Chá de Casca de Laranja e a família gripada
Por Francisco
Teve uma semana que eu tava de arrasto, pelo amor de Deus, ô gripe dos quintos dos infernos. Logo eu que não sou de me queixar ou falar palavrão, estava irritado, dor no corpo, olhos quase fechando, febre, ranheira, tosse, espirro e vontade de me esconder pra não ir pro trabalho. Pior que em Itajaí foi frio, pensa num frio e umidade, chuva geladinha na carcaça aqui. Fazia tempo que não tinha uma dessas e aceitando o conselho do capitão, pego dois dias de atestado pra ver se melhoro. Daí trampei quinta de manhã e fiquei de quinta de tarde até domingo me recuperando.
Só nesse trecho de conto, espirrei, tossi e gastei uns cinco lenços de "babel" a "gribe" faz o "dariz" "drancar", fica "dudo" fanho.
Enfim, eu com gripe não é o final do mundo, mas quando entro na cozinha e meu brigadeirinho espirra e quando me vê sorri, com os olhos lacrimejantes. Abençoado do Carlinho engripou também.
— Ai Francisco, por que "dá" de "banga" curta, eu "dô" "dremendo" de frio.
— Oh meu anjo — espalmo a mão na testa dele — febre, rapaz.
— Aham. Eu "dossi" muito. Vou fazer um chá com casca de laranja e mel.
— Mandou a Lu pra escola?
— "Dão". Espera... — ele tosse, espirra, assoa o nariz, lava a mão no banheiro e volta — de manhã fui no "bostinho". "Dossa" meu nariz tá muito "drancado", espera que eu já volto...
Pra não engripar quem está lendo, vamos avançar pra parte onde Carlinho despeja seu chá maravilhoso na xícara e adoça com mel. Jogamos pra dentro do organismo umas aspirinas, verificamos a febre da Lu que por sorte baixou e finalmente caímos no sono.
Quando percebo, Luíza está entre eu e o Carlinho, tadinha dormindo de boca aperta porque não consegue respirar direito.
Como eu peguei gripe antes dos dois e senti culpa por ter passado a eles, porém melhorei antes e me vi na obrigação de cuidar dos meus tesouros. Vou pra cozinha e me apavoro quando lembro que sou péssimo pra cozinhar. Até ovo eu já deixei torrar o que me faz dar ainda mais valor pro Carlinho.
E falar nele, já chegou na cozinha. Com paciência me dá as coordenadas e pela primeira vez na vida fiz um troço comestível. Também, com esse moleque dando dicas, fica fácil.
É sopa de frango desfiado com legumes picadinhos, batatinha, chuchu, cenoura, couve flor, batata salsa, batata doce e aipim, tempero verde e sal. O cheiro é bom demais. E dizem que é comida de doente um negócio bom desse. Posso dizer: meu miudinho sabe das coisas.
Eu já estou me sentindo melhor só com o cheiro da sopa, até Luíza que andava chatinha com a gripe, senta disposta pra comer a:
— Obaaa comida do paizinhooo. — ela comemora, funga com o narizinho e ri mostrando a terceira "janelinha" agora do dente de baixo.
— Não Lu, hoje foi o paizão que fez a comidinha.
— Fomos eu e o paizinho. — lógico que falo a verdade, fica mais bonito. Provo e olha... a sopa ficou do tipo — boa.
— Muito boa paizão, até a Pernoca disse que tá boa.
— Pernoca? Como que ela... ela nem come.
— Come sim, ó, vou dar sopa pra ela. — Sem que eu notasse a Lu sentou a Pernoca na cadeira do lado e colocou na frente do "negócio" um pratinho plástico com colherinha de brinquedo.
Sei que essa sopa e o chazinho à seguir são duas delícias, mas igual a essa família não tem.
...
Sábado a tarde damos uma passeada com nossa filhota, deixamos que ela brinque um monte no pequeno parque do bairro, na padaria do Fefê comemos um sonho quentinho, tomamos café com leite e conversamos com Liseu e Marçal, nossos amigos e vizinhos. De noite percebo que a Luiza dorme bem, com o narizinho destrancado e sem febre. Cansada abraça a Pernoca que tem uma cara tão bonitinha, mas... eu sei lá acho que perdi o medo, fico olhando e me chamo de tolo e ridículo por ter tido medo da coitadinha.
— Francisco!
— Ah!!! — Meu grito por pouco não acorda a Lu. É só o Carlinho que se assustou com uma lagartixa que caiu da parede dentro do box.
— Credo... que nojo... esse bicho é frio. Aquele homem que abusava de mim quando eu era pequeninho disse que elas entram dentro da gente e caminham, depois
— Ei, amor — o enrolo na toalha, seco ele rapidinho e as lágrimas de medo escorrem — você sabe que isso é mentira hoje em dia?
— Sim.
— Então confia no Chicão que ele cuida de você e a pobrezinha da lagartixa tem mais medo de você do que do contrário.
— É, eu sei — ajudo ele a vestir o pijama em flanela xadrez tomo meu banho e me jogo pra debaixo das cobertas, puxando meu pedacinho de gente contra o meu corpo. Ele começa com dengo, safado, nem gripado sossega o facho.
— Que bunda firme — dou umas palmadas enquanto beijo os lábios grossos, boca pequena do sorriso mais lindo que já vi.
— Ai Francisco, eu até engordei um quilinho.
— UM??? Nossa, eu notei mesmo que o senhor engordou, bombonzinho. Tá comendo muito doce?
— Não né. — ele responde igual a Luiza. — Só porque no frio eu sempre engordo um pouquinho. Mas não tem "poblema" porque quando chega o verão fico sequinho de novo.
— Tu me mata de fofura, coisa dengosa.
— Francisco, eu sou muito esquisitinho? Assim... você tem assim... um pouco de vergonha quando sai comigo?
— Carlinho, você não conhece o homem que tem?
— É que...
— Eu não vergonha de nada. De você eu tenho orgulho. Bobo. E para de chorar.
— É que é bonito quando você fala. Ah, eu me esqueci do nosso comprimido, dei o chazinho pra Lu e o remedinho, só faltou a gente.
Ele me dá o analgésico e nós apagamos. Somos acordados no domingo pela boneca falante, a Luíza. Subindo em nossa cama ela nos escala, nos enche de beijos e se enfia no meio de nós que a abraçamos e "capotamos" outra vez, acordando as onze horas da manhã, tendo um domingo delicioso, tão gostoso quanto o que Carlinho nos prepara de café, almoço e janta.
Faz a semana seguinte parecer longa e nos faz dar ainda mais valor para aqueles momentos de descanso, de reunião com quem amamos e acho válido mencionar, menos tempo no celular, porque até eu andava exagerando na dose e o fim de semana voava ainda mais rápido.
Mas a semana também não é nenhum fardo, pois mesmo que corra meus riscos, trabalho no que eu gosto e ninguém vai antes da hora, minha mãe sempre diz.
Com saúde tudo fica bom, volta a disposição que a gripe tirou e me sinto inteiro. Faço minhas rondas, abordagens, se precisar enfrentar o perigo fui treinado pra isso e quando o dia termina, agradeço por estar vivo.
No meu reino eu chego, minha casa sem luxo, só felicidade, abraço e "oi paizão" ou "ai Francisco que frio". Faz parte e é muito gostoso.
Passou a segunda-feira, terça-feira é um pulo, quarta a gente comenta com o colega:
— Cara, amanhã já é quinta!
— É, passa voando.
E realmente é assim, mesmo que na escala nós trabalhamos alguns finais de semana, temos direito ao descanso que aproveitamos com tesão cada segundo.
Minha folga não foi sábado ou domingo, foi segunda e terça da outra semana e quando volto na quarta, comento:
— Cara, amanhã já é quinta de novo!
— É, mais uma vez passou voando.
E o Carlinho? Ainda faz doces? Claro que sim. Encomenda é algo que não lhe falta, que de tanta coisa feita por ele, busca diversificar, fazer cursos e testar novas receitas, usando eu, a Lu, Marçal e Eliseu como "cobaias", oh vida difícil.
— Porque um doce tão bonito e gostoso tem esse nome difícil? "Camofeu", né
— Camafeu, ah é porque é branquinho que nem um bonequinho que usa pra decorar.
— Só sei que é bom. — Liseu comenta.
— Esse daqui é Ninho de Chocolate com Nozes, esse é Bem-Casado, esse copinho de chocolate com physalis é diferente, mas estão pedindo muitos nos casamentos. Eu tenho muita encomenda, já tem duas pessoas me ajudando, minha irmã Cris e minha cunhada Luma.
— Logo vão ficar ricos, hein Tonello. — Marçal provoca.
— Já sou. — olho para a família que constituí que não tem preço, é tudo pra mim.
— Carlinho, já se imaginou no Master Chefe, mana?
— Ai Liseu, aquele homem da tatuagem... eu tenho até medo dele e ia começar a chorar se ele me desse bronca.
— Ah vinhado, teu talento é grande demais pra ficar cozinhando só pra três. Já pensou?
— Ain mas eu adoro cozinhar pra família e amigos. Não tem "poblema" em não ser conhecido, quero ficar feliz assim desse jeito.
— Acho bom, porque eu soco o tatuado se fizer o Carlinho chorar.
— Ainda bem que não vou participar né.
A gente ri, belisca linguicinha de frango, plena quinta de noite, dia de semana que pode ser tão bom quando o final quando somos ricos, de forma não-financeira, mas temos amigos, saúde e família. Precisa muito mais que isso?
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Oi Pessoal, passei pra deixar um carinho pra todo mundo. ♥♥♥
PatiAdami FlaviaF4mily um chero especial. Creio que durante a semana consigo voltar a interagir mais e retomar as respostas aos comentários. Beijos e muito carinho :-)
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