XLVII

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Os tão esperados nove meses de gestação chegaram, e com ele a ansiedade por saber que, a qualquer momento, Mia enfim estaria conosco. Minha barriga estava ainda mais pesada que antes, de forma que só desejava ter o trabalho de parto de uma vez, embora ainda estivesse receosa para com esse momento.

– Já está na hora de mostrar esse rostinho lindo para nós, princesa – disse meu marido ao parar de tocar o violino para diminuir minha agitação.   – Desse jeito vai matar a mamãe e o papai de curiosidade.

– O papai tem razão, Mia – concordei, apoiando as mãos em meu ventre. – Você já está bem pesadinha, sabia?

Os preparativos já haviam sido feitos e só esperavam por ela. Meu antigo quarto fora redecorado para abriga-la posteriormente, porém Lins e eu concordamos em deixar o berço em nossa suíte até que Mia crescesse o suficiente para não nos preocuparmos tanto e não precisasse de cuidados tão constantes. No mais, várias roupinhas a aguardavam e a tornariam uma perfeita bonequinha, me obrigando a admitir que, dessa vez, Tio Trenderman havia caprichado de forma que nunca vi antes.

Observei o berço de madeira clara perfeitamente arrumado e acabei pegando a bonequinha de pano que meu pai havia dado como presente, imaginando como seria se essa gravidez tivesse acontecido enquanto eu estivesse com minha família humana.

No entanto, acabei afastando esses pensamentos, pois não havia um pingo de alegria caso me encontrasse lá, ao contrário: conhecendo minha avó e minha mãe, me incriminariam de ter sido displicente e ainda afirmariam com todas as letras que meu casamento não duraria, assim como os dela. Embora parecesse frieza e ingratidão de minha parte, no fim ter me livrado delas e vindo para cá foi a melhor decisão que tomei para meu futuro. Finalmente posso me afirmar feliz de verdade e completa ao formar uma família com o homem que amo e uma menininha que, é claro, se tornaria minha casquinha de ferida pela vida toda. Seria para Mia tudo o que minha mãe não foi para mim.

**

Todas as noites até então foram complicadas a partir do momento em que a barriga crescia mais e mais, porém dessa vez dormir parecia algo impossível. Por mais que tentasse me ajeitar, não encontrava um jeito que agradasse meu corpo, e a pior parte era que Lins estava em sono profundo e tranquilo, portanto não queria acordá-lo me virando de um lado para o outro, embora ele já estivesse acostumado de certa forma.

Olhei para o relógio, que marcava cinco e meia da manhã. Se fosse contar o total de horas que consegui ao menos cochilar, foram no máximo quatro horas, mas não seguidas. Estava prestes a fechar os olhos quando uma dor intensa me atinge. Não, não poderia ser um chute ou qualquer movimentação de Mia.

A dor era persistente, como se fosse um tipo de cólica, e então um líquido começou a escorrer entre minhas pernas.

Era chegada a hora.

– Amor – chamei, o sacudindo com talvez mais força do que o necessário. – Amor.

– Hm? – Sua voz sonolenta me fez sentir pena por acordá-lo assim, mas ao menos era por uma excelente causa.

– A bolsa estourou – avisei, fazendo  careta de dor e apertando o braço dele sem querer.

Seus olhos azuis abriram de uma vez e ele levantou da cama de supetão ao finalmente processar o que eu havia dito. Afastou o cobertor e me pegou nos braços no mesmo instante, gritando a plenos pulmões quando passamos na frente do quarto de Ery:

– Mia vai nascer!

Chegamos à ala médica e fui colocada na maca rapidamente. Sem perder tempo, Smiley e Ann começaram a fazer o trabalho de parto. Por estar de camisola, tiveram um trabalho a menos.

A dor era insuportável, porém ainda assim fiz questão de não agir como boa parte das mulheres que gritam e fazem todo um espetáculo para parir. Lins tentou segurar minha mão, mas balancei a cabeça em negativa, pois não queria correr o risco de quebrar a mão dele pela força que eu precisava fazer. Dessa forma, meu marido pegou um pano macio e se manteve secando o suor de minha testa.

– Sai daí, eu assumo essa situação. – Ery apareceu pouco depois, empurrando Smiley para longe enquanto assumia o lugar dele – Você está indo bem, maninha, continue assim.

"Por que não inibe a dor?" Llafn se manifestou em minha consciência.

"Porque quero passar por cada etapa de ser mãe" respondi, de forma simples.

"Os humanos e suas manias... De toda forma, dê o seu melhor, Blader, sei que essa menina vai ser a mais linda de todas."

Depois disso, ela não mais se manifestou, apenas me emprestou um pouco de sua força para fazer a cabeça de minha bebê passar e a dor amenizar significativamente.

Ao ouvir o choro de minha princesinha, as lágrimas me escaparam enquanto finalmente pude relaxar após tanto esforço.

– Você foi muito bem, mein Liebe. – A voz dele estava trêmula pelo choro e então me deu um selinho.

– Essa princesinha é tão linda... – Claro que Ery também estaria emocionada.

A maninha pegou minha menina com todo cuidado nos braços enquanto a levava para a outra parte da sala, a fim de limpá-la do sangue e providenciar os devidos cuidados.

– A regeneração agora vem a calhar, não? – Smiley comentou quando ia começar a cuidar do meu estado. Porém, aparentemente não foi necessário.

Depois de alguns minutos, Mia foi entregue a nós. Lins estava mais perto, por isso a pegou primeiro nos braços, chorando mais ainda. Segurou a pequena mão de nossa bebê e encostou sua testa na dela.

– É exatamente a garotinha que eu tanto desejei ter – murmurou, beijando o rostinho dela.

Ele então a ajeitou em meus braços e me senti ainda mais emocionada. Os cabelos de Mia eram ruivos, assim como os dele, e logo seus olhinhos se abriram um instante, revelando íris tão azuis quanto as do pai.

– Nove meses para parir uma cópia do meu marido – constatei, porém incapaz de conter o sorriso bobo. – Mas é o joelhinho mais lindo que vou ver em toda minha vida.

Beijei aquela testa tão pequena e a trouxe para mais perto de mim. Mal podia acreditar que uma menina assim havia saído de mim.

– Já sabemos que a Blader é a adotada dessa família. – Semicerrei os olhos para Smiley, controlando minha vontade de apertar o nó daquela gravata até ele ficar sem ar.

– Você sabe que agora ela pode te caçar até os confins por essa piada, certo? – Lins relembrou, e com razão. – A gravidez não existe mais para limitá-la.

O médico engoliu em seco ao se dar conta da situação. Porém, para a sorte dele, eu estava infinitamente mais preocupada e concentrada em um pinguinho de gente embrulhada em um cobertor lilás.

– Me deixe ver mais de perto essa coisinha tão linda. – Ery se sentou na beirada da maca onde eu estava, pegando uma das pequenas mãozinhas de Mia.

Meu pai então apareceu na sala, voltando a face vazia para minha menina e assim permanecendo por um bom tempo.

– Está tudo bem? – arrisquei perguntar.

– Só estava me lembrando de quando você era tão pequena e delicada quanto Mia – respondeu, e notei certa nostalgia em sua voz. Em seguida, afagou o topo de minha cabeça. – Tenho certeza que será uma excelente mãe, Blader, e fico extremamente feliz por ter a honra de te ver formando uma família.

– Obrigada, pai – agradeci, sentindo os olhos marejarem ainda mais.

Minha princesinha logo começou a chorar, provavelmente pela barriguinha vazia. Lins então dispensou os curiosos para que eu a amamentasse, fechando a porta da sala médica e ficando ao meu lado novamente.

– Seja bem-vinda, minha pequena Mia – disse, acariciando aquele rostinho tão delicado. – E obrigada por me fazer a mamãe mais feliz do mundo daqui em diante. – Afaguei com toda delicadeza sua bochecha enquanto prosseguia: – Prometo que farei de tudo para cuidar de nossa família e protegê-la até o fim.

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