você sabe o que je t'aime significa?

Estou cantarolando uma melodia coreana quando Chittaphon me lança um olhar de fúria. Eu não ligo e continuo a folhear o livro que estou segurando. Eu acho bonita a escrita, ainda que eu não entenda exatamente nada. Seria interessante se Ten me ajudasse um pouco nisso, mas ele está ocupado com seus livros de culinária.

— Taeyong, por que você está sorrindo tanto? — ele pergunta ao se aproximar de mim. Seu cabelo é longo e tão preto quanto o café que bebi hoje de manhã. Eu gosto quando esse tailandês tenta afastá-lo do rosto e é em vão.

— Bem, eu li cinco palavras até agora — estou feliz com isso, mesmo que tenham sido tão básicas que chega a me dar um pouco de vergonha.

— Ei, vai lá ver a área de cartões por algum tempo, vai — pelo modo o qual está falando, tenho certeza de que há um motivo que o faz me querer longe dele.

Pareço uma criança obedecendo o pai. Isso me dá agonia. Felizmente me ocupo nesses cartões ridículos e fico tentando traduzi-los. Seria interessante ter um telefone nesse momento, porém nada é do jeito que queremos. De soslaio acompanho Ten ir até o caixa com uma tonelada de livros e decido prometer a mim mesmo que não vou dar uma pontinha de ajuda.

— Vamos trocar cartões — diz ele ao aproximar-se mim. Não está com as compras nas mãos, talvez tenha deixado-as no caixa como reserva para alguns minutos.

— Cartões são chatos — resmungo. Eu não ligo se isso possa ofendê-lo.

— Isso porque você nunca ganhou um cartão — ele revida.

Eu suspiro impacientemente e escolho um colorido e cheio de corações de diferentes cores. Está escrito algo com je t'aime e, como sei bem o que isso significa, escolho-o e vou até o caixa. Peço uma caneta emprestada e escrevo "não me esqueça" em francês. Tenho medo de que sigamos nossas vidas depois da viagem e, de alguma forma, esqueçamos um do outro. Quero guardá-lo no peito.

Estou com um sorriso bobo no rosto de vergonha quando caminho até ele, que agora acabou de escrever no seu cartão para mim. Então ele sorri e gruda o cartão ao corpo, como quem fazendo um mistério. Queria poder dizer que amo seu jeitinho de ser. Ele falaria o mesmo de mim?

— Você já terminou? — pergunta com uma voz calma e doce.

— Aham — concordo.

Ele ergue seu cartão. Ergo o meu. Não faço a mínima ideia do que está escrito no meu, também não sei o que está escrito no seu. Ele pega o meu e eu pego o seu. O seu se torna meu e o meu se torna seu. Estou feliz porque tem seu cheiro e não quero esquecer disso. No meu cartão está escrito algo que não sei o que significa. Quero perguntar, melhor eu ficar quieto.

Seus olhos estão cobertos de excitação ao dar uma olhada no cartão. Ele lê a mensagem pronta e sinto algo mudar no seu sorriso. Porém ele continua alegre e abre-o para checar o que escrevi. Por mais que tenha um espaço enorme para um possível texto, escrevi numa única linha e isso já basta. Abro o meu e constato cinco linhas escritas por ele. Eu não sei o significado de nada disso senão o "eu" e "você". Isso não tem graça quando não se entende nada.

Ei, no meio disso tudo reconheço o mesmo termo presente no meu cartão. Eu estou surpreso, não creio que ele tenha escrito isso. Não creio que isso está presente aqui. Não creio que seja verdade.

Je t'aime — leio baixinho apenas para me saborear com a pronúncia.

— Você sabe o que je t'aime significa? — indaga-me. Coitado, tão ingênuo ao pensar que estou assim na estaca zero do francês.

— Talvez um dia eu descubra — é a minha resposta. Ele pensa que vou pesquisar o significado, porém independente da língua, eu sabendo ou não o significado, minha resposta continuaria a mesma. Eu quero descobrir o amor.

Então agora estamos lendo livros os quais não entendo nada e revezamos a cada cinco minutos. Ten ri quando lê uma página do seu, mas quando passa para mim, eu não rio nem um pouco. Queria que tudo fosse que nem o Google Tradutor e sua ferramenta de traduzir textos de sites. Acho que eu me sairia melhor assim.

Estamos de saída e Ten comprou um sorvete para mim como forma de agradecimento por estar carregando boa parte dos livros que ele comprou. Decerto que prometi não ajudá-lo, mas para que vale a promessa quando eu tenho seu sorriso para admirar? Eu penso mais em Chittaphon do que em mim e isso não é assim tão legal.

— Uh, que tal amanhã bebermos um pouco? — sua proposta acaba por me fazer parar de lamber meu sorvete.

— Pode ser — uma péssima ideia, isso sim. Não vai prestar, eu sei disso. Eu e bebida somos como água e óleo. Eu e bebida somos como meu amor próprio e eu. Nunca vão se misturar como queremos.

Às vezes venho pensando no que odeio tanto em mim mesmo. Não é tudo, claro. E então eu penso por que odeio essas coisas. Tudo bem que elas já me deixaram em situações horríveis, como um amigo maléfico te empurrando para lugares onde farão você se arrepender de ter topado. Honestamente, não é ódio o que sinto aqui dentro. É só desprezo por mim mesmo. É como se eu mesmo me ignorasse e me excluísse da rodinha de conversa porque minha presença me afeta.

Eu gostava do tempo em que tudo parecia mágico para mim. Eu não tinha de lidar com coisas do tipo, era sociável e todos me achavam legal e engraçado. Porém o tempo leva bons momentos e tirou-me isso também. Eu só queria que Ten aparecesse daqui a alguns anos, quando eu não estiver tão quebrado quanto agora. Porque é uma droga gostar mais dele do que de mim.

— Você não parece muito confiante — observa ele.

— Tenho medo de perder o controle — respondo. Ten se aproxima de mim quando vamos atravessar a rua. Ele quer cuidar de mim e eu não quero mais isso. Eu sou ridículo, precisando de zelo de alguém mais novo e mais ocupado que eu.

— Eu vou estar com você, cara — ele toca em meu ombro. — Relaxa, eu sei a hora de parar.

Mas é claro que sabe. Ou será que devo lembrá-lo da história de "Bêbado na França" que ele me contou antes de viajarmos e que, por incrível que pareça, ele acabou sem calça pelas ruas de Paris? Esse papo dele de agora está me soando balela, mesmo assim concordo.

Vamos à um supermercado porque Ten quer comprar algumas coisas. Como sempre, sigo-o pelas ruas até entrarmos. Aqui está com o ar-condicionado ligado, o que é uma dádiva, uma vez que eu estava derretendo lá fora. Eu ainda estou no processo de me acostumar com pessoas ocidentais em cada canto que andamos. Eu me sinto estranho, de todo modo.

Será que aqui tem lamen? Acho que sim. Mas não faz sentido comprarmos, já que estamos comendo fora o tempo todo. Aproveito que Ten está distraído e me jogo na seção de salgadinhos e chocolates. Olá, paraíso...

— Ah, finalmente te achei — o estraga prazeres aparece ao meu lado. — Por que entupiu seu carrinho de porcarias?

— O carrinho é meu e eu ponho o que quiser — dou língua para ele e coloco um salgadinho picante junto aos outros.

— Você vai morrer comendo isso tudo — ele reclama, tentando tirar as minhas delícias do carrinho.

— A intenção é essa — empurro-o de leve ao conseguir pegar de volta minha porcaria.

— Ah, é? Você tem muito pelo que viver — ele me abraça por trás e tenta arrancar-me o salgadinho picante das mãos.

Eu dou uma cotovelada nele, mas isso não parece adiantar. Se ele continuar com essa palhaçada de me obrigar a comer o que quer, eu vou dar um grito no pé de ouvido dele. Ah, fala sério que vou mesmo ficar aceitando ser subordinado desse jeito? Ele é bonito, mas a vida continua sendo minha.

— Bixo, larga meu bagulho! — rosno com raiva e mordo seu braço esquerdo.

— Você é um monstro! — ele me bate três vezes no ombro e me puxa para trás.

Então ambos caímos no chão e o salgadinho se abre bem à nossa frente, sem mais nem menos. Ten resmunga algo em francês e eu respondo com algo similar a um "foqui". De repente me vejo no caixa, com o rosto vermelho do salgadinho picante que estou mastigando e segurando o saco aberto para a moça cobrar. A camisa florida de Ten está com as mangas dobradas até o cotovelo e, caso alguém olhe para o seu braço esquerdo, verá marcas intensamente vermelhas de dentes e se perguntarão de quem é. São os meus.

— Não dá pra lidar com você! — ele reclama quando já estamos de saída. — Você é muito teimoso!

— Se eu ganhasse dez euros a cada vez que você reclama comigo, eu já estaria bebendo Chandon Rosé no topo da Torre Eiffel, a qual você ainda nem se prestou a me apresentar! — rebato com raiva, ignorando os olhares alheios.

— Eu estou tentando o meu melhor, idiota!

— Você que é idiota!

— É você!

— Se amanhã você você, idiota, merecer, eu posso te mostrar a Torre Eiffel — ele panca meu peito para me provocar.

Meus punhos estão cerrados. É melhor pararmos por aqui.

— Como assim "merecer"? Eu vim aqui só pra isso! — eu não acredito que estamos mesmo nessa palhaçada de discussão. Ele poderia ser menos egoísta.

— Então arranje um guia, se é assim que quer — seu revirar de olhos me enche raiva, por isso deixo as sacolas no chão e avanço para acertá-lo na barriga.

Não seria algo forte, iria ser apenas mais uma provocação. O ponto é que sempre estou lerdo e Ten acaba por bloquear o meu golpe. Suas sacolas também vão ao chão e ele decide me atacar com cócegas. Isso é infantil, mesmo assim eu gargalho e aqui estamos nós fazendo uma disputa de quem ri mais no estacionamento de um supermercado.

Sem querer tombamos num carro e ele começa a apitar. Chittaphon ainda está rindo quando, desesperados, recolhemos nossas compras e saímos correndo daqui antes do dono aparecer e pensar que estávamos querendo roubá-lo.

Na verdade, o único a roubar algo foi Ten. Esse desgraçado roubou meu coração ao sorrir o caminho inteiro de volta ao hotel.

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