Capítulo XIV




A P R I L

MINHA MENTE ESTAVA GIRANDO de cansaço. Meus músculos, pesados contra a cama, relaxaram até que eu não cogitasse mais me mexer. Cada pequena célula do meu corpo parecia ter derretido e se transformado em geléia. Se eu me concentrasse bem, poderia sentir o cheiro de amaciante impregnado no cobertor grosso. Ele me envolvia em uma oferta irrecusável — mais que irrecusável: era impossível sair dali. A gravidade parecia exercer uma força extra sobre mim, me aprisionando contra o colchão.

Eu me deixei naufragar no escuro por trás das minhas pálpebras, flutuando até as beiradas da inconsciência em um sono tranqüilo e sem sonhos. Quando recobrei meus sentidos, passarinhos cantavam em algum lugar próximo à janela. Uma claridade acinzentada atravessava a cortina translúcida, revelando um quarto silencioso nas primeiras horas da manhã.

Se fazia frio lá fora, eu não tinha como saber.

Eu estava encaixada a Hunter Campbell em um abraço.

— Merda.

— O quê? – ele resmungou.

— Nós dormimos agarrados.

E foi bom.

— E daí?

— E daí que nós não podemos dormir de conchinha, Hunter. A gente não faz isso.

O peito dele vibrou em uma risada silenciosa e o corpo masculino se ajeitou preguiçosamente entre os lençóis, me trazendo pra perto. Os lábios dele se grudaram no meu ouvido e ele murmurou, rouco:

— Isso aqui – ele pressionou seu volume matinal contra a minha bunda, colando nossos corpos, e de repente eu me esqueci do que falávamos – Isso não é bem uma coisa romântica, April – os dedos dele trilharam um caminho pela minha pele arrepiada e se engataram no meu quadril, me puxando para si – É uma conchinha pornô.

Tinha um sorriso escondido na voz dele que me fez gargalhar.

— Tem razão – eu levantei o queixo para encontrar as íris azuis me encarando de volta – Isso é definitivamente permitido.

Hunter tinha o rosto de quem passou uma noite mal dormida, mas uma satisfação invejável moldava um sorriso em seus lábios. Eu me inclinei para depositar um beijo em sua barba rala, evitando a boca por motivos óbvios e ele fechou os olhos.

O sol se erguia vagarosamente no horizonte e nós ficamos ali, deitados em silêncio por um tempo incalculável. Não demorou muito para que raios matinais desenhassem um rastro de luz na parede, trespassando as cortinas finas para tingir tudo de um tom alaranjado. Se eu não me movesse, passaríamos a manhã inteira suspirando em contentamento, nos ajeitando um contra o outro até dormirmos novamente.

Parecia um sonho. Um delicioso fruto do subconsciente de uma mente cansada. Aquele momento preguiçoso estava longe de acabar, mas já escapava por entre os meus dedos como névoa desvanecendo na luz do dia. Resistir era inútil. Eventualmente, eu despertaria e minhas lembranças iriam embora.

Eu não vi mal algum em aproveitar um pouco antes de levantar e deixar tudo aquilo para trás. Meus olhos se fecharam e meus músculos amoleceram e relaxaram contra o colchão. Segundos se transformaram em minutos, e minutos se transformaram em uma fração imensurável de tempo. Peguei no sono junto a Hunter.

Quando acordei de novo, estava pronta para partir.





Deixar Hunter para trás, sozinho em uma cama vazia, foi mais difícil do que eu imaginava. Me arrependi no momento em que perdi seu calor, separando sua pele da minha. Seu rosto sereno permaneceu imperturbado enquanto eu me afastava, olhos fechados e cílios escuros repousados sobre as maçãs do rosto. Ele parecia ser o tipo de pessoa que dormia em qualquer lugar, a qualquer hora, pouco se importando com o barulho ou com a luz constante na cara. Era bonito de se observar, mas eu precisava ir. Mesmo que meu corpo desse todos os sinais de que queria ficar, eu não poderia ignorar a voz da razão.

No final, eu estava fazendo um favor a nós dois ao ir embora. Aquela era a única saída lógica para a situação. Quer dizer, o que mais eu poderia fazer? Dormir agarrada a ele durante toda a manhã? Me despedir como algum tipo de parceira de foda? Com certeza, não.

Eu me vesti às pressas, sem olhar na direção de Hunter uma segunda vez. Tudo que eu sabia era que eu precisava fugir daquele recinto o mais rápido possível. Escapar de uma vez por todas das memórias que permaneciam incrustadas naquelas paredes. Cada segundo que eu passava ali dentro era mais um segundo eu me sentia aquela estranha sensação crescer no meu peito.

Finalmente desci as escadas — descalça, pronta para encarar as faces exauridas dos meus amigos abatidos pela ressaca. Meu rosto estava limpo, vestido ajeitado em seu devido lugar e hálito refrescante graças a pasta de dentes que encontrei no armário.

Passei pelo corredor revestido por tábuas de madeira como um raio e fui atrás do cômodo de onde provinha o som de conversas exaltadas e música animada. Dentro da cozinha, encontrei Zoe e Zack. Uma sensação de alívio me invadiu de imediato, mas a culpa não dava sinais de ir embora. Merda.

— Bom dia — anunciei minha chegada.

— Bom dia, April — Zack, meu melhor amigo, ensaiou uma saudação. Ele tinha os olhos castanhos injetados de sono e cabelos castanhos desarrumados como um ninho de rato. Entregou-me um daqueles sacos de lixo grandes o suficiente para guardar um corpo e disparou: — Você e a Zoe tiram o resto do lixo da sala. Eu fico com o escritório.

Eu travei por um segundo, atordoada com tanta disposição antes das dez horas da manhã.

— Uau.

— Eu quero acabar isso rápido — ele explicou, e determinação brilhava em cada traço de seu rosto.

Apesar da intensidade exagerada, Zack tinha razão em se apressar. A cozinha estava irreconhecível. Embalagens e mais embalagens de salgadinhos jaziam reviradas pelo balcão, junto com várias garrafas de bebidas alcoólicas sem rótulo. Nem mesmo os móveis escaparam da destruição. Algum idiota tinha arrancado a porta de um armário embutido e, por isso, as dobradiças de ferro seguravam o nada, pendendo para baixo. Havia lixo enfiado em todo mínimo espaço, como um cenário destruído de série teen. Caos era a palavra que vinha à mente.

— Corra, April — essa era Zoe, arrastando um balde com um pouco de água pelo piso escuro.

Meu amigo revirou os olhos para o teatro dela, jogando um pano limpo por cima do ombro. Eu deveria ter avisado a Zoe sobre o jeito prestativo do meu amigo. Zack poderia ser o vocalista da The F Word e um sacana nas horas vagas, mas ainda era um maldito perfeccionista. Quando colocava uma ideia na cabeça, independente de qual fosse, ele ia até o fim. Se metade do que eu lembrava da noite anterior realmente havia acontecido, os dois já haviam adiantado uma boa parte, pelo menos na sala de estar.

O rádio acima da bancada anunciou o início de uma nova música. Era a trilha sonora perfeita para uma manhã de sábado, como uma canção que pedia para se cantarolada. Zack sorriu e puxou minha amiga pela mão. Ela não apresentou resistência ao pedido silencioso. Envolveu o pescoço do vocalista com os braços e riu divertida, acompanhando os passos dele.

Eca. Não acredito que deixei a cama para segurar vela.

— A gente deveria contar ao Finch sobre o cortador de grama no carpete da sala? — a voz de Zoe era cautelosa.

Zack sorriu, depositando um selinho rápido nos lábios cheios da quase namorada.

— Já cuidamos disso — outro selinho. — É melhor que ele não saiba.

Aquela era a minha deixa para desaparecer pelo batente antes que fosse obrigada a presenciar mais beijos.

Foi só eu me distanciar do cômodo que Zoe passou por mim saltitante:

— Vamos, April.

Segui a morena pelo corredor enquanto Finch Abberley, dono da casa, descia os últimos degraus da escada. Ele sorriu para nós e seu belo par de íris verdes viajou pelo meu corpo:

— Olá, pernas.

— Bom dia, Finch  — eu o saudei assim que alcancei o batente da porta

Retribuí sua olhada. Finch não vestia a camisa de banda que usava noite passada e estava descalço, assim como eu. Mesmo de longe, consegui ver que alguém havia rabiscado um tabuleiro ouija em seu abdômen nu com uma canetinha preta. A julgar pela vermelhidão em seus olhos, o garoto tinha acabado de acordar de uma puta ressaca e isso deveria significar que em algum momento da noite passada seu voto de sobriedade fora para o espaço.

— Essa seria uma tatuagem legal — comentei, apontando para a barriga dele.

Aparentemente, Finch ainda não havia notado o desenho. Ele parou no meio do corredor e passou uma mão pela pele delineada por tinta.

— Cacete — murmurou para si mesmo, franzindo o cenho. As engrenagens de sua cabeça pareciam trabalhar lentamente atrás de uma resposta — Será que é marcador permanente?

— Pelo menos não desenharam um pênis.

Meu comentário pareceu lembrá-lo de que eu ainda estava ali. Ele estreitou os olhos com ar de suspeita:

— Me acompanha até a cozinha, April?

Olhei por cima do ombro e Zoe fez um sinal de positivo.

— Claro. Ainda não tomei café.





Nós estávamos na segunda rodada de pizza fria quando escutamos o som de passos abafados vindos da escada. Murmúrios baixos foram interrompidos pelo estalar de beijos e uma risada masculina estourou no corredor logo em seguida. Definitivamente, um casal se despedia e não se tratava de Zoe e Zack. Pelo que sabíamos, os dois saíram minutos atrás para ir ao supermercado atrás de reforços para suprir o estoque de produtos de limpeza da casa.

Não podia ser Hunter. Ou podia?

Meu estômago ficou gelado.

Eu e Finch trocamos um olhar, completamente imóveis. Por motivos diferentes, nenhum de nós conseguiu esconder o interesse em bisbilhotar a vida alheia. Nós largamos as fatias comidas pela metade em cima da caixa de papelão e andamos até a porta. Assim que chegamos perto do corredor, uma voz nos fez pular:

— April! Como você está? — Seth Montgomery sorria desavergonhado, usando as mesmas roupas do dia anterior — Vejo que finalmente decidiu colocar os gêmeos para ver o sol — ele gesticulou para o meu decote e então se virou para o garoto do meu lado: — E aí, Finch?

— E aí — Finch repetiu, seco.

Atrás de Seth, Jackie Foster meneava a cabeça em desaprovação. Seus cachos sedosos estavam presos em um coque, deixando o par de argolas douradas em suas orelhas em evidência.

— Eu tenho que ir, gente. Tenho treino de natação hoje — ela fez uma pausa e seus olhos castanhos pousaram no abdômen de Finch — Tatuagem maneira.

Finch se recompôs e olhou para os rabiscos como se não fosse nada.

— É canetinha, na verdade — deu de ombros displicente.

Jackie franziu as sobrancelhas em confusão. Milhões de perguntas se formaram em seu rosto, mas nenhuma chegou a ser verbalizada. Por fim, ela só abriu um sorriso gracioso e se despediu. Nós murmuramos alguma coisa de volta, observando ela desaparecer pelo interior da casa, atordoados demais para absorver o que havia acabado de acontecer.

— Vou te acompanhar até a porta — Seth gritou, indo atrás da minha amiga com uma corridinha ensaiada.

— Por favor, Seth! Não se emocione — nós ouvimos ela protestar à distância.

O som de um estalo — dessa vez não de beijo — ecoou pela sala e Seth chiou de dor. Eles deram início a mais uma discussão acalorada e dessa vez não me senti curiosa o suficiente para  xeretar. Guiei meus pés descalços de volta para a cozinha enquanto Seth falava o mais baixo possível dentro de suas limitações. Isso não significava grande coisa, já que conseguíamos escutar quase tudo.

— Você acha que eles...? — comecei.

— Não — Finch praticamente gritou, reagindo rápido demais.

Isso me fez sorrir.

— E por que não, Finch? As pessoas transam.

O rosto dele se amassou em uma careta. Parecia ter provado de algo azedo.

— Seria nojento.

Tive que concordar. Dei a volta para contornar o balcão e peguei um copo na pia.

— Além do mais, Seth é ruivo — ele murmurou com um tom definitivo.

Franzi o cenho para essa afirmativa.

— E daí?

Finch pareceu escolher as palavras com muito cuidado antes de se pronunciar:

— Semana passada Jackie disse que nunca transaria com um cara ruivo.

Eu voltei a me encostar no balcão da pia e escondi um sorrisinho.

Pior que Jackie havia dito isso mesmo. Era algo a ver com sardas, almas e pêlos pubianos. Fala sério, só alguém que já se imaginou fazendo sexo com um cara ruivo pensaria nisso. A pobre garota estava em negação. Meus ouvidos eram constantemente perturbados com as brigas dessa dupla, mas isso poderia significar outra coisa também. Quer dizer, eu e Hunter também estávamos sempre brigando e olha só onde fomos parar.

Merda. Eu não podia pensar em Hunter agora. Usei todas as minhas forças para bloquear as imagens mentais da noite passada, mas foi inútil. De repente, sua respiração ofegante em meu pescoço se tornou tão real que eu conseguia senti-la. Fechei os olhos, deliciada com a lembrança.

— Jackie diz muitas coisas, mas o que ela diz e o que ela faz são duas coisas completamente diferentes. Você deveria saber disso.

Minha voz soava rouca. Puta que pariu. Apenas a lembrança de Hunter se movendo sobre mim me excitava. Felizmente, se deixei transparecer, Finch não reparou. Estava ocupado demais catando o lixo esquecido em sua cozinha.

— Na minha própria casa — resmungou, recolhendo alguns pacotes de batatas chips.

— Você supera.

Finch continuou a reclamar mais um pouco, dessa vez sobre o estado da cozinha. Eu concordei vagamente, retirando algumas bitucas de cigarro de dentro do vaso de uma plantinha escondida na janela. Usar vasos como cinzeiro era excessivo, mesmo que a planta em questão fosse um tempero.

Terminei o pequeno serviço e me distraí com uma tarefa mecânica qualquer. A voz de Finch se tornou cada vez mais distante e o som do rádio, uma música de fundo agradável. Eu pensava em Hunter, deitado na cama, nu da cintura para cima. As coisas não estavam acabadas entre nós só porque havia o deixado para trás. Eu continuava a desejá-lo da mesma maneira de antes.

Cada barulho vindo do andar de cima fazer meu interior gelar. A verdade é que eu não sabia o que fazer e, com certeza, não deixaria Campbell decidir por mim. Por enquanto, eu precisava de espaço.

— April — Finch me chamou —, pode terminar de coletar as garrafas. Eu fico com a louça.

A simples visão daquela pia suja transbordando de copos e outros recipientes conseguiu embrulhar meu estômago. Finch provavelmente estava me livrando de pesadelos ao se oferecer para essa missão.

Eu sorri para a gentileza.

— Obrigada.





H U N T E R


Assim que acordei, eu senti. Minhas mãos percorreram o enorme colchão e encontraram nada além de lençóis amassados e edredons. O quarto estava vazio, preenchido pela luz do sol, e minhas roupas permaneciam espalhadas pelo chão, exatamente como na noite anterior.

A situação toda era ridiculamente previsível. Eu e April transamos como animais, dividimos uma cama em um momento de fraqueza e um de nós deu o fora pela manhã. Qualquer um com metade de um cérebro conseguiria chegar a conclusão de que aquele desfecho era inevitável. Mais uma partida de nosso delicioso joguinho de gato e rato chegava ao fim: como sempre, ela corria e eu perseguia.

Aquele tipo de comportamento vindo de alguém como April não deveria me surpreender. A garota nunca se permitia ser vulnerável perto de mim. Em momento algum ela demonstrou interesse em baixar a guarda. April não tinha fraquezas, só pontos fortes, ligas de metal e barreiras defensivas. Não havia nada que eu pudesse fazer para mudá-la.

Fui possuído por uma vontade descomunal de rir. Com certeza meu orgulho ferido estava me impedindo de enxergar as coisas com clareza.

Comi uma garota e ela deu o fora. E daí? Eu mesmo teria saído da cama primeiro, se a oportunidade tivesse surgido.





Meia hora depois, eu estava no quintal dos fundos. Puxei a mangueira mais uma vez e o cabo de plástico se esticou sobre a grama. Jatos de água gelada saíam da extremidade do tubo enquanto eu enxaguava a caminhonete vermelha coberta de sabão. Alguém havia vomitado sobre o capô do carro de Karen, a madrasta do Finch, e eu decidi unir o útil ao agradável: ali estava eu, ensopado e congelando do lado de fora enquanto todos arrumavam a casa.

A caminhonete vermelha estava estacionada na rua de trás, uma viela íngreme com chão de paralelepípedos. Fui até a torneira e fechei o registro. Meu trabalho estava concluído. Não me preocupei em caprichar muito porque provavelmente choveria durante a semana, mas pelo menos ninguém seria surpreendido com vômito ou outros brindes de festa. Eu poderia ir para casa com a consciência tranquila porque fiz a minha parte.

De repente, a porta da cozinha se abriu em um rompante e saiu de lá justamente a pessoa que eu tentava evitar.  April usava luvas para segurar uma sacola de lixo preta. O que me chamou atenção, porém, foram suas roupas: uma camiseta branca e uma samba canção. Não eram minhas, então só poderia ser de uma pessoa.

Meu rosto esquentou e eu torci a mangueira sobre meu braço, pronto para guardá-la. Enrolei o tubo de plástico como faria com uma corda, pensando no que dizer.

Puta merda, eu não estava pronto para ver April ainda. Era estupidamente fácil perder o controle na presença dela e eu não queria fazer papel de idiota.

April nem olhou na minha direção. Ela andou com pés descalços até a caçamba de lixo da calçada e arremessou o saco preto lá dentro. Deu duas batidinhas nas próprias mãos, se livrando de sujeiras invisíveis, e marchou de volta para casa.

— Foi muita gentileza do Finch te emprestar essas roupas — comecei, relutante, e ela me ignorou como o esperado — Mas seus sapatos ainda devem estar lá em cima.

Meu coração dava pulos dentro do peito. Eu não deveria ser tão direto com ela, mas não conseguia evitar.

Por sorte, meus avanços trouxeram resultados e eu estava de volta ao jogo.

April parou de caminhar na mesma hora. Aquilo que se formou em seus lábios não era um sorriso. Era um presságio de destruição, como um aviso de tempestade. Gritava xeque-mate.

— Eu não os deixaria para trás.

Mas me deixaria, não é?

Eu assenti, jogando uma esponja velha dentro de um balde cheio de espuma. Enquanto eu lavava o carro, minha camisa estava seca, estendida no varal. Tudo que eu vestia era minha calça jeans. April não soube disfarçar o interesse. Seus olhos castanhos desceram pelo meu torso nu e eu não escondi meu divertimento.

Olhos aqui em cima, April.

— Se eu não estou enganado, isso acontece algumas vezes na literatura — sorri malicioso e aproveitei para encurtar a distância entre nós — Uma noite inesquecível. O sapatinho deixado para trás.

A expressão em seu rosto se tornava cada vez mais tensa à medida que eu me aproximava.

— É por isso que é faz de conta — ela murmurou. — Cinderela não amava o sapatinho de cristal dela como eu amo os meus sapatos.

April estava nervosa e eu adorava isso. Estava tão próximo dela que poderia lhe roubar um beijo, se quisesse.

— Você está com fome? — perguntei, observando seus olhos fugirem de mim. — Porque essa cara feia aí, falta de sexo não pode ser.

Fui presenteado com um olhar estarrecido. A garota parecia pronta para me bater, seu rosto furioso em chamas. Cataloguei silenciosamente cada tom de vermelho que coloria suas bochechas.

— O que você quer, Hunter? Eu preciso voltar a arrumar a casa.

April voltou sua atenção para as próprias mãos. Tentava arrancar as luvas de qualquer maneira, atacando as mangas de borracha. O par finalmente atingiu o chão e ela respirou fundo, se acalmando.

— O mesmo de sempre — eu subi meus dedos por suas costelas, sentindo o pano fino de sua blusa.

Se April parasse de resistir só por um segundo, eu a tomaria pelos lábios e a beijaria.

Ela riu curto.

— Esse é o problema de querer coisas, não é? — finalmente ergueu o queixo para me encarar — Nós nem sempre podemos tê-las.

Eu assenti, mesmo que não soubesse o que suas palavras significavam.

April estava me dispensando?

— E o que você quer, April? — disse metade brincando, metade falando sério.

Dançaria conforme sua música até o fim.

Minhas mãos envolveram sua cintura, puxando o corpo dela para mim. Eu estava nervoso e precisava senti-la perto. April não resistiu. Logo seu calor estava em todo lugar: nos meus braços, no meu peito e na ponta dos pés, onde nossos dedos se encontravam. Havia passarinhos cantando em alguma árvore no quintal vizinho. O sol brilhava em algum lugar atrás das casas no horizonte e um carro passou pela rua atrás de nós. O rosto dela continuava de tirar o fôlego.

— Nesse momento? — ela murmurou — O mesmo que você.

Não consegui sorrir.

Não poderia ser tão fácil, não com April.

— Então qual problema?

Ela hesitou e, por fim, ganhou confiança. Foi como se rendesse de uma vez só. Entrelaçou seus braços atrás do meu pescoço e eu me senti enfeitiçado sob seus toques. A garota tomava cada um dos meus pensamentos, como se os envolvesse ao redor de seu mindinho.

— Eu estive pensando...

— Ah, não — eu lamentei de brincadeira e ela me ignorou.

— Se nós vamos continuar fazendo isso, precisamos de regras.

Porra. Estava demorando.

Regras? Para fazer sexo?

— Eu começo — April anunciou em tom profissional e eu revirei os olhos contrariado, mas pronto para ouvir — Número um: nossos amigos não podem saber — é, eu poderia viver com isso. — Dois: sem provocar o outro em público. Você sabe bem de que tipo de provocação eu estou falando.

Isso me fez rir. Não eram regras tão absurdas, afinal. A menina era tão cheia de "não me toques" que eu deveria saber que na menor oportunidade ela iria querer controlar tudo.

April queria me beijar. Estava escrito no rosto dela, eu já havia aprendido a reconhecer os sinais. No último momento, porém, algo a fez hesitar. Foi como se pensasse em mais uma brilhante adição.

— Regra número três: sem exclusividade.

Eu travei.

Literalmente.

Meus músculos enrijeceram por debaixo da pele, zunindo com a tensão que foi injetada nas minhas veias.

Porra. De onde isso tinha vindo?

Sem exclusividade o meu pau.

Estava funcionando muitíssimo bem só eu e ela. Eu deveria beijá-la e mostrar a April que ela não encontraria aquilo em outro lugar, mas algo me impediu.

"Bom senso" era o nome.

— Não precisava avisar — eu rebati com cinismo escorrendo pela boca, me afastando de seu abraço.

Não havia muito a ser feito. Se ela quisesse dormir outros caras eu teria que ficar calado e respeitar. Chama-se sexo sem compromisso por algum motivo. Eu deveria estar contente pra porra. Era isso que eu queria desde o início, não era?

— E você, Campbell? Quais são suas regras?

Um sorriso amargo entortou os cantos dos meus lábios.

— Até parece que você não me conhece, princesa.

— Ah, é?

Concordei pacientemente.

— Eu não faço regras, April.

Ela revirou seus olhos castanhos para mim.

— Deixe-me adivinhar... Você as quebra.

— Tem certeza sobre as provocações em público? — eu insisti.

— Tenho — sua voz era rouca, desprovida de emoções.

April queria esconder o constrangimento a qualquer custo. Deu-me as costas e partiu em direção à casa sem se despedir. Quando ela estava prestes a fechar a porta atrás de si, eu pulei em meu lugar. Agi por impulso. Tive que correr para alcançá-la:

— Espera.

Eu segurei a porta aberta e puxei April para fora. Meus dedos se afundaram em seus cabelos castanhos e ela fechou os olhos, firmando suas mãos sobre meu peito.

Maldição. April beijava muito bem. Seus lábios macios se moviam suavemente sobre dos meus enquanto sua língua quente se enroscava à minha, buscando meu gosto. Nós fazíamos tudo sem pressa e, mesmo assim, nossos corações batiam desesperados. Pensei em seu corpo suado debaixo do meu e no olhar em seu rosto quando investia tudo para dentro dela. A sensação que tive ao beijá-la foi a mesma.

Nós paramos quando o ar faltou em nossos pulmões. April me encarou, ofegante, procurando por uma explicação e, por vários segundos, não consegui juntar palavras. Ela voltou para dentro da casa sem conseguir uma resposta.

Ouvi o som da porta batendo e cambaleei para trás.

Puta merda. Eu precisava urgentemente de um plano para fazê-la mudar de idéia.



N/A: Boa noite, galera zapping zonica! Chegamos ao fim de mais um capítulo de BULLSHIT, uma história original do Wattpad. O que acharam?

Não posso me alongar muito porque tenho trabalho e prova amanhã... Estamos no fim do semestre e está cada vez mais difícil ficar aqui sem bater aquela culpa. Digamos que eu não estou me sentindo muito confiante.

Quero ouvir tudinho que vocês tem para dizer. O que acharam do que a April disse? E o Hunter? Ficaram curiosas sobre a arte da conchinha pornô?

Qualquer erro ou crítica, pode falar!

Beijinhos,

B.


Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top