Reunião
Eu estava inquieta, incapaz de me concentrar na paisagem que passava pela janela do carro. Tentava focar na música que tocava nos meus fones, mas o perfume do meu chefe preenchia o ar de forma sufocante. Desde que me convidou para participar da reunião, eu fiquei radiante, imaginando a oportunidade profissional. Mas agora, confinada com ele no carro, essa ideia já não parecia tão boa.
“Ele é seu chefe, não tem nada demais.” “Deus, me ajude a ser profissional!” “Senhor, por que tanto perfume? Mas... é tão cheiroso, e combina tanto com ele.” “E essa cor de terno, o deixou ainda mais bonito...” “O que você está pensando, Vanusa?”
De repente, a voz dele quebrou meu turbilhão de pensamentos.
— O que está ouvindo? — pergunta, me tirando do transe.
Assustada, respondi no impulso:
— Primavera, do Voz da Verdade.
Ele fez um som de aprovação, e antes que eu percebesse, deu um comando no painel, e a música começou a tocar pelos alto-falantes do carro. Tirei os fones devagar, surpresa demais para processar o que estava acontecendo.
— Realmente, as músicas deles são incríveis. As vozes são impressionantes — comentou ele, me deixando embasbacada.
Eu fiquei de boca aberta, sem saber o que dizer. Tudo o que consegui balbuciar foi:
— Você conhece? — E na mesma hora me xinguei mentalmente pela pergunta idiota.
— Sim — ele respondeu, me lançando um sorriso diferente, algo suave, quase... cúmplice. — Minha preferida até agora é “Escudo”.
“Deus, o que está acontecendo aqui?”, pensei, completamente desnorteada. O perfume, a música, o sorriso... Tudo parecia tão fora do comum que eu mal sabia onde colocar meus pensamentos.
— Ultimamente tenho ouvido músicas que nunca imaginei ouvir um dia. — tudo graças a alguém que me apresentou.
Seus olhos buscavam algo em mim, parecia esperar minha reação.
A música acaba e a voz de Tales Roberto, cantando Eu Escolho Deus, ressoa em meus ouvidos. Pisco aturdida olhando do painel para ele que agora focava o trânsito cantarolando a música.
Eram algumas de minhas músicas favoritas.
Reunião
Eu senti a raiva subir como uma chama, queimando por dentro. Trinquei o maxilar com tanta força que achei que meus dentes iam quebrar. O único motivo pelo qual eu não socava cada homem naquela mesa era porque, para ser justo, nem todos eram culpados. Mas era difícil raciocinar.
Vanusa andava pela sala, distribuindo as pastas, e eu via aqueles olhares nojentos percorrendo o corpo dela. Era um comportamento tão asqueroso que me revirava o estômago. Ela percebeu, claro que percebeu. Dava pra ver pela postura rígida e pelo sorriso forçado que ela tentava manter ao responder os cumprimentos.
— Sérgio, você é um homem de sorte — ouvi Reyder, o advogado dos fornecedores, falar com os olhos pregados em Vanusa, como se ela fosse algum tipo de prêmio.
Minha raiva só cresceu, mas antes que eu respondesse, TJ, sempre alheio a esse tipo de provocação, respondeu por mim.
— Não é sorte, é muito trabalho e dedicação. Agora podemos colher alguns frutos — disse ele.
Eu sabia que TJ estava tentando manter a conversa profissional, mas Reyder não se importava com isso.
— Claro, Dr. Tales, mas eu me referia ao fato de ele ter a secretária mais deslumbrante que já vi — continuou Reyder, sem vergonha alguma.
Eu fechei o punho por baixo da mesa. TJ me lançou aquele olhar que só amigos entendem, como se dissesse: “calma”. Ele sabia que eu estava a um passo de explodir.
— A beleza não vem ao caso aqui — TJ respondeu, tentando manter o controle. — Mas realmente estamos gratos pela competência das nossas secretárias.
Vi o sorriso arrogante de Reyder vacilar por um segundo. Vanusa terminou de entregar as pastas e voltou para o meu lado, com os olhos baixos. Isso só fez minha raiva crescer. O que ela estava sentindo? Humilhação? Desconforto? Eu não sabia, mas isso me matava por dentro.
— Vanusa, pode sair. Obrigado — disse TJ, percebendo o quanto ela estava desconfortável. Eu respirei aliviado quando a vi deixar a sala.
A reunião foi um inferno, e Reyder era ainda mais arrogante do que eu imaginava. Mas TJ, com toda a sua paciência, conseguiu finalizar tudo antes que eu perdesse o controle de vez.
De volta à empresa, TJ soltou uma risada nervosa.
— Cara, achei que você ia perder o réu primário lá dentro — brincou.
— Eu e você? Quando ele beijou a mão da Laís na saída na outra vez, quando veio aqui, ouvi seus dentes rangerem. Achei que ia ter que segurar sua cabeça pra não explodir — retruquei, tentando aliviar a tensão também.
— Tá imaginando coisas agora, Sérgio — ele desviou o assunto. — Vamos almoçar? Tô faminto.
Antes que eu pudesse responder, Vanusa bateu à porta e entrou. Sempre eficiente, sempre impecável.
— Tomei a liberdade de pedir seu almoço, senhor. Mas não incluí para o Dr. Tales. Posso alterar o pedido se desejarem — disse ela.
Por um segundo, algo dentro de mim se aqueceu. “Ela se preocupou comigo”, pensei, e tentei segurar um sorriso. Quanto tempo fazia desde que alguém realmente pediu algo pra mim sem esperar nada em troca?
— Não precisa se preocupar, Vanusa. E nada de ‘doutor’ só TJ — disse, ele tentando aliviar o tom. — Vou sair, espairecer um pouco... — TJ acena para se despedir.
— Desculpa, da próxima vez peço para os dois — ela divagou, parecendo nervosa. — Ou pergunto antes... bom, vou voltar pra minha mesa — disse, se virando tão rápido que tropeçou em alguma coisa.
Num reflexo, eu estava ao lado dela, segurando-a antes que ela caísse. Vi seu rosto corar instantaneamente, e aquele gesto involuntário me fez sentir uma onda de calor correr pelo corpo. O elevador se abriu e o entregador passou pela porta.
— Que bom que ele não quis... já que o pedido chegou — disse ela, olhando pra mim. Mas, ao perceber o que tinha acabado de falar, arregalou os olhos e ficou ainda mais vermelha.
Antes que eu pudesse responder, Vanusa fugiu apressada para receber o entregador. Eu ri sozinho. Algo dentro de mim se mexia, uma sensação quente, confortável, que não sentia fazia tempo.
Algo estava mudando. E, por mais que eu tentasse, não conseguia mais negar isso.
Cada nota, melodia e palavras naquelas canções me faziam ver algo além do meu mundo apagado. E Vanusa, minha secretária, como disse dona Margarida estava abrindo meus olhos para uma nova perspectiva. Sua essência, alegria assim como os acordes eram únicos.
- Espero que tenho pedido muita comida , pois você vai comer comigo!
Sussurro já rindo imaginando sua recusa.
🎼🎼🎼🎼🎼🎼🎼🎼
Curtinho 👀 mas espero que tenham gostado!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top