XXXIX
Embora o corpo do ruivo tivesse se adaptado à energia demoníaca da namorada, Lins ainda acabava oscilando entre sua nova aparência e a original pelo fato do corpo de Blader tentar fazer uma divisão perfeita de energia entre ambos, mesmo estando desacordada.
Três longos dias e três angustiantes noites se passaram, porém o músico se mantinha ao lado da amada sempre que podia. Ao longo desse tempo, descobriu que mexer nos fios castanhos da jovem era algo que lhe trazia calma, quase como uma terapia. Ora fazia tranças e admirava o quão longas ficavam, ora enrolava uma mecha em seu indicador e sorria quando o cabelo voltava a ficar liso.
— Espero que nossas crianças tenham cabelos tão lindos quanto os seus — sussurrou, acariciando a face da algoz e tocando sua testa na dela.
**
Enquanto dormia, sentiu dedos finos e frios percorrendo sua face, mais precisamente onde as escamas ficavam. Lins não se moveu, temendo estragar aquele sonho, porém caiu em si que aquilo era real quando um selinho foi depositado em seus lábios.
— Não imaginei que você pudesse ficar mais bonito ainda. — A voz dela estava rouca pela falta de uso, mas aquilo não importava. Blader se encontrava de olhos bem abertos e contemplando cada traço do rosto do violinista, que novamente se encontrava com a aparência demoníaca — Llafn não me disse que o pacto poderia te tornar uma obra de arte.
— Meine Liebe... — As lágrimas lhe escaparam. O ruivo precisou de um tempo para ter certeza de que ela conseguira acordar de fato. A observou com cuidado e até fechou os olhos violetas, apreciando o carinho que recebia. Quando finalmente se convenceu de que era verdade, apertou o abraço — Bitte, não faça mais isso, meu coração não vai aguentar outro susto.
— Me perdoe, meinen Prinzen — disse, aconchegando o rosto dele entre seu pescoço e ombro. — Nunca quis causar preocupação.
Ele balançou a cabeça em negativa, voltando a encará-la.
— Você está de volta para nós, isso é o mais importante — replicou, tomando a face dela entre as mãos. — E tudo o que eu desejo é que não me deixe nem por um segundo.
— Nunca mais vou te deixar sozinho, eu prometo.
Blader estendeu o mindinho para ele, que sorriu antes de imitar o gesto, fazendo seus dedos ficarem entrelaçados e, em seguida, depositou um beijo na mão dela.
O ruivo então fez o que almejava há dias: aproximou seu rosto do dela e a beijou, deixando transparecer a falta que sentiu de encontrar aqueles lábios tão delicados e preciosos. Poderia ter ficado assim por mais tempo, porém a morena se afastou com um resmungo de dor e uma careta.
— Onde dói, mein Herz? — indagou e a viu apontar para o local onde ela havia sido empalada pela Vela de Luz e Sombras.
O rapaz então olhou na direção de Smiley, que continuava adormecido sobre os relatórios médicos. Blader seguiu o olhar do namorado e revirou os olhos, franzindo a testa quando outra pontada de dor surgiu.
— Se esse maldito continuar dormindo no próprio plantão, vou sumir com todos os estoques de analgésico dele em um piscar de olhos! — anunciou alto o bastante e dando um meio sorriso vitorioso ao ouvir o médico resmungar.
— Você não é louca de... — Ao finalmente processar de quem era aquela voz, o de olhos avermelhados se endireita na cadeira em questão de segundos. Precisou piscar diversas vezes para ter certeza de que não estava tendo alucinações com a moça acordada e então prosseguiu: — Ficou quase quatro dias inconsciente e agora vai tirar o atraso das patadas, é?
— Deveria se sentir honrado por ser a primeira vítima, Smiley. — A resposta dela o fez revirar os olhos e tirou uma risadinha do ruivo.
— Não é bom compactuar com a conduta grosseira da sua namorada, Lins.
— Mas dessa vez ela não está errada, certo? — devolveu o músico. — Não deveria dormir no local de trabalho.
O outro revirou os olhos, logo prestando atenção na careta de dor da algoz e caminhando até ela com uma seringa.
— Isso deve resolver seu problema por enquanto — disse depois de aplicar algo para tirar o incômodo da jovem e em seguida se retirou do cômodo.
Lins ajudou a namorada e ficar sentada e não demorou para que a porta da sala médica se abrisse com um estrondo, revelando uma jovem loira com o nariz e olhos avermelhados por estar chorando. Correu na direção da outra e ambas se abraçaram durante um bom tempo.
— Se você der mais um susto desses na gente, vou raspar seu cabelo enquanto estiver inconsciente, ouviu? — Isso fez a morena dar uma risadinha — Não é pra achar graça, Blader!
— Tudo bem, já parei. — Ela levantou as mãos em sinal de paz — Prometo não aprontar mais.
— Acho bom mesmo. — A morena lhe deu um tapinha de leve no braço e mostrou a língua, fazendo Ery revirar os olhos antes ceder e abraçar a irmã novamente — Ah, é! — Ao se lembrar de algo, voltou a atenção para o cunhado — "Primeiro você precisa se preocupar se a Blader vai acordar" — repetiu, tentando imitar o tom grave da voz do cunhado. — O que me diz agora, hein?
— Que estou te devendo sobrinhos? — indagou o ruivo, rindo ao ver a loira balançar a cabeça afirmativamente e com animação — Não preciso lembrar que a mamãe dos meus filhotes não é fácil de convencer, certo?
— Ei, ainda estou aqui, sabe? — A morena reclamou, cruzando os braços.
— Sabemos, mein Herz. — O ruivo sorriu ao ver a expressão contrariada dela e beijou sua têmpora — Mas contra fatos não há argumentos.
— Ele tem razão — reforçou a loira, encarando a algoz. — E acho bom a senhora parar com isso e fazer logo uma criança correr por essa casa.
— Precoces — Blader resmungou, revirando os olhos.
Ery se levantou da beirada da maca, examinando o ferimento da outra, que jogou o lençol no rosto Lins para que este não visse seu tronco exposto.
— Acho que não precisa mais ficar em observação aqui, principalmente por estar acordada — concluiu. — Se quiser, pode descansar melhor no quarto, mas evite esforço, entendeu?
— Pode deixar, se depender de mim ela vai cumprir o repouso direitinho — afirmou o músico, pegando a namorada no colo.
— Ei, ei, e suas costas? — questionou a morena, tentando colocar os pés no chão, mas sem sucesso.
— Durante o tempo em que esteve desacordada, finalmente fiquei livre dos pontos e posso te carregar para onde eu quiser.
A garota revirou levemente os olhos, entendo o que "para onde eu quiser" significava.
— Então você vai parar no meu quarto para eu pegar minhas roupas e tolhas — ditou.
— Ja, Senhora Heilig — concordou o rapaz, sorrindo ao ver o pequeno rubor no rosto de sua amada por ela ter sido chamada daquela forma.
**
— Tem certeza que não quer ajuda? — perguntou mais uma vez ao notar a demora da morena no banheiro.
— Calma, homem, você acha que é fácil se secar e se vestir com a barriga cheia de pontos? — retrucou ela.
— Se me deixasse ajudar, já teria resolvido isso há vinte minutos — constatou, ficando encostado na parede ao lado da porta e cruzando os braços.
Já estava impaciente e preocupado. E se tivesse acontecido alguma coisa e ela não quisesse falar? Conhecia a namorada que tinha muito bem para saber que sua teimosia em querer fazer tudo sozinha mesmo debilitada poderia terminar mal.
Assim sendo, resolveu entrar, se deparando com Blader já vestida na parte inferior, porém lutando para desenrolar a camiseta nas costas, coisa que não conseguia fazer por não alcançar o tecido. De toda forma, ele foi incapaz de ignorar a parte exposta do corpo de sua amada. Aproximou-se de mansinho, sem conter o impulso de roçar os lábios nas costas dela. Como imaginava, a pele era extremamente macia e, se pudesse, depositaria milhares de beijos ali.
— Falei para esperar lá fora, maldito. — Já estava acostumado com esse tipo de reação, portanto apenas deu um sorriso, que se alargou ao vê-la arrepiada.
— Você estava demorando demais e achei que tivesse acontecido alguma coisa — respondeu, ajudando-a a desenrolar a camiseta. — Não precisa ficar brava, não vi nada além de suas costas e dessa cintura adorável. — Novamente a pegou nos braços, admirando as bochechas ainda coradas dela — Não precisa esconder o ouro de mim, mein Herz, eu te amo e nada vai abalar isso.
— Mas e se... você me achar feia? — Ela engoliu em seco, desviando o olhar.
— Ah, meine Liebe... — Sentou-se na cama, deixando-a sobre seu colo e passando os braços ao redor dela — Não tem como eu pensar uma coisa dessas nem agora e nem nunca. Mesmo coberta ao máximo, consigo perceber que você consegue ser linda de todas as formas, parece até uma escultura de tão maravilhosa que é.
— Você é um bajulador de primeira.
— Estou dizendo a verdade — respondeu, beijando a testa dela. — Me dê apenas uma chance e te farei entender que sou apaixonado por cada pedacinho seu.
— Quem sabe um dia...
— Vou esperar o tempo que for preciso.
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