou para uma rampa em espiral, que era construída em volta de uma espécie de jardim interno, rodeando um gazebo de madeira redondo. Havia uma estátua um animal que Menina não conseguiu realmente identificar, mas que tinha uma boca aberta e o que parecia ser... cabelo ao redor de seu pescoço?
— Que animal é esse? — indagou Menina baixinho para Tatá.
— Um leão — respondeu a amiga simplesmente. Ela olhava para o lugar desconfiada.
Não haviam muitas pessoas, no entanto. Para falar a verdade, com exceção deles, a única pessoa ali era um recepcionista atrás de um balcão, que sequer se deu ao trabalho de olhar para eles.
Bianca contornou o jardim rodeado por flores coloridas. Menina conseguiu reconhecer as tulipas, rosas, margaridas, lavandas e lírios. Ela gostava de flores. Haviam muitas floriculturas nas ruas. Menina sempre se empertigava para ler os nomes e dar uma fungada forte para sentir o cheiro doce antes de a expulsarem.
Eles pararam no meio de duas estátuas de mulheres: a primeira segurava um ganso nos braços, e a outra, alguns metros à frente, estava nua e cobria os seios com as mãos. Havia um caminho de terra batida entre as duas que ia até o gazebo. Menina achou as imagens engraçadas.
Juan foi o primeiro a andar pelo caminho sem dizer uma palavra sequer. Menina não entendeu direito o porquê, mas, assim que o garoto passou por entre as estátuas, ele sumiu!
Tatá piscou e sua boca abriu, pasma.
— Pra onde ele foi? — perguntou ela.
— Ora! Para o âmago vivaz, é claro — respondeu Bianca como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Ou você achou que ele estaria a vista para qualquer trouxa? Vamos, estarei logo atrás de vocês.
Tatá e Menina trocaram olhares entre si, em uma comunicação silenciosa de encorajamento. Elas respiraram fundo juntas, e deram três passos para frente, atravessando as duas estátuas.
De repente, o sol atingiu suas cabeças.
Menina piscou, tentando processar a informação. Em um momento, eles estavam no jardim e em outro estavam em uma rua lotada de pessoas vestidas com capas e roupas coloridas, no meio de diversas lojas que menina nunca ouvira falar. Uma loja que aparentemente vendia aparelhos que tocavam músicas atraiu a atenção total de Tatá, que passou a tentar entender o que as letras diziam.
Era num idioma que a velha senhora não conseguia entender, mas que em pouco tempo ela já estava sussurrando algumas poucas palavras que processara.
Porém, havia uma outra bem barulhenta que particularmente chamou a atenção de Menina: era uma loja cheia de araras. Araras azuis, verdes, vermelhas... algumas até tinham várias cores. Ela se pegou admirando as aves por um tempo, só saindo do transe quando viu que estava ficando para trás.
— Deixaremos a sua arara mais para o final — disse Juan quando Menina os alcançou novamente. — CasteloBruxo permite levar três tipos de animais: araras, ratos ou rãs. Mas não recomendo esse último. Elas ficam fugindo e alguns alunos têm nojo... — Beatriz deu um soco nas costas do amigo, que deu de ombros, como se não tivesse sentido nada. — Mas acho que a sua escolha está óbvia.
Menina piscou. Um bichinho de estimação? Para ela?
— Fora que araras enviam cartas — completou Bia. — Assim você sempre vai poder estar em contato com Tatá.
A garota olhou para a amiga. Ela sabia que Tatá não sabia ler, mas ela sempre poderia desenhar. Mas fora isso, ela não teria para quem enviar nada. Por isso, ficou pensativa com a sua futura escolha.
— Bom, vamos nos dividir. Eu também preciso comprar algumas coisas pra esse ano que me esqueci. Bia, poderia ir com as duas no Capas e Contracapas? Podemos nos encontrar na senhora Alvarez quando terminar.
— Tudo bem — concordou a morena. Ela se virou para as duas. — Fiquem por perto. Aqui está bem mais cheio do que eu esperava.
Elas caminharam juntas pela rua lotada. Tatá estava nitidamente em choque com o que via: ela olhava para todos olhos lados como se estivesse em um sonho. As pessoas que passavam por ela pareciam que tinham dezesseis olhos e quatro bocas, tamanho era o espanto da mais velha.
Então Bia entrou em uma loja bem grande com uma placa escrita "Capas e Contracapas" em letras de madeira entalhada, que tocou um sino quando abriram a porta. Menina soltou um soluço de espanto ao ver os livros empilhados até o teto. Tinham livros da grossura da cabeça dela e alguns mais finos do que seu dedo. Alguns tinham capas de couro e outros eram tão velhos que nem capa tinham. Mas o que mais impressionou Menina era que alguns dos livros estavam voando, com as páginas se fazendo de asas enquanto se guardavam em seus lugares. Até mesmo Tatá, que não sabia ler, estava olhando admirada para os montes.
Bia comprou os livros de Menina, que, diga-se de passagem, eram bem grossinhos. Ela nunca lera tantos livros assim. No máximo alguns finos que pegara em caixas de doações públicas em algumas praças de São Paulo. Ela se perguntou se daria conta de ler tanto assim.
Enquanto a dona da loja empacotava os livros, Bia estendeu algumas moedas e mostrou à Menina. Ela disse:
— Essa maiorzinha aqui é 1 galeão. Ela equivale a por volta de 50 reais. Essa aqui é 1 sicle, que é quase 3 reais. E por fim esse aqui é um nuque, que é o mesmo que 10 centavos no dinheiro trouxa. 493 nuques equivalem a um galeão, 29 nuques equivalem a 1 sicle e 17 sicles equivalem a 1 galeão — ela torceu o nariz. — Os preços tão estranhos, mas é por causa do dólar, né? Bom, isso não importa muito para nós, já que temos a mesma moeda em todo o mundo. Só é ruim para os trouxas que vão fazer o câmbio. Mas logo você se acostuma.
A cabeça de menina girou com as contas. Ela nem tentou entender perfeitamente e apenas se preocupou em decorar os nomes das moedas, para ninguém poder lhe passar a perna.
— Agora vamos ver as suas roupas — disse Bia, entregando uma parte das sacolas para Menina. Ela olhou brevemente para os sapatos da garota, furados e um pé diferente do outro. — E talvez uns dois pares de sapato também?
O coração de Menina acelerou um pouco. Ela realmente iria usar algo que não fosse furado ou que ficasse largo demais nela? Ela teria finalmente roupas próprias para chamar de suas? Ela não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Aquilo só poderia ser um sonho! Mas, se fosse, ela não queria acordar nunca.
A loja de roupas que Bia as levou se chamava Roupas Alvarez, e tinha um letreiro em latão pintado de verde. Elas entraram na loja e logo foram recebidas por uma mulher bem alta e magra. Ela usava uma roupa que Menina julgou ser chique para os padrões bruxos e que tinha um sorriso muito bonito.
— Bem-vindas, eu sou a senhora Alvarez. Você vai pra CasteloBruxo, querida? — Indagou ela e Menina assentiu. — Perfeito. Suba naquele banquinho, por favor.
Menina lançou um olhar rápido para Tatá, que apenas assentiu e estendeu a mão para pegar as sacolas dela. Hesitante, ela subiu no pequeno banco de madeira. No mesmo instante, uma fita métrica começou a tirar suas medidas. Sozinha. Um lápis e um papel iam anotando as informações que a fita passava para elas silenciosamente.
A senhora Alvarez então colocou nela uma veste comprida em Menina e começou a marcar a bainha. A roupa tinha a mesma cor que a de Beatriz e Menina se perguntou se a dela seria assim também. Provavelmente sim, já que aquele deveria ser o uniforme da escola.
— Pronto. Espere uns minutos que suas roupas estarão prontas.
Menina assentiu com o coração quase pulando para fora do peito e desceu do banquinho. Ela foi até a porta da loja, onde Juan, que havia acabado de chegar, lhe estendeu um lanche de presunto que comprou para as três. Tatá agradeceu e comeu tudo em poucos segundos. Menina decidiu que iria comer um pouco devagar, para aproveitar mais. Mesmo assim, ela deu um pedaço do seu lanche para a amiga quando Juan e Bia não estavam olhando.
A senhora Alvarez lhe entregou as roupas dentro de uma sacola e menina não conseguiu evitar de espiar. Nossa! Como eram limpas e novas! Ela mal podia esperar para experimentá-las. Inclusive, quando é que experimentaria? A carta dissera que as aulas começavam em setembro, mas Menina não fazia ideia do mês em que estavam. Timidamente, ela se virou para Bia e perguntou.
— Estamos em junho. Falta um mês ainda para as aulas começarem, se é por isso que pergunta.
— Ah — ela assentiu, não conseguindo evitar de lançar um olhar para Tatá ao seu lado. Ao mesmo tempo que estava ansiosa para tudo aquilo, ela também estava triste por ter que deixar a amiga para trás. Elas nunca se separaram nenhuma vez desde que se conheceram e agora essa ideia lhe assustava.
Entretanto, ela parecia tão fascinada com o Âmago Vivaz que Menina não arriscou dizer algo durante o resto das compras.
Porém, quando eles chegaram na loja de Araras, Tatá se pronunciou:
— Onde é que tudo isso vai ficar? — ela apontou para as várias sacolas nas mãos dos três. — Se ficar na rua, a gente vai ser roubada. Ainda mais carregando uma arara.
Juan e Bia trocaram um olhar rápido.
— Tatá é sua responsável, mesmo isso não estando registrado em papéis. E você volta para São Paulo nas férias. Em casos assim, vocês não ficam na rua.
— Como assim?
— Seu direito é ter um lar para voltar nas férias. A Escola providenciará isso. E é lá que as suas coisas vão ficar até o início das aulas.
— Um... lar? — Menina olhou para Tatá. Mais uma casa na assistência social?
— Depois conversamos sobre isso.
— Mas...
Porém Menina não conseguiu continuar quando entrou na loja barulhenta. Seu queixo caiu e ela esqueceu o que iria falar. Aquele era o lugar mais colorido que ela já vira em toda a vida! Algumas araras estavam soltas na loja, enquanto que outras dormiam tranquilamente em suas gaiolas. As crianças da idade de Menina também tinham um olhar parecido. Ela se aproximou de uma que dormia. A ave grasnou baixinho ao perceber que alguém a encarava. Era muito linda: as penas azuis brilhantes, com o papo amarelo. Menina sentiu vontade de tocá-la, mas se conteve.
— As araras têm o mesmo preço, então pode escolher qualquer uma. Se quiser um rato... eles ficam no fundo da loja — falou Juan às suas costas.
Menina olhou em volta. Eram tantas que ela precisaria de um dia inteiro para ver cada uma delas. Ela não queria demorar muito, no entanto. Já estavam no Âmago Vivaz a tarde inteira e ela sentia que estava exaurindo a paciência de Juan e Bia. Talvez um rato seja mais fácil de escolher, pensou Menina, girando sobre os calcanhares para se virar, mas parou de repente quando viu Tatá.
Ela estava... com uma arara no braço. Acariciando-a com uma ternura que Menina jamais vira nela. Ela se aproximou. Era uma arara totalmente dourada, com as asas em um tom de amarelo mais claro. O bico era branco e ela estava tão... calma no braço de Tatá que Menina soube que era aquela que queria.
Se não poderia levar a amiga consigo, então levaria algo que ela escolhera.
Ela chamou Bia e Juan e disse que seria aquela arara. Eles sorriram ao perceberem o porquê da escolha.
— É uma fêmea — informou Juan. — Qual vai ser o nome?
Menina pensou por alguns segundos. Ela não era muito boa com nomes. Não conhecia muitos deles, para falar a verdade. Mas chama-la simplesmente de "arara" não parecia muito certo.
— Eu tava pensando em chamar ela de Tatá, porque...
Mas a amiga já estava negando com a cabeça enfaticamente.
— Você já escolheu o bicho por minha causa, Menina. E ela é muito bonita pra levar o meu nome.
— Então... então...
— Se quer uma sugestão, chame ela de Yebá — falou a velha, o que fez todos a encararem com curiosidade. — Ouvi no refrão de uma música — explicou ela, dando de ombros. — Achei bonito.
— Yebá Bëlo é uma deusa da mitologia de vocês — explicou Juan, assentindo. — Você deve ter ouvido uma cantiga tradicional para ter ouvido esse nome.
Tatá deu de ombros, mas observou melhor a arara.
— Eu gostei desse nome — anunciou Menina por fim. Ela olhou para sua nova arara e sorriu docemente. — Olá, Yebá.
Como se fosse em resposta, a arara grasniu feliz, e pulou no braço da nova dona. Menina riu.
— Acho que ela gostou!
— Araras são muito inteligentes, Menina — falou Bia, sorrindo também. — Trate ela com amor e será muito bem recompensada.
Apesar de saber que seria uma grande responsabilidade, ela sorriu. Nunca tivera nada para cuidar além de si mesma. Ela tinha certeza que Yebá seria uma companheira insubstituível no futuro.
Apenas se ressentia que teria que ficar longe da ave por um mês inteiro...
O dono da loja trouxe a gaiola de Yebá e ensinou Menina a como colocar comida e lhe passou as instruções de horários e dieta. Ela se esforçou para memorizar tudo e não perder uma palavra sequer do que o homem falara.
— Bom, com isso falta apenas sua varinha — comentou Juan assim que saíram da loja. A gaiola de Yebá era praticamente do tamanho das pernas de Menina, e ela tinha dificuldades para mantê-la em uma altura que não arrastasse no chão. Por isso, Tatá entregou para ela as sacolas de livros que estava segurando e se ofereceu para levar a gaiola. — Como economizamos bem nos livros, podemos comprar sua varinha no Quarâni.
— Não há lugar melhor! — completou Bia com um sorriso.
Menina não conseguiu sequer retribuir. Uma varinha mágica? Assim como a que Bia sacara no banheiro?! Era a coisa que ela mais estava ansiosa para ter.
Eles desceram algumas ruas e viraram em um beco um pouco menos movimentado. A loja de Quarâni era antiga, com paredes descascadas que revelavam uma madeira vermelha.
— Eu não ficaria surpresa se alguém me dissesse que essa loja estava aqui antes mesmo do Âmago Vivaz existir... — sussurrou Bia para Menina quando Juan passou pela portinha estreita para entrar no estabelecimento.
A única coisa que conseguiam ver eram caixas e um balcão marrom.
Os quatro tiveram que se espremer para caberem dentro da loja. Yebá piou, anunciando a presença deles, e um homem de aparência muito velha apareceu por entre as prateleiras de caixas.
— Oh! — ele exclamou quando avistou os quatro. Com a cabeça trêmula, ele observou os materiais de Menina por alguns segundos antes de dizer: — Parece que alguém vai ir para o primeiro ano, não é mesmo? — seus olhos cansados pousaram em Menina. — Primeira varinha, suponho?
— Sim...
Quarâni se virou e, muito devagar, começou a caminhar por entre as prateleiras.
— Você é destra ou canhota?
— Eu... eu uso mais a mão direita — falou Menina.
Ele então pegou uma das caixas com cuidado e voltou até o balcão.
— Tente esta. Madeira de castanheira com núcleo de pelo de unicórnio. 22 centímetros.
Era uma varinha muito bonita. As mãos de Menina tremeram quando ela pegou no objeto. Quase que imediatamente, ela sentiu uma vibração desconfortável na mão e antes mesmo que pudesse terminar de erguê-la, os óculos de Quarâni voaram do rosto dele. Ela largou a varinha imediatamente.
— De..desculpa!
O senhor nem parecia ter ouvido conforme pegava os óculos do chão e guardava a varinha.
— Definitivamente não essa... Então que tal.. ah! Experimente uma de azevinho com pena de ararinha azul. 32 centímetros.
Menina experimentou. Uma cadeira voou pela sala e quase atingiu Juan na cabeça, se não fosse pelo reflexo dele em se agachar na hora.
A garota largou a varinha na caixa novamente e recuou alguns passos. Aquilo era muito perigoso! Bia pareceu ler os pensamentos dela:
— Isso é normal. Quando eu vim comprar a minha, quase destruí a loja. Experimentei uma varinha de espinheiro-negro que colocou fogo na capa do senhor Quarâni — ela estremeceu com a lembrança.
— Mas por que essas coisas estão acontecendo?
— É a varinha que escolhe o bruxo — explicou ela. — E como elas não têm boca pra falar... bom, é assim que dizem que não te aprovaram.
— E... — ela olhou em volta. Se cada uma daquelas caixas tivessem uma varinha, as possibilidades eram infinitas! Ela não queria passar o próximo mês testando varinhas. — Demora muito pra alguma me escolher? — E se nenhuma a escolhesse? E se ela não fosse uma bruxa e todas as varinhas a rejeitassem?
— Às vezes sim — sussurrou Juan quando o senhor Quarâni surgiu do meio de duas prateleiras trazendo consigo uma nova caixa. — Mas ele tem uma boa intuição. Não deve demorar mais do que uma hora.
Uma nova varinha lhe foi estendida. Menina engoliu em seco antes de pegá-la. Ela mexeu um pouco nela, mas nada aconteceu daquela vez.
— Não, não, não. Errada de novo — Quarâni tomou a varinha da mão dela e foi buscar outra.
Testaram tantas varinhas que Menina perdeu a conta. Ela olhava nervosa para os lados sempre que Quarâni pegava uma varinha nova. O coração de Menina estava praticamente galopando em seu peito, até que ele tirou uma varinha de um tom dourado da caixa.
— Pereira com núcleo de cabelo de Caipora... 27 centímetros — ele observou com curiosidade Menina tirar a varinha da caixa. — Uma combinação muito interessante e controversa, se me permite dizer.
Por um momento, nada aconteceu, para o alívio de Menina, que não queria destruir mais nada da loja do senhor Quarâni. Todos observaram curiosos Menina dar deu uma leve sacudida no objeto.
E então... os cabelos dela se levantaram e a ponta da varinha brilhou em um tom avermelhado. Dera certo! Menina estava fazendo magia! E uma varinha finalmente a escolhera. Se ainda haviam quaisquer dúvidas de que ela era realmente uma bruxa, elas se esvaíram completamente naquele momento.
— Oh! Muito bom! — exclamou Bia quando a varinha voltou ao normal e os cabelos de Menina ficaram para baixo.
Ela olhou para frente, observando o senhor Quarâni guardar a caixa da varinha em uma sacola. Ele estava com um olhar intrigado, pensativo, quando entregou a sacola para a garota.
— Menina... — Sussurrou ele, mais para si mesmo do que para ela. Parecia que estava encravando o nome dela em sua mente. — Estou curioso para saber que tipo de bruxa irá se tornar... A madeira de sua varinha tem uma natureza muito pacífica, sabe. Nunca vi um bruxo das trevas sequer que possuiu uma varinha de pereira... Mas o cabelo de Caipora, no entanto... — Ele não se deixou completar. Balançou os cabelos brancos para afastar os questionamentos. — Curioso... curioso...
Pagaram por fim cinco galeões pela varinha e saíram da loja. Menina não notou que estava prendendo a respiração até que o ar puro tocou seu rosto. Sentira medo das palavras do velho e ainda mais de sua curiosidade. O que significava ter o cabelo de Caipora em sua varinha? Ela sequer sabia o que era um Caipora!
— Bom, agora que está tudo finalizado, vamos leva-las para casa.
Menina e Tatá assentiram, subitamente sentindo-se tristes por terem que deixar o mundo mágico para trás e voltarem às ruas. Mas então Menina parou.
— Que casa? — ela indagou.
— A de vocês que falamos mais cedo, oras.
Tatá franziu o cenho.
— Como assim?
— Nunca tivemos um caso de alguma aluna morando nas ruas — explicou Bia, sem parar de andar. — Mas já tivemos alguns poucos bruxos e bruxas que perderam toda a família. Nesses casos, eles podem ficar em CasteloBruxo até mesmo durante as férias.
— Mas Menina tem você de responsável — continuou Juan. — E ela não pode voltar às ruas a cada fim de ano letivo. Por isso, nesse caso, a Escola abre um processo com o ministério da magia para lhes conceder uma casa. Pequena, claro. Como você é uma trouxa, não podemos fazer nenhum feitiço de expandimento e nem as colocar em um bairro bruxo, mas boa o bastante para não passarem nenhum sufoco.
— Então a gente vai ganhar uma casa... porque a Menina é bruxa? — indagou Tatá, atônita.
Eu apenas me juntei com ela porque a criança conseguia comida pra mim. Gosto muito dela, claro, mas não me parece muito justo conseguir uma casa porque ela é... diferente.
— Sim. Podemos te dar um emprego também, se quiser. Para se sustentar melhor. O ministério oferece oitocentos reais para vocês por mês. Menina pode começar a ajudar em algum clube da Escola para ganhar alguns galeões a mais, mas isso só é permitido no terceiro ano.
E um emprego também? Quem é essa gente?
— Não sei ler — falou Tatá. — O único emprego que tive na vida foi o de faxineira em casa de rico. Odiava aqueles lugares.
— Você pode passar por uma qualificação em outra área, se desejar — falou Bianca. — Mas vamos discutir isso mais tarde porque estou ficando com frio aqui.
Menina respirou fundo antes de assentir — o coração disparado. Aquilo tudo parecia um sonho que ela temia acordar. Era como encontrar um bolinho no lixo.
Não, corrigiu-se ela. Isso definitivamente nem se compara com um bolinho fedorento. É uma sensação nova. Eu gosto dela.
Ela segurou com mais firmeza a gaiola de Yebá e se colocou ao lado de Tatá para poderem ir para casa.
...casa... que palavra mais engraçada era aquela.
Menina percebeu que gostava de como ela soava em sua mente.
[Estrelinha no capítulo longo?]
Ufa! Finalmente estamos vendo a magia do Brasil! O que acharam? Estão ansiosos pra ela chegar na escola logo? Eu estouuu.
Espero que gostem do que há por vir! Até mais!!
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