011

Point of view: Lalisa Manobal

Bati na porta do quarto de Chiquita e logo entrei, vendo que ela estava assistindo algo no celular. Fechei a porta e me aproximei de sua cama, pronta para lhe dar uma bronca.

— Por que tá agindo desse jeito? Jennie não tem nada a ver com nossos problemas. Você não trata nenhuma empregada daqui com indiferença, por que tá tratando a Jennie?

— Eu sei muito bem o que aquela abençoada quer. Pra sua informação, já tá bem claro que ela deseja profundamente entrar pra esta família — ela não me olhou, continuou prestando atenção no celular.

— Como assim?

— Mãe, você viu o jeito que ela te olha? Aquela mulher te come com o olhar. Ela obviamente quer roubar o lugar da minha mãe.

— Não fale assim, ela não me come com o olhar forma. Inclusive, onde você aprendeu essas coisas? E outra: ninguém vai ocupar ou roubar o lugar da sua mãe, minha filha.

— Você diz isso hoje, mas daqui a um ano estará se casando com aquela mulher.

Arranquei o celular de sua mão e o coloquei em meu bolso, recebendo seu olhar furioso. Não liguei, apenas fixei meus olhos nos seus com firmeza.

— Você não pode tratar os outros assim por ciúmes. Sabe o que a Jennie passa no dia a dia e pra ter que aguentar a má criação de uma criança?

— Não sei se você lembra, mas eu faço quatorze anos esta semana, mamãe — ela sorriu sarcasticamente. — Quatorze anos não são quatro anos.

— É claro que eu lembro.

Eu esqueci, puta merda!

— Mas de qualquer forma, vai ficar sem isso aqui até começar a tratar a Jennie com educação. Tente enxergar que ela só está fazendo o trabalho dela.

— Mas mãe — ela choramingou.

— Mas nada. Pense nos seus atos e depois vá se desculpar por tratar a Jennie daquele jeito.

— Pense nos seus atos e depois venha se desculpar por machucar a sua filha daquele jeito. Por ter abraçado uma estranha e não ter abraçado suas filhas — ela falou com a voz embargada, mas eu sabia que aquilo era um truque para me fazer mudar de ideia.

Ignorei o que ela disse e saí de seu quarto, deixando-a sozinha. Caminhei até o andar debaixo, onde Jennie estava fazendo Ellen dormir. Aproximei-me da mulher, que olhava a bebê com carinho em seu olhar.

— Me desculpe pela minha filha, ela passou dos limites hoje. Não leve a sério o que ela falou, são só palavras de uma adolescente mimada.

— Tudo bem. Acho que talvez ela só não esteja acostumada a ter outra mulher cuidando da Ellen.

— Isso não justifica o jeito que ela te tratou. Vou sair agora, qualquer coisa, pode avisar a Mina que ela resolve, tudo bem?

— Certo. Cuidado nas ruas, senhorita Manobal, o trânsito está horrível — sorri, agradecendo sua preocupação.

[...]

— BAMBAM, VOCÊ TEM VISITA! — gritou. — Eu vou trabalhar, tchau, Lice! — ela me abraçou, porém eu não retribuí.

Esperei alguns segundos, vendo os porta-retratos que decoravam uma estante branca. Aproximei-me de um e o peguei, sorrindo ao ver a foto que estava nele.

— Tá fazendo o que aqui? — escutei sua voz grossa e fria atrás de mim, e então virei-me, ainda com o porta-retrato em minha mão.

— Temos que conversar.

— Não tenho nada pra falar com você. Não tô afim de brigar hoje, Lalisa. A semana tá sendo horrível pra gente.

— O que foi? Algo aconteceu? — perguntei, preocupada, vendo seus olhos ficarem no objeto que eu segurava.

— Não mexa nas minhas coisas — ele o pegou, colocando em seu devido lugar. — O papai tá doente, precisando fazer uma cirurgia no cérebro porque surgiu uma mancha vermelha. Não sei aonde vou arranjar dinheiro pra arcar com o custo. Depois que a mamãe faleceu, tudo mudou. Ele desenvolveu depressão e se enterrou na cachaça. Foi difícil pra mim, e você não estava aqui quando precisei do seu conforto. Faz quatro anos que você nos abandonou, Lisa. Tem noção disso?

Acabei assimilando a situação do meu pai e a minha, somos parecidos até nisso. Sou igual a ele na aparência, na personalidade, em tudo, praticamente. Não me orgulho disso, porque ele não era tão legal assim comigo, sempre jogava na minha cara que eu nunca iria ser uma mulher por conta da minha Intersexualidade. Ninguém sabia que ele falava isso para mim, já que nunca ousou dizer palavras homofóbicas na frente dos outros.

— Então, se veio brigar, não tenho tempo pra isso — ele falou, pegando um saquinho com um pó branco.

— Isso é maconha? — não respondeu. Aproximei-me, pegando o saquinho — Kunpimook Manobal, essa merda é maconha?

— O que te interessa? Acha que pode voltar como se nada tivesse acontecido e sair pegando minhas coisas sem mais nem menos? Olha aqui, Lalisa, eu não me dei bem na vida como você, querendo ou não, ainda continuo sendo pobre — falou, encarando meus olhos com ódio. — O papai é a minha única família agora, ele e a Minnie.

O saquinho foi arrancado da minha mão, e então, o segui com o olhar por cada canto que ia.

— Se eu perder ele, não sei o que vou fazer. Tô dando meus pulos pra conseguir essa grana, não vem me impedir se não vai ajudar.

— Isso é errado. Você pode se foder muito com isso, cara.

— Eu tô fazendo meu papel como filho, você deveria fazer o mesmo, Lalisa — ele pegou uma pochete e colocou em seu corpo, enchendo-a de maconha. — Não se esqueça que quando precisou, ele te ajudou.

— Quanto é a cirurgia? Eu pago. Não quero te ver na cadeia.

— Você faria isso por mim? — perguntou, sendo sarcástico. — Não tenho dinheiro pra te pagar de volta.

— Não quero nada em troca, tô fazendo isso por você, seu idiota. Me fala logo o valor antes que eu desista, porra.

Trocamos olhares por alguns segundos, e conforme o tempo foi passando, percebi que seus olhos raivosos foram cobertos por lágrimas, que não demoraram para escorrer. Surpreendi-me quando seus braços me puxaram pelo pescoço, envolvendo-me em um abraço que tanto senti falta nesses últimos quatro anos.

— Obrigado, obrigado, obrigado!! — falou, deixando um selar em minha cabeça enquanto chorava. — Eu te amo tanto, não tem noção do quanto senti sua falta, Lice.

— Eu também te amo, Mook — agarrei-o com força, sentindo minhas lágrimas caírem também. — O papai pode receber visitas agora?

— Ele vai ficar feliz em te ver — se afastou. — Vamos logo, quero resolver isso o mais rápido possível, não aguento vê-lo sofrer — ele disse, pegando suas chaves e se dirigindo até a porta.

Segui o rapaz, indo até o carro dele. Entramos no veículo e em questão de segundos já estávamos na estrada, seguindo caminho para o hospital.

Bambam é meu irmão mais velho e Minnie nossa prima que meus pais "adotaram", já que seus pais a abandonaram ainda bebê. Éramos muito grudados, confesso que senti falta de ambos nesses últimos quatro anos.

O celular de Chiquita apitou em meu bolso pela décima vez, curiosa, resolvi pegar e aproveitar para checar o que ela via no celular. Ao ligar, percebi que tinha algumas notificações da Ahyeon, mas resolvi não entrar na mensagem.

Enquanto procurava por algo errado em seu celular, outra notificação apareceu na tela, dessa vez era de uma empresa, a Jyp Entertainment. Franzi o cenho e cliquei, lendo com atenção o que estava na tela: "Olá, Riracha Manobal, agradecemos pela sua inscrição. Você passou na primeira etapa, agora partiremos para segunda, o teste presencial. Por favor, responder em até 72 horas."

— Que cara é essa? — perguntou.

— A Chiquita fez um teste pra ser idol e foi aprovada.

— UOU! Isso é incrível — falou, alegre e sorrindo, orgulhoso da sobrinha. — Por que não parece feliz?

— Ela escondeu isso de mim. A Chiquita não me pediu permissão pra fazer essa merda de teste. Quando eu voltar pra casa, ela vai me ouvir.

— Não brigue com ela, às vezes ela só não queria te iludir com a ideia de ser famosa. Provavelmente estava esperando pela resposta pra ter certeza de que teria chances de ser idol.

Não o respondi, apenas encarei a tela do celular, logo o desligando e prestando atenção na estrada.

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