10 - Para Sempre Sua
Zoe recordava-se da noite anterior, da sensação de aconchego e alegria que sentira nos braços de Morten.
Eles dançaram por muito tempo, entrelaçados um no outro.
Ela estava ansiosa com o que deveria fazer em seguida. Não por ela, já que estava em paz com isso, mas por ele.
-- Morten? Eu preciso de você. -- ela diz, em pé no meio do quarto.
Nem cinco segundos se passaram e ele estava ali. Ela o observou, aquele rosto belo e jovem mais uma vez balançou seu coração. O cheiro dele, unicamente o perfume de Morten, lhe invadiu as narinas.
-- Algum problema, Zoe? -- ele pergunta.
-- Eu estou pronta. -- ela diz, simplesmente.
Morten leva algumas batidas de coração para entender.
-- Não!
-- Morten…
-- Não! Não está pronta! Falta um desejo, falta que se apaixone por um mortal, temos tempo e…
-- Esse desejo não irá se realizar! -- ela segue até ele parando a sua frente -- Não se realizará pois já estou apaixonada.
-- Mas…
-- Eu o amo.
Morten arregala seus olhos verdes que brilham mesmo à luz do dia. E eles apenas se encaram ali.
Zoe sente-se leve por finalmente assumir para ele seus sentimentos. Ela o amava, sempre o amou, mas percebeu isso naquela noite no telhado.
Desde então ela perdeu o medo de partir. Zoe conheceu o amor, aquele que descreveu na infância.
-- Não, Zoe.. não faça isso. -- ele pede, desolado -- O desejo é que se apaixone por um mortal.
-- Eu pedi apenas para que conseguisse amar alguém como papai amou mamãe. Nunca pedi que fosse por um mortal. Isso foi você que acrescentou.
-- Mas...
-- Eu consegui. Eu amei você a cada batida de meu coração, e amo há muito tempo.
-- Você não entende. O que eu digo no desejo deve ser literal. Se não se apaixonar por um humano, isso anula o pedido.
-- E então...?
-- Você pode escolher outra coisa. Desde que não seja mais tempo. Mas, Zoe, não faça isso, por favor. Eu… eu a amo. Eu a quero aqui. Se mudar o desejo agora partirá imediatamente.
-- Eu poderia passar a eternidade com você, poderia meu espírito vagar junto ao seu? Seguiria cumprindo sua missão, mas comigo ao seu lado.
Por um momento, uma luz de esperança ilumina o desespero que há em Morten, mas apenas com meio pensamento o Criador manda a resposta: não. Zoe era uma humana e aquela existência semelhante a de Morten não era permitida a ela.
-- Isso não será possível, Zoe.
Ela já esperava tal resposta mas mesmo assim sentiu-se decepcionada.
O que poderia pedir se Morten era tudo que desejava? O que seria dele quando se fosse? Sozinho novamente atravessando os séculos, nessa imensidão.
Então, ela soube. Soube o que deveria pedir. Ela o faria companhia, de alguma forma.
-- Quero que minha alma suba aos céus, Morten. Quero que minha alma se torne uma estrela, grande e brilhante, para que me veja sempre que olhar para a imensidão do universo. Eu estarei ali, olhando para você, meu doce Morten. E você estará aqui, cumprindo seu propósito mas ainda sentindo meu amor por ti a cada luz que minha estrela irradiar.
Ele sentiu quando o desejo de Zoe foi aceito pelo Criador.
E sentiu também um misto de sensações: dor e pesar por essa ser a despedida, felicidade por tê-la encontrado em sua existência, gratidão pelo tempo que tiveram juntos, mas sobretudo ele sentia amor.
Aquela mulher com nome que significa "vida" ensinou a morte a amar.
-- Meus olhos estiveram sobre você desde que nos conhecemos, e assim permanecerão. Estaremos juntos na infinidade do tempo, acredite, pois eu olharei para sempre a estrela mais brilhante que surgirá hoje no céu. -- Morten aproxima-se e cola sua testa na dela -- Eu não quis, Zoe, nunca pedi para me apaixonar, mas foi a coisa mais bela e assustadora que me aconteceu. Você partirá mas saiba que uma parte sua viverá para sempre em minha alma. És amada por mim, e o será até que o mundo deixe de existir.
Zoe regozija-se com aquelas palavras, em saber que é correspondida.
Ela está feliz.
E não se ressente por esse ser um adeus, não, de forma alguma.
Ela teve uma boa vida, apesar de curta.
Ela amou e foi amada e isso basta.
Zoe levanta as mãos e as passa nos cabelos negros de Morten, sentindo sua maciez e ele solta um suspiro com a carícia.
-- Há duas cartas na gaveta da escrivaninha. Uma para você e a outra para meu pai. Leia a sua essa noite, quando me ver no céu.
Morten acaricia seu rosto e memoriza suas feições, seu perfume, o timbre de sua voz.
-- Se eu pudesse, Zoe... Se eu pudesse… eu…
-- Eu sei, meu amor. Eu sei.
Eles se abraçam e Morten sente algo que ainda não conhecia. Ele sente a dor de perdê-la.
-- Beije-me. Ao menos uma vez eu sentirei seus lábios e partirei em paz.
Os olhos da morte estão inundados em lágrimas e ele a beija.
Ah, foi mágico.
Esse sim foi um beijo que fez Zoe sentir tudo o que sonhava e ainda mais.
Os lábios dele eram quentes, sua língua lhe invadiu a boca, macia e desejosa.
Os braços fortes dele a apertavam contra si enquanto Zoe puxava o rosto dele mais para perto.
E, então, ela estava indo...
E então ela se foi.
Amado Morten,
Certa vez você me disse que gosta das cartas pois elas eternizam o que nelas está escrito. Então, eu não poderia deixá-lo sem um carta que eterniza o quanto eu sou apaixonada por você.
Eu te amei de tantas formas, Morten. O amei como meu amigo, meu confidente, meu porto seguro, meu companheiro. E, se há vida após a morte, saiba que continuo te amando.
Para sempre sua, Zoe.
Ao finalizar a leitura da última carta de sua amada, Morten sente algo gelado escorrer por seu rosto.
Está chorando.
Chorando pela humana que o ensinou tantas coisas, inclusive a amar. Que o ensinou as maravilhas e tristezas que é sentir-se vivo.
Ali, no alto de uma montanha, chorando por Zoe, Morten vê uma grande e bela estrela surgir, iluminando o céu com luzes pulsantes brancas e azuis.
Um pequeno sorriso se abre no rosto dele, em meio às lágrimas que ainda insistem em cair.
-- Olá, meu amor.
Fim.
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