Por Ela

Arius

Vê-la afastar-se dá-me um sabor amargo na boca.

O carro distancia-se e ela não olha para trás, acho que está demasiado traumatizada para olhar para mim.

Foi uma idiotice vir aqui, saiu ainda pior do que estava antes.

Ele se aproveitou dela como quis, se aproveitou do seu poder para a pressionar.

Eu vi o seu rosto assustado, todos vimos, e o Kaydon se aproveitou disso.

Sabia bem o que ele queria desde o início, ele tem as mesmas suspeitas que eu, que ela deve ser como nós. Por isso queria que ela provasse a carne, quando ela o fez mostrou a todos que é uma humana normal, não vi nem um rasto de sinais que provassem o contrário. Todos temos uma reação, e por isso lhe mostrei a minha, para ela perceber.

Acho que a marquei ainda mais.

Ela sabe o que comeu, e eu a trouxe aqui, deixei que ela entrasse nessa casa, devia tê-la amarrado num sítio qualquer e só a ter deixado sair no dia seguinte.

Porque ela não confiou em mim quando lhe disse que resolveria isto da sua amiga?

Eu sei o grupo em que a vão meter, só tenho que ser mais rápido que os outros e pegar nela antes que ataquem. Não deve ser difícil, a maior parte deles gosta de esperar um pouco no início para que as vítimas se separem e fiquem mais assustadas.

Gostam de brincar com a comida.

O que ela deve estar pensando agora? O que deve estar pensando de mim? De certeza que aqueles pensamentos todos de eu ser uma boa pessoa devem ter voado pela janela.

Sou tudo menos isso.

Sou o maior monstro deles todos.

Se ela soubesse o que já fiz já tinha corrido a sete pés.

Se calhar é isso que ela quer fazer neste momento.

Sento-me na cadeira de novo e noto que alguns deles já saíram, talvez para se preparem para a caçada. Não deve demorar muito mais.

— Ela se portou bem. — Kaydon começa levando o copo de vinho à boca.

— Já tem a sua confirmação. — Comento, e espero sinceramente que esta obsessão termine.

— É estranho. Tinha quase a certeza.

— Você viu que nada aconteceu. — Ele abana a cabeça pensativo. Parece muito mais abatido do que estava há uns minutos. Acho que isto lhe estragou alguns planos.

Sou dos últimos a sair da mesa, não preciso de me preparar como eles. Vejo alguns vestindo armadura, outros preparando as suas armas de escolha. Vêem isto como um grande evento.

Eu gosto de pensar que sou melhor que eles.

Até o sangue começar a jorrar.

Ando despreocupadamente para onde o grupo animado se junta, se me virem nervoso podem pensar que estou tramando algo. Sei para onde correr, sei o que tenho que fazer, é isso que importa.

Rezo mentalmente para que chegue lá primeiro, não quero ter que dar más notícias à Lace. Não posso deixar que a miúda se deixe magoar, esperemos que seja suficientemente espera para se esconder.

Um pensamento me passa pela cabeça.
Estou fazendo isto por ela?
Eu mal conheço a loira, e estou indo contra os meus por ela?

A raiva por eles sempre existiu, continuo naquele grupo porque se não o fizer vou sofrer as consequências, e isso pode pôr a vida do Bo em jogo. Continuei lá porque foram eles que me acolheram, que me fizeram sentir que não estava sozinho neste mundo, porque a ideia de ter amigos é apelativa.

Aos poucos fui percebendo que para ter amigos como esses mais vale não ter amigos.

Deve ser por isso que a tenho em pensamento, ela e o Bo fazem me sentir que tenho quem proteger. Coisa que não sentia e nunca senti com eles.

Foram parceiros de sobrevivência.

Nada mais.

Quando eles dão a partida, sou dos primeiros a ir.

A matança começa imediatamente, os gritos de dor e os risos que se interpõem enchem-me os ouvidos. Mas não ouso parar, não posso.

Chego ao ponto onde deixaram o grupo onde eles se encontravam, e encontro apenas uma garota assustada andando aos círculos tentando decidir para onde correr.

— Estou procurando uma loira. Ela estava no seu grupo, para onde foi? — Ela grita e se deixa cair no chão como se tivesse perdido as forças de um momento para o outro, pensa que a vou magoar. — Para onde foi?! — Repito para que ela se concentre mas é inútil. Viro a minha atenção para qualquer lugar onde ela se possa ter escondido, atrás das árvores, empoleirada num dos troncos. Não a encontro.

Não pode ter ido muito longe.

— Arius? — A voz aparece atrás de mim, quando me viro, não vejo ninguém. — O que está acontecendo?

Ela não sai do seu esconderijo, deve ter medo que alguém apareça.

— Eu vou te tirar daqui, ok?

Uns segundos passam até ela se levantar de um arbusto grande a uns metros de mim, está coberta de terra mas estava no ótimo lugar para não ser descoberta.

— Você é como eles, não é? — Ela se afasta quando dou um passo em frente.

— Não temos tempo para isto, alguém vai aparecer. — Corro para ela e puxo-a pelo braço. — Se não quer que um deles te coma até ao osso é melhor parar de lutar e vir comigo! — Grito quando a garota luta contra mim. Estou me arriscando para a tirar daqui e ela ainda duvida de mim?

— Lace! — O berro faz o meu corpo imobilizar.

Reconheço a voz mesmo de longe, e o nome que lhe sai da boca não podia ser mais audível.

O Sin não diria aquilo sem razão. Está tentando a assustar, a torturar.

Ela está aqui, não em casa, trouxeram-na aqui para a caçar.

Eu vou matá-los!

A Heli parece entender o porquê de ter parado e começa a puxar-me o casaco desesperada.

— Ela está aqui? Arius, você tem que a ir buscar! — Continuo a puxar pela loira, arrastando ela comigo até ao carro onde deixei o Bo. Ele sente-me muito antes de chegar, já saiu do carro e espera por ordens. Felizmente está aqui para tomar conta dela.

Volto para trás correndo que nem um louco.

Se eu vir o Sin vou rasgá-lo ao meio.

Como é que a vou encontrar?

Espero que ele ainda não a tenha encontrado. Não me vou controlar se ele tiver tocado nela.

Corro por todos os cantos, e sinto que encontrei cada vítima e cada assassino, acho que vi todos menos ela e o Sin.

Estou começando a entrar em desespero quando ouço.

Os sons são baixos, como gemidos, até se tornarem grunhidos fortes. Me aproximo vagarosamente, não sei o que pode saltar dali, não sei o que hei de esperar. Estou preparado para atacar quando espreito pela árvore.

E a vejo.

O cabelo castanho comprido completamente selvagem, de joelhos em frente a um corpo deitado no chão. Ela está... se alimentando?

Ela nota na minha presença, e sobe o seu olhar para mim.

Os olhos estão completamente vermelhos, parecem estar cobertos de sangue, está de boca aberta, como se fosse atacar, os seus dentes mudaram, triplicaram e ficaram aguçados, está mastigando a carne do garoto morto.

Ela o matou?

As unhas pretas que lhe cresceram estão cravadas na sua pele, como se não o quisesse largar, como se o deixar fosse desistir da sua vida.

Ela para para analisar o que fez, e observa o corpo com adoração, parece orgulhosa do que fez, parece satisfeita, feliz.

Depois olha para mim de novo, e para a minha surpresa, abre o mais terrível sorriso.

Lace tenta se levantar, mas as pernas não têm mais forças, acho que chegou ao seu limite.

A íris lentamente volta ao seu negro natural, assim como os dentes e as unhas, aos poucos ela se torna na Lace. Porque aquilo não era a Lace, era um bicho, um monstro.

Afinal, é verdade, ela é uma de nós.

Como é que não mostrou sinais no jantar?

— O que está acontecendo? — Ela pergunta numa voz inocente. Depois leva a mão à garganta e geme de dor. — Dói.

— Você vai colapsar. — Caio de joelhos a sua frente. — É normal. Só se deixa levar e eu trato de você ok? — Ela abre a boca para falar, mas eu interrompo. — Vai ficar tudo bem. Não se preocupe.

Outra dor faz com que ela se curve e se deixe cair na terra. As manchas percorrem-lhe o corpo enquanto ela grita de dores, enquanto sente cada pedaço do seu corpo doer.

Fico ao seu lado até ela chegar ao estágio final, em que todo o roxo lhe enche a pele e ela se deixa desmaiar.

Pego nela e começo a correr de novo para o carro, tenho que a tirar daqui, eles não podem ter conhecimento do que acabou de acontecer.

Não podem saber que ela é uma Bruisan.  


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Parece que quem mete medo é a Lace e não os outros kkk
Podemos ver mais um pouco dos pensamentos do Arius, gostaram?
No próximo já voltaremos a Lace!

Beijo

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