06| De volta as preocupações - Parte 3
COMO HAVIA prometido, ao final da tarde Melina retornou ao hospital, encontrando Dorian adormecido, ao que parecia, ele finalmente havia se acalmado de sua agitação e cedido ao sono. Caíque ainda permanecia com ele, e era o único a acompanhá-lo depois que Helena fora embora para cuidar de Lívia. Somente quando Melina chegou, ele se permitiu alguns minutos de descanso, e saiu para comer alguma coisa, enquanto ela continuava com Dorian.
Até aquele momento Melina se sentia entediada, não tinha nada o que fazer, tampouco queria acordar Dorian. No entanto, o momento de ócio pouco durou, o sono antes tranquilo dele, se tornou agitado, era claro em sua expressão que estava tendo um pesadelo. A forma como se debatia sobre a cama, demonstrava o quão horrível poderia estar sendo.
Foi então que Melina resolveu intervir, se aproximou de Dorian e com leves toques, tentou acordá-lo, embora aquilo parecesse tê-lo agitado ainda mais.
— Dorian. Dorian, acorda, é só um pesadelo!
Ainda resmungando e se debatendo, ele abriu os olhos repentinamente, parecendo assustado, o arfar e a respiração descompassada demonstravam que havia acordado, mas ainda se mantinha sob efeito daquele pesadelo. Voltando os olhos assustado para Melina, ele sussurrou:
— Ele estava aqui.
— Ele quem?
— Ele... ele veio até aqui. Eu ouvi, eu ouvi tudo.
— Dorian, de quem está falando?
— Corbeau.
Um choque percorreu todo o corpo de Melina, e embora já soubesse daquela informação, não saberia como lidar com aquilo, tampouco o que dizer a Dorian. Se mentisse, ele certamente saberia, era praticamente impossível mentir para ele. Então, ela resolveu apenas mudar de assunto, o questionando:
— Tem certeza, Dorian? Talvez apenas tenha ficado impressionado com tudo o que aconteceu.
— Não, eu tenho certeza. Dessa vez eu tenho. Ele esteve aqui. – Quando ela, apenas desviou os olhos, ele pareceu notar que havia algo errado – É verdade, não é? Você sabe, mas não quer me dizer.
— Eu não sei de nada, Dorian.
— Pare de mentir, está mais do que claro que sabe de alguma coisa e não quer me contar. Por que estão todos mentindo para mim? Por que querem me desacreditar?
— Ninguém está querendo te desacreditar.
— Mentira de novo. – Bradou ele, com voz mais grave – Está acontecendo algo e estão escondendo de mim. Por que não falam de uma vez? Eu vou ficar sabendo mais cedo ou mais tarde.
Lhe dando as costas e suspirando, Melina tomou certo tempo até se recompor e finalmente se voltar para ele novamente, para responder:
— Porque não é um assunto que deva ser tratado agora. Você acabou de acordar, não deve se preocupar com essas questões. Na verdade, tudo o que deve fazer é repouso, até se recuperar completamente.
Dorian não respondeu de imediato, continuou apenas encarando Melina, com uma expressão austera, parecendo enxergar muito dentro dela e até mesmo ouvir seus próprios pensamentos. Era claro que ele se encontrava contrariado, mas não estava disposto a discutir.
— Você sabe que ele esteve aqui, não é? Provavelmente até abriram uma investigação.
— Acha mesmo? – Desafiou ela.
— Tenho certeza. Está estampado no seu rosto.
Mais uma vez Melina suspirou, abaixando a cabeça e buscando a poltrona para se sentar, onde apoiou os cotovelos nas pernas e enterrou o rosto nas mãos, procurando esconder qualquer expressão que tivesse para que Dorian não a lesse novamente.
— Podemos não falar sobre isso agora?
— E vai protelar isso até quando? Até que ele apareça novamente? Porque tenho certeza de que essa não foi a primeira, nem será a última vez.
— E qual o sentido disso, Dorian? Hã? Por que acha que ele vai aparecer novamente? Por que acha que sabemos de algo? – Questionou ela, erguendo a cabeça abruptamente e aumentando o tom de voz.
— Porque ele é meu...
Dorian interrompeu a própria fala, se dando conta de que havia falado um pouco demais, e no fundo se sentindo incomodado em terminar aquela frase. Proferi-la em voz alta o deixava assombrado. Era como se a verdade recaísse sobre si, o esmagando de forma violenta e mostrando que sua vida possuía segredos que nem mesmo ele conhecia. Naquele momento, ele já não sabia quem ele próprio era. Talvez, toda sua vida tivesse sido uma mentira e Dorian já não sabia por onde começar a destramá-la, não sabia qual fio deveria puxar para finalmente saber a verdade.
Quem terminou aquela frase por ele foi Melina, que se levantou vagarosamente da poltrona e se aproximou, com a expressão mais compassiva que Dorian já vira em seu rosto.
— Ele é seu pai. – Ele apenas balançou a cabeça, permanecendo com o olhar fixo nos próprios pés cobertos – Sabia o tempo todo?
— Soube quando visitamos Deveraux. Eu achava que ele estava atrás de mim por algo que eu havia feito, não porque sou filho dele. Agora não sei o que fazer.
— Eu sinto muito Dorian.
Erguendo o rosto em direção a Melina, Dorian questionou:
— Como soube que ele é meu pai?
Ela hesitou por alguns segundos, sabia que aquele não era o momento de contar a Dorian tudo o que havia acontecido, principalmente porque ele ainda parecia estar em choque com aquela descoberta.
— É uma longa história. Prometo contá-la a você, mas no momento tudo o que precisava saber é que estamos cuidando de tudo.
— Todos já sabem, não é?
— É possível que sim.
— Então virão atrás de mim. – Constatou ele, parecendo mais consternado.
— Nós não vamos deixar isso acontecer.
— Não acredito que terão muita escolha. De toda forma, se vocês sabem outras pessoas também devem estar sabendo. Eu só me pergunto o que tudo isso irá causar.
Pousando a mão sobre o ombro de Dorian, procurando acalmá-lo. Não se contentou apenas com aquele toque, acabou se sentando na cama e o abraçando, fazendo-o descansar a cabeça em seu peito.
— Vamos enfrentar isso, não se preocupe. Não vamos pensar no que ainda virá, concentre-se no agora.
Dorian balançou a cabeça levemente e se aconchegou mais a Melina, a abraçando apertado, sentindo e ouvindo os batimentos dela contra seus ouvidos. E pela primeira vez, ao estar tão perto dela, se sentiu seguro, estranhamente sentiu que pertencia àquele lugar. Se sentiu em casa.
— Obrigado. – Sussurrou apenas para que ela ouvisse.
Nos dias seguintes, o plano de Jane de acompanhar toda a evolução de Dorian e de lhe dar alta, foi arruinado por um chamado de um paciente que ela atendia em uma cidade distantes o suficiente para afastá-la do hospital por dias.
A princípio Dorian não se importou muito, sabia que ela sendo uma excelente médica seria muito requisitada, além disso, era óbvio que lhe arranjariam outro médio e o poriam a par de seu caso. A única que pareceu não ter gostado muito da ideia foi Max, que claramente ficou chateada com a separação, ainda que fosse momentânea.
Dorian ainda tentava consolar a amiga quando o novo médico adentrou o quarto, se apresentando como Jonathan. Melina foi a primeira a cumprimentá-lo, seguida de Max. No entanto, diferente da boa recepção das agentes, Dorian mantinha os olhos fixos no médico parecendo ver um fantasma à sua frente. A princípio as agentes não entenderam muito bem sua reação, não havia nada muito chamativo naquele homem, exceto por uma única mecha branca em meio aos cabelos castanhos, o que destacava os olhos incrivelmente escuros dele. Era claro que ele não parecia exatamente um médico, sua postura era muito mais intimidadora, mas elas nada disseram.
Foi somente quando a expressão de Dorian passou de chocada para furiosa, que elas entenderam que ele conhecia aquele homem. Incrivelmente os olhos dele pareceram mais escuros, as sobrancelhas praticamente se uniram e o maxilar travou. Melina tinha de admitir que nunca vira tanta ira no rosto de Dorian, parecia uma pessoa completamente diferente.
Lentamente, ele atirou a coberta de lado, inspirou profundamente, enquanto colocava os pés para fora da cama e em questão de segundos avançou contra o médico, explodindo em uma fúria incontrolável, atirando o homem contra a parede e apertando seu pescoço, enquanto desferia murros em seu rosto.
— Desgraçado! – Berrava enquanto Melina e Max tentavam separá-lo de Jonathan – Eu vou matar você!
Foi Max que conseguiu tirar as mãos de Dorian de cima do médico, obtendo certa vantagem com sua altura, ainda assim, ela tinha dificuldades em segurá-lo, enquanto Melina socorria Jonathan.
— Dorian, se acalma. Pare com isso agora.
— Me solta, Maxine! – Gritava ele, ainda se debatendo.
Dorian ainda conseguiu atingir mais uma ou duas vezes o médico, chamando a atenção de quem estava do lado de fora do quarto. Foi preciso mais dois enfermeiros adentrarem o quarto para detê-lo, e ainda assim, Dorian continuava totalmente fora de si.
— Foi você, seu desgraçado! Pensa que esqueci? Você matou a Emily, seu assassino!
Ainda segurando o próprio rosto, Jonathan dirigiu um olhar apavorado para Dorian, se defendendo:
— Acredito que está me confundindo, senhor Delyon, eu jamais o vi. Não conheço nenhuma Emily.
— Pare de mentir!
Melina tentou intervir, e fazer Dorian voltar a si, até mesmo segurou o rosto dele entre as mãos, tentando fazer com que ele a olhasse, mas os olhos dele continuava fixos no médico, sedento por atacar novamente, como se algo dentro dele tivesse apagado sua consciência e deixado somente fúria no lugar. E teria o feito se ainda não estivesse sendo detido pelos dois enfermeiros, junto de Maxine.
A confusão foi tanta, que ninguém percebeu que um dos enfermeiros havia tomado uma precaução para acalmar Dorian, e ele mesmo só foi perceber quando sentiu uma dor aguda no braço e direcionou os olhos para a agulha que fora inserida na pele. Tarde demais percebeu que não havia mais líquido na seringa. Sentiu certa vertigem lhe atingir quase que instantaneamente, cambaleou para o lado, com as pálpebras pesando e se fechando sozinhas, as pernas cederam e o último rosto que ele viu foi o de Melina, lhe encarando preocupada. Segundos depois apagou.
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