Capítulo Dez

Quando voltei, com o cabelo seco porque tinha escolhido não o lavar antes de ir dormir, encontrei Harry sentado no meu sofá cinzento-escuro, com o comando na mão. Ele olhava à volta, com um sorriso suave, focando-se numa das fotografias que eu tinha penduradas na parede de cada vez. Só quando ouviu a porta a fechar atrás de mim é que ele se despertou do pequeno transe em que tinha entrado e voltou-se para mim, sorrindo. Tinha vestido o meu pijama de verão – um top e uns calções – e desligado o ar condicionado porque não queria ter uma conta maior no final do mês, então ainda estava imenso calor.

- Tu deves estar cheio de calor, Harry. Queres que eu procure alguma coisa para ti? Tenho quase a certeza que um dos meus irmãos se esqueceu cá de uns calções uma vez...

- Não te incomodes, Lizzie. Eu estou bem. As calças serem largas ajudam. – piscou-me o olho, divertido. – Espero que não te importes, mas estou com imensa vontade de ver Entrelaçados.

Olhei-o sem expressão durante uns bons segundos, até perceber que ele estava a falar perfeitamente a sério e soltar um guinchinho. Ele riu com o meu entusiasmo, riso esse que aumentou de intensidade quando eu praticamente corri em linha reta até ao sofá e saltei para cima do móvel, parando apenas a uns centímetros dele. Sentei-me em cima das minhas pernas no sofá e roubei-lhe o comando das mãos, enquanto ele abanava a cabeça, com uma expressão divertida.

- A Rapunzel é a minha princesa preferida da Disney. – foi a única justificação que ofereci.

- O Flynn Rider é o meu príncipe preferido. – soltei um grito como concordância ao que ele dissera e levantei a mão para ele dar um mais-cinco. Ele deu, nunca parando de rir.

- Queres pipocas ou assim? – Harry abanou a cabeça, olhando-me diretamente nos meus olhos. Suspirei. – De certeza?

- Sim, Lizzie. Descansa. Sou só eu.

- Ah... tu? – comentei, rindo depreciativamente. – Tu és o Harry Styles.

- Hoje sou só o Harry. – encolheu os ombros. Depois, agarrou no comando e forçou-me a olhar para ele. – Não quero que me vejas como o Harry Styles. – fez aspas no seu próprio nome. Eu mordi o meu lábio. – Tu própria disseste que eu estava igual e que não havia problema...

- E não há! – interrompi-o, elevando um pouco o tom da minha voz. Expirei. – Tu não mudaste, Harry. Mas é difícil não achar que, agora, tens padrões diferentes...

- Mas não tenho. Agora, vamos focar-nos no filme. Sabes quando foi a última vez que o vi? – abanei a cabeça – Na festa depois da nossa queima das fitas. Contigo.

- Comigo?

- Eu sei que tu não te lembras. – ele encolheu os ombros, rindo. – Tu estavas bastante bêbada, Lizzie. Os nossos amigos estavam todos ainda a beber ou já a dormir e eu honestamente só queria estar a dormir também, mas não te ia deixar sozinha. Levei-te para o nosso apartamento, mas tu insististe e insististe que querias ver o Entrelaçados. E vimos, juntos. Só adormeceste no final, aliás, algo que honestamente me surpreendeu.

Não sabendo o que responder, além do vermelho que subiu até às minhas bochechas, roubei-lhe mais uma vez o comando das mãos e comecei finalmente o filme. Quando a voz do Flynn Rider apareceu pela primeira vez, soltei mais um guincho pequenino e ouvi o riso rouco e suave do Harry demasiado perto do meu ouvido. Só quando tomei noção de quão próximo o som me soara é que me apercebi das nossas posições no sofá. Ele estava sentado, confortável, com os braços nas costas do sofá, mas eu estava sentada nas minhas pernas, inclinada para o seu lado. Quase com a cabeça deitada no seu ombro.

Afastei-me um pouco, para me sentir mais confortável.

Continuámos a ver o filme, ambos calados, embora a presença de Harry emanasse uma energia calma que eu me apanhei a gostar. Ele sempre fora assim, claro, mas eu estava sempre preocupada com outras coisas quando estava perto dele, durante os nossos anos de faculdade. E mesmo naquela noite, em que estávamos ambos confortáveis – eu eventualmente tinha cruzado as minhas pernas à chinês, para ficar mais confortável – a ver um dos meus filmes de animação preferidos, não conseguia parar de pensar no que ele tinha acabado de dizer. Ele tinha passado uma madrugada a ver um filme de animação comigo? Só porque sim? Não conseguia processar essa informação.

- You want to go outside? Why Rapunzel... Look at you, as fragile as flower.

Olhei para Harry, que tinha começado a murmurar a letra da canção de Gothel.

- Still a little sapling, just a sprout. – continuei, começando a rir quando Harry bateu na minha cabeça ao mesmo tempo que Gothel bateu na de Rapunzel.

E, durante a canção, Harry e eu cantámos entusiasmadamente, imitando os movimentos das personagens o melhor que conseguíamos. Espantou-me o facto de ele saber grande parte da letra, principalmente depois de ele próprio ter admitido que não via o filme há perto de uma década. Sentados no sofá, os nossos braços moviam-se livremente, muitas vezes batendo um no outro sem querer, e cantámos com todo o entusiasmo e com todas as nossas forças. Quando a música terminou com Gothel a descer a torre, deixei-me cair no ombro de Harry, cansada com o pequeno esforço físico, tão tarde como era. Harry riu e não fez gesto nenhum para me forçar a sair; pelo contrário, pois pousou o seu braço esquerdo em cima dos meus ombros.

- Não tens calor com o cabelo desatado? – questionou, numa voz suave. Encolhi os ombros. – Deixa-me.

- Hm? – fui interrompida ao sentir as mãos de Harry a recolherem o meu cabelo.

Forcei-me a olhar para a televisão e aproveitar a cena em que Flynn estava a fugir dos guardas do castelo. Senti uma mão de Harry a empurrar-me um pouco para a frente e obedeci-lhe, não sabendo se deveria questionar o que ele estava a fazer. Não demorei muito a sentir as suas mãos a dividirem o meu cabelo em três e percebi automaticamente o que ele estava a fazer: uma trança. Perguntei-lhe, baixinho, como é que ele tinha aprendido a fazer aquilo, ao qual ele me respondeu, numa voz igualmente baixa, que a mãe dele o obrigou a aprender, para poder fazer a Mary. Imaginei uma versão pequenina de Harry, atrás de uma versão pequenina de Mary, enquanto ele lhe penteava o cabelo e o cruzava numa trança.

A trança ficou pronta mais ou menos na altura em que Rapunzel se cruzou com Flynn pela primeira vez, ao bater-lhe com a frigideira. Começámos a rir ao mesmo tempo, aquela cena nunca falhando em fazer-me rir, e, mesmo sem o toque dele a retirar os nós do meu cabelo e a pentear-mo, senti o meu coração a bater rápido. Tinha quase a certeza que ele conseguia ouvir o batimento do meu coração e por isso não me mexi, nem mesmo quando ele voltou a empurrar-me lentamente para trás, contra o seu peito, para me deixar relaxar mais uma vez.

O seu corpo estava incrivelmente quente, algo que eu não sabia se gostava ou não. Por um lado, estava a fazer-me suar mas, por outro, Harry Styles far-me-ia sempre suar enquanto estivesse perto de mim. Ter as minhas costas contra o seu peito deixou-me confortável, como se fossemos mais íntimos do que realmente éramos. Como se existisse algo entre nós que nunca sairia daquela minha sala de estar, de tão secreto que era; como se nem sequer fosse real, apenas uma fantasia, um desejo de uma noite.

Senti o meu corpo deslizar pelo seu quando Gothel apareceu mais uma vez e Rapunzel tentou dizer-lhe que conseguiria desenvencilhar-se fora da torre, mas estava sempre a ser interrompida. Harry não impediu o meu corpo de continuar a deslizar, até que a minha cabeça pausou efetivamente em cima das suas pernas. Aproveitando que ele não se opôs, estiquei o meu corpo e coloquei-me um pouco mais confortável, fazendo bom proveito das suas pernas como minhas almofadas. Olhei para ele, vendo-o totalmente transfixo pelo filme enquanto um sorriso decorava os seus lábios cor de rosa e calculei apenas que ele não se importava com a nossa proximidade.

Depois disso, continuámos a ver o filme sem nenhuma novidade a acontecer entre nós. Rimos nas mesmas cenas do filme, algo que me deixou feliz, e cantámos todas as músicas em conjunto. Algo que me surpreendeu em Harry, além do facto óbvio de ele saber as letras de cor, era o facto de ele ter o mesmo hábito que eu de mudar a voz conforme a personagem. Cantar com ele, embora ele tivesse infinitamente mais talento que eu, provou-se incrivelmente divertido e eu apanhei-me a esperar pela próxima música quando a última acabava. Quando Flynn e Rapunzel entraram no pequeno barco de madeira, soltei um pequeno aw, esperando pela cena mais bonita de todo o filme. De toda a filmografia da Disney, se mo perguntassem.

Sem qualquer diálogo entre nós, fizemos o dueto da I See the Light da mesma forma que Flynn e Rapunzel fizeram. Sorri ao cantar, mas não tive coragem de olhar para Harry. De vez em quando, ele apertava o meu braço, como que a indicar de que ainda estava ali, a acompanhar-me. Se me deixasse cair no raciocínio que esperava por mim, pensaria que aqueles apertos do meu braço e que o facto de ele cantar aquela música comigo significava algo. Mas era apenas uma continuação da diversão que tínhamos começado no início do filme.

- All at once, everything is different...now that I see you. – cantámos juntos, numa voz baixinha, enquanto a música terminava.

- A tua voz é bonita, Lizzie. – ri um pouco, ignorando o elogio. – Estou a falar a sério.

- Significa muito, vindo de ti. – obriguei-me a agradecer. – Obrigada.

Como resposta, ele apertou o meu braço. O filme continuou, sendo a música seguida pela parte triste em que Rapunzel achou que tinha sido traída por Flynn. Agarrei a perna de Harry que era mais confortável agarrar quando finalmente chegámos perto do término do filme, em que Rapunzel implorou que Gothel salvasse Flynn. Ele apertou o meu braço mais uma vez, como se partilhasse a minha angústia e não me estivesse a julgar por estar tão desesperada apesar de ter visto aquele filme inúmeras vezes. Gostei da energia que ele emanava, apesar dos momentos que tínhamos acabado de partilhar durante todo o filme, porque ele continuava calmo, seguro de si, e a tocar-me em vários sítios. Sentia-me confortável, naquela posição. Não sabia se ia querer levantar-me quando o filme terminasse.

Quando o ecrã da televisão mudou para os créditos, Harry acariciou suavemente o meu braço.

- Lizzie? Estás acordada? – limitei-me a assentir. Ouvi-o rir.

- Não deves estar nada confortável, Harry. Desculpa. – tentei levantar-me, mas ele agarrou o meu ombro e impediu-me de o fazer. – Se calhar devia ligar para o segurança...

- Estás assim tão desesperada para que eu me vá embora?

- Harry! – repreendi. – Sabes que não é nada disso.

- Durante a faculdade tu nunca falavas muito comigo. Não se eu não falasse primeiro. Passei tanto tempo a achar que não gostavas de mim.

Levantei-me tão repentinamente que ele não me conseguiu impedir. Olhei-o seriamente, observando cada detalhe da sua cara à procura de provas que ele estivesse a mentir-me. No entanto, não encontrei nada do género. Ele tinha um sorriso pequenino nos lábios, mas os seus olhos verdes pareciam cheios de algo que eu não consegui identificar imediatamente. Só quando vasculhei em toda a minha mente e em todas as minhas memórias situações em que eu já tinha visto aquele olhar é que percebi o que ele estava a sentir. Tristeza. Harry estava triste porque pensara que eu não gostava dele.

- Não podias estar mais longe da verdade. Eu tinha uma paixoneta enorme em ti.

Tapei a minha boca com as mãos quando vi a sua expressão a transformar-se numa de choque.

- Estás a falar a sério?

- Sim. – resignei-me a admitir, forçando um riso depreciativo. – Todos os meus amigos o sabiam, acho eu. Durante meses achei que estivesses a ser simpático para mim porque tinhas pena.

- Lizzie...eu nunca faria isso.

- Eu sei, Harry. Mas só percebi isso depois de perceber que tu eras genuinamente simpático. – encolhi os ombros. – De qualquer forma...

- Eu era tão simpático porque eu tinha uma paixoneta em ti, Lizzie.

Afastei-me dele num pulo. Harry, no entanto, não me deixou sair do sofá, porque agarrou o meu pulso e prendeu-me na posição desconfortável em que tinha ficado. Mais uma vez, observei todas as suas feições, todos os detalhes da sua expressão, e voltei a concluir que ele estava a ser honesto. De repente, senti toda a minha cara a ficar vermelha, a minha língua a secar e a minha garganta com comichão. Fechei os olhos, para ignorar o olhar intenso esmeralda que me esperava quando eu os abrisse, e respirei fundo. Quando voltei a encará-lo, a pergunta estava clara na minha expressão. Estás a falar a sério? Harry assentiu, com um sorriso tímido.

- Eu vi-te a ter namorados, Harry.

- Viste. – concordou, nunca largando o meu pulso. – A certo ponto eu assumi que tu não gostavas de mim e tentei avançar com a minha vida. Não está na minha natureza ficar preso em sentimentos durante muito tempo quando sei que não são recíprocos.

- Uau. – soltei apenas, fazendo-o rir.

- Estou igual a ti, Lizzie. Não fazia ideia. – abanei a cabeça, não sabendo o que mais fazer. – Tenho a dizer que o Sam é um péssimo melhor amigo. A Anna sabia?

- Suspeitava. Todos eles suspeitavam e eu não me preocupei em desmentir, daí ter assumido que tu sabias. Mas a única que sabia com certeza era a Jill, porque estava fora do país. – ri um pouco, lembrando-me de quando enviara uma foto a Jill para ela saber de quem eu falava tanto e ela me ligara a gritar, por o Harry ser tão bonito.

- Não consigo evitar pensar no que teria acontecido se...

- Não vale a pena pensar nisso. – encolhi os meus ombros, fazendo-o virar-se de frente para mim de repente.

- Porque não?

- Porque já passou, não já? As nossas vidas levaram rumos diferentes.

- Sim, Lizzie. Mas agora voltámos a encontrar-nos. Por alguma razão foi.


este capítulo tem um lugar especial no meu coração por algumas razões:

primeiro, porque Tangled/Entrelaçados é dos meus filmes preferidos da Disney (dantes, eu diria que era a Bela e o Monstro, mas acho que os filmes mais recentes passam mensagens melhores e têm personagens melhores também...i mean...O FLYNN)

depois, porque a ideia de um Harry Styles a cantar as músicas deste filme com o seu interesse amoroso dá-me uma sensação muito quentinha

e por último, porque eles admitiram que ambos tiveram sentimentos um pelo outro, mas nunca agiram em relação a isso. era previsível, não? ahahah

a ideia de uma história em que as personagens dessem uma de Sandra Bullock e Keanu Reeves - nunca se envolvendo por acharem que o outro não gostava deles - foi muito interessante para mim. e, não vou mentir, dá um bocado de esperança às imensas crushes que eu tenho tido nos últimos anos lmao

e a ideia de um harry universitário a ter tido toda a liberdade que ele não teve graças aos 1d também é muito interessante. imagino-o com camisas floridas largas, cabelos compridos e a fazer basicamente o que queria - já que durante os 1D ele não fazia muito isso

pronto, por hoje esta é a minha introspeção. muito obrigada por continuarem a ler e espero que tenham gostado <3 vamos ver o que acontece a seguir

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