XI

— É melhor ficar esperta, Rake e Hobo agora querem sua cabeça numa bandeja de prata — comentou Nick ao encontrar a garota do lado de fora do covil.

— Como se eu me importasse. — Ela se descurvou e levantou a cabeça, que estava apoiada sobre os braços, e encarou o outro — Por acaso veio vinga-los?

O rapaz deu uma risada, apoiando-se na árvore diante dela.

— Só arrumo confusão quando sou pago para isso. Mas, para sua sorte, Zalgo não me deu um tostão sequer. Aliás, o que faz aqui fora e tão cabisbaixa?

— Não estou cabisbaixa, estou sem óculos, é diferente. Por mais que meu grau de miopia não seja tão alto, é incômodo ficar sem eles depois de algum tempo.

— E por que não disse logo? Basta irmos buscar o que te falta, ora essa.

A garota arqueou uma sobrancelha e cruzou os braços.

— Que tipo de cilada é essa? Acha mesmo que vou cair na sua lábia para depois Zalgo descobrir e acabar com a minha raça?

— Zalgo não é do tipo que liga muito para onde vamos, basta voltarmos. Posso te acompanhar para garantir que isso vá acontecer.

— Por acaso acha que sou do tipo que vai e some?

— Você não, mas sei bem de certo ruivinho que te esconderia debaixo da cama dele se fosse preciso só para não te ver ir embora.

— Vocês não têm nada para fazer além de tomar conta da vida dos outros?

— Isso se chama "coletar informações sobre o inimigo". Mas e aí? Vai aceitar ou prefere ficar vendo tudo em baixa resolução?

Ela acabou dando de ombros. Cilada ou não, a verdade era que não tinha muito a perder. Se levantou, afastou a grama das roupas e acabou por seguir o garoto em uma longa caminhada de volta para a mansão de seu pai.

**

Já era noite quando finalmente chegaram às redondezas. Pelas grandes janelas da mansão, era possível ver sombras andando de um lado para o outro, o que dificultaria sua entrada mesmo invisível.

— Só não te mato porque não sei o caminho de volta. — O olhar de Blader fez o outro levantar as mãos em rendição.

— Me desculpe se não avisei que a caminhada era longa, tudo bem?

— Agora quero saber como vou entrar.

— Escalando as varandas até chegar ao seu quarto? — sugeriu Nick, como se fosse algo óbvio.

Ela suspirou, ficando invisível enquanto se aproximava da casa. Começou a escalar de pouco a pouco, finalmente chegando ao destino desejado. A porta da varanda estava destrancada e seus óculos em cima da escrivaninha, então seu trabalho seria rápido, ou foi o que pensou.

Adentou o cômodo e escutou uma respiração profunda. Se virando na direção do som, vê o violinista adormecido e abraçado ao pijama da jovem como se aquilo fosse a coisa mais preciosa do mundo. Pegou o que queria e foi em direção à saída, mas não conseguiu ignorar o ruivo.

Quando se deu conta, estava sentada na beirada da cama observando cada detalhe da expressão serena de Lins, que acabou segurando o pulso dela enquanto suspirava.

"Sei bem de certo ruivinho que te esconderia debaixo da cama dele se fosse preciso só para não te ver ir embora". A observação de Nick a fez incapaz de reprimir um sorrisinho. Afinal, mesmo dormindo, o austríaco dava seu jeito de mantê-la por perto.

— Preciso ir, mas prometo que volto logo — sussurrou, abaixando o rosto para beijar a têmpora do jovem.

O fato de ele se virar de repente para o outro lado pegou a jovem desprevenida. Por conta da proximidade, seus lábios se tocaram por um breve momento, porém estava livre para se levantar. Engoliu o nó em sua garganta de pulou da varanda, caindo de joelhos. Sentiu os olhos marejando enquanto voltava para o meio das árvores, passando por Nick de forma a evitar contato visual.

— Que demora foi essa? Precisou fabricar os óculos?

— Cala a boca e vamos voltar.

— Que mau humor, garota.

Ela revirou os olhos, seguindo o rapaz em silêncio. Tocou os próprios lábios com a ponta dos dedos, sentindo seu coração bater um pouco mais rápido. Gostava dele, isso não conseguia negar mais para si mesma, mas não podia continuar assim. Quando retornasse para a mansão, deveria continuar sendo Algoz e de certo seu pai a enviaria para outros trabalhos, quais seriam as chances de retribuir o carinho que recebia e receberia de Lins? Não achava justo e também não sabia como dar um jeito nesse impasse.

**

Depois de mais um longo tempo de caminhada, Blader ficou surpresa ao ver as coisas como estavam e não se deparar com Zalgo na porta do covil furioso com o sumiço repentino dos dois.

Levou um tempo para ela reencontrar o quarto onde estava hospeda. Tomou um banho rápido, aliviando o cansaço da maratona que Vanill a convenceu percorrer. Deitou-se na cama sem se importar em procurar algo para comer, mesmo tendo ficado o dia todo em jejum.

**

— Não demore para voltar, por favor.

Há muito a morena não via o ruivo em seus sonhos. Estavam em um canto de uma praça e ela se aproximou enquanto ele tocava violino.

— Quanto tempo faz desde a última vez? — indagou a garota.

— Um ano. Tudo porque certa moça decidiu ignorar seu lado sobrenatural e nos repelir inconscientemente. — Lins terminou a melodia e iniciou outra, lançando um breve olhar à Blader em seguida — Sei que esteve no seu quarto há algumas horas. Como encontrou o caminho de volta?

— Nick Vanill me ajudou a chegar lá. — Ela deu de ombros, apreciando a paisagem — Precisava dos meus óculos de volta. Mas muito me intrigou te encontrar agarrado às minhas roupas enquanto dormia. — Foi a vez dela o encarar de forma breve.

— Precisava de alguma coisa concreta para enganar a mim mesmo de que você estava ali comigo.

O músico parou de tocar e procurou algo nos bolsos, retirando uma corrente prateada com um pingente de coração feito de cristal.

— Era da minha mãe e foi um presente do meu pai quando tiveram o primeiro encontro. — Ele afastou os cabelos da jovem e delicadamente abotoou o colar — Quero que fique com você a partir de agora.

— Desde quando você tem isso?

— Desde o breve momento em que o senhor Slenderman me deixou pegar meus pertences depois da morte do meu pai. — O rapaz beijou o topo da cabeça dela — Vou te deixar descansar agora, mein Herz. Espero que durma bem e volte logo para casa.

**

A garota abriu os olhos de repente, sentando-se na cama ao sentir algo diferente em seu pescoço.

— Lins... — Mesmo sendo um sonho, o colar era bem real, como se sempre estivesse ali.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top