Chá de Melissa

Chá de Melissa


Melissa Rackler Oliveira organizou seus papéis novamente, mudando a ordem de algumas folhas, tentando imaginar como seria apresentar mais uma vez a sua ideia e receber um não.

Não! Desta vez não receberia um não, pois estava pronta e qualquer pessoa que pensasse diferente, então essa pessoa não servia para ser sua sócia.

— Quer beber alguma coisa? — a garçonete perguntou mais uma vez, ainda com o sorriso animado no rosto, mesmo que Mel já estivesse reservando aquela mesa por mais de vinte minutos e não tivesse pedido nada mais do que água da casa.

A verdade era que ela estava nervosa. E muito. Contudo talvez aquela fosse a primeira vez que ela estivesse com bons pressentimentos sobre sua vida em meses. Ou pelo menos era isso o que Gabriella estava lhe prometendo desde que Caio teve a brilhante ideia de marcar aquele encontro. Encontro de negócios.

— Eu estou esperando uma pessoa — Mel respondeu com um grande sorriso, vendo a garçonete concordar e sair.

Provavelmente pensava que ela era apenas mais uma garota que havia levado um bolo do encontro. E se aquele fosse o caso, seria triste, mas não era um encontro romântico, apenas um encontro de negócios. Será que isso tornava o bolo menos triste?

Ela olhou ao seu redor, imaginando que tipo de pessoa marcava para encontrar um possível parceiro de negócios em um bar no Potato Valley, mais conhecido como Largo da Batata, e como essa pessoa poderia ser remotamente confiável. Tinha que ser o melhor amigo de Caio, aparentemente.

Haviam se passado mais dez minutos e ainda nada do amigo misterioso que havia acabado de se aposentar e estava procurando algo para ocupar sua mente depois de um ano sabático viajando pela Ásia — Mel também queria um ano sabático viajando, porém suas contas não se pagariam sozinha e ela não queria ter que trabalhar mais um mês como assistente de marketing.

E como, ela se perguntava, Gabriella e Caio conheciam um senhor que pudesse querer entrar em algum negócio depois de se aposentar? Isso não ia contra todas as dicas de finanças pessoais que os blogueiros postavam na internet?

Se ela realmente quisesse, poderia pedir demissão para focar em sua loja, porém para isso precisaria pedir dinheiro emprestado para seus pais. Eles não se importavam, de verdade, em ajudar Melissa em qualquer projeto que ela encabeçasse, porém eles já haviam gastado uma parte do dinheiro da aposentadoria deles com Fabíola, sua irmã mais velha, e sua fabricação própria de sapatos.

A princípio todos pensaram que não daria muito certo, porém o negócio deslanchou quando uma modelo descobriu sua loja e usou um dos sapatos no São Paulo Fashion Week há três anos — agora ela tinha três franquias, 20 funcionários, estava mobiliando sua casa no litoral, comprando um CRV novo e tirava férias a cada quatro meses.

No entanto, nunca passou pela cabeça de Fabíola que ela deveria pagar o dinheiro que pegou emprestado de seus pais, pois achou que aquilo era apenas um presente.

Melissa olhou novamente para seu celular e notou que a pessoa estava mais de quarenta minutos atrasada. Qua-ren-ta.

Furiosa, ela pegou o seu celular e começou a escrever uma mensagem extremamente mal-educada para sua amiga, explicitando com várias figurinhas o quanto ela estava irritada por gastar o seu tempo com aquela ideia. E tudo o que recebeu em retorno foi uma figurinha dizendo que sua amiga só voltaria a atendê-la no horário comercial.

Típico de Gabriella.

Bem, ela decidiu, uma pessoa que não se importava com o simples compromisso de chegar no horário em uma reunião não era o tipo de pessoa que ela queria trabalhar com.

A muito contragosto, a moça chamou a garçonete, pediu a conta — que provavelmente daria trinta reais apenas pela água e o serviço estratosférico que eles cobravam ali — e juntou seus papéis em sua pasta, sentindo a frustração tocar seu rosto.

Mundo 5. Melissa 0.

O que é para ser, vai ser, sua mãe, Amanda Rackler sempre lhe dizia e ela acreditava piamente naquelas palavras.

— Com licença, Melissa? — um homem parou na sua frente quando ela começou a se levantar e abriu um grande sorriso, estendendo sua mão — meu nome é Ricardo Bötinger, amigo do Caio. Sinto muito o meu atraso, eu estava tentando cancelar a minha linha da Vivo e a mulher conseguiu me enrolar por mais de trinta minutos. E eu não cancelei o plano, fiz um upgrade — ele meneou a sua cabeça, irritado consigo mesmo.

Melissa parou onde estava e franziu seu cenho, pois o nome realmente era o mesmo do amigo de Gabriella, porém aquele homem tinha no máximo trinta anos — isso porque ele estava com a barba perfeitamente arrumada. De onde ele lhe era familiar?

Aquele homem deveria estar em uma capa de revista de tão desconcertantemente belo que era, e não aposentado. Aposentado! Como ele havia feito aquilo e como ela poderia fazer o mesmo?

— Tem certeza? — foram as primeiras palavras que ela conseguiu falar, depois que desviou seus olhos castanhos dos dele, que eram como duas estrelas super-novas brilhando em uma noite calma. Na verdade, a cor dos olhos dele lembravam um pouco o amanhecer, aquela linha tênue que separava a terra e o céu no horizonte. Era como sonhar acordada.

— Se eu tenho certeza do que? — ele indagou, confuso, abaixando a sua mão depois que ela não a aceitou.

— Gabriella me disse que você é aposentado. Você não tem nem trinta — ela explicou, tentando se fazer entender depois que percebeu que estava fazendo tudo errado.

Não era assim que ela tinha imaginado que sua noite e o seu encontro — de negócios — ocorreria.

— Faço trinta em setembro e sou aposentado. Eu me aposentei — ele explicou, sentando-se na cadeira a frente da que ela estava parada e começou a sondar o cardápio — estava pensando em pegar estas lulas a carbonara e depois uma taboa de queijos e pães.

Ela continuou olhando para Ricardo Bötinger, tentando entender o que ele fazia parecer óbvio, pois ele não tinha apenas um pouco de dinheiro. Ele tinha muito dinheiro. Apenas o relógio dele custava mais do que o apartamento que dividia com Tainá.

— Você ganhou na loteria ou é herdeiro? — Melissa continuou perguntando, vendo que um de seus cachos loiros escapou do seu coque, que provavelmente já estava em auto-destruição.

— Isso importa? — ele levantou uma sobrancelha — tenho certeza de que minha saúde financeira interessa apenas a mim.

— Se vamos ser sócios, então importa sim. Não vou vincular meu nome ao de uma pessoa que pode ter enriquecido ilicitamente — ela cruzou seus braços, esperando.

Depois de alguns segundos de um constrangedor silêncio, Ricardo suspirou e apontou para a cadeira que ela deveria se sentar e, desta vez, ela o fez.

— Trabalhei dos 17 aos 28 anos como analista de mercado em um banco, entregando análises diárias para todos os clientes, fazendo visitas, prevendo tendências de mercado, mas por uma briga de ego, acabei me desentendendo com o CEO do banco e saí — ele explicou, em seguida chamou a garçonete e fez o pedido por eles — o mercado financeiro gosta de bônus gordos para manter os funcionários estrelinhas, então aqui estou.

Melissa parou um pouco, pensando na história dele e se ela acreditava nela, percebendo que não havia motivos para ele mentir tão descaradamente logo de cara — e ela já havia ouvido falar daquela lenda urbana dos bônus de bancos.

— Tudo bem — ela concordou — acho que posso trabalhar com essa possibilidade.

— Vamos falar de negócios, agora? — ele apoiou seus cotovelos na mesa e inclinou seu corpo para frente, assumindo um olhar mais sério — venda seu negócio para mim.

— Eu fiz uma análise mercadológica e percebi que existe um gap no setor de comidas e bebidas desde 2013, onde as pessoas que... — ela começou a retirar seus papéis, entregando um maço de 20 folhas frente e verso com gráficos e fluxogramas que estavam perfeitamente detalhados.

— Eu quero que você me venda seu negócio com apenas uma frase — ele pediu, colocando as folhas de lado, cruzando seus dedos em frente ao seu rosto — como vamos convencer as pessoas que a experiência que vamos proporcionar vale cada centavo gasto?

Sob o encanto daquele olhar ela venderia até mesmo Gabriella sem hesitar, porém aquela não era uma resposta apropriada.

— Não é só uma experiência, é um estilo de vida — Melissa o corrigiu, sentindo as palavras fluidas em sua língua, da maneira que ela havia tanto treinado.

— É arriscado, pois o mercado de cafés ainda é e sempre será mais presente e mais conhecido, como vamos suplantar esta barreira? — ele continuou perguntando, como se tivesse uma sequência de perguntas programadas em sua mente.

— Não estou atrás do consumidor de café. Estou atrás do não-consumidor de café, que representa 20% dos brasileiros, nos levando a um público potencial de aproximadamente 41 milhões de pessoas. Aquela pessoa que adoraria ter um lugar para ir após o almoço ou apenas para sair com os seus amigos no meio de uma tarde, porém que não gosta de café — desta vez foi a vez dela de se inclinar para frente — chá é o novo café. O mercado é grande, existe esse gap e o mundo está pronto para essa mudança.

Ricardo abaixou seus olhos para as folhas de Melissa, desta vez passando seus olhos nelas com calma.

Ele retirou uma caneta do bolso de sua camisa e começou a fazer anotações, concordando e escrevendo, ou negando e riscando, porém, realmente, ele estava lendo todo material — até mesmo as notas de rodapé que ela deixou ali.

— Isso aqui está muito bem feito — ele comentou, assim que terminou de revisar as folhas e entregar de volta para Melissa, guardando sua caneta — você contratou alguém para ajudá-la?

— Eu tenho um MBA em empreendedorismo e finanças — ela explicou, notando que desta vez, ele é quem parecia estar impressionado com ela — e então, Ricardo?

Ele parou um pouco, olhando para ela, como se a decisão já não tivesse sido tomada há algum tempo.

— Minha nobre dama — ele chamou a garçonete, que pouco depois apareceu ao seu lado, pronta para explicar o motivo da demora das entradas que ele havia pedido — uma garrafa de champanhe, por favor? Möet & Chandon se tiver seria perfeito.

Melissa mordeu seus lábios, tentando não se animar demais, pois ele poderia apenas estar pedindo aquele espumante para remendar o coração partido dela quando dissesse que não queria parte naquele empreendimento.

— E qual o nome da nossa loja de chá? — ele indagou, quando a garçonete abriu o espumante discretamente, servindo duas taças com um sorriso que chegava a doer nos lábios da moça.

— Minha criatividade se resume aos chás — Melissa deu de ombros — sou péssima com nomes.

— Fique tranquila, vamos fazer isso juntos.

E eles brindaram.

A/N:

Oizinho, tudo bem?

Vocês ainda vão me dar uma chance com essa história? Pela primeira vez em meses eu estou sorrindo enquanto escrevo e acho que isso é um bom sinal.

Este post de hoje não significa que teremos capítulos regulares. Não ainda, mas é uma promessa que eu vou tentar ao máximo entregar a vocês a história que eu sempre quis contar.

A Mel e o Ricardo não começaram da maneira mais normal, não é? Mas desde quanto isso é um impeditivo? Acho que isso torna essa história diferente das outras.

Espero que estejam gostando!

Como estou reescrevendo tudo, algumas coisas manterão a mesma estrutura, mas a maior parte da trama está completamente diferente (para aqueles que gostavam da trama antiga, eu sinto muito, mas foi um sacrifício necessário).

Daqui a pouco devo ter um casting para vocês acompanharem.

Novamente obrigada pela chance.

E aí? Vocês gostam de chás? Qual o preferido de vocês? Eu simplesmente amo e o meu atual favorito é de Laranja, Manga e Canela (sim, estranho e sim, incrível).

Beijinhos <3

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