II. Google isn't trustable

⊱♥⊰

A vida adulta é estranha. Esquisita, dramática e cheia de escolhas. E não há nada que eu odeie mais do que ter que tomar decisões. Não seria tão mais simples esperar com que as coisas aconteçam sem a inútil interferência humana? E embora a simples existência dos problemas seja desgastante o suficiente, aprender a escolher quais batalhas valem a pena o esforço é essencial.

Às vezes o maior aprendizado vem após uma ressaca das boas para afogar as mágoas. No Entanto, vivemos em um mundo controlado por adultos amargurados, e passamos nossa vida aprendendo regras sobre um mundo o qual nem ao menos conhecemos. Nossa irresponsabilidade é uma dádiva, não esperam muito de nós, e esta é a maior vantagem.

Entretanto, por mais irônico que possa parecer, estou aqui apenas por uma escolha. Pensamentos bem estruturados poderiam facilmente comprovar meu ponto, mas devo lembrar que estamos lidando com adultos nessa parte da história, e sua teimosia é quase tão irritante quanto a de uma pequena garotinha. Pequenas mãozinhas e fraudas sujas diante de uma mulher radiante, com sonhos e memórias felizes. Essa foi a escolha que custou a vida da minha mãe durante uma gravidez de risco. Ela me amava tanto que acabei me tornando sua maldição.

O amor pode doer às vezes. Muito.

Em certos momentos, percebo o olhar do meu pai sob mim, lembranças felizes passando diante de seus olhos, e então, há a dor. "Você é igualzinho a sua mãe". Dean Willis, o homem mais forte que conheço.

— Acho que a senhorita Van Dijk e seus amigos gostariam de nadar no mar, e não em sua baba, meu filho.

Respiro fundo, tão fundo que meus pulmões parecem doer por um segundo, apenas para fazê-lo novamente, como uma espécie de masoquismo pessoal. Meus instintos afirmam com todas as forças que continuar encarando é uma má ideia, entretanto, desviar o olhar não estava em meus planos.

Imediatamente retomo o foco da minha atenção ao meu pai, que me olhava com um sorriso sarcástico, demonstrando que havia me pego no flagra mais uma vez. Sinto minhas bochechas esquentarem, e por um momento me pergunto se Sabrina havia notado.

É claro que não.

Meus sentimentos quanto a Sabrina Van Dijk eram confusos e atípicos. Era possível odiar alguém e ao mesmo tempo ter uma enorme queda por ela? Acredite, já fiz minhas pesquisas, mas os resultados não me agradavam. Como poderia estar apaixonado por uma pessoa que cultivei ódio por tantos anos? Certamente, Google não tem as fontes mais confiáveis, e eu não seria tolo o suficiente para acreditar em um teste online. Como podem afirmar algo com tanta certeza?

— Seb? — meu pai sinaliza com a mão em frente ao meu rosto. —  Gostaria de ajudar sua pretendente com as malas? — ele aponta para o grupo de jovens que embarcava, destacando a garota loira que havia sido deixada para trás. Suas sobrancelhas estavam curvadas para baixo e sua boca levemente torcida em uma careta, provavelmente em razão às diversas bagagens carregadas por seus bracinhos pálidos. Por algum motivo, seu rosto brilhava diante do sol, assim como o resto de seu corpo. Um tanto vampiresca, peculiar e... sexy.

De soslaio, percebo-a nos interceptar com o olhar, como se exigisse a atenção que nosso trabalho demandava. Ao andar em sua direção, me preparo mentalmente para seu humor instável, ao mesmo tempo em que ansiava por sua presença.

— Sabrina! — assim que a fala se perde no ar, percebo que talvez tenha soado animado demais, por isso me contenho. — Hum... precisa de ajuda? — sigo suas malas com o olhar.

Com a expressão impaciente, a garota larga suas bolsas contra meu peito abruptamente em um revirar de olhos. Apesar de sua brutalidade ter me feito cair no chão, sua expressão corporal não demonstra sinal de culpa, mas o baixo nível de compaixão em seu semblante muda drasticamente quando vê seus pertences caindo no mar. Sabrina me encara, mortificada.

— Derrubou as malas no mar, empregado inútil! Vai pagar com seu trabalho!

Se ainda me restavam dúvidas quanto a sua dignidade duvidosa, agora pude, com total certeza, confirmar que Sabrina não havia abandonado sua típica arrogância. Suspiro, abrindo um sorriso de lado enquanto me levantava.

— Pretende me usar como escravo sexual, senhorita Van Dijk?

A garota abre e fecha a boca diversas vezes, provavelmente moldando a resposta mais mal educada e petulante que sua mente ardilosa poderia inventar. Creio que seguindo meus conselhos telepáticos, ela decide não lutar essa batalha. Boa garota.

— Eu poderia demiti-lo agora mesmo, garotinho insolente, mas ainda precisamos de uma isca caso bárbaros famintos nos interceptem no mar. Quero esta mala em meu quarto imediatamente — e com o brilho de seus saltos reluzindo em contraste ao sol, ela faz sua saída triunfal.

Ah, Sabrina.

...

Após o indesejável — embora refrescante — mergulho matinal, precisava continuar providenciando diversão a Barbie e seus amigos de Malibu, e dessa vez, serviria os drinks. Contribuir para a manutenção social e ego frágil da elite capitalista era justamente minha agenda pelos próximos dois meses, e eu não poderia estar mais radiante. Apesar da ignorância, riquinhos sempre pagam cachês consideráveis, não havia do que reclamar. Ah, é claro, exceto pela humilhação, um aspecto que Sabrina deveria abordar na próxima sessão de terapia.

— A seleção natural acabaria com cada um deles, seria trágico — comento ao observar o pequeno grupo de jovens, recebendo um olhar de indiferença junto a uma pequena risada do meu pai, que preparava as bebidas. — É sério, pai, até você sabe, eles não teriam a mínima chance... — dou de ombros, preparando minha bandeja. — Se bem que seriam bons hamsters de bolso. Talvez pudesse domesticar algum, acha muito arriscado?

— O que eu acho... — faz uma pausa enquanto coloca canudos coloridos tipicamente burgueses em cada copo. — É que você deveria levar isso aos seus amigos. — ele pisca, enfatizando a última palavra com um sorriso de canto.

Limpo a garganta e respiro fundo, mentalizando como andar antes de dar o primeiro passo. Não sabia se o que estava me deixando nervoso era Sabrina ou o efeito do peixe afrodisíaco que eu havia erroneamente tocado mais cedo. Considero a segunda opção.

Murmuro um "bom dia", servindo as bebidas e voltando a minha zona de conforto no exato momento em que entrego a última taça. Aquele ambiente era quase tão intimidador quanto a oitava série, quando as garotas escolhiam os meninos tímidos para serem seus mascotes pessoais.

Retomo minha posição anterior ao lado do meu pai, escorando o corpo na bancada de bebidas, observando-a.

— Seus olhos são da cor do oceano...

— Jura? Bem, talvez algum oceano poluído, Seb, esqueceu que herdou os olhos castanhos de mim?

A frase havia escapado dos meus pensamentos antes que eu pudesse contê-la, mas não ligava para os comentários furtivos do meu pai. Meu olhar permanecia sobre seu rosto e cabelo na altura do ombro, com uma pequena trança lateral em uma das partes de sua cabeça. Por mais que me esforçasse ao máximo para não parecer como um psicopata que gosta de encarar, era difícil tirar meus olhos dela.

Me afasto do balcão e caminho até às grades de proteção que me impediam de pular e acabar com minhas lamentações de amor não-correspondido. Estava em uma área afastada, então não deixaria traumas para ninguém. Encaro mais profundamente o oceano, me assustando com a imensidão que a luz solar me impediu de notar. É, melhor abandonar essa ideia.

Mas quando pensava estar sozinho e ter começado a cantarolar minha música típica de chuveiro, um barulho do rangido da madeira me distrai. Ao longe avistei Sabrina caminhar em minha direção, mais determinada do que nunca.

Por um momento pensei que fosse abandonar sua fachada ridícula e poderíamos conversar sobre futilidades, como fazíamos nos velhos tempos, mas isso não estava em seu planos.

Sua movimentação se tornava cada vez mais imprevisível, deixando o lado cognitivo do meu cérebro confuso por alguns instantes, já que ela continuava a se aproximar. Nesse ritmo, estaríamos à centímetros de distância em poucos instantes.

— Joshua!

Após o grito de Sabrina, não tenho tempo para me preparar ou até mesmo me perguntar quem era Joshua, já que suas mãos seguram os dois lados do meu rosto, encarando o fundo da minha alma, para então aproximar os lábios e me beijar.

Seu brilho labial tinha gosto de melancia, e seu perfume me lembrava morangos fresquinhos. Era uma salada de frutas de sensações, às quais nem em meus sonhos mais absurdos poderia imaginar estar presenciando. Seus lábios também eram macios, como se os hidratasse diariamente, e desejei nunca me afastar.

Foram questões de segundos até que estivéssemos longe um do outro novamente, ambos chocados demais para proferir uma palavra sequer. Ainda extremamente atônito, toco os lábios com a ponta dos dedos, processando o ocorrido enquanto observava a garota antes ousada assumir uma postura tímida.

— Na verdade... meu nome é Sebastian.

— Ok... TCHAU!

Não imaginava que Sabrina fosse do tipo atlética, mas lá estava ela, correndo como se treinasse para uma maratona que custaria sua vida. Provavelmente faria o mesmo, se ainda não estivesse em estado de absoluto choque.

Será que ela realmente levou a serio o lance de escravo sexual?

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