CAPÍTULO 02 - YURI MARTEL

                                      CAPÍTULO 02

Narrado por Yuri Martel

Acabamos o nosso banho fomos direto para Punta. Era uma cidade não muito grande, mas bem movimentada, muito rica quando se fala em dinheiro. Considerada uma das cidades costeiras da américa latina mais ricas. Não cabia mais nos padrões Yuri Martel de ser, mas era, incondicionalmente, bonita. Tirando o fato de estar fazendo um dos dias mais frios da história, a cidade estava lotada com turistas cheio da grana aqui do MercoSul e fora dele. Os turistas eram nossa fonte de renda, pois, basicamente tudo o que era produzido no Uruguay, era para comercialização com turistas. Então keeping-smiling "sempre sorria" era nossa nova regra. Por mais que nossa história no Brasil tenha sido há mais de uma década, ainda haviam gatos-pingados que nos paravam na rua para perguntar como o "casal-sobrevivente-perfeito" estava. Respondíamos que "melhor impossível!".

De alguns anos para cá, o Cael adotara um estilo bem mais, como posso dizer, punk. Sua cabeleira e barba deram lugar a uma cabeça raspada, tatuagens pelo corpo e logo veio a idade. Ele ficara impagavelmente mais charmoso como tiozão de 45 anos. Ele era o novo dono das plantações da cidade. Se Cael tinha um dom, era mexer com tudo que se dava na terra. Ele convencia que tudo que ele plantava, cultivava e vendia eram as melhores. De fato, eram sem dúvidas, melhores hostifrutis. Gado, leitões e galinhas eram de consumo do pessoal da comunidade. Mas como dito, toda essas coisas que nasciam aqui, não davam para sustentar todas as famílias. Então muita coisa aqui funcionavas na base da troca. Temos também nossa própria comunidade de refugiados. Meio confuso, mas tudo ficará mais claro a adiante.

Paramos para tirar fotos em Las Manos del Punta. Monumento que fica na praia, que mostra uma grande mão saindo das areias. Quem passa por Punta, deve passar pelas Manos. Tiramos mais outra foto em meio aos turistas e ficamos contemplando o mar. Aquele vento gostoso, frio, que cortavam a pele de tão frio e faziam nossas olhos lacrimejarem. Mas ambos, sadomasoquistas, ficavam sentados lá por horas, se precisassem. Era maravilhoso ver o mar quebrando, o som das ondas, o Cael boquiaberto. O bom desse lugar, que o povo era mais liberal e permitia que andássemos abraçados há anos. Uma das coisas diferentes que não tinha ná época do Brasil.

O Yuri de agora era constantemente monitorado pelo meu marido e meu filho. Deveria dar satisfações de todas as coisas que tinha que fazer durante o dia, caso contrário, pudesse dar uma crise em meio a rua e "tchau familia". Eles não comentavam, mas ficavam felizes quando eu batia o record de dias sem ter crises. A última foi há 1 ano e 3 meses. Acho que uma das maiores da minha "vida".

Paramos para comer num restaurante bem caro para nosso novo padrão.

"Agora entendi o motivo de me trazer aqui sem o Ian, ele queria gastar menos."

- Não faça essa cara. É o nosso aniversário – disse ele pegando na minha mão e puxando para dentro.

- Aniversário? – perguntei sem me lembrar qual data deveríamos estar comemorando.

- Sim!

- Posso saber qual deles?

- huuuuuuuuum, aniversário de domar o Zebu! – respondeu ele num sorriso bobo.

"Ele estava mentindo! Tipo, eu tenho o dom de mentir, ele mal sabe o que é fazer isso!"

- Eu quero saber apenas se temos esse dinheiro, apenas isso e volto a sorrir.

- Então volte a sorrir, por favor!

Comemos frutos do mar, coisa que eu o Cael aprendera amar profundamente. Sempre que saíamos, tentávamos comer o mais diferente possível do que era servido dentro de casa!

- Eu não entendo, como passei 40 anos da minha vida, sem saber o que era isso! – disse ele comendo um sashimi de atum com cream cheese – posso passar a vida toda comendo só isso.

- Não me conhecia. Só sabia ficar naquela montanha. Juro, pensando hoje, olha só como você era limitado. Um multimilionário, dono de uma montanha, dono de uma cidade, não conhecia nada além de gado.

- Eu não tinha necessidade! Eu não queria viver mais do que tinha alí. Ninguém de despertava interesse de conhecer o mundo.

Dei de ombros.

- Olhe pra você agora, todo moderninho, com várias tatuagens, piercing no pinto, cabeça raspada, uma rachadura na testa...

- Toma no cu! Por que eu fui pular na bendita neve?!

- Porque é uma mula, isso sim!

Acabamos nosso jantar e depois fomos até uma gelateria tomar sorvete. Voltamos em casa e depois nos jogamos no chão da sala. Fizemos amor de barriga cheia, parecendo duas focas após comer e ficamos deitados, abraçados no chão. Acordamos somente com o Ian gritando ao nos ver em casa. Ian tinha 11 anos, era índio de verdade, olhos puxados, pele morena, cabelos e olhos negros. Media 1,50 e pesava seus 40 kilos.. Carregava um sorriso imenso na boca e, por mais que o Cael insistisse que ele se parecesse comigo, era sem dúvidas uma copia fiel dele.

- PAAAAAAAAAAAAAAAAI! – berrou o jovenzinho ascendo as luzes e nos olhando com cara sapeca.

- Obrigado por ascender a luz e enfiar uma faca nos meus olhos – disse jogando a almofada nele.

O Cael ainda fazia caretas bem feias para entender o que acontecia.

- Há quanto tempo chegou? – perguntei me firmando no chão e olhando o menino.

- Agora! – respondeu ele fechando a porta, jogando a mochila em mim e depois tirando os sapatos – o pai Cael raspou a cabeça?

- Ninguém quis vir falar conosco, desta vez? – perguntou o Cael com voz grossa de quem tinha acabado de acordar, concordando a com a pergunta do Ian – nenhuma bronca, nenhuma reclamação, ninguém que tenha subido em árvores ou montado em animais?

- Nadinha! – disse ele balançando a cabeça negativamente – vocês viram a neve?

- Sim, sim e você?!

- Fomos acordados bem cedo pra vermos! Muito lindo, mas não sabia que ia durar até 9 da manhã. A Maria, uma das meninas burras da classe, foi pular na neve e partiu o queixo. Acredite em mim, teve que dar 05 pontos. Burra pra caralho!

Não deu outra, eu explodi em gargalhada. O Cael me olho com cara de zero amigo, daqueles que me jogaria na primeira vala que visse.

- Que foi? – perguntou o Ian rindo, mas sem entender.

- Primeiro, cadê nosso abraço? – perguntei estendendo os braços.

E lá vieram, 40 kilos de garoto pra cima de nós dois. Primeiro ele abraçou o Cael e passou a mão na sua cabeça raspada e depois veio aos meus braços.

- Vocês dois estão fedendo! – disse ele se afastando da minha barba – estão fedendo a baba e peixe. Que fedor!

- Falo aquele que está cheirando a limpeza! – disse o Cael cheirando o sovaco do garoto.

Depois, com todo carinho do mundo, o Cael se levantou e foi até o banheiro mijar e ligar o chuveiro para esquenta a água.

- Por que o pai Cael tá bravo? – perguntou o Ian mexendo na minha barba.

Eu não aguentei e enfiei minha cara na barriga do Ian e comecei a rir.

- Pai, por que você está rindo, seu tonto? – perguntava o moleque sem entender.

- Pergunte ao seu pai, por que ele está com a testa relada? – disse enfiando a minha cara na barriga do meu filho pra abafar o som.

- Você é filha da puta Yuri Martel! Muito filha da puta! – disse o Cael de dentro do banheiro – quero os dois, aqui dentro, agora.

Nos levantamos, ajudei o Ian a tirar a roupa e fechamos a porta pra não congelar. Se antes era ruim caber 02 homens dentro de um banheiro pequeno, agora com 03, tínhamos que fazer malabarismo. Bolamos um esquema de lavagem da família, quando o banho era coletivo: o primeiro de todos a se lavar era o Ian. A gente lavava, simultaneamente para que saísse o mais rápido dali e pudesse ficar desfrutando da água quente enquanto nós dois, brutamontes, de pele grossa, pudéssemos nos lavar. Eu e o Cael ficávamos responsável por lavar da cintura pra cima, já que éramos altos, o Ian da cintura pra baixo. E, cada um ali, era responsável por lavar suas próprias partes intimas. Depois era minha vez e por último o Cael.

- Pai Cael? – pediu o Ian ao Cael para ser pego no colo.

- No colo? Dentro desse banheiro? Eu vou matar o seu pai – respondeu o Cael que tapava o riso com a boca.

- Ou, se preferir, pode descer aqui.

O Cael se agachou e ficou de frente ao Ian.

- Ficou ótimo o seu cabelo!...

- Obrigado! Acabou? – perguntou ele olhando feio pra mim.

- Que você fez na sua testa? – perguntou o garoto rindo.

- Eu fui pular na neve e rachei a testa! – respondeu ele vindo e apertando a minha costela.

Mas nada do Cael fizesse, nos fazia parar de rir. Ele se levantou e saiu do banheiro, sem se enxugar, pingando pela casa toda, naquele frio que fazia.

- Não acredito que ele fez isso! – disse o garoto mijando de tanto rir.

- Nem eu!

Nos secamos, bem rápidos, e saímos do banheiro. Ficamos rindo boa parte da noite, até o Cael "jogar-sujo" com o Ian e jogar um pacote com uns 20 alfajores no seu colo. O sorriso de garoto sumiu na hora.

- Vocês foram a Punta? – perguntou o Ian com a boca aberta e olhos semicerrados.

- Fomos passear. Passeio de pais.

- Como vocês dois são cabaços! – disse ele colocando os alfajores de lado.

- Foi ideia do seu pai Cael – disse olhando dentro dos olhos de índio.

- Mas você foi!

- Bom, tem sopa pra todos aqui e depois cama – disse o Cael com sorrisinho de vitória.

Ser pai é ter que ir à escola 02 vezes na vida. A primeira, quando nós cursamos. A segunda, quando temos que levar os filhos nossos. É uma das obrigações que temos e não se compara a ter uma cachorro, como a maioria das pessoas comparar ao chamar os cães de filhos. Ter filho vai muito além de banhos, de comida, de passeios. Ter filhos é estar eternamente ligado a algo que vai necessitar de você. Quando eu disse cães, por favor não se ofendam. Mas a maioria das pessoas de hoje, acha que cães são como filhos. Mas não são! Você pode muito bem deixar um pouco de ração e água para seu cão, numa sexta-feira à noite, caso queira ir a uma balada. Mas não pode fazer isso com uma criança. É muito fácil dizer, quero ter um cão. Porque, querendo ou não, o cão, no final das contas, sempre irá obedecer o dono. Já seu filho, vai morrer de fome se você não alimentá-lo.

Acabamos tomando uma sopa forte, ajudei o Ian com material da escola de amanhã e fomos dormir. Acordamos cedo na segunda-feira. O Cael ia arrumar suas coisas para trabalhar com os demais do acampamento, já eu e o Ian íamos para a escola. A discussão daquela manhã era sobre Ian querer ver a neve de novo e o Cael querer que ele se aprontasse pra escola.

- Por favor, por favor, por favor pai – pediu ele segurando a mão grossa e peluda da Cael.

- Já disse, sem banho, nada de brincar! – disse o Cael apontando o banheiro com o dedo.

- Tá frio pai. Dormi a noite toda e não suei nada! Por favor, deixe eu ver a neve?

- Aprenda a tomar banho Ian. Quando eu não tiver aqui você vai apodrecer. Eu e seu pai tomamos banho todos os dias.

- Poxa, ontem foi Punta e hoje a neve. Sacanagem pai!

- Eu avisei sobre Punta – disse batendo os dedos na mesa.

- Nem Punta e nem a neve vão sair da onde estão! Agora banho – disse o Cael sério.

- O pai Yuri não toma banho cedo, assim!

- Você não precisa ser como seu pai Yuri. Aliás, seu pai tem outras obrigações. Depois, ele lhe toma banho.

O garoto de olhos puxados e cabelos negros e liso, procurara meus olhos como forma de forma de apoio, mas não ia desrespeitar o Cael na frente dele. Apenas pedi para que fosse logo com aquele banho, então o jovenzinho fora para o banheiro fungando. O Cael voltou para a pia onde começara a preparar o café. Ajudei ele a fazer o lanche do Ian, já que o Cael tinha que se encontrar com outros trabalhadores rurais.

- Ele está aprendendo com você a ser um porco! – disse ele sem me olhar nos olhos.

- É que ele não viu como o pai dele era antes de me conhecer! Qual é Cael, o garoto está certo! Nevou novamente numa cidade que nunca tinha nevado e você quer faze-lo tomar banho! Deixasse o garoto ver 05 minutos de neve.

- Não... ele pode tudo! Abro mão de tudo, menos limpeza. Terá mil outras nevascas. Jura que ele vaificar falando de Punta o ano inteiro?

Apenas concordei rindo.

- Qual a graça?

- Você todo limpinho. Até parece que não vivia mijado de vaca, com bosta nas botas, placenta de bezerro pelo corpo.

- Eu estava trabalhando. Ian tem apenas 11 anos e está na escola.

- Mesmo no dia de neve!

- Mesmo! – respondeu ele olhando dentro dos meus olhos, significando que não haveria exceções.

Me levantei e o abracei por trás. Passei a mão na sua cabeça raspada que um dia já deu lugar para uma cabeleira terrível. O Cael de hoje era um homem sorridente, com marcas da idade pelo rosto e várias tatuagens pelo corpo.

- Te amo meu amor! Te amo mais que tudo. Vocês são minha vida, sabia?

- Sabia que o Ian não come sanduíche sem presunto? Isso, lembrando que sou o vilão dessa família– pediu ele apontando o pacote de presunto do outro lado da pia – obrigado amor da minha vida! Te amo mais que tudo.

- Está gostando da nossa vida de casados? – perguntei ao Cael que estava compenetrado em mexer nos lanches.

- Sim! Sim, melhor impossível – respondeu ele arqueando as sobrancelhas – posso saber por quê?

- Curiosidade!

- Hum! E você?

- Confesso que nunca achei que teria tantos pelos juntos, mas é maravilhosa. Você não poderia ser melhor homem e nem o Ian melhor filhote.

- Qual é? O guri é maior puxa saco seu! Com toda certeza ele é o melhor filho.

Ele fitou os lanches por um bom tempo até responder que sim. Sabia que nossa vida de casados era um pouco exaustiva, mas por conta dos meus problemas.

- Cael, uns dias pra que vejo que... sei lá, andas meio enciumado com o Ian.

Ele me olhou bem fundo nos olhos, sabe quando queres dizer algo, mas ainda não está formulado, então abriu o sorriso Cael.

- Te amo mais que tudo! – respondeu ele sorridente.

No seu pulso esquerdo, em letras de crianças, bem finas, estava escrito "Eu Prometo" em uma tatuagem simples. Passei a mão nela e ele me encarou com aquele olhar "De novo vamos entrar nesse assunto!". Eu sabia que uma hora ou outra esse assunto viria a tona, mas que não fosse hoje. Dei um beijo no Cael e fui até o banheiro ajudar o Ian a se trocar.

- PAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAI – berrou ele ao me ver passar pela por – TÁ FRIO!

Apenas consegui gargalhar da cena daquele homenzarrão de 1,50 pedalinho e carrancudo comigo.

- Já lavou tudo? Lavou esta pistola, seu saco, o furico e tudo?

- Tudo! – respondeu ele enxugando os olhos com a mão.

- Se sair alguma coisa na toalha eu coloco sua bunda no gelo!

- Não vai sair nada!

- Olha só heim. Já viu um lava jato de carro?

- Só na TV!

- Sabia que eles secam o carro assim? – perguntei catando o Ian no colo, enrolando a toalha nele e esfregando todo o seu corpo de uma vez só.

Ele ria, pois fazia cócegas, por fim deixei seu cabelos arrepiados para o Cael pentear.

- Nada de um lado, nada de outro, pronto! Vai por essa cueca – disse dando um tapa na bunda dele.

- Pai?

- Sim!

- Me leva um dia pra ver o lava-jato?

- Ficou curioso pra saber se lavam assim, não ficou?

- Não! Apenas eu nunca vi um, então... queria ver um de perto! Talvez tenha alguns em Montevideo.

- Promete?

- Prometo sim!

- OBAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!

Ajudei o Ian se vestir bem vestido, ensinei a ele pentear de forma que seu topete negro ficasse arrepiado. Saímos do banheiro e lá estava o Cael, sentado à mesa, tomando seu café. Ian sentou-se à sua frente, lugar que ficava ao meu lado e devorou o misto quente.

- Quais aulas você tem hoje?

- Matemática blééééééh, ciências, história, catelaño.

- Materiais estão todos aí?

- Sim!

- Tarefa feita?

- Tá pai, desde sexta o pai Yuri fez comigo! – respondeu ele tomo homenzarrão da casa.

Fiz sinal para deixa-lo comer em paz. Era natural eu e o Cael não se cobrar com coisas tão tolas, mas depois que tivemos o Ian e soubemos o quão são independentes. Se nós não pedir pra que comam, eles não comem. Só que do nada vem a fome, no meio do dia, ai eles ficam putos, choram e a culpa é nossa. Se nós não pedir pra mijar, eles não mijam. Depois é aquela trabalheira pra achar lugar pra mijar, fazer coco, porque tudo que pergunta na hora, ninguém quer. Passou 05 minutos, se não fizer a vontade deles, eles viram os capetas.

- Quero saber quando vão me levar a Punta?

- Pelo amor de Deus! Parece que nunca foi a Punta!

- Podemos ir um dia desses, pra jantarmos. Que tal? – perguntei fazendo o Cael revirar os olhos.

- Hoje? – perguntou o Ian enfiando o resto de lanche na boca.

- Talvez no final de semana! – respondeu o Cael me olhando nos olhos.

- Ok, eu, Yuri Martel quero ir a Punta jantar, quem quer ir comigo?

- EUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU! – berrou o jovenzinho.

O Cael apenas fez sinal de "joinha" pra mim, num gesto de reprovação, e voltou ao seu lanche.

"Poxa, eu também sou pai! Sem falar que meus limites temporais não são muito bons.".

Deixei meus homens a mesa e fui até o quarto pegar meu abrigo e o do meu filho. Esperamos ele terminar de comer e fomos lá fora ver a neve. Mais uma vez, ao abrir a porta, aquela visão linda do pasto branquinho, sob um sol nascente amarelo.

- Ian, diga ao seu pai pra não pular na neve – eu disse arrancando gargalhadas do garoto.

- Que burro!

- Tá certo! Continue assim e nada de Punta. Agora vai ver essa neve antes que ela derreta – disse o Cael empurrando o garoto para brincar na neve.

Depois ele veio e se encaixou nos meus braços, me deu um leve beijo e se encolheu em mim. Suas bochechas estavam vermelhas e seu nariz escorria.

- Quer ir lá pular, meu amor?

- Cuzão! – ele respondeu rindo – vou morrer e nunca vão esquecer desse dia. Sorte o guri não ter visto.

- mas viu ele roxo na testa!

- Yuri Martel, eu sei que está planejando leva-lo a Punta após a escola.

- Por isso eu te amo!

- Mas tenha juízo, heim! Ele tem apenas 11 anos.

- Fica sossegado, estou devendo esse dia a ele faz tempo. Sabe disso!

- Só quero saber se vai ficar tudo bem. Última vez que teve recaída foi em um passeio com o Ian...

- Cael, eu não to sentindo absolutamente nada1

- Além de termos você, agora temos o Ian. Estamos em outro país. Se você sumir e deixar seu filho desaparecido, ninguém no planeta vai conseguir devolver um índio de uma família de homossexuais.

- Tô falando serio, pô!

- Não fique assim. Quero apenas o melhor para nós três!

"Posso jurar e prometer o quanto quiser, pois não tinha moral alguma para comandar minhas ações!"

- Vamos Ian? – chamei nosso filho que fazia bolas de neve com a mão e logo jogos em nós dois – Vem dar um beijão no pai Cael.

Ele veio correndo, como se o gramado fosse um chão plano, com piso antiderrapante. Apenas fechei os olhos e senti aquele monstrinho colidir com força em nós dois que estávamos abraçados. Graças a Deus, no quesito pais homossexuais, o Ian ia crescendo e evoluindo bem. Não deixando a sociedade o influenciar. Ele abraçou o Cael com força, depois esfregou sua careca que estava espetando e beijou seu rosto. Dei um beijo na boca do meu amor e sai de mãos dadas com nosso filho pelo pasto. O Cael ia ficando ao longe nos olhando e depois correu ao nosso encontro. Tínhamos esquecido a mochila e, mais uma vez ele se ajoelhou de frente ao Ian e num suspiro disse:

- Eu prometo! – olhando no fundo dos olhos do garoto que, por segundos precisou da sua ficha cair.

- Eu prometo! – respondeu ele com uma voz fraca.

"Eu daria meu cu com areia pra saber o que significava essa porra de promessa. Um dia eles sorriam, outro dia com cara de bosta. Lógico que era um código de cuida do seu pai pra mim! Pra uma criança de 11 anos, deveria ser um cu cuidar de um pai "bomba-relógio'."

- Nossa, agora cheguei até ficar com ciúmes com essa "promessinha" dos dois.

- Vão logo, se não vão se atrasar! – pediu o Cael, porá mais uma vez não entrarmos nessa situação.

Caminhamos pelo pasto branco até chegarmos a uma ruazinha da pequena San Carlos. Lá encontramos com os demais garotos da comunidade. Todos eles iam acompanhados dos seus pais.

"Prometo que os diálogos ficarão em castelaño. O meu amigo tradutor está viajando!"

- Hola Yuri e Ian!" – disse um dos garotinhos que era da classe do Ian.

- Buenos dias Alejandro!

Alejandro era um dos melhores amigos do Ian, estudavam na mesma classe e frequentava muito nossa casa.

- Como foi o final de semana?

- Muito bom! Visitamos uma comunidade aqui perto! Vemos a neve a uma de nossas amigas bateu o queixo no chão.

Todos rimos e contamos a história do Cael.

- Que bom que tiveram um bom final de semana!

- Tio Yuri, quiero saber se o Ian pode brincar conosco hoje à tarde?

- Acredito que sim! – respondi ao Alejandro.

- Eu acho que não! – respondeu o Ian puxando minha mão pra baixo.

- Faz o seguinte, falarei com o Ian e Cael e ele te procura. Tudo bem?

- Sim! Até mais – despediu o garoto correndo pela rua.

Continuamos caminhando até o garoto sumir.

- Você não se recusou brincar por causa de Punta? Fica frio que vamos a Punta e fará todas as suas coisas.

- Não é isso! – respondeu ele olhando para os pés.

- Por que está com essa cara? – perguntei ao menino que chutava a neve da rua.

Ele apenas me olhou e balançou a cabeça negativamente.

- Ian... o que está acontecendo? Conta pra mim, confie em mim, sou seu pai.

- Assim como o pai Cael!

- Ian, somos seus pais. Óbvio não ter segredos!

O garoto abaixou os olhos mais uma vez. Estava acontecendo algo naquela cabecinha.

- Ian venha aqui – chamei o garoto até um banco que ficava na rua.

- Eu já estou atrasado!

- E eu sou seu pai.

Ele deu de ombros.

- Pode me dizer o que está acontecendo, eu prometo não dizer ao pai Cael.

- Promete?

- Prometo! – disse cruzando os dedos.

Ele olhou para os lados, como se estivesse certificando que ninguém estava mais ouvindo.

- Qual é pai, como foi querer ficar com o cara mais chato do mundo?

Eu explodi na risada. Daquelas que precisava de um tempo para me recompor.

- Nunca deixe o Cael saber disso!

- Sério, ele é chato pra caralho, feio, mal humorado. Já você é bonito, sorridente, amigo de todos.

- O pai Cael é homem mais perfeito que conheci na vida.

- Sabia que ia dizer isso! – disse ele fungando.

- É que você não tem idade pra saber disso. Mas um dia vai entender o motivo dele ser assim.

- Ele só sabe mandar, mandar, mandar e brigar...

- Porque ele é um verdadeiro líder. Ele tem que cuidar de dezenas de famílias e mais a nossa. Seu pai é um dos maiores homens daqui de San Carlos, sabia?

- Se ele é, por que ninguém quer ser como ele? Por que ninguém fala do pai Cael como uma grande homem? Por que todo mundo quer ser como você pai Yuri?

- Com assim? – perguntei sem graça.

- Todas as meninas da classe te acham lindo. Todos falam que você foi um grande homem. Que você salvou muita gente. Você é um super herói pra todos aqui. Você poderia até ter uma família que nem todos aqui!

- Ei, ei, ei, ei... então essa história não é sobre o Cael, mas sobre essa imbecilidade de normal ou não?

- Pai, entendo bem o que somos, apenas dizendo que não precisamos que nossa família tenha alguém chata.

- Aí eu me separaria do seu pai e ficaria com alguma mulher? – perguntei olhando no fundo dos seus olhos.

- Sim! – respondeu o jovem suspirando.

- Diga que isso não veio de nenhum amigo seu da sua classe ou algum bando de idiotas que enfia essas coisas na sua cabeça?

- Alguns...

- Ian? – disse me ajoelhando aos seus pés.

- Pai?

- Quem somos nós 03?

- Uma família!

- Somos ligadas pelo o que?

- Amor!

- Ian ?

- Amor pai!

- Você realmente ama sua família.

- Amo pai!

- Só que...?

- Que não sou um garoto de 11 anos normal. Tengo que fazer coisas que muitos garotos de 18 anos não fazem.

- E agora é seu pai te dando bronca. Isso é problema dos garotos de 18 anos. Cada família tem seu problema, você vai descobrir isso cedo ou tarde. De forma sutil ou dolorida, mas todas tem seus problemas. Se eu digo a você que o Cael te ama, então acredite em mim, ele te ama. Ele é o maior homem que conheci na vida e um dia você vai entender também! Você acredita em mim?

- Acredito!

- Se alguém dizer algo ao contrário, por favor me diga.

- Claro!

- O Cael disse alguma coisa?

- Não, pelo contrário. Ele nunca diz nada. Apenas que vocês dois me ama!

- Então acredite em nós! Agora vamos.

Puxei ele e o coloquei sob meus ombros e caminhei até a escola. O coloquei no chão quando chagamos, ganhei meu beijo.

- Ian, acredite em mim quando digo que o pai Cael te ama mais que tudo!

- Eu acredito! – disse ele num sorrisinho frouxo.

- E acredite também quando dizemos que somos a melhor família pra você.

- Eu acredito pai!

- Então boa aula e hoje vamos dar nosso rolê – disse fazendo o sorrir.

- Acredite em mim quando disser que tenho que fazer coisas que garotos de 18 anos não fazem – disse ele abanando a mão e saindo para dentro da escola.

- Essa conversa fica pra depois. Quando sair da escola.

- Tanto faz! – disse ele se virando e enturmando com os demais da sua classe.

Essa história de 18 anos era totalmente a respeito dele ter que dividir sua vidinha com cuidar de mim e da casa. Cuidar de um pai "bomba-relógio". Por algum motivo ele estava estressado com essa rotina que ele não precisaria ter. Eu ia pra casa e teria uma conversa séria com Cael. 

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