1: (não) misture tequila e cerveja

A fotografia entre seus dedos causava-lhe um sentimento agridoce de saudade. Mesmo com a música alta e as pessoas indo e vindo como carros em uma avenida, ele não conseguia desviar os olhos daquela pequena imagem na sua mão e relembrar com nostalgia de uma época que jamais voltaria. Um tempo onde tinha um melhor amigo, uma alma gêmea, mesmo que brigassem todos os dias pelos motivos mais bobos do mundo. Como o sabor do sorvete, qual filme assistiriam, pipoca doce ou salgada, eles nunca corcordaram com nada.

Jungkook analisou a foto com ternura, permitindo-se sorrir minimamente ao observar como Jimin estava adorável. Ele sorria sem mostrar os dentes, retraído, provavelmente para esconder o aparelho ortodôntico. O boné virado para trás e torto na cabeça era estilo como o próprio sempre dizia quando perguntavam a respeito. Já Jungkook estava um desastre, vestido todo de preto, lápis de olho forte e o cabelo repicado e espetado para todas as direções.

Por que ele se vestia assim, mesmo?

Lembrou-se de quando se conheceram — dois anos antes daquela foto —, de como Jimin defendeu-o dos valentões da escola e em como sorriu docemente mesmo com um nariz quebrado. Nunca mais se separarm depois disso, e logo depois surgiu Namjoon, o aluno novo e esquisito dos oculos gigantes. Eram o trio inseparável, o tipo de amizade que Jungkook queria levar para a vida inteira.

Um suspiro melancólico escapou por entre seus lábios e ele sorveu o conteúdo morno da sua garrafa de cerveja, fazendo uma careta logo em seguida.

Não existe nada pior que cerveja quente.

Era estranho pensar no contraste entre passado e presente ali naquela festa, onde todos estavam se divertindo menos ele. Seus amigos estavam espalhados por aí, cada um com seu par e alguma bebida. Mas ele estava naquela sala, encarando um pedaço de papel e sentindo-se um tonto por ter tomado as decisões erradas em todas as oportunidades certas e agora se lamentava. Jungkook sempre desejou continuar tendo Namjoon e Jimin para sempre, mas sentia que estava perdendo o rapaz de fios descoloridos pouco a pouco e isso era muito pior que cerveja quente.

Jimin era como um peixe flutuando ao redor de si. Lindo, colorido, radiante, mas todas as vezes que tentava tocá-lo, ele fugia por entre seus dedos com rapidez. Porque Jimin nasceu para ser livre, e Jungkook devia se contentar em apenas observá-lo voar por aí como uma borboleta. No entanto, ele não se conformava com o fato de que havia se apaixonado por um espírito livre, não suportava saber que Jimin beijava outras bocas além da sua, não aguentava ficar sozinho em um lugar lotado enquanto imaginava onde ele poderia estar.

Quanto mais Jungkook pensava, mais maluco parecia ao seu ponto de vista.

Guardou a fotografia de volta na carteira, assim como todos os sentimentos que ela fazia-o ter. Levantou-se, decidido a pegar algo gelado no bar e tentar esquecer um certo rapaz de cabelo cor-de-rosa. Ele provavelmente estava muito bem sem ele, Jimin sempre foi independente, deveria seguir o exemplo e fazer o mesmo. Olhou ao redor, à procura de alguém que lhe chamasse atenção, mas ninguém tinha o sorriso dele ou os olhos de raposa que tanto lhe enfeitiçaram.

Era inútil procurar alguém ali quando sua mente insistia em arrastá-lo até Jimin.

Chegou no bar, pediu uma dose de tequila e se perdeu encarando as garrafas expostas na parede à sua frente. Quando foi que tudo começou a dar errado? Talvez foi desde o primeiro beijo? Estavam bêbados demais para saber o que estavam fazendo, e quando acordaram nus na cama de Jungkook, prometeram nunca mais repetir aquilo para não correr o risco de acabar com a amizade.

Essa foi a primeira das mil e uma promessas quebradas.

Assim como Jungkook e Jimin não paravam de discutir sobre tudo, pois esse era o estranho modo deles demonstrarem afeto um pelo outro, os garotos também não conseguiram afastar os corpos um do outro depois de descobrirem os sabores únicos que guardavam. Eram como polos opostos, se atraindo cada vez mais, até que estivessem completamente colados. Com pernas e línguas entrelaçadas, calores compartilhados, suspiros mesclados.

O erro de Jungkook foi entrelaçar seu coração em meio às pernas de Jimin. Esquecendo-se de quem ele era, ignorando todos os avisos que sua mente lhe dava cada vez que Jimin gemia seu nome como se fosse um mantra, uma oração que fazia com demasiada devoção. Conhecia todos os seus meios de trapaça, e mesmo assim caiu. Jungkook era mesmo um tolo. Se perdeu naquele sorriso cafajeste, se encontrou no olhar brilhante e deleitoso ao atingir seu ápice, e mergulhou em seu corpo como se fosse um submarino em alto mar.

Mas... Jungkook estava mergulhando cada vez mais a fundo, e sentia o oxigênio se fazer escasso cada vez mais.

Assim que a tequila foi posta na sua frente ele virou o copo de uma vez, sentindo a bebida descer queimando pela garganta e deixá-lo levemente zonzo. Não era recomendado misturar bebidas, assim como misturar sentimentos com sexo casual. Ambos poderiam trazer sérios efeitos sob seu corpo. No dia seguinte poderia vomitar as tripas e coração, e, naquela noite, sentia os órgãos se embolarem dentro de si somente em pensar em Jimin Park.

— Você tá péssimo. — uma voz ao seu lado soou, chamando sua atenção de volta a realidade. Uma realidade barulhenta, solitária e sem Jimin. Yoongi estava sentado na banqueta ao seu lado e mesmo que não o encarasse, Jungkook sabia que ele já havia lido todas as suas expressões. Yoongi era assim, sempre se atentando a cada detalhe.

— Onde tá o Hyunie? — desconversou, ignorando o comentário a respeito de si mesmo. Naquela noite, estava disposto a até mesmo esquecer seu nome se isso significasse apagar seus sentimentos românticos para com Jimin Park.

— Na pista de dança com Jin. — apontou, sorrindo daquela forma boba e brilhante que apenas tolos apaixonados fazem.

Jungkook encarou o lugar indicado pelo amigo, vendo Jin e Taehyung focados na coreografia perfeita de alguma música da Ariana Grande. As garotas em volta deles encaravam-os um tanto embascadas, Jungkook sorriu.

— Eles não perdem uma chance de fazer um show.

— Eles nasceram para brilhar, Jun. — o barman deixou um copo de uísque com gelo na frente de Yoongi e ele agradeceu com um aceno. Jungkook observou-o sorver a bebida em silêncio, sendo atormentado por pensamentos que envolviam fios cor-de-rosa. — O que você tem? Brigou com o Ji?

A pergunta pegou Jungkook de surpresa e ele desviou os olhos, enquanto refletia sobre. Quem dera estivessem brigados, quem dera Jimin fosse aparecer em sua porta com uma barra de chocolate e olhos brilhantes como um pedido de desculpa. Entretanto, dessa vez não houve nenhum desentendimento, nenhuma discórdia. Haviam se afastado, fazia uma semana que não se falavam e Jungkook estava, aos poucos, sucumbindo em si mesmo.

— Não, a gente só... — o que eles estavam fazendo? Dando um tempo? Em que? O que tinham? Sequer ainda eram amigos? — Sei lá, Yoon. Não faço ideia do que tá rolando com a gente.

— Já tentou conversar com ele?

Jungkook lançou um rápido olhar cansado ao amigo, já esperando por aquilo.

— Já, e a gente sempre acaba na cama.

— Cara, vocês precisam conversar. — Yoongi fez um tsc com a boca antes de sorver mais um gole do líquido âmbar do seu copo. — Aproveita e faz isso hoje. — ele levantou-se assim que terminou de tomar sua bebida e lançou um sorriso lateral a Jungkook, que lhe encarou confuso. — Agora irei levar meu amor para casa. Até mais, Jun. E boa sorte.

Ainda com o cenho franzido, Jungkook observou Yoongi se afastar de si, com os fios longos e sedosos ricocheteando as luzes da pista assim que se aproximou para puxar Taehyung para longe. O que ele quis dizer com fazer isso hoje? Ele deveria ir até Jimin? Mas isso não seria muito extremista da sua parte? E se ele estiver acompanhado em casa? Não queria nem pensar nessa possibilidade.

O rapaz tatuado estava prestes a se virar para pedir outra dose de tequila, mas travou assim que o viu. Jimin estava ali, naquela maldita festa, sorrindo como se soubesse que tem o mundo aos seus pés. Desfilava por entre o mar de gente com um ar de superioridade, Jungkook se odiou por achar aquilo tão atraente e odiou ainda mais a porra do seu coração que não parava de martelar fortemente em seu peito ao vê-lo se aproximar cada vez mais perto de si. Ele vestia uma camisa de uma estampa esquisita e um casaco com lantejoulas, fazendo-o cintilar como um globo espelhado. Os fios rosados caiam sob o rosto perfeito com simetria, refletidos pelas luzes coloridas do ambiente.

Jimin finalmente o viu ali e sorriu, como se aquela fosse a terceira vez que se encontravam naquela semana, como se estivessem se falado todos os malditos dias em que ele ficou se martirizando em seu apartamento, sentindo o cheiro de Jimin por toda parte. Observou ele sentar ao seu lado, pedir uma cerveja e ponderou se deveria falar primeiro e o que. Por fim, afastou qualquer devaneio e pediu outra tequila.

— Você ficou irresistível com esse corte. — a voz suave e sedutora de Jimin soou sob o som alto, causando arrepios no corpo de Jungkook. Ele se odiou um pouco mais, e encarou o dono da voz, perdendo-se em cada traço e expressão dele com facilidade.

Jimin tinha o punho apoiando o rosto, olhos famintos e um sorriso sugestivo dançava entre os lábios fartos e corados. Isso não era bom, Jungkook sabia bem onde aquilo iria dar. Enrolados entre os lençóis, ardendo em chamas. Aquilo era péssimo para alguém que esperava ter uma conversa madura e esclarecedora.

— E você tá parecendo um enfeite de natal com essa jaqueta, eu adorei. — alfinetou, tentando com todas as forças destruir aquele clima de tensão sexual que sempre surgia entre os dois. Jimin gargalhou, o que não foi nada bom para o seu coração idiota que deu solavancos dentro do peito.

A cerveja foi colocada na frente do rapaz, mas ele não desviou sua atenção de Jungkook e ainda ostentava aquele mesmo olhar faminto que causava calafrios nele.

— Eu vesti ela apenas para que você pudesse tirar, querido.

O pequeno copo de tequila foi colocado próximo a mão tatuada de Jungkook e ele engoliu em seco, sem desviar os olhos daquele mar escuro do olhar de Jimin. Ele ainda encarava-o com aquele maldito sorrisinho sacana e o jovem quis se afogar em seu copo e naqueles lábios. Para afastar qualquer pensamento promíscuo, ele soltou um risinho sem humor e segurou o sua bebida, sem uma real intenção de bebe-la.

— E sabia que eu estaria aqui?

— Falei com o Yoon mais cedo, ele comentou que viriam todos para cá. — respondeu desinteressado, antes de sorver um gole da cerveja lentamente. Jungkook observou o ato com a boca seca.

— E por quê não falou comigo?

Jimin travou, encarando a logomarca da garrafa esverdeada em sua mão com um olhar perdido. Jungkook virou o copo de tequila de uma vez, mas o queimor que desceu pela sua garganta não foi tão intenso quanto o do peito quando o rapaz de cabelo cor-de-rosa lhe encarou, seus olhos mais afiados que qualquer espada já forjada.

— Você também não falou comigo. — sorriu presunçoso, deu uma piscadinha e tomou mais um longo gole da cerveja.

Touché. Ele tinha razão.

Jungkook suspirou, sentindo a cabeça girar e o calor do álcool esquentar seu corpo lentamente. Não deveria ter bebido, não era seguro ficar bêbado na presença de Jimin Park. Encarou a figura brilhante na sua frente se levantar e acompanhar o ritmo suave da música, como uma serpente, se rastejando lentamente até ele.

— Jimin, a gente precisa conversar... — murmurou com dificuldade, ao mesmo tempo que sentiu as mãos delicadas pousarem no seu ombro e visualizou o sorriso mais brilhante que qualquer estrela do céu.

Jimin passeou os dedos delicadamente pelo seu braço recém cicatrizado das tatuagens, parando-os em meio a serpente e sorriu, como se pudesse ler o significado de cada desenho da sua pele. Jungkook o odiou um pouco, ao mesmo tempo que desejou enfiar os dedos entre aquele cabelo e arrancar aquele sorriso presunçoso que ainda permanecia na sua boca.

— Hoje eu só quero dançar, Jungkookie. — disse ele, arrastando cada sílaba do nome do rapaz como se ele fosse feito de elástico. Jungkook sentiu seu mundo tremer, mas algo lhe dizia que não era o álcool em seu sangue. Jimin o puxava pela mão, convidando-o para acompanhar os movimentos lentos e hipnóticos do seu corpo.

— Eu... Você sabe que não danço. — murmurou uma resposta com dificuldade, pois seu olhar estava preso em como Jimin movia a cintura com maestria. Um riso divertido escapou pelos lábios brilhantes por lip balm, Jungkook engoliu em seco.

— Mas eu quero dançar com você... Vamos! — ele praticamente implorou, com um par de olhos brilhantes e um biquinho adorável. Jungkook suspirou, completamente rendido.

Se Jimin pedisse uma estrela do céu, ele voaria até lá e traria outras mil.

O rapaz levantou-se, sentindo o chão sob seus pés um pouco maleável, mas ignorou, acompanhando Jimin até a pista de dança. Seus dedos estavam entrelaçados, ele sorria como se fosse o maior sortudo do mundo e Jungkook sentia seu coração bater um pouco mais rápido que tambores de uma bateria.

O aspirante a ator agarrou-o assim que se juntaram ao mar de pessoas dançando, e Jungkook deu um sobressalto. Jimin tinha o peito colado no seu, o braço enrolado no seu pescoço e a virilha roçava perigosamente na sua ao ritmo da música. O rapaz engoliu em seco, o que ele estava fazendo?

— Dança comigo, Jun... — ele sussurrou, com os lábios extremamente próximos do seu ouvido e ele suspirou deleitoso ao sentir seu hálito quente chocando-se contra sua pele. — É só me acompanhar...

Jungkook ergueu a mão direita, que formigava em vontade de tocá-lo e segurou sua cintura com delicadeza. Ele continuava movendo-se graciosamente com o corpo colado no seu, fazendo o calor se triplicar e sua cabeça girar ainda mais. Jimin cheirava a cereja, bala de menta e pêssego. Jungkook sentia-se entorpecido por todos aqueles aromas.

— As pessoas estão nos encarando. — o rapaz tatuado comentou, lançando um rápido olhar ao redor, onde as pessoas encaravam-os com olhares curiosos e outros enjoados. Jimin o encarou por trás da franja rosada e sorriu.

— E daí? Estão vendo dois gostosos dançando, é impossível não encarar.

Jungkook soltou um risinho, se deixando levar pelas batidas envolventes da música e os movimentos do corpo de Jimin, e começou a mover-se timidamente tentando acompanhá-lo.

— Você não tem medo? — ele perguntou, perdendo-se em meio ao olhar doce do rapaz em seus braços.

— Do mundo? Claro, mas não vou deixar de dançar com o cara mais gato dessa festa por isso.

— Você é inacreditável, Jimin Park.

— E você dança muito mal, Jungkook Jeon.

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