vinte e nove
Isla não teve tempo de encontrar desculpas. Seu cérebro trabalhava a mil por hora, mas, de uma vez por todas, seu estoque de mentiras tinha acabado. As mãos de Luke ainda estavam nela quando Sally entrou na Kombi, parecendo não ouvir os protestos de Lino para que eles saíssem dali.
- Há quanto tempo você tá mentindo para mim? - Sally perguntou, seus olhos azuis pareciam pretos, as mãos fechadas ao lado do corpo. - Há quanto tempo, Isla?
Elas estavam frente a frente, o ar pesado entre as duas. Isla não podia acreditar que ela estava ali. Não podia acreditar que acabaria daquele jeito.
- O que é isso? - Luke perguntou, a soltando só o suficiente para que pudesse se virar para a outra garota. - Ficou maluca, Sally?
Mas ela nem olhou para Luke, seus olhos estavam fixos em uma Isla imóvel e acuada.
- Todo esse tempo eu confiei em você, achei que éramos amigas! - Ela soltou uma gargalhada desprovida de qualquer humor. - E você devia estar se divertindo com a minha burrice o tempo todo!
- Isla, do que ela tá falando? - Luke perguntou, a voz baixa. Ele segurou sua mão. - O que tá acontecendo?
- Então ele não sabe? - Sally continuou, olhando para Luke pela primeira vez desde que adentrara a Kombi. - Estava enganando nós dois, Isla?
- Por favor, Sally, você não entende. - Ela ergueu as mãos, trêmula. - Me dá uma chance de...
- A gente tinha um acordo! - Sally gritou, sem dar ouvidos a ninguém, agora despejando toda a verdade em Luke. - Eu trazia Isla para Malibu, em troca, ficava perto de você e tentava consertar as coisas. Esse era o plano. Mas vocês devem estar juntos desde o início. - Ela balançou a cabeça, lágrimas escorrendo pelo rosto. - Quando a gente começou com tudo, quando te contei sobre como me sentia, você ria pelas minhas costas? Você me trouxe para Malibu e para o seu grupinho de amigos sabendo que eu jamais poderia me aproximar de Luke de novo, porque você estava com ele?
- Sally eu não menti para você, não no início. Eu...
- Espera um pouco. - Luke ficou no meio delas, o cenho franzido em confusão. - Você tinha um acordo com a Sally? Você a trouxe para Malibu e mentiu quando disse que eram amigas?
- Sim, eu menti sobre isso - Isla admitiu, os olhos ardendo. Sem mas. As coisas eram como eram.
- E depois de eu ter te contado tudo, depois que você sabia o quanto doía em mim ficar perto dela, ainda sim não me contou a verdade. - Luke tropeçava nas palavras, e o carinho com que a olhava antes desapareceu, sendo substituída por dúvida e mágoa. - Você continuou mentindo depois de tudo...
Ele levou as mãos ao cabelo, andando de um lado para o outro como se de repente todas as peças se encaixassem.
- É por isso que você não queria que Sally soubesse sobre a gente! Não tinha a ver com o medo de que a notícia se espalhasse na ilha, tinha a ver com o seu medo de ser descoberta. Se era tão importante assim para você vir para Malibu, poderia ter me contado, poderia ter dito a verdade e eu faria qualquer coisa para te ajudar!
- Luke, por favor...
Isla estava chorando agora, sem conseguir controlar as próprias emoções. Ela tentou se aproximar dele, mas Luke se afastou depressa. Aquele gesto foi o responsável por quase fazê-la cair de joelhos.
Luke olhou para ela, traído.
- Sobre o que mais você está mentindo?
Isla não conseguiu responder. Sua garganta estava fechada, as palavras se embolaram dentro dela.
- Acho que eu deveria devolver isso - a voz de Sally se sobrepôs a dele. - Me iludi achando que havia alguma explicação, mas a única verdade aqui é que você é uma mentirosa e manipuladora.
Sally mexeu na bolsa pendurada em seu ombro. Quando encontrou o que queria, estendeu o objeto para Luke.
Não.
Isla cambaleou em direção à própria bolsa jogada em um banco da Kombi. Ela revirou seu conteúdo, mas seus olhos não a tinham enganado.
O colar não estava mais ali.
Luke segurou o colar com as mãos trêmulas. Ele passou um dedo pela placa de metal, os olhos perdidos.
- Como você encontrou isso? - ele perguntou, a voz rouca.
- Na bolsa da Isla. - Sally o olhou confusa e magoada. - Pelo visto, você não deu o colar para ela como eu pensei.
- Não, não dei. Eu perdi o colar. Perdi... na tempestade.
E naquele momento, todas as peças do quebra-cabeça se encaixaram para ele.
- Eu não tenho mais o que fazer aqui - Sally falou, erguendo o queixo mesmo que as lágrimas ainda molhassem suas bochechas. - Eu estava pronta para deixar isso para trás. Queria me ajeitar com você, Luke, da melhor maneira possível e seguir em frente. Não me importa mais que esteja com outra pessoa. Não me importa que essa pessoa seja a Isla. O que dói é a sensação de ser enganada. De estar cega de felicidade demais por ter pessoas com quem me importava para não perceber que só era uma peça em uma manipulação muito maior, pelo visto. - Ela enxugou o rosto com raiva. - Me sinto ainda pior do que quando tudo isso começou.
Sally deixou a Kombi e Lino trocou um olhar rápido com Isla. Ela viu a dúvida no melhor amigo. Ela assentiu e ele soltou a respiração, correndo atrás de Sally e a deixando sozinha com Luke.
- Foi você - ele disse depois de um momento interminável de silêncio, a voz baixa, os olhos fixos na placa de metal na palma da sua mão. - Foi você no mar. Foi a sua voz na praia.
Isla engoliu em seco. Ela perderia tudo. Sabia disso. Mas pelo menos agora não precisava mais mentir.
- Fui eu.
Luke olhou para ela, a expressão nebulosa, desolada. Era como um sonho, como voltar à superfície depois de muito tempo no fundo do oceano.
- Eu te avistei naquele dia, do alto de uma pedra na costa - Isla contou, as lembranças vindo em flashes. - Vi o barco e quando Dug caiu no mar. Então te vi, pulando atrás dele. Peguei um barco que estava atracado na praia e fui atrás de você. Foi... - ela fechou os olhos com força - o momento mais assustador da minha vida.
Luke permaneceu em silêncio. As palavras o tinham deixado por completo.
- Eu consegui te tirar da água, de alguma forma. Quando te levei pra praia, você estava sangrando muito e eu não sabia o que fazer. Liguei para o socorro, mas pensei que não chegariam a tempo, porque tinha sangue demais... - Ela não conseguiu sufocar o soluço, as memórias a rondando. - Eu não sabia o que fazer para te manter consciente, então cantei aquela música boba que costumava escutar quando criança, não só para você, mas para mim, porque a gente podia ter morrido e eu estava com muito medo.
- Por que não me contou a verdade quando a gente se conheceu? - Luke indagou, ainda longe dela. - Aquele dia no Geoffrey's... Foi real? Você sabia que eu estaria lá?
- Não! Eu nunca poderia imaginar que te veria de novo. Por isso derramei aquela limonada estúpida em você, porque não conseguia acreditar que estava mesmo ali, que estava vivo e bem... - Isla piscou depressa para afastar as lágrimas. - Tudo o que aconteceu depois foi real, Luke. Eu queria te contar no início, queria te entregar o colar que ficou comigo depois do acidente, mas não consegui, então meu pai descobriu sobre as minhas fugas e vendeu o nosso barco. Eu estava desesperada para voltar para Malibu, desesperada para viver longe da ilha e conhecer os lugares da lista da minha mãe. A Sally sabia que eu te conhecia, já tinham avistado a gente na cidade, então ela propôs um acordo e eu aceitei. Eu aceitei antes de me envolver com você, eu...
- Mas sabia que eu tinha uma história com Sally, não sabia? Mesmo antes de eu te contar?
Isla assentiu.
- Sim. Ela me contou antes do acordo. Mas eu não sabia com detalhes o que tinha acontecido, só sabia que não se davam bem e que você tinha tirado ela da sua vida por completo.
Luke virou o rosto, sem conseguir encará-la.
- E mesmo assim você a trouxe para Malibu... E depois que eu te contei tudo no píer naquele dia, continuou sem dizer nada. - Luke balançou a cabeça. - E em Santa Mônica, quando falei sobre a garota que tinha me salvado do mar... Era você! Eu estava falando todas aquelas coisas idiotas e era você o tempo todo!
Seu rosto estava vermelho de constrangimento. Ele tinha confessado para ela o modo como a garota misteriosa não saía da sua cabeça, como, de certa forma, estava encantado pela ideia dela.
- Eu queria ter te contado sobre o acidente na roda-gigante, mas depois que você disse tudo aquilo, eu não podia. Porque estava tentando ser fiel ao acordo com Sally e o plano era que você voltasse a se apaixonar por ela, não por mim, a garota que tinha te resgatado.
- Meu Deus, Isla! O que você acha que eu sou? Um brinquedo que pode ter os sentimentos manipulados?! - Ele estava com raiva agora, com raiva e tão profundamente magoado... Era a dor nos olhos dele que intensificava a dor dentro dela. - Você mentiu sobre tudo! Sobre sua relação com a Sally, sobre o acidente, sobre o motivo dela não poder saber sobre o nosso relacionamento... - Uma ideia lhe ocorreu naquele momento, e Luke a encarou bem nos olhos quando disse: - Você mentiu sobre seus sentimentos também? Durante todo esse tempo, o nosso namoro falso só se tornou real por minha parte?
- Não! Luke, eu nunca... - Ela tentou se aproximar de novo, mas ele se desvencilhou dela. - Luke, você não entende? Nada saiu conforme eu planejava! Porque, no fim, eu traí a Sally. Traí ela me apaixonando por você! Tudo o que eu sinto, tudo o que eu te disse, foi real. Eu não sei muito bem quando começou, não sei quando a amizade se tornou algo mais para mim, mas aconteceu. E eu... Eu me importo com você! Te adoro tanto que nem sei o que fazer com esse sentimento.
Luke estava olhando bem para ela quando disse, as palavras baixas e repletas de dor:
- Eu não acredito em você.
Isla se segurou em um dos bancos quando o mundo vacilou ao seu redor.
Estava acontecendo. Ela estava perdendo aquele garoto incrível, que só a fazia feliz, que era responsável pelo que deviam ser os melhores momentos da sua vida.
Isla até podia ter salvado ele do mar, mas era Luke quem a deixava viva de verdade. Tinho sido ele quem a resgatara e mostrara um mundo tão lindo e maravilhoso que agora não parecia mais tão incrível sem ele.
Ela não queria perder aquilo. Não conseguia.
- Eu sou grato por ter me ajudado naquele dia. Nunca vou me esquecer que só estou vivo por sua causa. Mas eu não sei se posso... - Ele abaixou a cabeça e enxugou o canto do olho com o polegar. - Não posso confiar em você. Porque eu acho que te amo - a voz dele falhou - e não posso viver desse jeito de novo, com essa incerteza.
Ele sabia de toda a verdade e não estava gritando com ela. Ele sabia de tudo e estava deixando a Kombi, em silêncio, destruído, sua confiança traída e a promessa dos beijos que trocariam naquela noite perdida no passado. E aquilo era pior, mil vezes pior, do que se ele se revoltasse contra todas as suas mentiras e planos falhos.
Porque ele não a estava deixando de cabeça quente. Ele estava indo embora porque havia decidido que não podia mais ficar perto dela. Porque não podia mais ser machucado.
Eu também te amo.
Mas Luke tinha ido embora. A luz da lua ainda entrava pela clarabóia aberta quando Isla caiu no chão, envolvendo a barriga com os braços e se desmanchando em soluços.
Ela não soube por quanto tempo ficou ali, mas em algum momento Lino voltou e a encontrou em pedaços. Ele a envolveu em um abraço e suas lágrimas molharam o ombro dele.
- Sally foi embora. Zack e Dean viram Luke e foram atrás dele, mas... Ele não vai voltar, Isla. A gente precisa ir.
Isla não questionou quando o amigo a levantou e a guiou por metros e metros ao longo da costa até um atracadouro. Ali, sobre as ondas calmas da noite, havia uma embarcação desconhecida.
- Eu liguei para o seu pai. Era o único jeito de voltar para casa. Ele pegou o barco emprestado com um vizinho.
Isla ergueu os olhos inchados e vermelhos para o homem que saiu da cabine de comando. Ele olhou para ela, não com raiva, não com desgosto, mas com pura e genuína preocupação.
E foi aquilo que a fez se perder de vez.
Isla soltou o braço de Lino e correu até o barco. Rodrigo foi até ela e a puxou em um abraço que a fez desmoronar por completo.
- Me perdoa - ela pediu, a voz mal saindo. - Me perdoa, pai.
Ele passou a mão pelos cabelos da filha mais jovem.
- Shhhh. Tá tudo bem agora - ele disse naquele seu inglês com sotaque, a voz rouca e familiar.
Luke foi embora, ela queria dizer. E tá doendo demais.
De alguma forma, ele entendeu.
- Vamos para casa, meu amor.
E, semanas depois de ter saído pela primeira vez, Isla voltou para a Ilha da Rocha com o coração destroçado.
______________________❤️__________________
oii, gente!!!
sei que demorei, mas continuo com a missão de entregar esse livro completo para vocês o mais breve possível!
não sei se pergunto o que vocês acharam do capíulo de hoje, porque pressinto muita dor e hostilidade aí do outro lado hahahaha mas como tenho uma grandíssima cara de pau, me contem aí: o que acharam??
em breve volto com mais tristez... quero dizer, capítulos rs.
se cuidem e até breve! (torcendo para ver vocês já no próximo domingo!)
bjs,
ceci.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top