TWO
— COMO ASSIM ELA NÃO ESTÁ PREPARADA PRA FAZER MEDICINA?
Eva tinha as mãos na cabeça enquanto seu pai tentava acalmar sua mãe que havia explodido com o médico segundos antes.
— Sra. Collins, entendemos que sua filha é uma moça inteligente e super dedicada. Caso não fosse, não estaríamos aqui tendo essa conversa. Mas ela pode não está em condições de levar o curso no momento.
— Claro que está em condições! Olhe para ela! Ganhou até um peso.
— Mãe... — Eva começou a falar mas foi logo cortada.
— É o sonho dela! Ela tem que desistir só por causa de um trauma desses?
— É o sonho dela ou o seu? — O Dr. Tanaka já estava com raiva daquela mulher. Ela não via que sua filha estava debilitada?
— Como é que é? Como ousa falar assim comigo?
— Helena, por favor... — Finalmente Flávio, pai de Eva interviu.
— Por favor nada! Se esse medicozinho de quinta acha que pode me tratar assim ele está muito enganado!
— Se a senhora não percebeu, sua filha está com depressão pós-traumática. Ela precisa de ajuda de um médico e não de uma sala de aula!
— Não é só visitar um psiquiatra e ja resolve isso?
— Gostaria que fosse simples assim, Sra. Collins, mas não é. Sua filha precisa de ajuda há tempos e não é ignorando isso que ela vai superar.
Helena não o respondeu imediatamente. Sentou-se novamente na cadeira, estava atônita, sem palavras.
— O Senhor tem filhos, Dr. Tanaka? — Perguntou baixinho.
— Tenho. Um da idade de Eva. — Ele olhou para a moça que estava de cabeça baixa. — Não posso o imaginar passando por isso, Sra. Collins, mas precisa fazer algo. Algumas pessoas sofrem tanto com algo que não conseguem superar sozinhas.
— Há alguma forma, doutor? Dela cursar e fazer o tratamento? Talvez meio período ou... — Era Flávio. Ele queria que a filha fosse tratada, porém sabia que oportunidades como essa não surgia da noite pro dia.
— Vamos precisar fazer uma análise do quadro. E vocês não vão poder morar no Kentucky enquanto ela faz o tratamento. Nesse momento ela vai precisar de vocês.
— Nos mudar para Boston? — Helena perguntou confusa.
— Para começar. Porém precisamos saber todo o quadro. E se Eva quer mesmo levar esse curso para frente.
Todos olharam para Eva que ainda permanecia calada. Ela sabia o quanto eles haviam sacrificado para que ela tivesse a chance de sua vida. Claro que, depois de Charlie, aquilo não fazia mais sentido. Mas se ela voltasse novamente para sua cidade, enlouqueceria.
— Se tiver como... gostaria de continuar o curso.
Helena soltou o choro que estava na garganta. Flávio andou até a filha e a abraçou:
— É isso mesmo que você quer? Você sabe que eu largo tudo para te ver bem, não sabe?
Eva então chorou. Era tão injusto com seu pai e sua mãe, eles haviam comprado seu sonho e estavam ali simplesmente porque ela não conseguia superar e seguir em frente.
— Verei o que posso fazer. É importante que ela comece logo o tratamento. Vou deixar vocês a sós para conversarem. Com licença.
O Dr. Tanaka saiu da sala já sem fôlego. O que aquela garota havia vivido fora cruel o bastante para mudar toda sua vida. Pensou em seu filho, em como ele também vivia momentos delicados. Gostaria muito de conseguir se comunicar com ele, porém sabia que naquele momento ele também precisava de espaço.
Depois de algumas horas negociando, o psiquiatra indicado pelo Dr. Tanaka liberou. Ela poderia cursar caso seus pais estivessem morando na cidade e ela precisaria visitar o psicólogo e psiquiatra semanalmente. Seus pais estavam alegres, porém Eva não conseguia enxergar alguma chance de sair daquele buraco sem fim.
Combinou com seus pais que moraria no alojamento até eles se mudarem para Boston. A mudança aconteceria em três semanas, nesse meio tempo as aulas de Eva já teria começado. Estava tudo acertado.
Quando voltou para o alojamento, percebeu que algumas pessoas que a encaravam. Não deixou se intimidar. Quando chegou em seu quarto, finalmente pôde deitar e dormir. O dia seguinte seria de muitos trabalhos e ela já encontraria o psiquiatra no final do dia.
•
A primeira aula do curso era "Fundamentos biológicos e bases morfológicas da medicina". E o assunto era Histologia e Biologia estrutural da célula. Uma matéria um tanto estranha, mas fazia sentido. Eva sentou-se no canto da sala enquanto via seu professor falando e gesticulando. Era difícil se concentrar quando se tinha tanto para pensar.
O professor se chamava John Hills, era um senhor de cinquenta e tantos anos e já falava há quinze minutos quando um aluno entrou na sala e chamou atenção de todos. Ele usava um casaco pesado, segurava vários livros e Eva ainda pôde ouvir cochichos entre as garotas da sala.
— Ora, ora Sr. Tanaka, parece que realmente não era boato que estaria em meu curso esse ano. — O professor falou com um sorriso irônico no rosto.
— Desculpe-me pelo atraso, Sr. Hills, não acontecerá novamente.
O rapaz caminhou até duas cadeiras ao lado de Eva. Ela, por sua vez, percebeu semelhança entre ele e o médico que a havia atendido, mas podia somente ser uma infeliz coincidência.
O rapaz olhou para ela e deu um sorriso seguido uma piscadinha. Eva voltou a olhar para frente sentindo nojo daquele rapaz. Finalmente entendera que ele era um dos novos alunos cobiçados pelas calouras. Fazia sentido já que elas cochichavam e olhavam para trás o tempo todo.
A aula continuou lenta e torturante até o professor avisar que o horário com ele já havia terminado.
Enquanto os alunos iam alvoroçados até o professor para fazerem suas perguntas de novatos, Eva arrumou suas coisas e saiu rapidamente da sala. Ainda tinha mais algumas até o fim do dia. Não sabia como aguentaria aquela rotina.
Foi até a sala onde teria a aula seguinte e escolheu o mesmo lugar para assistir. Dessa vez viu o aluno retardatário chegar na hora rodeado de garotas enquanto contava uma piadinha nojenta sobre mulheres.
Eva balançou a cabeça pensando realmente que aquele rapaz nada tinha a ver com o Dr. Tanaka que a atendera.
O restante das aulas pareceram uma eterna roda gigante chata e monótona. Era óbvio que Eva gostava daquele assunto, porém sua vontade de estar ali era nenhuma. Ela se forçava a prestar atenção e anotar as partes importantes. Fazia isso principalmente pelo seu pai que se sacrificou tanto para que ela estivesse ali.
— Ei...
Eva ouviu alguém falando, mas achou que fosse com outra pessoa e não deu atenção.
— Ei, psiu! Você.
Ela olhou para trás e viu o tal Tanaka olhando para ela:
— Foi você quem desmaiou no alojamento?
— Está interessado no assunto mesmo ou só quer mesmo encher o meu saco?
— Wow! Irritadinha você hein? Meu pai só disse que talvez eu estudasse com você.
— Seu pai é o Dr. Tanaka?
— Ele mesmo. — Sorria triunfante. — Talvez você queira saber mas eu sou o filho mais bonito dele.
— Avisarei caso alguém se importe. — Eva virou as costas enquanto deixava O rapaz rindo da situação. Se aquele idiota achava mesmo que ela seria seu saco de pancadas, ele iria ver uma coisa.
•
A primeira consulta havia sido difícil. Seu psiquiatra a havia deixado a vontade, mas ela não quisera falar muita coisa além do que ele já sabia. Não haviam feito tanto progresso, mas para o médico já era um começo.
No final do dia, Eva se sentia totalmente perdida e completamente e inevitavelmente cansada. Não sabia quanto tempo aguentaria até a corda quebrar. E, exausta de tanto pensar, dormiu um sono sem sonhos até o dia amanhecer.
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