Bônus II

Eu não vou me alongar aqui, porque ninguém gosta de ler avisos 👉👈  Obrigada pelo seu carinho, e por ter acompanhado Black Swan até o fim 💜

Este capítulo bônus conta (em resumo) a história de Francis Bonny, então tem muito drama, luta, sangue e choro. Como quem leu Black Swan sabe, o maior de todos foi enforcado (em 1691)... então, vai estar presente na história dele esse momento ;-;

Enfim… 

Boa leitura 💜

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Ilha de Nabuco - 1669

As ondas da maré forte batiam contra as bases do deque do Porto de Nabuco. Um jovem Ômega de cabelo castanho estava sentado no cais, observando o sol nascendo e iluminando o céu em mais um dia. 

Aos poucos, o Porto tornava-se movimentado à medida que os comerciantes e navios chegavam, com seus produtos para serem comprados ou vendidos. 

— Francis!? — O Alfa dono do estaleiro deliberou. — Onde está esse menino?!

De repente, ele viu o garoto correndo pelo deque, vindo ao seu encontro. Alguns piratas desembarcavam suas cargas, com expressões tenebrosas e discutindo por um lugar.

— Chamou, pai?

— Onde você estava? — O mais velho abriu as portas do estaleiro. — Leve isso à oficina.

— Eu vou arrancar sua cabeça e entregar aos tubarões! — Um pirata ameaçou o outro, um pouco atrás.

O Ômega recebeu uma caixa com alguns equipamentos utilizados por seu pai para consertar peças de navios.

Yejun Bonny gostaria de conceder ao seu único filho uma vida mais digna e segura, mas como dono de um estaleiro onde os próprios piratas ditam seus preços, o Alfa vivia de consertar navios e recebia aquilo que os capitães decidiam ser o justo.

— Fique longe desses animais — o Alfa avisou baixo, para que apenas seu filho escutasse. — O filho de Minjee desapareceu essa semana. Não desvie do seu caminho e-...

— Tome cuidado. — O menino completou a fala do pai. — Já sei. Você diz isso todos os dias.

— Estou falando sério, Fran. — O Alfa acariciou a bochecha do menor. — Eu só tenho você.

— Não se preocupe. 

O Ômega segurou a caixa com mais firmeza e seguiu seu caminho ao longo do cais. No auge de seus quinze anos, o garoto estava começando a atrair a atenção de Alfas e Betas por onde passava. 

Geralmente os Ômegas de sua idade começavam a se interessar por moças e rapazes Alfas ou Betas. Mas o jovem Francis apreciava ajudar seu pai na oficina, porque lá ele podia ouvir histórias dos marinheiros, sobre aventuras em alto mar. 

Quando foi descoberta pela Marinha coreana, Nabuco rapidamente se tornou um grande centro de comércio marítimo, sua localização facilitava o transporte de mercadorias para locais mais distantes. Mas isso também chamou a atenção dos piratas.

Os chamados demônios do mar chegaram em Nabuco um pouco depois, mas não conseguiram o domínio da ilha logo a princípio. Na tentativa de mascarar seu comércio ilegal, um grupo de piratas criaram o que ficaria conhecido como Submundo. 

Ômegas começaram a desaparecer por toda Nabuco, e boatos diziam que eles eram levados para o tal covil onde bandidos da pior espécie se reuniam, para praticar seu comércio clandestino. Yejun temia que o mesmo acontecesse ao seu filho, por isso se enchia de cuidados. 

Sempre que Francis demorava a retornar, o mecânico largava o serviço para procurar pelo Ômega. Mas naquele momento, Yejun se encontrava com o maior capitão da atualidade, William Rivers.

— Por que tanto olha para a janela, Bonny? — William indagou. — Eu acho que é uma grande falta de respeito não dar atenção ao seu cliente.

— Desculpe, eu só… — Yejun saiu da janela e voltou à mesa de negócios. — Então fica por vinte moedas?

— Não. Mudei de ideia. Agora são dezenove, por sua audácia e falta de respeito.

— Mas-...

— Dezoito. Continue e o preço cairá a cada vez que abrir essa maldita boca. 

— Pai, cheguei! — Os Alfas olharam para o lado quando a porta foi aberta. — Eu me atrasei um pouco porque estava… Capitão Rivers?

— Seu filho, Bonny? — Yejun assentiu, incomodado com o modo interessado que Rivers olhava para o Ômega. O capitão ofereceu a mão para cumprimentá-lo. — Estou impressionado que ele não tenha nascido com sua cara de rato de esgoto.

— Você já se olhou no espelho, por acaso? — O Ômega perguntou, apertando a mão do pirata com força. — Sua cara parece que tá do avesso!

— Francis! — Yejun repreendeu por medo do capitão castigá-lo pelo insulto. — Mais respeito! Entre e sirva alguma bebida ao Capitão Rivers.

— Café. — Willian solicitou. Ele observou o garoto entrar por outra porta, e voltou sua atenção ao mecânico: — Seu filho tem a mão forte.

— Ele é um lúpus, e está acostumado ao serviço pesado da oficina.

— Ele é muito bonito. Tem feições delicadas mas possui um olhar feroz. Só precisa tomar cuidado com a língua, pode ficar sem ela a qualquer momento.

— Ele é apenas uma criança, perdoe-o. Façamos o seguinte, as peças ficam por quinze moedas. 

— Parece que você aprende rápido. — Rivers sorriu satisfeito, ficando mais à vontade na cadeira.

Alguns piratas de sua tripulação entraram no escritório do estaleiro, ocupando outros lugares. Yejun se manteve o tempo todo tentando fazer com que o capitão esquecesse a ofensa que seu filho dirigiu a ele. 

A conversa havia tomado outros rumos, mas alguns piratas conseguem ser tão desprezíveis quanto sua fama valia. Quando Francis retornou trazendo consigo um bule para servi-los, sentiu uma mão subir pela coxa e apertar sua bunda. 

— O que-...?! — O Ômega sobressaltou, virando para o pirata. 

— Vai fazer o que, ratinho? Morder a minha canela? 

Os piratas riram. Yejun estava prestes a mandar Francis deixar o café na mesa e se retirar, ele conhecia bem o filho que tinha. Mas antes que pudesse, o Ômega abriu a tampa do bule e despejou todo o conteúdo quente sobre o colo do Capitão Rivers.

— AAAHH! — O Alfa rugiu. Ele lançou as costas da mão no rosto do Ômega, que foi jogado ao chão de imediato. — Agora te ensino uma lição, seu merdinha!

Rivers se levantou desengonçado, o líquido quente havia queimado suas partes íntimas. Ele puxou uma pistola e apontou para o Ômega caído, mas sua atenção foi desviada para o Alfa que tentava intervir pelo filho.

— Leve de graça! É tudo seu! — Yejun gritou desesperado, sendo contido pelos outros piratas. — Não o machuque! Vingue-se em mim!

— Você irá fornecer materiais de graça e vai trabalhar para mim, pelo que resta da sua vida miserável! — Rivers sentenciou balançando a arma contra o rosto do Alfa. — Farei com que seu sobrenome seja pior do que os vermes que rastejam pela sarjeta, Bonny! 

Rivers acertou um soco nas costelas de Yejun, rosnou para o Ômega que ainda estava no chão e logo depois se retirou com seus Alfas.

Francis encarou o pai, com a mão no rosto. Havia sangue perto de sua boca. O mais velho puxou uma cadeira para sentar, respirou fundo e chamou o filho para ir até ele. O menino se levantou e seguiu obediente.

— Por que você faz isso, Fran? — Ele examinou o rosto machucado do filho. — Eles são piratas! Não se importam se você é um Ômega.

— Aquele nojento passou a mão em mim, pai. Devia ter cortado aquela mão imunda e enfiado no cu dele!

— Ei! Já conversamos sobre esse linguajar grosseiro dos piratas, mocinho. Por isso não gosto quando você fica ouvindo nossas conversas, só aprende o que não presta. Tenha modos, menino! 

— Ai! — O Ômega resmungou quando o pai passou um curativo em seu rosto. 

— É pra doer mesmo! Quem sabe assim você não aprende, e deixa de se meter em confusão!

— Ele me desrespeita na sua frente e você vem brigar comigo?! 

— Eu sei, meu filho, eu sei. Você tem razão e eu invejo sua valentia e coragem. Mas eles são pessoas perigosas, e quando não temos forças para lutar, o melhor que fazemos é abaixar a cabeça.

— Eu jamais farei isso. — Francis afirmou com convicção. — Jamais vou abaixar a cabeça para um Alfa, Beta, Ômega ou o diabo que for! 

— Com pensamentos assim você vai apanhar muito na vida.

— É assim que se aprende a lutar, não é? — O Ômega sorriu. 

Yejun negou balançando a cabeça e suspirou, observando o filho limpar a bagunça que ficou pelo chão. Ele se preocupava, mas no fundo tinha muito orgulho daquele Ômega. 

O garoto não tinha medo de absolutamente nada. Muitas foram as vezes que se meteu em confusões, desde a infância, enquanto brincava com as crianças da ilha. Chegava em casa todo machucado, e escondia do seu pai que havia apanhando dos Alfas, para que o mesmo não fosse tomar satisfação.

Havia perdido seu outro pai muito cedo, para uma terrível doença. Mas Yejun nunca deixou que faltasse amor em sua criação. 

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Algumas semanas depois, Francis ajudava seu pai como de costume, no estaleiro. Estava sujo de graxa com o cabelo bagunçado e as roupas encardidas, quando Yejun o chamou para uma pausa. 

— Ainda tem muita serviço, pai. Tem certeza que podemos parar agora? 

— Sim, depois continuamos. Aliás, olhe para você, está parecendo um porquinho. — Francis olhou para si mesmo e riu junto. — Por que não vai tomar um banho? Eu vou fazer a janta.

— O senhor vai cozinhar? — O Ômega olhou para o céu. — Vai chover. 

— Pare com isto. Hum… eu comprei uma roupa para você também. Quero que vista ela hoje.

— Por que? 

— Eu vou… te apresentar… — Yejun pigarreou. — Um amigo…

— Pai…

Yejun estava preocupado que, quando morresse, Francis ficasse sozinho no mundo. Ele não poderia proteger o filho para sempre, estava disposto a conseguir um bom casamento para o Ômega, e desse modo assegurar o futuro do menino.

— É um Alfa de boa família. Um oficial da Marinha Real.

— Que nojo. 

— Faça o que eu disse. Tome banho, se arrume e vista-se para recebê-lo.

— Eu não quero conhecer este rapaz.

— Ele é um bom Alfa. Tem status e um bom nome para você. Ele é até bonito e jovem.

— Pare de repetir isso. Se o acha tão interessante, case-se com ele o senhor!

— BASTA! — Yejun bateu a mão sobre a mesa. — Vá tomar seu banho e vestir a porcaria da roupa, Francis! Agora!

O Ômega rosnou irritado, seu pai percebeu a ira em seus olhos prateados, quando o menino se levantou e foi fazer como o mais velho disse.

Yejun dirigiu-se à cozinha, para deixar tudo pronto para o jantar. Doía-lhe fazer aquilo, mas para ele, deixar seu filho para sofrer no mundo sozinho, seria pior do que obrigá-lo a se casar. Se preocupou em encontrar um Alfa que fosse jovem, bonito e gentil, mesmo sabendo que nada disso faria diferença. 

Logo mais a noite, batidas foram ouvidas do lado de fora da porta. Yejun foi receber o convidado. O Alfa estava vestido formalmente com o uniforme da Marinha coreana, parecia ter em torno de seus vinte anos, ou seja, era recém formado na escola de aprendizes. 

— Boa noite, senhor Bonny. 

— Boa noite, Hyunsik. Pode entrar, ele o aguarda na sala. 

O oficial adentrou na casa modesta, sendo guiado pelo mais velho até um outro cômodo. Havia um Ômega vestido elegantemente, o cabelo penteado adequadamente para o lado com uma expressão emburrada.

— Francis, este é o Hyunsik. — O menino não se moveu. — Por favor, mostre a educação na qual lhe criei. 

O Ômega suspirou, levantou-se do sofá e cumprimentou o oficial. Não foi rude em nenhum momento, mas também não se mostrou interessado no rapaz de uniforme.

Francis seguiu o protocolo, obedecendo o pai. Mas de maneira nenhuma iria fingir estar interessado naquele casamento. 

Após o jantar, Hyunsik pediu a autorização de Yejun, para dar uma volta com o mais novo, pelo cais. O Alfa permitiu, ignorando o olhar irritado do filho. 

— Eu adorei jantar em sua companhia e do seu pai. — Hyunsik expressou, enquanto caminhava lado a lado com o Ômega.

— Que bom. 

— Seu pai cozinha muito bem.

— Também acho.

— Gostaria de comer mais vezes lá. Quem sabe em um almoço?

— Almoço? — O menor parou de andar. — Você pretende voltar?

— Sim. Para acertar melhor as coisas do casamento, não? 

— Hm…

— Você não parece muito feliz com isso.

— Claro que estou. Será que não vê? Estou dando pulos de alegria. — O Alfa ergueu as sobrancelhas, surpreso. Francis fechou os olhos, suspirando. — Me desculpe, eu sou um estúpido.

— Tudo bem.

— Não, não está tudo bem. Você é um bom Alfa, está sendo muito gentil. Eu fui realmente idiota com você. Me desculpe mesmo. Não tenho nada contra você, só estou chateado.

— Por que não me conta? Converse comigo.

— Sinceramente? Eu não quero me casar com você. Estou sendo obrigado pelo meu pai, porque ele acha que preciso de alguém pra cuidar de mim quando ele morrer.

De repente, Hyunsik começou a rir. Francis o olhou com o cenho franzido.

— O que há com você? 

— É que… me desculpe — o Alfa respirou fundo, se recuperando. — Bom, é uma situação engraçada, você não acha? Seu pai tem medo que você fique sozinho. Está buscando desesperadamente por alguém para cuidar de você, quando está claro que não precisa.

— Obrigado.

— Você é muito bonito, embora seja um pouco arisco…

— Decida-se, você quer me elogiar ou insultar?

— Não me entenda mal. Eu considero uma qualidade, principalmente nos Ômegas. Você não leva desaforo pra casa. 

— Não mesmo. — Francis cruzou os braços.

— Direi ao seu pai que não quero me casar com você.

— De verdade?! 

— Sim. Mas ele com certeza vai tentar encontrar outro Alfa…

— Por que você tinha que acabar com meu breve momento de felicidade?

— Nossa… se casar comigo seria tão terrível assim? 

— Até que não… 

— Será que agora tenho chance?

— Não.

— Foi o que pensei. 

O Ômega desarmou o semblante austero e riu. Os dois permaneceram conversando por um tempo, até que chegaram nos limites do deque onde geralmente os navios maiores ancoravam, devido a profundidade.

— O que pretende fazer? — Hyunsik perguntou. 

— Eu não sei… Não vou conseguir fugir por muito tempo, uma hora vai acontecer. Meu pai tá muito decidido. Acho que, talvez, o máximo que eu possa fazer é nunca permitir que meu marido me toque.

— Você sabe lutar?

— Mais ou menos.

— Me mostra o que você sabe…

Das muitas brigas em que esteve metido, Francis aprendeu alguns truques, e aplicou naquele breve treinamento que Hyunsik estava guiando. O Alfa ainda lhe ensinou melhor a se defender contra investidas vindas por parte de alguém maior e mais forte. 

O Alfa ficou impressionado pelo quanto aquele menino era engenhoso e hábil. Francis mostrou uma força incrível enquanto lutava contra o oficial. Hyunsik podia sentir, aquele lobo era indestrutível.

No momento em que retornaram para casa, o oficial cumpriu como prometido e cancelou as visitas que faria. Yejun recebeu a decisão com muita surpresa, pois o Alfa havia se mostrado muito interessado. 

Yejun esperou até que estivesse sozinho com seu filho, para obter uma resposta mais coesa. Uma nova discussão se iniciou, dessa vez, mais calorosa. 

— Eu não estarei aqui para sempre, Francis! Será que não entende que estou fazendo isso para o seu próprio bem?!

— Pai, um Ômega pode muito bem viver sozinho! Posso cuidar do estaleiro, o senhor me ensinou bem!

— Não, não pode! Você viu o que William Rivers faria com você! Estará morto assim que eu deixar este mundo!

— Eu não vou casar! Pode trazer quantos Alfas quiser, direi não a todos eles.

— Ah, você vai… — Yejun baixou o tom de vez. — E já tem outra pessoa. 

— Do que está falando, pai?

— Bill, o dono da taberna perguntou por você esses dias. Ele também ficou interessado. Eu não considerei, mas-...

— O quê?!

— Mas agora, já que descartou Hyunsik e está disposto a fazer o mesmo com qualquer bom rapaz que eu traga aqui, talvez eu não deva perder meu tempo e posso trazer o Bill mesmo...

— Você está falando isso apenas para me assustar.

— Procure Hyunsik amanhã, e diga que mudou de ideia. 

— Eu não vou fazer isso. 

— Então você não me deixa escolha… Eu realmente não queria fazer isso, Francis, mas se for preciso eu responderei por você. É um Ômega. É o que diz a lei, você não pode fazer nada.

O mais novo ficou em silêncio por um momento, as lágrimas que se formaram em seus olhos falavam por si. O pai tentou se aproximar, mas ele recuou.

— Você não faz ideia do quanto está me magoando — o menino murmurou encarou o pai profundamente. As lágrimas continuaram descendo. — Ser um Ômega não faz de mim seu objeto, pai. Não pode decidir isso por mim.

— Sabe que pela lei eu posso. — Yejun respondeu com cuidado.

Francis sentiu uma dor forte no peito, mas a engoliu. 

— Que seja, então… se me obrigar a ter uma vida infeliz vai lhe deixar com a consciência tranquila, tenha uma boa noite.

— Espera… — o Ômega sequer olhou para trás, quando seu pai chamou mais uma vez: — Francis?!

Yejun fechou os olhos quando ouviu a porta do quarto do filho bater ferozmente. Ele sentou em uma cadeira próximo a janela, e encarou o oceano. Seu coração doía pelo que estava fazendo, mas temia seu filho sozinho em um mundo tão avassalador.

Desse modo, ele imaginou que quando ficasse mais velho, o jovem Ômega entenderia seus motivos.

Contudo, na manhã seguinte, assim que se levantou para dar início a um novo dia de trabalho, o Alfa encontrou um pedaço de pergaminho em cima da mesa, com a letra de seu filho:

“Uma vez que me ensinou a voar, não vou permitir que corte as minhas asas. Eu te amo muito, pai. Espero que um dia possa me perdoar.”

Yejun segurou o bilhete com força, o papel foi amassado instantaneamente em sua palma. Não sentiu raiva. Na verdade, havia um pouco de arrependimento. Ele conhecia bem o filho que tinha, Francis nunca aceitaria se casar e levar uma vida planejada pelos outros. Era independente demais.

Pode-se dizer que, naquele instante, o Alfa estranhamente sentiu uma dose de alívio e orgulho percorrer o seu interior. Com lágrimas nos olhos, ele caminhou até a janela.

— Voe, Francis. — Yejun sussurrou encarando o oceano. — Voe alto!

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Na noite em que havia discutido com seu pai, dor, revolta e fúria enchiam o coração do Ômega. Não era do tipo que se entregava sem lutar, mas nada podia fazer contra a vontade de seu pai.

— Sociedade estúpida! — Ele tentou atirar um livro na parede, mas acabou passando direto pela janela. — Porcaria! 

Francis se debruçou na abertura e procurou pelo objeto no escuro. O livro havia caído um pouco distante, ele então pulou a janela e caminhou até recolhê-lo. 

Haviam algumas embarcações ancoradas, entre elas, o Ranger, navio capitaneado pelo afamado Capitão Benjamin Hornigold. Por um momento, passou em sua mente que poderia se juntar aquela tripulação, mas o brilho da ideia se desfez ao lembrar-se do código mais estúpido em que já ouvira falar sobre a pirataria:

“Ômegas não são permitidos a bordo. Quem embarcar pessoas disfarçadas é punido com a morte.”

Descartou a possibilidade enquanto voltava para seu quarto, mas quando apoiou as mãos no batente da janela, percebeu que havia sujado suas palmas com algo de cheiro forte. Alcatrão.

— Que ódio! — O Ômega lamentou, passando as palmas na parede. O cheiro forte adentrando suas narinas acenderam uma luz em sua mente outra vez. — Ômegas não são permitidos a bordo. Mas ninguém precisa saber…

Era uma ideia um tanto estúpida, mas ficar em Nabuco e se casar com Bill, o Alfa mais escroto de toda a Ilha seria uma opção muito pior. Até a morte era mais bem vinda.

Com o plano de se disfarçar de Alfa em mente, Francis entrou em seu quarto novamente, pegou algumas roupas e poucas moedas que talvez fosse precisar, e escreveu o bilhete para seu pai, deixando-o em cima da mesa. Ele deu uma última olhada no velho Alfa que havia adormecido no sofá.

Em seguida, ele recolheu dois frascos cheios de óleo de baleia e passou um pouco em sua pele. O cheiro era terrível, mas serviria para esconder seu aroma doce de chocolate. Ele pulou a janela outra vez e rumou na direção do centro da Ilha, em busca de Benjamin Hornigold em alguma taberna.

— Sua fama diz que ele é rico… — o Ômega caminhava enquanto murmurava consigo mesmo. — Mas se ele ancorou tão exposto, significa que não tem nada que possam roubar, logo ele não tem muito o que gastar… 

Francis parou de caminhar e olhou à sua volta, em busca da taverna menos luxuosa. Porém, antes de entrar, ele ponderou um pouco mais:

— Não. Benjamin Hornigold é um capitão famoso. Quando estão na falência, Alfas sobrevivem de blefe… — Ele girou, olhando na direção da taverna mais movimentada. — E quem não gostaria de pagar uma bebida para um capitão com boa fama?

Com isso, o Ômega rumou até a taberna escolhida. Assim que entrou no estabelecimento, lá estava o bendito capitão. Tomando rum alegremente, com dois Ômegas sentados ao seu lado. 

— Mais uma, por conta da casa, Capitão! — O Beta dono da taberna ofereceu.

— Eu gostaria de pagar, mas já que você insiste...— Hornigold aceitou, sorrindo convencido. — Se for assim, vai ter que servir minha tripulação também!

Todo mundo queria sentar na mesa com Hornigold, o Alfa era uma lenda. Famoso, forte e bem sucedido. Além de ser extremamente simpático.

Francis tentou chegar o mais próximo possível daquele Alfa, para ouvir a conversa. Ele acabou se sentando em uma mesa com alguns piratas desprezíveis, mas por sorte, eles estavam bêbados demais para notar o pequeno sentado ali.

— O que vai querer? — Uma Ômega perguntou a ele.

— Traga-me um pouco de rum.

A Ômega assentiu e se retirou.

— Yo! — O pirata que estava ao lado ergueu uma caneca. Com o movimento, um pouco da bebida caiu em cima do Ômega. 

Enquanto se limpava, ele ouviu quando uma outra pirata levantou um questionamento que chamou sua atenção. A mesma perguntou quando seria o próximo saque do Capitão Benjamin. Francis forçou a audição para conseguir ouvir a resposta, já que Alfas e Betas bêbados faziam barulho em toda a taberna.

— Em breve! — Hornigold respondeu. — Há um grande carregamento de ouro japonês que eu pretendo saquear.

— Aqui está. — A Ômega serviu Francis.

— Obrigado. — Ele sorriu, a moça recolheu o pagamento e se retirou.

— Em breve, quando? — Um Beta inquiriu. — Está nos dizendo isso há muito tempo, Capitão. Onde está o ouro japonês que nos prometeu?

— Acontece que eu preciso de mais Alfas e Betas. É muito ouro, é claro que está bem protegido! — Hornigold gargalhou. 

“Muito ouro”. Duas palavras que encheram os olhos dos muitos ambiciosos que se encontravam naquela taberna.

— Me aceite em sua tripulação! 

— Eu também quero, Hornigold! 

Uma chuva de Alfas e Betas avançaram na mesa em que o capitão estava. Todos tentando garantir um espaço em seu navio, para receber uma parte do referido tesouro. 

Francis tentou fazer o mesmo, mas a aglomeração era violenta e parecia como um enorme muro entre ele e Benjamin. Recebeu uma cotovelada e caiu no chão, mas não iria desistir. Ele se abaixou e engatinhou por entre as pernas daqueles Alfas, até chegar do outro lado, bem na frente do famoso Capitão. 

— Aceite-me na sua tripulação! — O Ômega tentou soar firme.

— E você quem é? — O Alfa riu, encarando-o dos pés à cabeça. — Quantos anos tem? 

— Farei dezesseis em breve. Mas sou muito habilidoso no conserto de navios.

— Desculpe, garoto. Não aceito Ômegas em minha tripulação.

— Mas eu não sou um Ômega! 

Hornigold franziu o cenho, se concentrando no olfato para identificar se era verdade. O cheiro forte de óleo o impediu de sentir o verdadeiro aroma de Francis.

— Você é muito pequeno para um Alfa da sua idade. Tenho alguns grumetes na minha tripulação que são mais altos que você.

— Se o senhor busca por altura, pode recrutar os coqueiros da ilha. Como disse, sou habilidoso consertando navios. 

— Mas como é malcriado esse grumete da língua ferina. — Hornigold riu divertido. Ele deu de ombros. — Tudo bem. Quanto mais Alfas melhor.

Francis suspirou aliviado, sua fuga para longe daquela ilha e do casamento com Bill estavam garantidos. Agora, só precisava continuar fingindo ser um Alfa até ancorar em um outro lugar, e enfim poder recomeçar sua vida.

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Assim que os suprimentos para uma nova temporada no mar foram armazenados, todos os novos e velhos tripulantes embarcaram e o Ranger finalmente zarpou do Porto de Nabuco, pouco antes do amanhecer. Francis observou o estaleiro se distanciar, à medida que o navio avançava na direção do oceano.

Sabia que iria sentir muita falta do seu pai, e talvez ele não o perdoasse nunca mais. Mas não podia aceitar aquele destino para si. Era hediondo.

— E ai, novato? — Ouviu a voz de um Alfa e olhou para trás.

Dois garotos que aparentavam ter sua idade estavam se aproximando. Um tinha o cabelo preto e era um pouco mais alto, já o outro possuía o cabelo da cor de cobre e era um pouco mais gordo.

— Eu sou Edward Teach e este é meu irmão, Fenn.

— Eu posso me apresentar! — O ruivo rugiu. 

— Vai mesmo fazer uma cena na frente do novato?

— Por que você sempre faz isso?! 

— O quê? — Edward suspirou irritado.

— Foda-se! — Fenn girou, deixando-os sozinhos na popa.

— Por favor, ignore. — Edward sentou perto do Ômega. — O que ele tem de grande, tem de infantil. 

— Estou vendo.

— A propósito, você é o…? — O Alfa ofereceu a mão.

— Francis Bonny. — Ele aceitou e apertou a mão do outro, mas franziu as sobrancelhas quando Edward não o soltou. 

— Que fato curioso… — os olhos de Edward encaravam os de Francis profundamente. 

O Ômega tentou puxar sua mão, mas o Alfa segurou com mais força.

— O que está fazendo?! Solte a minha mão!

— Como conseguiu?

— Do que está falando?

— Ômegas não são permitidos a bordo.

— Eu não sou um Ômega. 

— E eu sou uma sereia. Confia... — Edward riu sozinho. — Você pode enganar a todos aqui, mas não um lúpus. Sinto seu aroma de longe. Tenha certeza de uma coisa, senhor Alfa, chocolate é uma delícia.

O coração do Ômega acelerou, e ele sentiu algo gelado percorrer seu corpo. Edward sentiu a palma dele tornar-se úmida.

— Se quiser que eu solte a sua mão, tudo bem. Mas no momento em que fizer isso, eu vou contar ao Capitão que temos um Ômega aqui.

— O que você quer? 

— Eu só exijo uma coisa... — Edward se aproximou um pouco mais. Francis virou o rosto quando o Alfa inalou seu aroma mais de perto. — Não quero passar meus ruts sozinho.

— Como é!?

— Você é da minha idade, então já deve ter seu heat. Vai precisar de mim também. Veja isso como uma troca de favores. 

— Não vou fazer isso.

— Então você prefere morrer? Está em um navio pirata, sua morte não será tão rápida. Principalmente porque você enganou o capitão. — O Ômega encarou o oceano, pensativo. — O que foi? Você é virgem? Não se preocupe, eu posso ser carinhoso na sua primeira vez.

— Você é extremamente nojento.

— Resposta errada, Francis Bonny. Meu próximo rut vai ser em duas semanas, vou te dar um tempo para pensar, mas é bom que não demore porque se eu me irritar, talvez não seja tão carinhoso.

— Vai me oferecer ao seu irmão também? Seu porco.

— Não. — Edward sorriu, soltando a mão dele. — O Fenn não é lúpus, e eu não gosto de dividir as minhas coisas.

Com isso, o Alfa se retirou deixando-o sozinho e pensativo. Estava perdido. Deveria ter adivinhado que teria um maldito Alfa lúpus a bordo. Mas de maneira alguma iria se sujeitar às chantagens daquele miserável. Francis tinha duas semanas para encontrar uma forma de se livrar de Edward Teach. 

Durante os próximos dias, ele passou a observar o comportamento e decisões do capitão. Benjamin Hornigold parecia um morcego cego navegando pelos mares, em busca do tal galeão japonês e seu tesouro colossal.

Pelo que ouviu nas conversas entre o capitão, o contramestre e o navegador, aquele itinerário estava certo. Eles apenas não sabiam dizer, o dia exato em que o navio carregado com o tesouro iria passar por aquela rota, ou se já haviam passado, o que era mais provável.

Logo após a primeira semana, Francis se encontrava sentado no parapeito, ao lado do timoneiro. O Beta lhe contava algumas histórias sobre as aventuras que tivera ao lado de Hornigold, o menino ouvia atentamente.

— Se as vigas de madeira deste navio falassem… — o Beta gargalhou. — Aliás, já naufragamos tantas vezes que nenhuma parte deste navio deve pertencer a armação original.

Um brilho repentino cintilou na mente do Ômega. Ele desceu do convés superior com um único salto, e correu até a cabine do Capitão. 

Assim que o contramestre saiu, a sua entrada foi permitida. Ele encontrou Hornigold sentado de frente a mesa, bebendo tequila enquanto examinava os mapas.

— Está se dando bem com a tripulação, grumete? 

— Sim, senhor. Hm… — Francis examinou os mapas. — Quanto, ao tesouro…

— Se veio para me cobrar é melhor parar por aqui mesmo — o Alfa ergueu a mão. — Prometi ao meu contramestre que o próximo que viesse me perguntar sobre isso, eu atiraria para fora do navio. Você ainda é muito jovem para morrer, então tenha cuidado com o que vai perguntar.

— Na verdade, senhor, tenho uma observação a fazer.

Hornigold encarou o menino. Aquela era apenas a segunda vez que conversava com ele, mas gostava de fazê-lo. O garoto tinha um ar inteligente, e o melhor de tudo, suas respostas sinceras lhe eram divertidas. 

— Pois não? Faça sua observação, estou ouvindo.

— Acredito que o galeão japonês tenha naufragado. 

O Alfa arregalou os olhos.

— Eles desconfiam que esteja mentindo, mas o senhor fala com tanta convicção sobre esse tesouro que me convenceu. — O Ômega continuou. — É comum que naufrágios aconteçam por essa região? Não estou muito familiarizado com viagens marítimas.

— Eh… Eu… Sim… Deixe-me ver — Benjamin removeu alguns objetos que estavam em cima do mapa. — Estamos aqui — ele indicou um lugar. — E aqui se encontra o Triângulo da Morte.

— Já ouvi falar.

— É possível que naufrágios aconteçam sim, mas é raro longe do Triângulo. — O Alfa explicou enquanto o menino puxava o mapa para si, e tomava uma bússola que também estava em cima da mesa. — Ei, o que está fazendo?

— Pensando… — Francis respondeu, sem tirar a atenção do objeto. Benjamin ficou em silêncio, enquanto o Ômega murmurava baixinho consigo mesmo: — Estamos seguindo nessa direção, hm, certo. Isso significa que o vento está soprando pra lá…   

Francis apontou numa direção, ainda mantendo a atenção no mapa. Hornigold olhou no sentido em que o dedo do garoto apontava, depois voltou a olhar o mapa quando Francis guiou seu dedo para lá novamente, seguindo em linha pelo mar no pedaço de papel. 

— Estamos na rota do tesouro, se o galeão naufragou… — O Ômega continuou. — Seus destroços foram levados até aqui. — Ele parou com o dedo exatamente em uma ilha pequena, e ergueu o rosto para encarar o Alfa. — O que o senhor acha?

Mas Benjamin Hornigold não tinha o que falar. Sua expressão estupefata confundiu o Ômega, e Francis estava se perguntando se ele havia passado pouco óleo sobre sua pele, e o capitão acabou descobrindo o seu segredo.

— Capitão Hornigold? — Engoliu em seco.

— Você… — Francis largou a bússola na mesa e regressou os passos conforme o Alfa avançava devagar em sua direção. — Qual é o seu nome mesmo?

— Francis Bonny.

— Francis Bonny… — O Alfa repetiu quando parou de andar. — Você é a minha galinha dos ovos de ouro!

— Quê? — O menino franziu o cenho. 

— Onde está dormindo atualmente? 

— No porão. Não há mais espaço nos dormitórios.

— A partir de hoje você ficará em minha cabine. Não se preocupe, farei com que meus Alfas tragam uma cama confortável pra você. — Francis ficou parado observando o capitão seguir até as estantes. — Vamos virar essas duas pra cá, e então você pode dormir nesse canto aqui.

— Senhor, foi apenas uma observação. Tem certeza disso? Não estou reclamando, mas…

— Você não tem ideia da enorme dor de cabeça que esse tesouro vem me causando… Essa foi a observação mais inteligente que alguém já fez em relação a este maldito. 

— E se eu estiver errado?

— Você e seu cérebro astuto continuarão comigo nesta cabine. — Hornigold sentenciou. — Agora vá buscar suas coisas.

O Ômega deu de ombros e desceu até o porão. Estava rezando para que o tesouro estivesse naquela ilha, dessa forma, conseguiria moedas suficientes para começar uma nova vida em outro lugar, além de nunca mais ter que olhar na cara de Edward Teach novamente.

A tripulação levou apenas um dia para chegar na ilha em questão. Ela era pequena e inóspita, possuía alguns rochedos enormes que formavam um precipício à beira do mar. De longe era possível enxergar apenas parte do galeão destruído. Mas conforme os botes que desceram do Ranger se aproximavam do lugar, o brilho do outro espalhado por baixo da água rasa da margem cintilavam nos olhos dos piratas.

Logo, toda a tripulação estava desembarcando na praia. Os destroços do navio estavam espalhados por todos os lados, assim como baús quebrados exibindo muitas moedas de ouro ainda dentro. Também haviam moedas dentro da água, e os piratas levaram alguns dias até conseguirem remover todo o outro daquele local. 

Com o tempo que havia se passado, também se foi junto o prazo dado por Edward Teach. O Alfa já estava começando a perceber os sinais de seu rut, quando todos embarcaram no Ranger novamente. 

— Já tomou sua decisão? — Ele puxou o Ômega para seu quarto, enquanto o mesmo passava pelo corredor. — Estou pegando fogo!

— Pois entre em combustão e queime sozinho! — Francis soltou o braço e rumou para fora. 

Edward o puxou novamente e fechou a porta, o empurrando contra a madeira. Seus olhos estavam vermelhos.

— Caiu nas graças do velho Hornigold, agora tá se achando o tampa, não é?! Deixa ele saber que você não passa de um Ômega!

— Tire suas mãos imundas de mim! — Ele exigiu quando Edward o abraçou fortemente. — Pare!

O Alfa ignorou tentando beijá-lo. Quando passou a língua contra os lábios do Ômega, Edward o largou no momento em que sentiu uma aguda e forte dor quando foi mordido. Sangue fluía de sua boca através do ferimento. Quando deu por si, tomou um chute no abdômen e perdeu o equilíbrio, caindo para trás.

Francis abriu a porta e saiu correndo, na direção do convés. Mas não havia para onde fugir, a não ser que ele pulasse no mar. 

Pouco depois, Edward apareceu no convés, com sua boca, suas mãos e roupa sujos de sangue. Seus olhos ainda permaneceram da mesma cor enquanto procurava pelo outro. 

— Há um Ômega a bordo do navio! — Ele rugiu para que todos ouvissem. 

— Do que ele está falando? — Os piratas se aproximaram.

— Ele acabou de me agredir no dormitório porque descobri seu segredo sujo — Edward contou, exibindo o sangue. — É o preferido do capitão! Francis Bonny!

Benjamin estava na porta, prestes a perguntar o que era toda aquela gritaria. O contramestre surgiu trazendo consigo o Ômega pelo braço. Ele o empurrou e Francis caiu no chão, diante da tripulação.

— Não pode ser… — Benjamin murmurou.

— Ah, não? Pois então veja isso, Capitão… — Edward agarrou um balde com água e jogou em cima de Francis.

A espuma juntamente com a água removeu boa parte do óleo, e o cheio de chocolate finalmente foi sentido pelos demais marujos. Era doce e intenso. Não restava dúvidas, aquele menino todo encharcado e encolhido no pavimento, era um Ômega.

— Como permitiu que ele subisse a bordo, Capitão?! — As acusações iniciaram.

— O miserável enganou a todos nós!

— E se eles estiverem juntos?

— É um complô para nos roubar!

— Quietos! — O Capitão rosnou. 

— O que devemos fazer? 

— Amarrem ele no mastro — Hornigold decidiu. — Preciso pensar um pouco a respeito…

— Pensar?! Não tem o que pensar! 

— Façam o que mandei! — Benjamin bateu a porta quando se trancou na cabine.

Os Alfas pegaram cordas e obedeceram o Capitão, deixando o Ômega preso no mastro da proa.

— Vou pedir ao capitão pra deixar a gente se divertir com ele um pouco — um pirata lambeu os próprios lábios. 

— Eu vou ser o primeiro. — Um outro se aproximou.

— Sai daqui, seu porra! A ideia foi minha!

Uma briga se formou no convés, e Francis os encarava com espanto conforme eles disputavam sobre quem o tocaria primeiro, rosnando ameaças e contando o que faria com o menino. 

Aqueles Alfas eram terrivelmente violentos, sujos e tenebrosos. Alguma coisa precisava ser feita. Seu raciocínio foi interrompido quando Edward Teach parou diante dele.

— Você poderia simplesmente ter feito o que mandei. Tenho certeza que iria gostar, mas agora, olha pra isso… — Ele exibiu os Alfas e Betas se agarrando no chão, brigando feito cachorros no cio. — Eu não gostaria de estar na sua pele agora. 

— Nem eu. — Fenn riu. 

— Talvez o Capitão me deixe usar você primeiro, já que fui eu quem o denunciou. 

— Eu também quero! — O irmão dele solicitou. — Você fica uma hora com ele, depois é minha vez.

— Estou em meu rut, animal! Preciso dele comigo durante todos esses dias. — Edward respirou fundo, controlando-se para não tocar no Ômega. — Ali está, lá vem o Capitão.

Assim que Hornigold abriu a porta, os piratas cessaram a briga e ficaram de pé, esperando o líder se aproximar para enfim dizer seu veredito.

— Ninguém toca nele. — O Capitão decidiu, para o choque da tripulação. 

— O senhor enlouqueceu?!

— Parece que teremos de fazer uma votação e trocar de capitão...

— Vocês já viram como é que tá a porra do porão? — Hornigold perguntou. — Aqueles baús cheios de ouro só estão conosco porque este Ômega nos levou até o local exato. Querem matá-lo? Tudo bem, afinal vocês são a maioria. Mas estejam certos de que estarão jogando fora, as chances de obtermos sucesso em nossas próximas investidas. 

— Está superestimando ele. — O Contramestre argumentou.

— Não, eu não estou. — Benjamin se aproximou e cortou as cordas que mantinham o Ômega preso. — Acreditem em mim, esse garoto é um gênio. 

— Capitão! — Edward se aproximou ofegante. — Já que eu descobri a verdade, permita que ele passe o meu rut comigo.

— Eu sinto muito, Ed — Hornigold encarou o jovem Alfa com o olhar cheio de pena. — Não vou danificar a minha galinha dos ovos de ouro.

— Mas-...

— Sei que é um lúpus e seu rut é mais intenso. Mas essa é a minha decisão final. — O Capitão acenou para que Francis o acompanhasse. — Tente encontrar alguma coisa no porão e se satisfaça sozinho. Você é forte, sei que ficará bem.

Edward Teach podia sentir suas veias saltarem devido a fúria que ferozmente circulava pelo seu corpo. Ele viu quando o Ômega olhou para trás e sorriu, mostrando o dedo do meio.

— Maldito Hornigold! 

— Calma, Ed — Fenn tocou em seu ombro. —  Esse miserável tá com os dias contados.

— Se você falar um pouco mais alto ninguém vai ouvir, seu idiota! — Edward rosnou com sarcasmo. 

O Alfa lúpus rugiu com ira, devido aos olhares de pena que os piratas lhe dirigiam. Ele esbarrou contra alguns bucaneiros que estavam em seu caminho e desceu até o porão, onde passaria o restante de seus dias de rut em agoniante isolamento.

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Conforme os dias se passavam, o jovem Francis ganhava ainda mais a admiração do Capitão Hornigold. Em contrapartida, a tripulação ainda não se sentia confortável com o fato de terem um Ômega a bordo. 

Para eles, a presença de Francis Bonny traria à tona maldições sobre a tripulação. Devido às superstições ignorantes, a maioria o desprezava e faziam questão de humilhá-lo sempre que tinha uma chance.

— Limpe o convés. — O contramestre exigiu. 

Francis não reclamou. Ele apenas assentiu, pegou um balde, uma escova e se colocou de joelhos, esfregando o chão engordurado do pavimento superior.

Quem passava por onde ele estava cuspia no chão ou batia a sola dos sapatos, para sujar ainda mais. Ele ignorava as ofensas pois mantinha em sua mente que, em breve, estaria livre e rico para viver sua vida. 

No entanto, à medida que acompanhava os piratas em saques e lutas empolgantes, o Ômega sentia-se mais vivo. Ganhou até mesmo uma longa espada do próprio capitão, no qual desenvolveu grandes habilidades treinando sozinho, ou nos próprios ataques feitos pela tripulação.

Após mais um saque bem sucedido os piratas estavam comemorando, bebendo na proa ao som da banda.

— Viva o Capitão Hornigold! — Alguém ergueu uma caneca com rum.

— Viva! — Todos responderam.

— Não, meus amigos — Benjamin negou balançando a cabeça. Ele passou o braço pelo ombro do único Ômega a bordo, e afirmou com um sorriso orgulhoso: — Um brinde a Francis Bonny. O sucesso dessa emboscada foi um plano dele, não se esqueçam disso.

— Parece que esse ratinho é um bendito de um cara muito esperto. — Um pirata riu. 

— Talvez ter um Ômega a bordo não seja tão agourento como dizem. — Outro afirmou.

— É a minha galinha de ovos de ouro!— Hornigold brindou. 

A tripulação parecia estar muito satisfeita com o rumo dos acontecimentos. Benjamin estava sorrindo contente com o aumento de sua riqueza. Os bons anos de abundância finalmente voltaram, depois de um longo período de decepções.  

O Capitão temia que, cedo ou tarde, um motim seria criado para expulsá-lo do comando. Como todos sabem, um líder só permanece no poder enquanto trás grandes conquistas à tripulação. Mas graças àquele Ômega, Benjamin conseguiu reconquistar a confiança dos bucaneiros.

Pelo menos era como Hornigold imaginava, mas por trás de tanta euforia dos piratas, havia alguns que se comportavam ligeiramente incomuns. Quando se voa muito alto, acredita-se que não há ninguém acima, mas eles estão lá, tentando derrubar a todo custo. 

Francis estava um pouco mais afastado, observando a comemoração dos piratas enquanto bebericava um pouco de rum. Ele via olhares, sorrisos e abraços. Analisava as expressões de cada pirata, e percebia que nem todos estavam sendo sinceros. 

Acreditando que se tratava devido a sua presença, ele resolveu anunciar ao capitão Hornigold sobre seu desejo de deixar a tripulação. Embora tivesse se apaixonado por aquela vida, não queria viver para sempre em um lugar onde seria diariamente odiado e humilhado. Foi justamente por isso que fugiu para não se casar.

— Capitão, eu gostaria de receber a minha parte dos saques. Pretendo desembarcar no próximo Porto.

— Por que? — O Alfa fechou o livro de registros e o encarou. — Alguém está ameaçando você?

— Não, senhor. 

— Pensei que estivesse gostando da pirataria. 

— E estou… Mas a tripulação nunca vai se acostumar com o fato de ter um Ômega a bordo. Essa situação me deixa desconfortável. Não me encaixo aqui.

— Escute, Francis. Não se trata de ser aceito ou se encaixar. Pirataria se trata de riqueza, do quanto você consegue saquear e acumular. Apenas isso. 

— Não considera importante o que sua tripulação acha?

— Sim. Mas se eles são contra minhas posições, eu permaneço firme no que acredito. E no momento eu acredito que você é muito bem vindo aqui.

— Ficou feliz em saber disso.

— Se você ainda quiser ir embora, eu entendo. Mas se aceitar um conselho de uma pessoa mais velha, eu acho que você não tem que fugir para sempre. Vamos encontrar dificuldades em todos os momentos da nossa vida, principalmente você por ser um Ômega. Mas se decidir ficar e lutar, você conseguirá um coração tão forte que ninguém conseguirá destruir. 

— Obrigado, Capitão. — O Ômega sorriu com os olhos marejados. As palavras de Hornigold haviam lhe tocado. — Não vou mais fugir. A partir de hoje, serei aquele que ficou, lutou e venceu.

— Muito bem. Seu pai ficaria orgulhoso. Há quanto tempo não o vê?

— Há pouco mais de um ano.

— Se sente saudade, pode voltar a Nabuco…

— Estou bem. Pertenço a uma tripulação agora. Tenho obrigações com meu Capitão.

Hornigold sorriu, assentindo. Ambos sobressaltaram quando a porta da cabine foi aberta abruptamente pelo contramestre.

— Marinha se aproximando pela proa!

— Preparam os canhões! — O Capitão ordenou, saindo da Cabine. O Ômega puxou a espada e o seguiu.

Uma embarcação da Marinha Real coreana se aproximava a toda velocidade na direção do Ranger. O galeão era menor, mas possuía um poder de fogo superior. O navio de Hornigold era grande em tamanho para conseguir armazenar uma maior quantidade de cargas.

— Eles estão se aproximando a mais de dez nós! — O atirador observou com uma luneta. 

— Timoneiro, vire a embarcação a estibordo! — O  capitão ordenou. — Preparem-se para a batalha!

— Aquele galeão tem pólvora suficiente para nos mandar pelos ares! — O contramestre avisou. — Temos de fugir!

— Podemos atacar diretamente em seu ponto fraco! — Francis opinou encarando o galeão de aproximar.

— E qual seria? Eles possuem praticamente o dobro de canhões a mais do que nós!

— Exatamente isso — o Ômega sorriu. — Seus canhões!

— O quê?! Esse menino enlouqueceu, Capitão.

— Vamos trombar! — Francis falou com o líder, sem dar atenção ao que o contramestre dizia. — Vire a proa contra a lateral do galeão. 

— Assim vamos ficar em pedaços. — Hornigold avaliou.

— E destruir os canhões deles. — o Ômega acrescentou. — Somos maiores, Capitão. Um arranhão no casco não derruba esse navio.

— Façam o que ele diz! — Benjamin ordenou. — Icem todas as velas! Velocidade máxima contra o galeão! 

Conforme os navios se aproximavam, entravam na mira um do outro. O galeão virou seus canhões para que ficassem apontados contra o Ranger, e sob as ordens do comandante, tiros foram disparados contra a embarcação pirata.

— Fomos pegos! 

— Os botes viraram estilhaços!

O galeão coreano permaneceu com seus disparos, criando buracos e destruindo a armação do navio pirata. O comandante imaginou que eles fariam uma curva para ficar lado a lado, e tentar usar seus canhões mais de perto. Mas o navio pirata continuou avançando de frente, contra a lateral da Marinha.

— Preparem-se para o impacto! — Hornigold bradou.

O comandante do galeão ao se deparar com o enorme navio vindo extremamente rápido em sua direção, tentou impedir a colisão ordenando aos seus oficiais que movessem o navio imediatamente. Mas não houve tempo para tal.

A proa do Ranger chocou-se contra os canhões laterais do galeão. O impacto afundou o casco do navio da Marinha, fazendo seus canhões serem retraídos em suas posições, tornando-os consequentemente inutilizáveis.

Os piratas invadiram o galeão, ao passo que o timoneiro da marinha tentava remover o navio, mas estavam presos e a água começou a invadir o interior da embarcação. 

Alguns marinheiros pularam no convés do Ranger, na tentativa de subjugá-los e tomar o navio. No meio da luta, Francis encontrou um Alfa que não via há muito tempo.

— Hyunsik! 

— Francis?! — Ele atirou contra um pirata e virou-se para o Ômega: — Por Deus, como o mundo é pequeno!

— Conseguiu se casar, finalmente? — O Ômega se defendeu de um ataque, investindo no mesmo instante contra outro inimigo.

Hyunsik riu, lembrando-se do motivo pelo qual viu o Ômega pela última vez, onde Yejun Bonny tentou uni-los em matrimônio. Não houve tempo para responder, os piratas retornaram para o Ranger e sendo maioria, os oficiais não tiveram outra escolha a não ser fugir.

Em meio ao alvoroço, Francis viu quando Edward Teach ergueu uma caixa com pólvora se preparando para lançar contra o Capitão Hornigold. Sem pensar duas vezes, o Ômega puxou sua pistola, mirou na caixa e disparou.

A caixa explodiu a milímetros da cabeça de Edward, e o jovem Alfa gritou, sentindo parte do rosto queimando e derretendo.

O barulho da explosão chamou a atenção de Hornigold. O Alfa olhou para trás e viu Edward gemendo com a mão no rosto, rugindo e amaldiçoando o mundo inteiro. 

— O galeão está afundando! — Um pirata avisou.

— Recuar! — Benjamin ordenou e as velas foram posicionadas de modo que o navio pirata se libertasse das entranhas do galeão.

A tripulação comemorou o triunfo em cima da Marinha. Hyunsik e outros que conseguiram escapar da morte, tentavam se salvar do naufrágio em botes, enquanto o Ranger se distanciava. 

O navio estava literalmente caindo aos pedaços, mas conseguiria navegar por pelo menos alguns dias.

— Cuidem dos feridos. — Hornigold ordenou.

Edward e mais outros bucaneiros que foram feridos gravemente durante a batalha, foram levados pelos companheiros até o médico na enfermaria.

— Para onde iremos, Capitão?

— Nabuco é a melhor opção! — Alguém opinou.

— Não. Nabuco é um ninho de cobras. — o Capitão afirmou. — Acerte o curso para Cabuga.

— Mas em Nabuco teremos mais recursos para consertar as avarias! — O contramestre tentou fazê-lo mudar de ideia.

Hornigold ponderou. O contramestre não estava completamente errado, mas Benjamin precisava de uma opinião que, ao seu ver, era a mais confiável. 

— O que você acha, Francis? 

— O quê!? — o Contramestre se colocou diante do Capitão. A tripulação assistia em silêncio. — Você considera o que essa coisinha fala mais importante do que eu, o seu braço direito?!

— Eu só pedi a opinião dele. Calma, Cirilo. Não precisa se descontrolar. 

O contramestre rosnou, encarando o Ômega, assim como os outros Alfas e Betas que esperavam pela resposta dele. 

— Concordo com Cirilo que Nabuco possui mais recursos — Francis iniciou. — Contudo, nas condições do navio-...

— Lá vem bosta! — O Contramestre interrompeu. 

— Deixe ele continuar. — Hornigold solicitou.

— Nas condições do navio, a Marinha vai terminar o serviço antes mesmo de chegarmos no Porto. Cabuga pode ter menos recursos, mas é uma ilha pirata. Estaremos mais seguros lá.

— Está decidido. — O Capitão deliberou com sua voz de Alfa, para não deixar dúvidas de que ainda estava no comando. — Quem estiver achando ruim, pegue um dos botes que restou e desembarque agora mesmo.

Os piratas trocaram olhares, alguns concordando, outros nem tanto. Mesmo que o Ômega tivesse um ponto, pelo menos metade da tripulação acreditava que Benjamin Hornigold já não era o mesmo. O Alfa não dava um passo sem a devida orientação de Francis Bonny. 

Com a tripulação dividida, a vontade do Capitão se sobressaiu. As velas do Ranger foram içadas e o navio levado até a Ilha de Cabuga, para reparos.

A viagem de quatro dias foi mais longa do que o esperado. O clima entre os piratas não era dos melhores. Edward Teach mantinha um curativo em seu olho esquerdo, e estava mais fechado do que o habitual. Conversava apenas pelos cantos entre os seus, o que deixou Francis desconfiado. 

Hornigold manteve-se em sua cabine a maior parte do tempo. Não queria encarar sua tripulação. Esperava que assim que chegasse em Cabuga, o conserto do Ranger elevasse a confiança dos piratas em si.

— Capitão, eu não quero me precipitar fazendo acusações… — Francis comentou baixinho, enquanto os piratas se preparavam para ancorar. — Mas eu acho que-...

— Então não faça. — Hornigold o encarou com um semblante sério. — Eu aprecio a sua opinião quando estou interessado. Agora não é o momento.

— Eu vi quando Edward Teach tentou lançar um barril de pólvora no senhor. — O Ômega ignorou. 

— Você deve ter visto errado, eu conheço aquele garoto há mais tempo que você. Acolhi ele e o irmão quando se tornaram órfãos. Os dois são extremamente gratos por isso. 

— Tudo pronto, Capitão. — Cirilo avisou.

Benjamin e Francis disfarçaram, seguindo cada um para um lado diferente. O contramestre os observou por um tempo, em seguida levou alguns bucaneiros consigo para o esteiro da ilha.

Conforme as semanas se passavam, Hornigold não observava nada de estranho se passando ao seu redor, estava mais preocupado com o conserto da proa e as avarias causadas pelos canhões do galeão. 

Mas um grupo de piratas liderados por Cirilo tinham a intenção de tomar o posto do Capitão, já que uma votação não seria suficiente pelo fato de a tripulação estar dividida. 

No dia em que os consertos do Ranger finalmente chegaram ao fim, a tripulação solicitou a permissão de Hornigolg para comemorar. O Capitão autorizou, é claro, ele mesmo queria estar entre os festejos. 

A banda tocava no convés e os bucaneiros tomavam rum despreocupadamente, quando as luzes foram subitamente apagadas. A escuridão se espalhou pelo navio, Benjamin questionou sobre o que estava acontecendo, mas quem estava com ele não saberia responder, e os que saberiam, obviamente não iriam se manifestar.

— O que está acontecendo? — O Capitão se levantou. — Acedam as luzes imediatamente!

O barulho agoniante de uma Alfa engasgando com o próprio sangue alarmou os bucaneiros. Ela caiu no chão com a mão na garganta, tentando conter a perda de sangue. Mas faleceu segundos depois.

Ouviram-se lâminas sendo desembainhadas, e segundos depois um grupo de piratas atacaram o Capitão Hornigold. Quem ainda era fiel a ele, puxaram suas armas e se juntaram a ele em sua defesa.

Cirilo avançou contra o Benjamin, e ambos entraram na cabine onde a luta continuou. Francis viu quando seu Capitão havia sido encurralado e correu para ajudá-lo, mas os irmãos Edward e Fenn se colocaram em seu caminho.

— Você escolheu o lado errado, Ômega. — Edward comentou e seu irmão sorriu apoiando. — E vai se arrepender por ter me feito isto!

O Alfa puxou os curativos de seu rosto, exibindo que não havia nada ali além de uma pele derretida, cobrindo o que um dia foi seu olho. A queimadura se estendia até mais da metade da face, e deixava a bochecha um pouco recaída.

Edward e Fenn atacaram Francis covardemente ao mesmo tempo. Mas o Ômega agarrou um cabo e o cortou, sento instantaneamente puxado para cima. Ele se equilibrou na trave que suportava uma das velas, puxou a pistola e disparou contra eles.

Os irmãos correram para se proteger, trocando disparos com ele. 

— Suba até ele! — O mais velho rosnou. 

— Você não manda em mim, Edward! — Fenn atirou outra vez, mas foi surpreendido por um Beta que o atacou na retaguarda, por pouco ele não conseguia se defender.

O próprio Alfa lúpus decidiu subir atrás dele. Ele cortou um outro cabo e fez o mesmo que o Ômega, equilibrando-se do outro lado da viga em que Francis estava.

— Lute de espada comigo — Edward pediu. Francis estava com a pistola apontada na direção dele. — Prove que você vale o tanto que Hornigold acha. 

— Não preciso provar nada a você. 

Edward rosnou soltando o cabo que ainda segurava. Francis apertou o gatilho mas não acertou o Alfa. O tecido da vela solta o cobriu, impedindo-o de enxergar. Mas ele ouviu os passos de Teach vindo em sua direção, ergueu a espada cortando o tecido e ao mesmo tempo, evitando que a lâmina do Alfa chegasse em seu peito.

Ambos lutavam com suas espadas, ao passo que tentavam se equilibrar na mais alta trave que segurava as velas presas aos mastros. Edward rugia a cada golpe defendido por Francis, e seu único olho estava vermelho e cheio de fúria. 

O Alfa bradou a espada, cada vez mais empurrando o menor para a extremidade da trave. Ele ergueu o braço e lançou a arma, na tentativa de pôr um fim àquela luta, quando o Ômega segurou no apoio de cima e pulou por cima de Edward. 

Quando o Alfa girou o corpo para confrontá-lo novamente, foi recebido por uma espada que perfurou seu abdômen. Francis o chutou e o corpo dele foi lançado para trás. De cima, ele viu quando Edward caiu no mar. Ele ainda olhou na direção da cabine quando ouviu um disparo, e então desceu, indo ao auxílio de seu Capitão.

Assim que chegou na porta, ele encontrou o corpo de Hornigold no chão, enquanto Cirilo se preparava para desferir o golpe final. Quando notou que o Ômega estava na cabine, o contramestre virou-se contra ele para se defender.

Francis sacou a pistola mas foi surpreendido quando o Alfa agarrou seu pulso e lançou seu corpo contra o dele. O Ômega caiu de costas na mesa, com o outro logo acima. 

A mão que segurava a pistola estava presa contra a mesa, enquanto a outra segurava o pulso do Alfa, impedindo-o de perfurar seu olho. A lâmina descia à medida que ele não conseguia conter a força de Cirilo, mas um chute no meio das pernas do Alfa o desestabilizou completamente. 

Cirilo cambaleou para trás e caiu de vez, quando finalmente o Ômega acertou o centro de seus olhos com um disparo da pistola. Francis correu até Hornigold e caiu de joelhos ao seu lado. O Capitão cuspia sangue conforme respirava com dificuldade.

— F-Francis…

— Não fale nada! Eu vou chamar o médico! — Ele tentou se levantar, mas Benjamin segurou no tecido de sua roupa, fazendo-o voltar. — Capitão?!

— Não há nada que possa ser feito — o Alfa tossiu. — Este é o meu fim.

— Não diga isso! — Os olhos de Francis encheram-se de lágrimas.

— Escute, Francis, não temos muito tempo. — Ele tossiu novamente, dessa vez respirando com mais debilidade. — Me perdoe, eu não ouvi você quando tentou me advertir.

— Poupe suas forças.

— Seja forte. Seja grande. Faça o mundo conhecer a força de um Ômega.

De repente, a mão que segurava o tecido da roupa dele perdeu a força. Lágrimas desceram pelas bochechas do mais novo, e ele apoiou o rosto no peito de Benjamin. 

Mas não havia tempo para lamentações, Francis ouviu passos se aproximando através da porta e imediatamente puxou sua pistola, olhando para trás com seus olhos prateados e cobertos por lágrimas. Ele disparou à medida que se levantava, derrubando o Beta que mal tinha avançado dois passos para dentro da cabine.

Com uma pistola em uma mão e a espada na outra, o Ômega avançou contra aqueles que traíram seu Capitão. Obtendo apoio de outros que ainda eram fiéis a Hornigold. Seu coração ardia de raiva e tristeza. O cheiro do sangue escorrendo pelo convés, era menos fétido que a traição que presenciou.

Seu rosto, cabelo e roupas estavam sujos de sangue e suor, quando o último dos traidores perdeu sua vida sob a mira da pistola dele. Francis caminhou até a popa da embarcação e encarou o oceano sozinho.

Os piratas que restaram, juntavam os cadáveres enquanto discutiam sobre o que seria feito. Devido ao motim, Capitão e contramestre foram mortos, logo não havia nenhum outro que pudesse assumir a liderança naquele instante.

— Vamos pra outro lugar — Um Alfa chamado Abel ponderou. — Quando as outras tripulações souberem do motim, vão querer tomar o Ranger para si.

— Mas e os mortos? Eles eram camaradas decentes…

— Jogaremos seus corpos no mar. — Todos ergueram o rosto quando ouviram a voz do Ômega, e viram ele se aproximando. — Abel tem razão, é hora de partir.

Os piratas assentiram e colocaram-se a limpar os vestígios da sangrenta luta. Outros içaram a âncora e soltaram as velas. Em poucos minutos o Ranger estava navegando novamente, rumo ao oceano.

Após os corpos dos bucaneiros amigos serem lançados ao mar, Francis estava na cabine organizando a bagunça deixada pela batalha, enquanto pensava em Benjamin e nos ensinamentos que o Alfa lhe deixou, assim como em suas últimas palavras. Ele abriu o diário de bordo sobre a mesa, registrando tudo o que havia acontecido a Hornigold, quando a porta foi aberta e Abel entrou, junto ao timoneiro.

— Hm… Oi — o Alfa parou próximo a mesa, o Beta ficou um pouco mais atrás. — Então… eu estava verificando o porão, Hornigold gastou bastante com os consertos e comemorações. 

— A tripulação já decidiu o que será feito? — O Ômega guardou o diário. 

— Não… — Abel fez uma pausa, olhando para o timoneiro. Depois voltou a encarar o Ômega. — Estamos esperando você decidir. 

Francis piscou com uma expressão confusa desenhando seu rosto.

— Por que eu? — Ele de fato jamais havia cogitado ficar no lugar do Capitão.

— Nós conversamos no convés e concordamos que se o Hornigold confiava em você, é porque devemos fazer o mesmo.

— Estão desesperados por um líder e com medo de serem os próximos a serem traídos. — Francis cruzou os braços, encostando na mesa. — O Ômega aqui seria a melhor opção para o teste, estou errado?

Abel olhou para trás novamente, mas o Beta desviou o olhar. Com isso, ele voltou a encarar o Ômega. 

— Não… Claro que não.

— Vai ter que se esforçar mais se quiser me enganar, Abel. — Francis lhe encarou profundamente, deixando o Alfa desconcertado.

— Está bem, ninguém decidiu nada além do Jihoo e eu. — Abel confessou. — Você é o mais novo e mais inexperiente de todos nós. Vai ser fácil descobrir se alguém aqui ainda está tramando alguma coisa se você for o próximo Capitão. 

— E para descobrir isso vocês querem me jogar como sacrifício? 

— Não leve para o lado pessoal.

— Você deve ter testículos no lugar do cérebro.

O Beta riu. Abel rosnou, e o timoneiro voltou a ficar sério novamente.

— É mesmo, Ômega dotado de toda inteligência? — Francis suspirou, sorrindo. O Alfa se aproximou um pouco mais, até ficar a meros centímetros de distância. — Diga-me, então, o que pretende fazer?

— Aceitar sua proposta. 

— Como é?! Você acabou de falar que preciso de muito para te enganar, e agora está simplesmente aceitando de bom grado?

— Não confunda as coisas. Estou aceitando por que eu quero, não porque faz parte dos seus planos. — O Ômega ficou de pé, Abel regressou alguns passos para lhe dar espaço. — Vamos ver o que eles acham disso. 

Após o motim, a tripulação com cerca de cem Alfas e Betas caiu para pelo menos metade disso. Os que não morreram, fugiram com medo do mesmo fim.

Os piratas se encontravam reunidos no convés, formando um grande círculo. Abel indicou Francis para novo capitão do Ranger e Jihoo o apoiou. Contudo, a maioria se mostrou ainda em dúvida, e logo os questionamentos vieram:

— Não podemos ir contra o código pirata. Ele nem mesmo pode estar a bordo deste navio, quem dirá ser capitão.

— Vai ver foi por causa disso que essa desgraça aconteceu ao pobre Hornigold. Fomos amaldiçoados!

— Não pode colocar a culpa das más ações das pessoas nos Ômegas. — Abel defendeu. Francis o encarou com um olhar desconfiado. — Nossa tripulação diminuiu consideravelmente, e ainda querem perder mais membros?

— Seja você o nosso Capitão, Abel!

— É, Abel — o Ômega cruzou os braços, sorrindo com sarcasmo. —, seja você o capitão.

Abel respirou fundo quando o encarou de volta, tentando controlar a raiva. 

— Eu não posso.

— Por que não? — Os piratas inclinaram-se ansiosos.

— Não sei o que fazer. — Houve murmúrios incômodos entre a tripulação.— Se acham ruim, assumam o comando! 

Os piratas começaram uma discussão, com ameaças e maldições, um querendo rosnar mais alto que o outro. Francis respirou fundo, revirando os olhos. Aqueles Alfas sempre resolviam suas questões com brigas e xingamentos, e os Betas iam pelo mesmo caminho.

— Vamos saquear pequenos navios mercantes. — A voz do Ômega fez os demais se calarem por um momento.

— A gente precisa ir pra Nabuco recrutar mais Alfas. — Thon opinou. — Nossa tripulação foi cortada pela metade.

— É isso — ele recebeu apoio. — Assim que a gente chegar em Nabuco, eles vão implorar pra entrar no Ranger. É sempre assim.

— Eu não contaria com isso — o Ômega refutou. — Hornigold conseguia ser bastante convincente, mas sem ele, vamos precisar de mais do que apenas palavras. 

— E o que você sugere, então? Como vamos saquear navios com poucos Alfas?

— Não temos tão poucos assim. A tripulação do Hornigold que era grande mais. — Abel disse.

— Por acaso eu ouvi muitas conversas enquanto trabalhei no estaleiro do meu pai — Francis iniciou. — O Capitão do Vulture conseguia seus saques por uma rota pouco conhecida, onde o transporte de seda é a principal fonte de comércio.

— E por onde fica essa rota?

— Não sei.

— Você só pode estar brincando. 

— Eu nasci em Nabuco. Deixei a ilha pela primeira vez em dois anos, o que vocês queriam? Eu não entendo muito bem de mapas… Onde está o navegador afinal?!

— Morreu em batalha.

— Eu posso ajudar com isso — Abel ergueu a mão. — Eu entendo um pouco de navegação.

— Estamos começando muito bem — um pirata riu com sarcasmo. — Um Ômega no comando, um navegador que sabe pouco do ofício, um timoneiro pau mandado... Perdemos os melhores e agora somos um grande grupo de fracassados.

— Mas sempre tem um que só sabe reclamar — Abel virou-se para ele. — Em toda tripulação tem um cara que quando abre a boca só fala merda. Em nosso caso é você.

— Vou te mostrar quem-...

— Vocês vão ficar o dia todo rosnando e mostrando sua presas um para o outro, ou vão içar a porra das velas?! — O Ômega rugiu. — Nunca vamos conquistar nosso objetivo se ficarmos navegando em círculos. 

— Vocês ouviram. Ao trabalho! — Abel fortificou. — Vamos mostrar a eles que o Ranger continua firme e forte!

— Sobre isso… — Francis articulou. — Eu vou rebatizar o nome do navio. 

— Por que isso agora? Estava bom assim.

— Não, não — Abel interrompeu. — Acho que vai ser uma boa ideia deixar o antigo nome para trás, com toda a merda que aconteceu. Se vamos recomeçar, que seja com uma nova identidade.

— E qual vai ser? 

Os piratas entraram em uma nova discussão, em busca de uma insígnia que seria o novo símbolo da tripulação. Francis olhou para o céu e embora ainda estivesse claro, a lua já estava lá, se preparando para iluminar o mar a noite.

— Luna. — o Ômega afirmou. A tripulação ficou em silêncio quando ele virou-se para encará-los: — A vida, assim como a lua, é feita de fases diferentes; o importante é que ela nunca perca o seu brilho.

— Eu gostei. — Jihoo defendeu. — Eu sei desenhar bandeiras, posso criar a insígnia.

— Ótimo — Francis sorriu para ele. — Venha, Abel. Temos um itinerário para criar. 

Abel assentiu e acompanhou o Ômega. Os piratas sentiram-se inspirados com a sensação de recomeço, e logo trataram de mover as velas para aproveitar o que restava da luz solar, e percorrer a maior distância possível até que o breu cobrisse a face das águas.

 

🏴‍☠️👑🏴‍☠️

Poucas semanas após a escolha do novo capitão, o Luna navegava próximo a um conjunto de ilhas adjacentes às Filipinas. A embarcação cuja bandeira hasteada carregava o emblema de uma lua em sua fase crescente, estava oculta por uma enseada de uma ilha, aguardando um pequeno navio mercante se aproximar. 

Assim que chegaram perto o suficiente, as velas do Luna foram içadas e o navio cercou a embarcação mercante. Assustados com a repentina aparição, os mercadores correram para chamar seu comandante.

— Preparem os canhões! — Abel determinou.

— Não. — Os piratas hesitaram quando ouviram a voz do Capitão. — Ainda não.

— Não podemos dar tempo para eles pensarem. Eles vão fugir!

— Eles irão fugir se virem uma artilharia pesada mirando neles. É instinto. — O Ômega explicou. — Alcem a bandeira preta.

— Deixe-os tentar — Abel sorriu insano. — Iremos pegá-los de qualquer jeito. 

— Por que gastar recursos e munição, se podemos simplesmente fazê-los se render?

— Odeio a sua lógica — Abel bufou. — Não é nem um pouco divertida.

Na embarcação mercante, os marujos aguardavam ordens do comandante para fugirem imediatamente. Mas o líder ponderava porque eles não estavam atacando.

— Senhor, precisamos fugir! É um navio pirata. Não conheço aquela bandeira, mas a julgar pelo número de canhões…

— Não estão ativados — o comandante avaliou através da luneta. — Vejam! Eles içaram a bandeira preta! Isso significa que terão piedade em uma invasão.

— Podemos fugir!

— Eles possuem mais velas. Uma fuga seria impossível — o comandante determinou. — Icem a bandeira branca.

Com a rendição anunciada, o timoneiro do Luna aproximou o navio perto o bastante até que as vigas de madeira foram encaixadas entre os navios. 

Francis foi o primeiro a cruzar as embarcações, seguido por Abel e outros Alfas. Os marujos do navio mercante paralisaram conforme os piratas ocupavam o espaço no convés.

— O meu nome é Francis Bonny — o Ômega caminhou entre a tripulação rendida. Ele parou diante do comandante e sorriu quando anunciou: —, e eu estou assumindo o controle deste navio.

— Onde está o capitão daquele navio? — o comandante perguntou ao Ômega. 

— Você está falando com ele. 

— Como é…?! — Os marujos entreolharam-se confusos. 

Aquela era a primeira vez que eles estavam vendo um Ômega como capitão de um navio pirata. Aliás, eles nunca tinham visto Ômega algum no comando de qualquer embarcação.

Talvez ainda houvesse a chance de recuperar o controle, diante de uma liderança “frágil”. O comandante levou a mão vagarosamente até a pistola em seu coldre, mas engoliu em seco quando sentiu a ponta da espada do Ômega sendo pressionada contra sua garganta.

— Faça qualquer gracinha, comandante, e eu usarei seus ossos como carvão no meu navio. — Ele pressionou um pouco mais, o Alfa tremeu recuando. — Será que fui pouco claro?

— N-não!

— Abel, verifique as cargas no porão — Francis comandou, e o Alfa assentiu.

Aquela foi a primeira das inúmeras invasões sofridas pelos navios mercantes. O porão do Luna estava repleto de seda, farinha, açúcar e pedras preciosas. 

À medida que as embarcações saqueadas retornavam para seus reinos, rumores de que havia um Ômega dominando o contrabando nos mares ao Sul, se espalharam pelos vilarejos.

Depoimentos sobre a sua aparência chamavam a atenção, devido ao fato de ser completamente diferente das bestas raivosas que estampavam os cartazes de procurados.

Quando ancorou no Porto de Folsom, o Luna já era conhecido por toda costa asiática. Os locais comentavam sobre um navio com uma lua crescente na bandeira, que estava parado na costa, cheio de cargas.

Após uma longa temporada no mar atacando e saqueando, os piratas receberam de seu capitão a recompensa mais benquista de todas; alguns dias para se divertirem nos famosos bordéis de Folsom. 

Como eram feitos para agradar apenas Alfas e Betas, Francis frequentava uma das poucas tabernas onde os profissionais dos bordéis não compareciam para oferecer seu trabalho.

— Você vem aqui todos os dias, sozinho — o Beta que guarda o bar comentou enquanto limpava as mesas. A taberna estava vazia, com exceção dele e de Francis. — Onde está sua tripulação?

— Estão ocupados. 

— É claro… Mas você é muito bonito, poderia estar com quem quiser agora.

— Já ouviu falar naquele velho ditado? — O Beta negou, se aproximando para ouvir a resposta: — Antes só, do que mal acompanhado.

— Nossa… — o Beta sorriu, colocando a mão sobre o peito. — Foi uma indireta?

— Eu não sei. — Francis sorriu também. — Me diga você.

— Eu acho que não… — Ele apoiou as mãos na mesa em que o Ômega estava. — Você é durão, não é à toa que se tornou capitão de um navio pirata. Se eu estivesse incomodando, você faria mais do que jogar indiretas.

— Está certo.

— Viu? Sou diferente de um Alfa, pois ainda me resta um pouco de cérebro. 

Francis riu divertido, negando com a cabeça. 

— Está tentando me agradar?

— Tá tão na cara assim? — O Ômega balançou a cabeça assentindo. — E eu consegui, pelo menos?

— Está no caminho certo.

— Ravi, estou me recolhendo — um Alfa mais velho avisou, subindo as escadas.

— Você tem que fechar a taberna agora? — O Beta negou com a cabeça. — Por que não se senta um pouco?

— Não posso beber com os clientes. Mas nada me impede de pagar uma bebida para um Ômega que estou conhecendo… Você aceita?

— Eu gosto de rum...

— Ótimo. Eu já volto.

Francis acompanhou com o olhar o Beta seguindo até o bar. Ele apanhou uma garrafa de rum e uma caneca, e logo retornou à mesa para sentar-se junto ao Ômega.

— Há algo que tem me deixado curioso desde que ouvi falar em você. — Ravi informou. — Você não parece ter mais do que vinte anos. Quantos anos tem?

— Dezoito. 

— Uau…

— O que foi?

— Você é apenas dois anos mais novo, e já comanda um navio conhecido em muitos mares. Enquanto eu vivo de limpar mesas e vômitos de bêbados nojentos.

— A vida é mesmo uma caixinha de surpresas.

— Por que diz isso?

— Até um tempo atrás eu estava limpando o convés do navio, sendo humilhado pela tripulação. Hoje sou o Capitão deles. — Francis indicou com orgulho. O Beta assentiu. Não tinha o que falar, logo ficou admirando o Ômega em silêncio. — Por que me olha desse jeito?

— Nada… 

O Beta desviou o olhar, e Francis sorriu para ele. A garrafa de rum ainda estava na metade, e assim continuou. Eles estavam tão distraídos em uma conversa harmoniosa, que se esqueceram da bebida.

Um barulho na porta do primeiro andar fez o Ômega entrar em alerta, levando a mão ao cabo da pistola. 

— O que foi isso?

— Provavelmente foi o meu pai. Aquele Alfa que subiu as escadas. Ele é sonâmbulo. Deve estar sonhando que está destelhando o prédio mais uma vez.

— Está tão tarde assim?

— Por que? Você precisa ir a algum lugar?

— Não… Voltar pro navio, talvez. Mas estou com preguiça. — Francis relaxou, apoiando a testa na mesa.

— Meu quarto fica apenas a alguns metros daqui… — o Ômega ergueu a cabeça com o cenho franzido. — Eu fui muito direto?

— Imagina... — respondeu com sarcasmo. 

— Desculpa.

— Tudo bem, eu gosto de sinceridade.

— Então, gostaria de conhecer o meu quarto?

— Está me convidando pra dormir com você ou apenas conhecer o cômodo? 

— Eu não pretendo dormir, Capitão Francis… Se também for da sua vontade, é claro.

O sorriso presunçoso do Ômega deu lugar a um rosto corado. Ele apanhou a caneca de rum e tomou todo o conteúdo restante de uma só vez. 

— Mostre-me o caminho.

Ravi levantou e de maneira respeitosa, ofereceu a mão para ajudar o Ômega a se levantar. Francis aceitou e se deixou ser guiado por um corredor que os levou até o quarto do Beta. Ele deu passagem e esperou que o mais novo entrasse primeiro, logo após também entrar no aposento ele fechou a porta.

— É bem modesto. — O Beta comentou a medida que Francis observava os detalhes do quarto.

O cômodo era semelhante aos demais quartos das pousadas que às vezes o pirata descansava, com uma cama, uma pequena mesa com duas cadeiras e uma cômoda. 

Simples lamparinas iluminavam o ambiente. O que o diferenciava dos demais quartos era a decoração, que parecia mais pessoal. Haviam quadros retratando paisagens pela parede, todos muito bonitos. Mas apenas um chamou de fato a atenção do pirata, por se tratar de uma pintura de algum Ômega completamente sem roupas.

— Eu deveria ter tirado isso daí… — Ravi disse sem jeito, coçando a nuca.

— Parece que você não é tão diferente dos Alfas, afinal de contas… — O Ômega riu.

— Nunca foi crime apreciar o que é belo.  

Ravi se aproximou devagar, parando rente às costas do Ômega. Quando virou-se de frente para ele, Francis sentiu os batimentos acelerarem quando o Beta tocou em seu rosto. Ele estava muito perto.

Francis Bonny ficou conhecido por ter saqueado dezenas de navios mercantes, sem ter disparado um único tiro de canhão. Além de ser descrito como um Ômega muito feroz em batalha. Quando seus olhos se tornavam prateados, era melhor sair de seu caminho, diziam. 

Contudo, depois de longos meses navegando pelo Oceano Pacifico, de Norte a Sul. De tantas lutas, invasões e saques, ele nem sequer havia sido beijado uma única vez. 

Quando mais moço, ele gastava seu tempo ajudando o pai no estaleiro, e à medida que se tornava mais velho, tornou-se assustador para a maioria dos Alfas. Os que tinham coragem de se aproximar nem sequer ousavam cogitar a possibilidade de cortejá-lo. Aquele Ômega era diferente de qualquer outro já visto.

É como dizem; os Alfas têm medo dos Ômegas fortes e inteligentes.

— Não tenha medo… — Ravi sussurrou quando o beijou carinhosamente na bochecha.

— Não estou com medo. — Ele de fato não estava, mas o Beta podia sentir um pouco de hesitação da parte dele.

Ravi não contestou, apenas sorriu para ele e continuou beijando-lhe pelo rosto, vagarosamente, como se estivesse ganhando sua confiança. 

Francis manteve os dois braços largados ao lado do corpo, não tinha certeza do que fazer naquele momento, apenas aguardou. Ravi então segurou as mãos dele e as guiou até seus ombros. 

— É como uma dança. — O Beta afirmou.

— Eu nunca dancei.

— Posso guiá-lo se quiser. 

O Capitão assentiu balançando a cabeça lentamente. Ravi se aproximou devagar, aproveitando cada segundo daquele instante, admirando os lábios do Ômega poucos segundos antes de juntá-los com os seus. 

Francis teve a sensação de estar em um barco à deriva, sem se preocupar com a direção do vento, apenas se deixando levar em águas calmas. Ravi tinha toques suaves, e entender cada centímetro do Ômega era como desbravar um oceano desconhecido. Era preciso cuidado e muita atenção.

O Beta entendeu que Francis não era o único sentindo algo novo alí. Ele se deu conta de que havia aprendido pela primeira vez o que realmente era amar o corpo de alguém. Aquela noite foi diferente de qualquer outra que já tenha passado com algum outro Ômega ou Beta. 

Logo que amanheceu, Ravi foi o primeiro a despertar. Ele aproveitou que o Ômega ainda estava dormindo para admirá-lo um pouco mais. Mas não demorou muito, e logo Francis abriu os olhos e piscou algumas vezes se situando. Ele sorriu quando viu Ravi lhe observando em silêncio, e foi retribuído.

— Como se sente? — O Beta perguntou, acariciando o cabelo castanho.

— Bem, e você?

— Eu estou ótimo. — O sorriso dele cresceu. — Melhor impossível. 

Ambos ficaram alguns minutos deitados na cama, conversando ou simplesmente apreciando o momento. Um tempo depois, Ravi se levantou na intenção de preparar uma refeição para eles e levar até o quarto, mas foi pego de surpresa quando saiu da cozinha e viu o Ômega ocupando uma das mesas da taberna.

— Eu ia levar até você. — Ele colocou a bandeja em cima da mesa. 

— Estou faminto. 

Ravi sorriu vendo o Ômega servindo-se. Ele também fez o mesmo. 

Um pouco mais tarde, o pai de Ravi abriu as portas da taberna, dando início a mais um dia de expediente. Ao invés de voltar ao navio, Francis decidiu ficar ali mesmo, conversando com o Beta e assistindo-o trabalhar. 

Preocupado com a ausência de seu Capitão, Abel decidiu procurá-lo pelas tabernas da cidade, encontrando-o em pouco tempo de busca. 

Assim que entrou no estabelecimento, ele viu quando um Beta que segurava uma toalha e uma bandeja, beijou a bochecha de seu Capitão, bem ali, diante de todos. Tomado por um sentimento de fúria, ele se aproximou com visível raiva estampando suas feições.

— Que pensa que está fazendo, Beta? — Ele se colocou na frente do Ômega, como uma proteção. — Afaste-se do meu Capitão!

— O que deu em você? — Francis o virou para si. 

— Ele estava se aproveitando do senhor. 

— Ninguém estava se aproveitando de mim, Abel. 

— Quem é ele? — Ravi observou curioso e surpreso.

— Meu contramestre.

— Devo içar a âncora, Capitão?

— Não. 

— Mas não íamos zarpar hoje cedo?

— Mudei de ideia. Ficaremos mais dois dias em Folsom. Tenho certeza que a tripulação concorda com isso. Avise aos demais.

— Não acho que seja uma boa ideia.

— Qual o problema aqui exatamente, Abel?

— Será que podemos conversar sem que um Beta enxerido escute? 

Francis ergeu as sobrancelhas. Abel sempre foi um Alfa prudente, e foi exatamente por isso que foi escolhido como braço direito. Não havia motivos para estar se comportando daquela maneira.

— Com licença. — Ravi apoiou a pequena toalha no ombro e se retirou.

— Vai me explicar que porra ta acontecendo aqui? — O Capitão indagou.

— Eu não gostei do jeito que aquele Beta estava te tratando.

— Quem tem que gostar sou eu, não você.

Abel respirou profundamente antes de tentar beijar o Ômega. Francis se afastou, com choque expressando suas feições. 

— Não faça isso.

— Desculpe… Me desculpe, Capitão. Eu… — O Alfa passou a mão no rosto. Em seguida, segurou na mão do Ômega e o puxou consigo para um canto menos movimentado da taberna. — Eu gosto de você. 

— O quê!?

— Eu me apaixonei por você. Esperava que fosse correspondido. Não devia ter demorado pra contar. 

— Abel, me ouça — O Ômega chamou calmamente. Tendo a atenção do mais alto para si, ele continuou: — Eu gosto de você, mas não do jeito que deseja. 

— É por causa daquele Beta desgraçado, não é?

— Não importa. O fato é que esse sentimento que você tem por mim não é recíproco, eu sinto muito. Isso é tudo. Quero que respeite o meu espaço.

— Como desejar… — O Alfa olhava para Ravi com fúria nos olhos. Francis percebeu suas intenções.

— Abel, olhe para mim. — Este o encarou. — Fique longe dele. Não ouse tocar em um fio de cabelo dele. Se você o prejudicar de alguma maneira vai se ver comigo, eu fui claro?

— Sim, senhor.

— Ótimo. Agora volte pro navio, ou para um dos bordéis em que perambulou por esses dias.

Francis não esperou por qualquer resposta, e mesmo que esperasse, Abel não saberia o que dizer. Ele realmente havia passado todos aqueles dias se divertindo com os profissionais dos bordéis. Além de que não fazia sentido algum cobrar qualquer sentimento do Ômega por si. 

— Me desculpe por aquilo. — Francis murmurou assim que voltou a sentar no mesmo lugar de antes.

— Tudo bem. Parece que ele ficou um pouco bravo por ter me visto com você. Espero não ter trazido problemas sérios.

— Problema algum. Esses Alfas às vezes pensam que possuem algum controle sobre mim. Algumas vezes preciso mostrar quem está no comando.

Ravi sorriu, inclinando o corpo para murmurar no ouvido do Ômega:

— Você falando desse jeito fica muito tentador. 

Francis sorriu quando respondeu no mesmo tom:

— Vai ter que esperar até a noite. 

— Você duvida eu colocar todos pra fora e fechar essa taberna agora mesmo? É só dizer sim.

— Pare com isso. Seu pai vai brigar com você. 

O Beta suspirou em um lamento evidente, mas aceitou. Ele trocou olhares significativos com o Ômega conforme trabalhava servindo ou limpando as mesas. No fim do expediente, Ravi fechou a taberna e apreciou cada instante que teve com o Capitão Francis.

O Ômega também fez o mesmo. Foi divertido passar esses dias na companhia do Beta.

E na manhã do segundo dia, Ravi já não queria que Francis o deixasse. 

— Você realmente tem que ir? — O Beta abraçou-o fortemente na cama. 

— Já me estendi demais por aqui.

— Sabe que sempre que voltar para Folsom, será muito bem vindo aqui, certo?

— Fico feliz em saber disso. — Francis lhe concedeu um último beijo, e logo estava de pé, vestindo-se para finalmente partir.

Ravi o acompanhou até o Porto, onde se despediu do Capitão Francis, com quem compartilhou dias inesquecíveis de uma paixão rápida, porém intensa. 

Assim que subiu a bordo do Luna, Francis buscou pelo contramestre, e este, parecia ter deixado para trás todo sentimento que havia confessado. 

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Ilha de Nabuco - 1672

Yejun Bonny estava sentado em sua oficina tomando café enquanto observava a figura do seu filho, ilustrando um pergaminho com uma certa quantia oferecida em sua captura.

— Este lugar continua com o mesmo cheiro terrível de alcatrão — William Rivers comentou assim que entrou na oficina do estaleiro. 

— Capitão Rivers? — Yejun se levantou, quase derrubando a cadeira. 

— Onde estão as peças que solicitei semana passada?

— Ainda não estão prontas. Eu falei com a ferreira e ela-... — A fala de Yejun foi cortada quando Rivers bateu em uma bigorna com violência, derrubando a ferramenta.

— Você quer que eu toque fogo nessa choupana que você chama de estaleiro?!

Yejun estremeceu temendo que o Capitão Rivers cumprisse o prometido. Ele agarrou uma lamparina e ameaçou jogar sobre as cordas e tecidos utilizados para consertar velas.

— Não vai fazer isso! — Uma voz firme soou na entrada da oficina.

William Rivers rosnou quando olhou para trás. Os olhos de Yejun quase saltaram assim que viu seu filho entrar no escritório, e outros Alfas logo atrás. 

O cabelo castanho estava oculto por um chapéu, e ele vestia um longo casaco de veludo. Por cima de uma faixa que ornamentava a cintura, havia um coldre com duas pistolas e uma espada embainhada. 

Seu rosto, embora em aparência parecesse o mesmo de quando deixou a ilha há cerca de dois anos, parecia igual, exceto por uma cicatriz que cortava uma de suas sobrancelhas. Havia algo a mais naqueles olhos castanhos de que Yejun se lembrava. 

— Olha só, então o ratinho voltou pra toca. — Rivers riu. 

— Capitão Francis, pra você. — Abel avisou. 

— Capitão? — William olhou surpreso. — Então qualquer um se torna capitão hoje em dia.

— Cai fora. — Francis exigiu.

— E quem vai me tirar daqui? — Rivers avançou contra o Ômega, mas parou imediatamente quando os Alfas da tripulação dele puxaram suas armas e apontaram para si. — Parece que você possui alguns cães de guarda. 

— Você vai deixar meu pai em paz.

— Sairei daqui, mas antes quero minhas peças. 

— O que você quer é irrelevante.

— Eu tenho um acordo com ele.

— Estou refazendo os termos. Você vai embora e não levará nada, e eu pouparei sua vida.

— Você acha que pode rosnar mais alto que eu?

Francis removeu a pistola do coldre e mirou o cano no meio dos olhos do Alfa. Rivers nada fez, além de observar em silêncio. Se movesse um centímetro, seria alvejado pelas armas dos demais piratas do Luna. 

— Rosnar mais alto não vai impedir que eu deixe um buraco no meio da sua cara. 

William Rivers era, até então, o Capitão mais temido dos sete mares. Foi extremamente humilhante para ele, ser expulso do estaleiro por um jovem Capitão que ainda estava começando a ficar conhecido.

Assim que o Alfa se retirou, Yejun deu alguns passos até ficar próximo do filho. Francis não sabia o que esperar, havia fugido de casa e sumido por cerca de três anos, agora estava ali, diante de seu pai. 

Yejun observou o filho com seus próprios olhos, em silêncio por alguns segundos. Ouviu falar sobre ele e suas conquistas pelos mares do Sul, mas para ele, Francis Bonny continuava sendo aquele pequeno Ômega que corria pelo estaleiro no meio dos Alfas, e chegava em casa tarde da noite, com o cabelo bagunçado e sujo de graxa.

— Oi, pai… — disse, olhando-o hesitante. 

— Meu filho! — Yejun o abraçou fortemente.

Uma sensação de conforto tomou conta dos dois. O Alfa dormia todas as noites rezando para que Netuno, o deus dos mares, protegesse o seu pequeno e o trouxesse de volta para si, para que pudesse abraçá-lo pelo menos uma última vez. 

Suas preces foram ouvidas e seu filho estava ali, na proteção de suas asas. Ele já não era o mesmo Ômega de antes. Era o Capitão de um navio. Mas ainda assim, era seu pequeno Francis.

— Perdoe seu velho pai. Tudo o que eu queria fazer era pensando no seu bem.

— Acredito no senhor, pai. Está tudo bem. Eu o amo muito! — Francis o abraçou novamente. 

— Senti a sua falta — o mais velho expressou. — Todos os dias. 

— Agora acredita que posso me cuidar sozinho? 

— Oh, Francis. Agora estou mais preocupado do que nunca. — O Alfa confessou, rindo e secando algumas lágrimas. — Mas sim. Você retornou, como Capitão de um navio. Estou muito orgulhoso do quanto és forte.

Bonny abraçou o filho mais uma vez, para senti-lo tanto quanto necessitou durante todo o tempo em que ele esteve longe. Francis contou ao seu pai sobre as histórias e desventuras que passou, o mais velho ouvia atentamente cada palavra. 

Em outra ocasião, Yejun fez questão de fazer uma vistoria e aperfeiçoar o Luna. O navio estava deixando a desejar, embora tenha sido consertado em outros Portos, não havia ninguém melhor do que o velho Bonny para fazê-lo desempenhar suas funções de maneira exímia.

Muitas cargas foram vendidas, o que chamou atenção não apenas dos comerciantes de Nabuco, mas daqueles Alfas e Betas que ainda não pertenciam a nenhuma tripulação, ou estavam cogitando trocar de capitão.

O assunto que chegou a uma das tabernas mais movimentadas de Nabuco, era de um navio ancorado cuja insígnia era de uma lua crescente, e seu Capitão um Ômega. O próprio Francis Bonny entrou naquela taberna, em busca de marujos para sua tripulação. 

— É ele… — murmúrios foram ouvidos.

Alfas e Betas olhavam disfarçadamente para a mesa em que Francis estava, outros nem tanto. O fato era que todos queriam ver com seus próprios olhos, quem era o famigerado Capitão Ômega que obteve tanto lucro, em tão pouco tempo.

— Todos estão olhando na nossa direção. — Abel comentou. Ele ocupava a mesa com o Capitão Francis e mais alguns Alfas.

A maioria era de apenas curiosos. Alguns se ofereceram para entrar na tripulação, mas não a quantidade que estavam esperando. Mesmo com todos aqueles saques, ainda havia aqueles que duvidavam da liderança de um Ômega.

Contudo, Francis já havia imaginado um baixo número de candidatos. Mas aquilo era apenas o começo. O que ele não esperava era que o Capitão Rivers fosse até a taberna em que ele estava, em busca de uma retaliação.

— Onde está o Ômega que brinca de ser pirata? — Ele entrou esbarrando em quem encontrava pela frente. Assim que o viu ocupando uma das mesas, ele caminhou diretamente até o mesmo. — Temos contas a acertar.

— Eu não tenho nada a tratar contigo.

Rivers chutou a cadeira em que o Ômega estava sentado, fazendo-o balançar para o lado.

— Será que eu deveria matar cada membro da sua tripulação? — O Alfa puxou a pistola e mirou diretamente no cozinheiro. — Pra ver você correndo de volta pro papai quando estiver sozinho?

Antes que pudesse apertar o gatilho, Francis desembainhou a espada e o Alfa teve segundos para se defender, usando a pistola como escudo para bloquear a lâmina de acertar seu ombro esquerdo. 

As mesas foram desocupadas de supetão quando a luta teve início. Os Alfas de William Rivers não permitiram qualquer intervenção por parte da tripulação do Luna, 

Rivers teve de trocar a pistola pela espada rapidamente, assim que quase teve o braço decepado ao tentar mirar no Ômega. Francis era muito ágil em seus ataques, e o Alfa mal tinha tempo de se defender, sendo seguidamente lançado para trás, para esquivar dos ataques.

Próximo da porta, o Ômega bateu com o cabo da espada no rosto de William quando usou a lâmina para se defender. Ele chutou o Alfa que instantaneamente se desequilibrou e caiu escada abaixo, indo parar no chão, no meio da rua.

Quem estava dentro da taberna saiu para continuar assistindo a luta, e outros curiosos que passavam pelo local, se juntaram à multidão fazendo um círculo ao redor de ambos.

Francis se aproximou para continuar com seus ataques, quando foi pego de surpresa por uma nuvem de areia que cobriu seus olhos. Rivers se recuperou no mesmo instante, e lançou-se contra o Ômega. Ele manteve o peso do próprio corpo em cima do menor, e puxou seu cabelo para que erguesse a cabeça quando rosnou para que todos ouvissem:

— Você me fodeu naquele estaleiro, agora chegou a minha vez de foder você!

Rivers largou o cabelo dele para abrir o próprio cinto, acreditando que estava mantendo-o sob seu controle, embaixo de si. Mas o Ômega lançou a cabeça para trás, batendo contra o nariz de William. O Alfa caiu para trás, sentindo-se ligeiramente atrapalhado. 

Francis sentiu dificuldade para enxergar, mas encontrou sua espada novamente quando sentiu seu pé pisando em algo firmemente sólido. O Alfa mantinha a mão no nariz, onde o sangue que escorria indicava que estava quebrado. Ele engoliu um rosnado, para não entregar ao Ômega sua localização.

Rivers ergueu a espada e caminhou em silêncio. A cada passo que dava, seu nariz pintava sangue no chão. Francis estava segurando com firmeza o cabo da espada, respirando profundamente enquanto se concentrava nos passos do Alfa.

O vento entregou Rivers quando ele tentou lançar seu ataque contra o Ômega. Assim que investiu a espada contra Francis, este se abaixou ao mesmo tempo que erguia a própria arma, para impedir de ser atingido pelas costas. Ele girou e assim que sentiu o Alfa logo a sua frente, avançou com a espada perfurando o abdômen dele. 

William regressou alguns passos conforme o Ômega avançava contra ele, quem estava no caminho abriu passagem imediatamente. Rivers teve as costas pressionadas contra a parede de um outro prédio. Ele cuspiu uma grande quantidade de sangue quando Francis puxou a espada de seu corpo e, seguindo os instintos de seu lobo Ômega lúpus, lançou a lâmina em uma altura suficiente que cortou a garganta do Alfa.

Francis voltou dois passos quando Rivers desabou de joelhos em sua frente, engasgando com o sangue que escapava de sua boca e garganta. Ele caiu de frente para o chão, e dentro de poucos segundos a vida o deixou. O Ômega ainda lançou a espada para o lado, quando ouviu alguém se aproximar.

— Calma, Capitão! Sou eu! — Era a voz de Abel. — Mostre seus olhos.

O Ômega sentiu alívio à medida que a água limpava a areia de seus olhos. Quando finalmente voltou a enxergar, ele viu uma poça de sangue sobre seus pés, e o corpo de William Rivers estendido no chão.

A população o olhava com medo e espanto, mas também com admiração e encanto. Foi assustadoramente assombroso assisti-lo enfrentando o Capitão Rivers, mesmo de olhos fechados. Todos foram testemunhas.

Ao contrário do que William Rivers garantiu, o sobrenome Bonny se tornou uma lenda em Nabuco, e as canções sobre o valente Ômega lúpus que enfrentou e venceu o terrível Capitão atravessaria os mares, e chegaria aos ouvidos de de todos os vilarejos pelo mundo afora.

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Em algum lugar do Oceano Índico - 1675

Com uma tripulação em maior número e um navio fortemente armado, o Luna navegava pelos mares próximo da Índia. Estava perseguindo uma outra embarcação pirata que covardemente tentava fugir do navio comandado por Francis Bonny.

— Prepare os morteiros. — O Capitão Ômega ordenou. Ele observava o convés do outro navio ao longe, utilizando sua luneta ornamentada em ouro. — Destruam o mastro deles.

O atirador assentiu. Havia Alfas dispostos em cada aparelho quando o Capitão Francis deu a ordem, os canhões soaram disparos contra o navio logo a frente. Bolas de ferro conectadas por uma corrente, acertaram os mastros do outro navio, destruindo-os instantaneamente.

Sem velas suficientes para dar continuidade à fuga, o navio foi rapidamente alcançado pelo Luna. Os piratas inimigos não demonstraram intenção de se renderem, e uma contenda foi iniciada até que finalmente a tripulação foi rendida.

— Vocês são idiotas ou o que? — Capitão Francis indagou, passando pelos mortos no convés do navio inimigo. — Poderiam ter evitado essas perdas se apenas tivessem se rendido. 

— Seu maldito Ômega desgraçado! — Uma voz familiar chegou aos ouvidos de Francis. Quando olhou para trás, ele reconheceu de imediato o Alfa ruivo que conheceu há alguns anos, mas que agora possuía uma longa barba e muitas cicatrizes pelo rosto. — Deveria ter morrido com o Hornigold!

— Fenn Teach? — O Ômega se aproximou, com o cenho franzido. — Onde está seu irmão para lhe dizer o que fazer?

— Eu não preciso daquele merdinha, e não me chame por este sobrenome nojento! Eu sou Barba-Ruiva, o terror dos mares! — Ele rosnou, exibindo as presas.

— Nossa — Francis sorriu. — Realmente, estou tremendo de medo. 

O contramestre do Ômega o chamou, e ele virou-se para ouvir:

— Capitão, há vários baús com ouro e pedras preciosas na cabine e também no porão.

— Leve tudo pro Luna. Não deixe uma única moeda. — Francis indicou.

— Não me dê as costas! — Fenn rugiu, mas não pôde se aproximar já que estava sendo contido por alguns Alfas. — Eu estou falando com você!

— Vai catar os piolhos da tua barba! — O Ômega balançou a mão, fazendo careta. — Não tenho tempo pra lidar com você agora.

Ignorando os rugidos, pragas e maldições de Fenn Barba-Ruiva, Francis retornou à cabine do Luna e anotou no diário de bordo os registros dos saques daquele dia. 

Enquanto terminava as anotações, ele podia ouvir a tripulação comemorando a gigantesca obtenção com o navio de Fenn.

Com o porão repleto de mercadorias, o Capitão Francis não tinha outra escolha a não ser retornar a Nabuco, para vendê-las por um valor considerável. Em troca de suas cargas, o Ômega aceitava apenas moedas de ouro. Por este motivo, o Luna também era chamado de a Lua Dourada.

Ilha de Nabuco - 1676

Assim que o Luna ancorou em Nabuco, diversos comerciantes já se encontravam no cais, tentando obter as cargas valiosas do afamado navio pirata. Em seu poder não havia apenas uma grande quantidade de produtos, mas também eram da melhor qualidade. 

Após um longo dia negociando suas mercadorias, o Capitão Francis e sua tripulação seguiram para uma taberna, onde finalmente puderam descansar os dias cansativos no mar. O Luna era um navio extremamente grandioso, e seu porão estava em grande quantidade ocupado por baús cheios de moedas de ouro, jóias e pedras preciosas. 

Embora o navio não fosse um dos mais bem armados, não havia uma única alma corajosa o bastante, capaz de tentar saquear o navio capitaneado por Francis Bonny.

Contudo, havia uma instituição conhecida pela alcunha de, a Ordem, responsável por diversos tipos de serviços como, assassinato, sequestro, torturas e etc. Além disso, eles recebiam uma grande quantidade de moedas quando caçavam piratas e os entregavam à Marinha Real, visto que a mesma sequer era capaz de fazer seu próprio trabalho.

A instituição era secreta e misteriosa, ninguém sabia sua localização exata, mas tinha-se conhecimento que eles estavam espalhados por todo o mundo. A Ordem enviava constantemente caçadores para capturar os piratas. 

No caso do Capitão Francis Bonny, o valor era bem maior. Com isso, era necessário enviar o melhor de todos à sua procura. Lee Seungho não era exatamente o prodígio da instituição, mas sua linhagem próxima dos antigos líderes da Ordem, deu-lhe a chance de receber a missão de capturar o notório pirata.

Lee passou uma semana observando os passos do Capitão Francis, para que seu plano saísse exatamente como havia planejado. Ele iria esperar o Ômega passar por uma viela a noite, e o pegaria de surpresa em uma emboscada. Ninguém enxerga melhor na escuridão, do que um Alfa lúpus.

Naquela noite, enquanto esperava o seu alvo, Lee mantinha-se concentrado olhando na direção em que Francis sempre voltava da taberna. Estava tudo arquitetado para capturar o pirata, quando de repente ele sentiu um cano gelado de uma pistola sendo pressionado contra sua nuca, que o fez estremecer da cabeça aos pés. 

— Está perdido? — Era com certeza a voz de um Ômega.

Lee engoliu em seco. Só podia ser ele.

— Perdão? — Ele tentou virar o corpo, mas o som da trava sendo desativada o fez congelar. — Vamos conversar… — Lee não sabia o que dizer, estava perdido. O máximo que poderia fazer era ocupar o Ômega por tempo suficiente para pensar em uma estratégia. Ele pigarreou, antes de continuar: — Estou apenas observando o vai e vem dos transeuntes.

Sentiu alívio ao escutar uma risada atrás de si.

— Essa é a sua melhor desculpa?

— Sou um admirador seu.

— Own, que fofo. Eu quase acreditei. — O Alfa engoliu um rosnado. Francis segurou na pistola com mais firmeza. — Vou te dar um tempo pra pensar numa resposta mais convincente… cinco, quatro…

Nada do que Lee tentasse iria convencer o Ômega de que era verdade, e ele só tinha alguns segundos para sair daquela enrascada. Usar sua voz de lúpus poderia ser arriscado com ele apontando a pistola em sua nuca. Caso desse errado, o Ômega ficaria muito bravo e aí sim, seria o seu fim. 

Talvez, ser sincero fosse a única coisa que o manteria vivo por mais tempo.

— … três, dois-

— Sou um caçador! — Lee Seungho confessou em meio ao desespero.

— Hmm, agora ficou mais interessante. — O Ômega regrediu um passo, apenas para dar a volta e ficar frente a frente com o Alfa. E não era um Alfa comum, era um lúpus. Alto, ombros largos, corpo em forma e o inferno de bonito. — Muito interessante...

— Se vai me matar-

— Eu não vou te matar — Francis o cortou, observando-o dos pés à cabeça. — A não ser que você faça algo muito estúpido.

— Como o quê, por exemplo?

— Usar sua voz.

— Eu poderia fazer isso. Tomaria a sua arma e o entregaria à Marinha agora mesmo.

— E por que não faz? — O Ômega sorriu, o que deixou Lee hipnotizado por alguns segundos. — Se acha que é capaz de tal proeza, então faça. O que te impede, caçador?

Lee Seungho ponderou por um tempo.

— Não irei subestimá-lo. Eu fiz o meu dever de casa. Não estava mentindo quando disse que sou um admirador seu. 

— Só está dizendo isso porque tenho uma arma apontada pra você.

— Talvez pareça realmente, mas estou dizendo a verdade.

— É… acho que isso pode ser divertido… — Francis balançou a arma indicando uma direção. — Anda.

— O que pretende?

— Apenas faça o que estou mandando.

Lee suspirou contra, mas não tinha o que fazer contra o Ômega segurando a pistola. Ele apenas caminhou na frente enquanto era seguido de perto. Estava se perguntando o que seria feito consigo, quando percebeu que estava sendo levado diretamente para o navio do pirata. 

Assim que subiram a rampa que dava acesso ao convés, alguns bucaneiros que continuaram no Luna viram quando Francis seguiu até a cabine, levando um Alfa consigo.

— Eita! parece que a noite do Capitão vai ser boa — Alguns deles riram.

— Foquem em guardar o tesouro que está no porão, seus imbecis! — Abel rosnou, olhando para a porta da cabine incomodado. 

Dentro do cômodo do Capitão Francis, Lee Seungho foi guiado até uma coluna de madeira que ajudava a manter o teto firme. O Ômega colocou a cadeira encostada nessa mesma coluna, e indicou que ele sentasse. 

— Dê-me suas mãos. — Francis estava atrás dele. Ele usou correntes para manter o Alfa preso em sua cadeira, ligado à coluna logo atrás.

— O que pretende? 

— Você não queria conversar? — Ele amarrou os pés do Alfa junto às pernas da cadeira, assim como suas mãos nas costas. — Então vamos conversar. 

O caçador estava completamente imobilizado, mesmo que usasse a sua voz de lúpus, não teria muito o que fazer preso àquela cadeira. O que lhe restava era continuar seguindo o jogo do Ômega. 

Francis puxou outra cadeira para si, e sentou de frente ao Alfa. Ele cruzou as pernas e colocou a pistola sobre o colo, apoiando as mãos no joelho.

— E então? 

— Então o quê? — Lee tentou manter-se calmo.

— Não vai se apresentar? 

— Por que você não me desamarra daqui? Aí a gente conversa de igual para igual.

— E você conversa com a boca, ou com o seu corpo? 

— Você entendeu o que eu quis dizer. 

Francis estava se divertindo com aquela situação. O Alfa era enorme, mas naquele momento parecia um cachorrinho assustado, tentando fingir coragem.

Lee, por sua vez, embora estivesse preocupado com a situação em que se meteu, mantinha viva uma pequena esperança dentro de si. Se fosse qualquer outro pirata ele teria sido morto no momento em que foi pego, mas se estava vivo, significa que ainda tinha uma pequena chance de sobreviver.

— Qual é o seu nome? 

— Lee Seungho.

— Por que estava me seguindo? — Lee ficou em silêncio. — Pretendia me matar?

— Não.

— Então por que estava me espreitando na surdina? — O Alfa se manteve em silêncio novamente. — Parece que eu vou ter que usar outros métodos…

O Ômega se levantou para então remover o casaco de veludo que vestia, e logo depois o chapéu. Ele guardou a pistola em cima da mesa e quando virou-se para Lee, este o observava muito atentamente. 

— Devo avisar que na Ordem eu fui treinado para resistir a todo tipo de interrogatório.

Francis sorriu quando se aproximou. O Alfa estava preparado para qualquer ato de violência menos para o que lhe aconteceria em instantes. O Ômega sentou em seu colo de frente para ele, com uma perna de cada lado e segurou suavemente em seu rosto.

— E para isso, estava preparado? — Ele sorriu diante do choque do Alfa. O pirata estava muito próximo, tão perto que ele podia sentir o aroma de chocolate através de sua respiração. — Quais são as suas intenções comigo?

Lee podia virar o rosto a qualquer momento, o Ômega não estava lhe segurando com força. Mas ele não queria. Estava envolvido pela voz dele, pelo cheiro. Por aquele sorriso astucioso, como se já tivesse o mundo nas mãos. 

— Eu… — Os olhos de Lee subiam e desciam entre os lábios e os olhos do Ômega.  — Pretendia entregá-lo à Marinha.

— Você sabe o que a Marinha faz conosco? — Francis estava se referindo aos piratas. Sua voz entrava suavemente nos ouvidos do Alfa. 

Lee respirou profundamente e, por um breve instante, conseguiu recobrar o controle de suas ações. Ele fechou os olhos e engoliu saliva, antes de responder.

— Isso não é problema meu.

— Agora é. Já que está aqui em minha cabine, sob o meu domínio. — O Alfa umedeceu os lábios e engoliu em seco mais uma vez. — Quero saber mais algumas coisas...

Francis prosseguiu com seu interrogatório, retirando do Alfa toda e qualquer informação que julgou necessariamente importante, sem a menor dificuldade. Ele obteve localizações, nomes e tudo que o ajudaria a manter-se fora do alcance da Ordem.

Assim que conseguiu o que queria, ele se levantou repentinamente do colo de Lee, deixando-o confuso. 

— Já terminou? — Ele parecia decepcionado. — Não tem mais perguntas?

— Não. — O Ômega caminhou despreocupadamente até a mesa, e com um sopro suave apagou uma das lamparinas. — Estou satisfeito.

— O que vai fazer?

— Eu estou cansado. — Ele suspirou, enquanto removia as botas. — Vou dormir, é claro.

— E eu!? Vai me deixar aqui?! — O Alfa estava claramente frustrado. — Eu pensei que…

— Pensou o que? — Francis removeu o coldre que portava suas armas e o colocou em cima da mesa. Ele ainda desabotoou alguns botões da camisa para ficar mais à vontade. 

 — Que eu seria recompensado por ter cooperado... — Ele baixou o olhar para o próprio colo.

O Ômega fez o mesmo. Havia uma notável ereção por baixo das calças de Lee Seungho. Embora tenha notado enquanto estava sentado ali, Francis ergueu as sobrancelhas, chocado pela ousadia daquele Alfa.

— Você ainda está respirando. — O Capitão suavemente apagou a chama de uma outra lamparina. — Esta é a sua recompensa.

Através de uma janela de vidro que ficava ao lado da cama do Ômega, a única luz presente no cômodo era a da lua. Ele subiu confortavelmente em sua cama, e dormiu ignorando os resmungos do Alfa. 

Lee permaneceu a noite inteira acordado, não apenas pela posição desconfortável em que se encontrava, mas pela frustração. Podia sentir o suave aroma do Ômega enquanto ele dormia tranquilamente. A cálida luz da lua enobrecia-o, e Seungho nada podia fazer a não ser observá-lo. O Ômega estava tão perto mas ao mesmo tempo tão longe. Malditas correntes.

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Na manhã seguinte, quando despertou, Francis esticou o corpo na enorme cama de casal que dormiu confortavelmente sozinho. Ainda deitado, ele olhou na direção em que o Alfa foi deixado. Lee ainda estava acordado, com olheiras e um semblante terrível.

O barulho dos piratas no convés indicava que o sol já havia nascido há um bom tempo. O Capitão se levantou, lavou o rosto e fechou a camisa novamente. Lee apenas o observou em silêncio, enquanto ele pegava o cinto com as armas e o prendia em volta de seu corpo.

— Liberte-me. — Seungho arriscou.

— Hmm… — Francis ponderou enquanto arrumava o cabelo utilizando os próprios dedos. — Ainda não.

Lee Seungho rosnou balançando o corpo ferozmente, tentando se libertar da cadeira. O Ômega apenas suspirou, negando com a cabeça. Ele girou o corpo e quando abriu a porta, deu de cara com Abel com o punho erguido, pronto para bater na madeira.

— Bom dia, Capitão.

— Bom dia. — Francis caminhou passando direto e puxou a porta. Antes de ser fechada, Abel ainda o vislumbre de um Alfa sentado, preso a uma cadeira. — Como estamos de negociação? Foram todos vendidos? 

— Sim, com exceção da cabeça de javali. — Abel afirmou quando seguiu logo atrás dele. — Um dos compradores disse que é amaldiçoada, e ninguém mais quis. Todos ficaram com medo.

— E ela é, de fato? — O Ômega franziu o cenho. 

— Não sei dizer, mas só há um lugar em que poderá negociá-la. No leilão do Submundo de Nabuco.

— Tudo bem, eu irei até lá.

— Capitão, não é querendo faltar com respeito, mas… — Abel hesitou. — Ômegas não são permitidos lá embaixo.

— Veremos. — Francis sorriu para ele. — Fique de olho naquele Alfa que está em minha cabine.

— Se me permite saber, quem é ele?

— Um caçador que a Marinha mandou atrás de mim.

— E por que ele ainda está vivo?! Devemos matá-lo agora mesmo!

— Não mate. Pretendo abandoná-lo em uma ilha qualquer.

Abel assentiu, para ele aquele castigo realmente era pior do que morrer. 

Capitão Francis recebeu a cabeça de javali, um objeto feito de bronze e olhos de safira, desceu a rampa, falou com seu pai no estaleiro e logo em seguida, rumou sozinho para o Submundo de Nabuco. 

Não era de grande importância a venda daquele item, ele poderia simplesmente jogar aquela cabeça em um lixo qualquer. Mas não era do feitio dos piratas desperdiçar qualquer coisa que lhe trouxesse lucro.

Diferentemente do que Abel imaginou, Francis Bonny não teve dificuldade em garantir uma vaga no leilão do Submundo, assim que exibiu o item que levava consigo. Além dele ser nada menos que o grande Capitão Ômega, que acumula riquezas tão rápido quanto um raio que corta uma tempestade.

O leilão ficava em uma das camadas mais sombrias do Submundo, e enquanto seguia para tal lugar, Francis encontrou pelo caminho um mercado de runas. Um brilho prateado semelhante à lua chamou sua atenção, e ele se aproximou com grande interesse.

— São runas lunares — um Alfa fechou a tampa onde ficava exposta sua mercadoria. — Custam cem moedas de ouro.

— Isso tudo?!

— Poderá levar essas aqui também. — O Alfa ofereceu um saco com alguns itens dentro. — Na promoção.

— E o que é isso?

— Também não sei. 

Francis não estava alí para perder valores, mas sim para ganhar através da venda de seu item. Contudo, enquanto segurava no cabo de sua espada, sentiu que ela ficaria esplêndida se aquelas runas fossem entalhadas no cabo. Ele então decidiu que a compra valeria a pena e adquiriu o produto. 

Seguindo seu rumo pelas profundezas do lugar, ele encontrou a passagem descrita como a dos compradores. Ele percebeu olhares sobre ele, mas nenhum dos que estavam perambulando por ali, sequer ousou chegar perto dele. 

Uma porta foi aberta diante do Ômega. Um Alfa lúpus anotou seu codinome ao lado de um número, recebeu a cabeça de javali e indicou uma outra porta. Ele seguiu através dela e logo se encontrou em uma sala cheia de cadeiras, diante de um palanque. 

Francis e demais Alfas que estavam naquela sala, ocuparam cada um uma cadeira quando o leilão teve seu início.

Algumas peças, uma mais horripilante que a outra, foram vendidas de início. A cabeça do javali foi o quinto item a ser leiloado, e rendeu ao Ômega uma boa quantia. Quando estava prestes a se retirar, ficou paralisado sem saber ao certo se era engano de seus olhos, ou se aquela cena realmente estava acontecendo.

Uma Ômega vestida com uma única túnica branca foi colocada sobre uma mesa e exibida diante de todos. O leiloeiro apresentou a “mercadoria” e tirou Francis de seu transe quando gritou:

— Dêem seus preços!

— Cinquenta moedas de prata! — Alguém gritou.

Logo, outras vozes se juntaram ao coro, oferecendo valores para comprar a Ômega.

— Oitenta!

— Cento e dez!

— Mas que porra é essa!? — Francis se dirigiu ao Alfa lúpus que o recebeu. — Estão leiloando Ômegas?!

— Este leilão vende qualquer produto que um Alfa deseja, e Ômegas estão no pacote principal. Você foi permitido estar aqui devido ao seu valioso item e, é claro, por ser quem é. Mas não vamos admitir uma rebelião aqui dentro. Portanto, ou o senhor volta para a sua cadeira e continua participando do leilão, ou pode recolher seus ganhos e se retirar imediatamente.

 — Ou eu posso cortar sua maldita garganta e usar seus órgãos como isca! — Antes mesmo de puxar suas espada, dezenas de armas foram apontadas em sua direção. 

— Essa opção não existe. — O Alfa permaneceu calmo.

Francis respirou profundamente, largando o cabo da espada devagar. Ele olhou para trás e voltou a se sentar em sua cadeira, ouvindo os Alfas continuarem a lançar seus preços.

Poderia matar alguns daqueles Alfas e fugir sem nenhum problema, mas com isso, tinha cem por cento de certeza que aquela pobre Ômega pagaria brutalmente por isso.

— Trezentas moedas de prata!

— Mil moedas! — Capitão Francis gritou por cima. Ouviu-se um murmurinho de vozes espantadas entre os compradores. O Alfa que havia dado o último valor, abriu a boca para cobri-lo com mais um lance, quando o Ômega lúpus adicionou: — De ouro.

O Alfa fechou a boca e a manteve desse jeito. Ninguém contestou o valor, e a Ômega foi vendida para o Capitão Francis. Ela foi entregue apenas quando o lúpus retornou trazendo mais moedas, e pagou pelo “produto”.

A garota manteve-se com a cabeça baixa durante o percurso. Assim que deixaram aquele lugar funesto, Francis cortou as amarras que prendiam as mãos dela e perguntou seu nome. Ela respondeu com voz baixa e trêmula:

— Haesun…

— Olhe para mim — ele pediu com voz calma, erguendo seu rosto com suavidade. — De onde você é?

— Busan… fui tirada dos meus pais em uma invasão na cidade.

— Levarei você até seus pais. 

— Está falando sério? 

— Sim. — Ele sorriu, surpreso quando a Ômega o abraçou.

— Obrigada! Não sei como lhe agradecer.

— Apenas mantenha-se forte. 

Francis segurou firmemente na mão da garota, e a guiou até seu navio. Ele ordenou que comida fosse servida a Ômega e dirigiu-se até a cabine. 

Tinha esquecido completamente que havia deixado um Alfa amarrado ali. Ele abriu a porta e caminhou até a mesa, onde apoiou ambas as mãos e ponderou com a cabeça baixa:

— Aquele lugar… Como eles ousam fazer isso?! — Ele socou a mesa. — Mas nem que seja sozinho, eu vou acabar com esse maldito leilão!

— Do que está falando? — Seungho o lembrou de que ainda estava ali.

Francis não respondeu. Ele abriu o diário de bordo e anotou algumas informações, em seguida, ele transferiu Lee Seungho no porão, para acomodar Haesun em sua cabine.

E lá o Alfa permaneceu até que foi deixado em uma ilha, dois dias após partirem da Ilha de Nabuco.

— Você não pode me deixar aqui! — O caçador estremeceu com a ideia de ficar sozinho naquela ilha.

— Há muitas árvores nessa ilha, você não vai morrer de fome. — Francis suspirou, observando a faixa de terra. 

— Mas-

— Você prefere a prancha?

Lee não respondeu. O Capitão permitiu que ele continuasse com uma pequena faca, mas a katana e demais armas foram confiscadas. 

O Luna seguiu navegando para o Norte, e dentro de alguns dias, eles já estavam ancorados próximo a costa coreana. O navio ficou escondido em uma enseada, enquanto os piratas desceram botes para chegar até a cidade de Busan, por meio de uma praia distante do Porto, para não chamarem muita atenção.

Capitão Francis acompanhou de longe quando Haesun foi recebida com surpresa e grande alegria pelos pais. Com as runas lunares em sua posse, ele procurou por um ferreiro que fosse habilidoso o bastante para conseguir entalhar no cabo de sua espada, algo que ele meramente enxergava de maneira diferente.

— O que é isso? — O ferreiro perguntou ao abrir a pequena arca. 

— Runas.

— Runas? Eu nunca vi runas desse jeito.

— Elas são um pouco diferentes devido ao brilho. — O ferreiro encarou-lhe com o cenho franzido. — Encontrei elas no Submundo de Nabuco.

— Oh, Nabuco… O comércio está voltando a crescer por lá? — Ele perguntou, enquanto fazia seu trabalho. 

— Mais ou menos… tudo depende do quanto você tem para vender ou comprar. 

— Eu gosto de Nabuco. Um dia eu voltarei para aquela ilha indômita.

O ferreiro sorriu para ele e foi retribuído. O Capitão aguardou enquanto as runas eram entalhadas, não pretendia ficar passeando pela cidade, arriscando topar diretamente com oficiais da Marinha. Embora não tenha visto muitos desde que pisou na cidade.

— Aqui está — o Ferreiro entregou a espada, meio sem jeito. — Espero que tenha ficado como esperava.

— Está perfeito! — Francis encarou o objeto com grande sorriso, o que para o ferreiro foi um pouco estranho, já que para ele não havia nada demais alí. — Obrigado. — Ele entregou um saco com o pagamento e guardou a espada na bainha.

Conforme ele voltava para a enseada em que os botes foram presos, o Ômega ouviu uma discussão calorosa vindo da praça mercantil. Curioso por ouvir a voz de algum de seus Alfas, ele decidiu averiguar o que estava acontecendo e resolver o impasse. 

Os piratas estavam discutindo com uma Alfa de cabelo longo e preto. Ela mantinha uma pistola apontada para um Alfa, mesmo que mais três estivessem em sua direção.

— O que está acontecendo aqui? — O Ômega se aproximou. 

— Essa insolente jogou uma pedra na minha cabeça! — O pirata que estava na mira da pistola, e que também apontava a sua contra a Alfa, explicou.

— Você derrubou um vaso muito caro! — Ela rosnou. — Vai pagar por ele!

Os piratas voltaram a gritar, despejando ameaças e maldições a comerciante. 

— Chega! — O Capitão deliberou. — Eu disse para não chamarem atenção, e vocês fazem esse escarcéu bem no caralho da praça! — Os Alfas trocaram olhares encabulados e baixaram as armas. — Desapareçam daqui!

Os piratas fizeram como o Capitão ordenou e sumiram como fumaça, evitando assim que uma aglomeração se firmasse em volta da briga, e chamasse atenção dos oficiais.

A Alfa, que mantinha a pistola ainda mirando nos piratas, voltou sua atenção para o Capitão Francis mas franziu as sobrancelhas quando o viu recolhendo os resquícios do vaso. Ela apontou a arma na direção dele e observou, mas o Ômega não ofereceu qualquer ameaça. 

Assim sendo, ela guardou a pistola no próprio cinto e cruzou os braços, enquanto assistia o outro tentando consertar a bagunça.

— Quanto custa esse vaso?

— Dez moedas de prata. 

— Tudo isso!? Quem pagaria por essa coisa feia?

— Pessoas que entendem da sensibilidade das coisas… — Ela respondeu muito ofendida. — Para um Ômega, você não parece muito sensível.

— Não devia rotular as pessoas assim. — Ele entregou as moedas. 

— E você deveria manter a coleira dos seus Alfas presa, Capitão Francis.

— Você sabe quem eu sou?! — Ele indagou chocado.

— Claro que sei — Ela puxou um pergaminho entre suas coisas e o abriu diante do Ômega. Era um cartaz de procurado, em seu nome.

— Está errado, a cicatriz na minha sobrancelha fica do outro lado… — E indicou no próprio rosto. — Espera, por que você guardou um cartaz meu?

— Não é da sua conta. — A Alfa dobrou o papel de qualquer jeito e o guardou novamente.

Na verdade, ela havia considerado aquele Ômega muito belo, e seu sorriso encantador. Por isso havia guardado quando o cartaz foi distribuído por toda a cidade. Não queria usar para identificar o procurado, mas para admirar sua beleza.

— Nossa… — Francis não esperava por aquilo. Geralmente, a maioria dos Alfas temiam simplesmente falar com ele, e até mesmo se aproximar apenas. Mas aquela florista o tratou como alguém comum, mesmo sabendo quem ele era. Aquilo soou divertido e interessante, para ele. — Você é sempre tão grossa assim com todos?

— Sim, com quem merece. Por exemplo, pessoas que fazem pouco da minha arte. — Ela contou as moedas para conferir. — Mas com os meus clientes eu sou um amorzinho.

— Hmm… pois então eu gostaria de comprar algumas flores, por favor.

— Você é mesmo um-... — A Alfa suspirou, rapidamente compreendendo a intenção de Francis, quando ele sorriu. — Tudo bem, o que vai querer?

— Eu não entendo muito bem, senhorita…?

— Sarah.

— Pois então, poderia fazer o favor de me explicar, Sarah?

A Alfa assentiu. Primeiramente, ela escolheu um ramalhete de flores amarelas e começou a explicar, seguindo de outros pequenos ramos de cada espécie de flor. 

Francis inclinou um pouco mais para prestar atenção. Era curioso como Sarah mudou tão drasticamente a sua personalidade, de uma hora para outra. Nem mesmo parecia aquela Alfa arisca de minutos atrás. Ela falava sobre as flores com tamanha delicadeza e doçura.

— E aquelas ali atrás? — O Ômega mostrou alguns ramos escondidos embaixo de uma lona.

— Ah, essas não chamam muita atenção por serem as mais baratas. — Ela pegou alguns ramos de cada cor e adicionou sobre a bancada, na frente do Ômega. — São tulipas.

— São lindas, imagine um jardim inteiro cheio delas... Cada pétala parece que foi adicionada à mão, com muita delicadeza e cuidado... — ele afirmou. — Do jeito que você gosta, certo?

Quando ergueu o olhar para encarar a florista, Francis percebeu que ela estava sorrindo para ele. 

— Sim. Isso mesmo. Como o vaso que seu subordinado quebrou.

— Você o fez à mão? — Ela assentiu. — Desculpe… não quis ofender naquele momento. Ele realmente era feio… — Sarah cruzou os braços com o cenho franzido. Ele prosseguiu: — Mas é muito lindo como você defende o que gosta.

— As pessoas não dão o devido valor às coisas simples… — Ela lamentou tocando em uma pétala, desfazendo a postura defensiva. — É bom reservar um momento e fazer algo você mesmo, para depois apreciar. Não vendo flores apenas pelo lucro que vou obter. Eu realmente gosto disso. Gosto de mexer com a terra e plantar cada bulbo… você consegue me entender?

— Não tenho certeza… mas eu amo navegar. Gosto quando as velas são içadas, e o navio atinge maior velocidade rumo ao oceano. 

— Sim. É por esse caminho… Já escolheu?

— Quero as tulipas.

— Foi uma ótima escolha, Capitão Francis. Combina com você.

— Está me chamando de Ômega barato? — Ele colocou a mão no peito, e fingiu estar ofendido.

— Não! — Ambos riram. Pegando uma por uma, a Alfa começou a criar um ramo colorido conforme explicava: — Tulipas são consideradas flores inferiores. São menosprezadas e subestimadas. Assim como os Ômegas. Só quem entende o quanto tulipas são especiais, consegue enxergar o verdadeiro valor de um Ômega. — Ela concluiu, entregando o ramalhete. 

O Capitão recebeu as flores e inalou seu perfume suave, quase inodoro. Ele apreciou as tulipas coloridas por um momento, sentindo-se tocado pelas palavras sutis da Alfa.

— Sua comparação foi muito gentil. Me sinto honrado. — Ela assentiu com um sorriso sincero. — Quanto custa?

— Não precisa pagar. Fique, como um pedido de desculpas pela minha grosseria de antes.

— Tudo bem… — Francis olhou à sua volta. A movimentação estava tranquila, sem a Marinha aparentemente. — Eu tenho que ir.

— Tem mesmo?

— Sim… A não ser que haja um motivo que me faça ficar. 

— Conhecer um jardim é motivo suficiente?

— Depende da companhia.

— Bom, eu fecho o estande ao entardecer caso esteja interessado. 

O Ômega se afastou lentamente, olhando para trás de vez em quando, só para ver se Sarah ainda estava observando. A Alfa não tirava os olhos dele, e fazia questão de demonstrar isso.

Assim que voltou ao navio, Francis decorou sua cabine com as tulipas. Os piratas estavam aguardando o Capitão retornar, para decidir o próximo itinerário e partir imediatamente. Mas ele abriu o diário de bordo e registrou informações sobre a Alfa florista que havia conhecido. Não estava em seus planos zarpar tão cedo de Busan.

Quando deixou a cabine, foi para informar que ficariam naquela enseada um pouco mais. Os piratas receberam a decisão com incertezas.

— Por que vamos ficar? — Abel perguntou. — Pensei que iríamos apenas deixar a garota e continuar com os saques.

— Houve uma mudança nos planos… — O lúpus comentou, caminhando até o parapeito do navio. Estava pensando.— Vamos ficar um pouco mais.

— Eu ainda não entendi porque essa repentina mudança. Só está atrasando nossos planos.

— Você não percebeu como o Luna está mais lento? — Ele girou, agora de frente a tripulação. — Vamos limpar o casco do navio.

— Não vejo nenhum sentido nisso. — O contramestre cruzou os braços. — Um nó a menos em velocidade não faz diferença alguma.

O Capitão poderia simplesmente fazer valer a hierarquia e seu poder, mas não era um tirano. Ele acreditava que a tripulação tinha voz e merecia sim ser ouvida. Mas o contramestre estava dificultando demais.

— Imaginem o seguinte cenário... — Francis caminhava entre a tripulação, estudando suas expressões enquanto articulava: — Um galeão repleto de jóias caríssimas e moedas de ouro... — os olhos dos piratas brilhavam. Eles já podiam sentir suas mãos naquele tesouro. Ele prosseguiu: — Além do porão cheio de produtos-...

— Vamos saqueá-lo! — Alguém gritou, os piratas festejaram jogando chapéus para o alto. 

— Agora imaginem o Luna perseguindo este galeão… 

— Já consigo ver o desespero deles… — Outro indicou, também sendo bem recebido.

— Sim, sim! — Francis disse com grande entusiasmo. Os piratas sorriam de uma orelha a outra. — Mas não vamos conseguir. Não vamos chegar nem perto do galeão — os sorrisos murcharam —, porque temos um nó a menos em velocidade, que não faz diferença para o nosso contramestre.

O Ômega estava diante de Abel, atrás dele estavam os muitos Alfas e Betas indignados. Ele estava com os braços cruzados e sorriso presunçoso, encarando o Alfa contramestre.

— Os corais invadiram sua cabeça, Abel!? — A tripulação se revoltou.

— A gente vai limpar a porra do casco! — Apontaram o dedo para dele, esperando alguma oposição de sua parte.

— Tudo bem. — Abel engoliu em seco, e ergueu as mãos em desistência. — Não está mais aqui quem falou. 

— Ótimo, podem começar amanhã mesmo. — O Ômega afirmou, caminhando até a rampa. — Enquanto isso… podem festejar no convés.

— Está falando sério, Capitão?

— Sim. Agora tenho um compromisso, até mais tarde… — Ele desceu, acenando para os Alfas e Betas.

Os piratas foram buscar os barris, muito animados com a farra. Abel apoiou as mãos no parapeito e observou de longe o Ômega se distanciar.

Sarah estava desmontando sua exposição e guardando os produtos que não foram vendidos, organizando-os na carroceria de uma carruagem. Ela olhou para cima e observou o céu começando a ganhar um tom alaranjado. Não havia nem sinal do Ômega.

— Sarah, sua idiota. Por que tinha que ficar dando coices tal como uma égua? É por isso que os Ômegas se afastam de você... — a Alfa comentou com si própria. — É claro que ele não voltaria. Por que ele iria voltar? Ele é bonito, amável e inteligente. Ele é o Capitão da porra de um navio! — Ela concluiu, acomodando os últimos ramos.

Quando fechou a porta e dirigiu-se até o lugar do cocheiro para guiar os cavalos, Sarah teve uma agradável surpresa. Francis já estava sentado no banco ao lado das guias, esperando por ela.

— Você veio…

— Claro que viria. — Ele sorriu. 

A Alfa subiu ao lado dele e segurou as rédeas, para logo em seguida conduzir a carruagem, guiando os cavalos pelas ruas de Busan.

Sarah era uma Alfa diferente dos demais, porque não olhava o Ômega cobiçando o que ele poderia ter para lhe oferecer. É claro que sentiu-se atraída por ele, afinal, Francis era um Ômega atraente e muito bonito. Mas acima disso ele tinha muito mais a oferecer, e ela apreciava isso.

A cada vez que partia e passava uma longa temporada pelos mares, saqueando e multiplicando sua riqueza, o Capitão Francis sempre voltava para a Alfa. Sarah o recebia como se nunca tivesse se ausentado. 

Embora o mar fosse a sua casa, era com aquela Alfa que ele se sentia acolhido. Era com a Alfa que ele sentia uma espécie de proteção, não somente material mas psicológica também. Sarah era o seu lar. Ela despiu-se completamente para ele, e por ela Francis permitiu-se ser marcado.

🏴‍☠️👑🏴‍☠️

Mar Tenebroso - 1682

O Luna enfrentava uma tempestade pior do que as que aconteceram no Triângulo da Morte. O mar agitado jogava a embarcação para os lados, e as fortes ondas quase partiu os mastros. Contudo, as velas não conseguiram se manter com a mesma estabilidade.

— Vamos naufragar! 

— De jeito nenhum! — Abel rosnou. — Eu me recuso a deixar todo nosso ouro no fundo desse mar.

— Mas não podemos continuar. Nós vamos afundar!

— Não iremos. — Capitão Francis afirmou. 

 

O Ômega estava na proa segurando um cabo enquanto o vento e as ondas fortes atingiam o convés. Sem medo algum ele enfrentava a tempestade de frente, mesmo que o firmamento escuro ocultasse a lua e as estrelas.

Raios cortavam o céu à medida que os Alfas e Beta seguiam seus comandos. O Luna conseguiu sair da tempestade e retornar a calmaria do Oceano Índico. 

Os planos de percorrer o mar tão envolto de mistérios foram adiados, por hora, e a tripulação retornou à costa asiática, mais precisamente, o Reino da Coréia.

Como em todas as vezes, Sarah recebeu seu Ômega com muito entusiasmo, mas dessa vez ele não retornou sozinho. A Alfa podia sentir algo desenvolvendo-se dentro dele, além de, é claro, o ventre ter crescido na metade da gestação.

— Você faz ideia do quão arriscado foi deixar terra firme e navegar a caminho do Mar Tenebroso, na situação em que está?! — Embora feliz, a Alfa estava brava e preocupada. — Por que você escondeu isso de mim?! É claro! Você sabe que eu iria impedi-lo de voltar!

— Eu não sabia… — O Ômega confessou. Ele estava sentado no sofá, com as mãos apoiadas no ventre. — Comecei a sentir quando já estava longe demais. Não tinha como voltar.

— É claro que tinha! Você é o Capitão deles!

— Por que está gritando comigo? 

— Ore, porque-... — Ela hesitou.

Diferentemente do costumeiro sorriso que sempre estampava as feições do Ômega, ele parecia cansado e seus olhos estavam marejados. A gravidez estava deixando-o muito sensível. 

— Me desculpe… — Sarah diminuiu o tom. Sentando-se ao lado dele, ela segurou em sua mão. — Só estou preocupada.

— Não precisa se preocupar. Estamos bem. 

— Você pode ser temido por todo o mundo, mas nessa casa não. 

— Onde você quer chegar? — Ele a encarou desconfiado.

— Está decidido; a partir de hoje, você não vai sair de Busan até que tenha nosso filho.

— O quê?

— Usarei minha voz se for necessário, Francis Bonny, mas de perto de mim você não sai.

— Sabe que não pode, certo? — O sorriso vaidoso retornou. — Eu sou um lúpus. Sua voz não faz nenhum efeito em mim.

— É verdade… mas, que raiva! — Ela acabou sorrindo junto. — Sinto que você só ficará seguro se estiver comigo. 

Sarah tinha noção de todas as coisas perigosas que seu Ômega fazia. Ele era o Capitão mais rico e respeitado da era dourada da pirataria. Não havia falhas em suas invasões, até mesmo os galeões de guerra da Marinha Real recuam diante da bandeira de lua crescente.

Até mesmo capitães como Alma Negra, Fenn Barba-Ruiva e Edward Teach o temiam. Eles evitavam o Luna a todo custo. 

Mas todos os Alfas se tornam extremamente cuidadosos quando seus companheiros engravidam. Com Sarah não poderia ser diferente.

— Me desculpe… — Ele expressou, deixando-a confusa. — Eu sempre viajo e fico semanas, até meses fora. Mas você sempre me recebe com muito amor, e agora está preocupada. Eu sou muito egoísta mesmo.

— Você não é. Eu o conheci nessa vida e sabia exatamente o que me aguardava quando me envolvi com você. — Ela suavemente encaixou a mão no rosto dele. — Nunca permitiu que ninguém te dissesse o que fazer. Mas eu gostaria de acompanhar isso com você. É muito importante pra mim.

— Tudo bem. Eu ficarei.

Ela o beijou e abraçou logo em seguida.

— O mundo não vai acabar porque o Capitão Francis ficou longe dos mares por alguns meses.

— Quem disse que vou ficar longe do mar? — Ele sorriu. — Iremos para Nabuco. O Luna não pode ficar por tanto tempo assim em Busan. Ainda sou o Capitão deles e preciso cuidar da minha tripulação também.

— Estou de acordo. Estremeço só de imaginar que a qualquer momento a Marinha pode entrar aqui e levar você.

Sarah e Francis permaneceram juntos na casa de Yejun durante os meses que restavam para completar a gestação. Nabuco estava infestada de piratas, logo a Marinha Real não tentaria invadir, por enquanto.

A tripulação recebeu permissão para cometer pequenas invasões pelos arredores, e quando o pequeno Alfa nasceu, o Luna já estava ancorado no Porto de Nabuco novamente, trazendo consigo um grande aborrecimento que Sarah não permitiu chegar em seu Ômega, pelo menos durante algumas semanas.

— Vocês deveriam ficar em Nabuco — Yejun comentou, enquanto passeava com seu netinho pelo cais. — Eu poderia ajudar a cuidar do Jack…

— Eu não gosto dessa ilha — Sarah foi sincera. — Ela é vulgar.

— Tomara que o Jackson não tenha essa sua personalidade, quando crescer...

— Meu pequeno vai ser forte como o pai, e sincero como a mãe. 

— Não dê ouvidos a ela, Jack — O Alfa sussurrou. — Seja amável quando crescer…

O pequeno Alfa sorriu, mexendo nos botões da camisa do avô. Três meses haviam se passado desde o nascimento de Jackson, e os piratas sentiam que já estava na hora de revelar ao Capitão o grave incidente envolvendo parte do ouro que o Luna transportava.

— Nós fomos atacados... — Abel foi o portador da notícia. — Alma Negra levou apenas quatro baús, porque o porão do Black Swan já estava cheio de cargas.

Capitão Francis fechou os olhos, inspirando profundamente. Poderia estrangular sua tripulação, um por um, mas estava com seu filhote nos braços, por isso se controlou. 

— Por isso ele passou por aqui de tão bom humor… Aposto que todas as tabernas de Nabuco sabem. Ele me fez de idiota! 

— Ele não te fez de idiota, você não tem nada a ver com isso — Abel opinou. — Fomos nós que perdemos o ataque.

— Eu tenho tudo a ver com isso. Eu sou o Capitão do Luna. 

Os piratas entreolharam-se encabulados. Conseguiram pôr uma mancha no histórico impecável do Capitão Francis, em apenas algumas semanas.

— Eu vou resolver isso. — Ele beijou a testa do bebê, e seguiu sozinho, conversando com ele pelo deque. 

Jackson adorava a companhia do pai. Ficava mais animado e soltava gritinhos quando ele brincava consigo. Francis cantava para ele, sentado no cais e de frente pro mar. Os olhos do pequeno Alfa brilhavam, quando prestava atenção no som da voz do Ômega.

Ao anoitecer, Francis voltou para casa, onde passou as últimas horas ao lado de sua Alfa e filho, para logo em seguida retornar para os mares. 

Seguindo as informações adquiridas pelas tabernas, a tripulação levou o Luna na rota em que Alma Negra navegava com o Black Swan. Tiveram sorte de encontrá-lo dois dias após zarpar do Porto de Nabuco. Mas ele não estava sozinho…

— Parece que ele está em um confronto. — A Alfa que estava na cesta do mastro informou.

Capitão Francis alcançou sua própria luneta e observou de longe. O navio de velas negras disparava seus canhões contra o de Edward Teach, e era igualmente atacado de volta.

— O que faremos, Capitão? — Abel chegou junto.

— Prepare os canhões — o lúpus ordenou puxando a espada. — Timoneiro, aproxime-se do Black Swan!

— Sim, senhor! 

Abel seguiu com o atirador e outros Alfas e Betas até os canhões. O Capitão estava com a espada em punho, no ponto mais alto na frente da embarcação. Ele sorria ansioso e cheio de si, conforme o navio se aproximava dos demais com velocidade.

— O Luna está se aproximando pela proa, senhor! — Black Caesar avisou.

Todos os piratas que estavam no Black Swan e também no Queen Anne's Revenge, olharam ao mesmo tempo na direção apontada pelo contramestre de Edward. 

O timoneiro do Luna girou o leme, fazendo a embarcação virar, deixando seus canhões direcionados para a frente dos navios inimigos.

— Fogo! — Capitão Francis rugiu.

A proa do Black Swan e do Queen foram recebidos por balaços dos canhões do Luna, as bolas de ferro fizeram buracos no casco dos navios, destruindo tudo pela frente. 

Os piratas se jogaram no chão do convés no momento dos disparos, para não serem atingidos. Tudo foi muito rápido. Quando se ergueram novamente, viram um Ômega lúpus com os olhos prateados, portando uma espada, pulando para dentro do Black Swan, segundos após os disparos dos canhões.

O vapor dos tiros ainda pairava sobre o convés quando ouviram o som de uma espada perfurando o abdômen de alguém, e sendo removida segundos após. À medida que o vento dispersava a fumaça, eles viram o Capitão Francis avançando contra os marujos com sua espada. 

Ninguém era capaz de pará-lo. O Ômega era simplesmente genial com seus ataques ágeis e certeiros. Nada o fazia temer. Nem mesmo Alma Negra, com seus olhos vermelhos e diabólicos vindo em sua direção.

— Então você está de volta.

Francis puxou a espada que estava enterrada no peito de outro marujo, o movimento fez o sangue que ficou na lâmina acertar o rosto de Alma Negra. Ele rosnou.

— Eu vim buscar o que é meu! — O Ômega apontou a espada para ele. 

— Deveria ter ficado cuidando do seu filhotinho. — Teach riu. 

— Credo, Edward — uma expressão de nojo assumiu o semblante do Ômega. — O que houve com seu rosto?

Quando alguém tentou lhe atacar lateralmente, ainda encarando o Alfa, Francis sacou a pistola e atirou para o lado. O pirata caiu morto instantaneamente ao lado. 

— Não me chama de Edward! — Rugiu. — Eu sou Barba-Negra!

— Barba-Ruiva, Barba-Negra… Um verdadeiro show de criatividade. — Francis riu, desviando de um ataque e fazendo Alma Negra bater com o rosto contra um mastro.

— Maldito Ômega! — Alma Negra avançou contra ele.

Os três navios trocaram mais tiros de canhão, estremecendo toda a estrutura de madeira. Os marujos do Luna também entraram na luta, e Edward Teach achou que aquela seria a melhor oportunidade para sua vingança, pelo Ômega tê-lo impedido de tomar o antigo Ranger.

Francis lutava contra Alma Negra quando uma espada surgiu em seu campo de visão. Ele inclinou para trás e a lâmina passou direto. Quando olhou para o lado, viu Edward Teach puxando a arma para logo em seguida lançar contra ele novamente.

— Essa luta não é nossa, capitão! — Black Caesar tentou advertir. — Vamos embora!

Mas Teach não deu ouvidos, e atacava o Ômega com fúria, junto ao capitão do Black Swan. Alma Negra lançou um barril contra Francis, que o acertou enquanto o Ômega se defendia de Edward. 

 

Francis bateu com as costas no parapeito, e quando Edward lançou sua espada para rasgar sua garganta, o Ômega escorregou caindo sentado no chão. Ele chutou o joelho do Alfa, fazendo-o quebrar para trás, e ele caiu com um joelho apoiado no chão.

O grito de Teach foi abafado quando a espada de Francis atravessou seu ombro. O Ômega errou, estava mirando o coração. Mas não tinha tempo para ser preciso no momento, estava lutando contra dois Alfas lúpus. 

Francis rolou para o lado quando Alma Negra apontou a pistola para ele, e disparou. Ele teve de se defender quando o Ômega ficou de pé e investiu a espada contra ele. Black Caesar ajudou Edward Teach, e junto a outros Alfas carregou o capitão deles até o Queen Anne's Revenge. 

— Agora é só você e eu. — O Ômega disse, apontando a espada para Alma Negra. Estava respirando pesadamente devido a intensa luta. 

Alma Negra estava com o braço rasgado, apoiado em uma caixa grande que continha alguma carga.

Com a fuga de Barba-Negra em seu navio, agora só restava a Alma Negra se render, ou lutar até a morte. Mas era covarde demais para a segunda opção, e ainda acreditava que poderia vencer. 

Mas Francis Bonny lhe mostrou através da espada, porque ele era considerado o maior pirata da história. O Ômega lhe fez recuar a cada investida vigorosamente feroz. 

Alma Negra podia ver a sua morte se aproximar através daqueles olhos prateados. 

— Ajudem-me! — O Alfa rugiu quando caiu no chão próximo da cabine, segurando a coxa rasgada. — Matem esse Ômega desgraçado!

— Eu acho que não... — Francis sorriu, parado de pé diante dele. Logo atrás, estava a tripulação do BlackSwan rendida no convés. Ele se abaixou até ficar na mesma altura que o Alfa. — Há uma grande diferença entre nós. Lembre-se disso, antes de ousar atacar o Luna novamente!

Abel e demais Alfas entraram na cabine e recuperaram os quatro baús, que Alma Negra estava ostentando em seu cômodo. Além disso, o Capitão Francis ordenou que todas as cargas que estavam na posse do infame pirata, fossem transportadas para o porão do Luna. 

— Devemos afunda-los, Capitão? — Abel perguntou, quando já estavam a bordo de seu próprio navio.

Francis encarou o navio inimigo. Do casco até aas velas mais altas, ele era completamente negro. A embarcação estava toda acabada, mas como filho de um mecânico ele sabia que o Black Swan poderia ser bem mais que aquilo. 

 

O Ômega olhou para cima e observou por alguns segundos o cisne sombrio, com as asas abertas, que estampava a bandeira do navio. 

— Não. — Ele por fim respondeu.

— Alma Negra não merece sua compaixão!

— Não estou fazendo por ele — Francis suspirou, ainda encarando a bandeira. — Esse navio é magnífico. Seria um pecado mandá-lo para o fundo do Pacífico assim. Além do mais, eu acredito que um dia o Black Swan terá um Capitão digno que fará jus a ele. 

— Se está dizendo. — Abel deu de ombros. 

— E quando foi que estive errado, Abel?

— Capitão, com todo o respeito, o senhor é um exibido!

Francis riu divertindo-se, o Alfa também.

— Vamos pra casa — o Ômega decidiu. — Quero ver meu filho e minha Alfa.

Abel assentiu e junto ao timoneiro marcou a rota de volta para Nabuco. 

🏴‍☠️👑🏴‍☠️

Retornando para a Ilha de Nabuco, Francis recebeu a notícia de que seu pai havia decidido mudar-se para Busan, para ficar mais perto de seu neto. A princípio o Ômega não entendeu bem a decisão, Yejun amava aquele estaleiro e estava decidido a jamais entregá-lo em outras mãos.

— Agora tenho algo mais importante — o Alfa explicou. — Tenho meu pequeno netinho para ensinar a consertar coisas. Assim como ensinei meu pequeno Ômega. Para isso eu preciso estar em Busan, já que a Sarah não quer ficar em Nabuco.

— Não mesmo. — A Alfa disse com os braços cruzados, irredutível. 

— O senhor vai gostar de Busan — Francis sorriu para o pai. — E vai ter muito para gastar.

— O estaleiro não vale tanto assim. Isso se eu encontrar alguém que queira comprar.

— Não se incomode com isso. Não precisa mais trabalhar tanto. — O Ômega argumentou. — Seu filho tem um porão cheio de ouro. Aproveite a aposentadoria.

— Acho que tem razão. Dei meu sangue por esse estaleiro, e a troco de quê? Está na hora de descansar.

Francis levou o Luna com sua família até a Coréia. Eles tiveram de ancorar um pouco distante, escondidos na enseada de uma praia um pouco distante, como sempre. Yejun se instalou na casa de Sarah, a pedido da própria e do filho. 

Busan - 1688

Com os anos que se passaram, o Capitão Francis e sua tripulação continuaram enchendo o gigantesco porão do Luna, com tudo o que há de mais valioso. Sempre que podia, o Ômega retornava rapidamente para a Coréia, não aguentava ficar tanto tempo longe de sua Alfa e filhote.

Mesmo tendo um Ômega Capitão pirata, extremamente bem sucedido, Sarah manteve a profissão de florida, pois ela realmente amava aquela atividade. 

Certo dia ela trouxe alguns bulbos de tulipa e os plantou no jardim. A floração das tulipas durou cerca de quinze dias, até que na frente da casa estava exibido um lindo tapete de flores roxas.

O pequeno Jackson de apenas seis anos estava sentado entre elas, com seu bonequinho de madeira observando o pai lhe mostrar sua habilidade com a espada. 

— Papai, me ensina a lutar assim também, com sua espada. 

— Você ainda é muito pequeno, poderia se machucar. — O Ômega embainhou a espada, pegou uma vassoura e caminhou até ele. — Mas podemos usar isto. 

— A gente vai varrer a rua ou algo do tipo? — Jackson cruzou os braços.

Francis forçou a vassoura no muro e usou seu peso quando quebrou o cabo em duas partes, entregando uma para o menor. O menino desfez o bico irritado e recebeu sua arma improvisada, com muito entusiasmo. 

Jackson tentou imitar os movimentos de seu pai, achando que seria muito fácil vencê-lo. Mas em todos os ataques ele era lançado ao chão.

— Contra um adversário mais forte, seja ágil — Francis ensinou, ajudando-o a ficar de pé novamente. — Use a força dele contra ele mesmo.

— E quando ele for muito forte e muito ágil? — Jackson perguntou. Estava se referindo ao próprio pai.

— Encontre um ponto fraco. Todos têm.

— Não é por nada, mas… — o Alfa iniciou, disfarçando enquanto mexia nas flores. — Papai, qual é seu ponto fraco?

Francis ergueu as sobrancelhas, chocado. Ele instantaneamente começou a rir. Jackson era muito fofo, tentando desesperadamente encontrar uma abertura para vencê-lo. Nem ao menos conseguia disfarçar. 

— Seu inimigo não vai revelar isso pra você, meu pequeno. — O Ômega sorriu, acariciando o cabelo castanho do menino. — Precisa descobrir sozinho.

— E como eu posso fazer isso?

— Pensando. Não ataque apenas cegamente, observe bem seu adversário, como se mexe, como se apóia, se usa pouco algum membro. Pense, Jack. 

— Entendi… — o Alfa suspirou. — Eu vou treinar muito até ficar forte igual a você, e aí vou te vencer!

O Ômega sorriu orgulhoso.

— Eu acredito que vai conseguir. É um garoto muito forte e esperto.

Jackson também sorriu, e acompanhou com o olhar o pai se distanciando e entrando dentro de casa. Com isso, o Alfa voltou a brincar, dessa vez, usando o cabo partido que recebeu.

— Toma isso! — Ele lançou vários ataques contra as tulipas, destruindo todo o jardim. — Morra, tulipa maldita! Você não é páreo para o Capitão Jackson!

Minutos após o ataque de fúria às pobres plantas indefesas, Jackson escutou o chamado de seu pai e voltou para dentro de casa. Eles estavam com Yejun, terminando de fazer o jantar quando ouviram a Alfa rugir assim que chegou em Casa:

— Meu jardim! — Sarah encarava as tulipas destruídas com fúria nos olhos. — Quem destruiu as minhas flores?!

Francis ouviu os rugidos da Alfa, e percebeu que seu filho estava com os olhos arregalados.

— Jack… — O Ômega cobriu a boca. 

— Essa molecada dos infernos entrou aqui e destruiu todo o jardim! — Sarah entrou, rosnando irritada. — Vocês viram quem foi?

Jackson e seu pai trocaram olhares, e negaram com a cabeça. Yejun, que estava mais inocente na história, também não sabia dizer quem fez aquilo.

Sarah ficou brava durante dias. Seu humor foi estabilizando quando seu Ômega juntamente com o filho, ajudaram a refazer o jardim destruído, plantando mais bulbos. E no período de quinze dias, as flores estavam ostentando sua beleza novamente.

Francis passou a ficar mais tempo em terra firme, o que não agradou muito sua tripulação. Mas foda-se. Ele tinha um filho e uma Alfa, e não podia simplesmente abandoná-los para viver apenas no mar. Queria acompanhar ao máximo o crescimento do seu filho.

Jackson gostava de ouvir as histórias que Francis contava, sobre suas aventuras em alto mar. O Ômega queria muito que seu filho enxergasse as lindas runas que brilhavam na mesma tonalidade que a lua, mas ao invés, por acidente, ele descobriu que o menino podia ver além das runas do sol, algo que ele não podia. 

Era a antiga escrita utilizada entre os Alfas lúpus. Assim como as runas lunares eram para os Omegas.

A felicidade era algo presente naquela residência. A casa tinha uma aparência alegre, com flores decorando os cômodos. Nada muito exagerado. Mas com o passar do tempo, uma desolação se abateu quando uma doença que estava se fortalecendo na época abateu-se sobre Yejun.

Com o corpo marcado pelo trabalho de longos anos, o Alfa não conseguiu resistir por muito tempo. O sorriso que sempre estampava o semblante de Francis Bonny foi substituído por lágrimas de uma tristeza incapaz de descrever.

Mas ele não estava sozinho. Francis podia sentir o imenso amor e apoio de sua Alfa através da marca, e do símbolo máximo do sentimento que um nutria pelo outro cada vez mais, seu filho Jackson.

Sarah criou um lindo jardim no local em que Yejun Bonny iria descansar por toda a eternidade. E a tristeza que se abateu sobre o Ômega foi substituída pela certeza de que Yejun estava apenas descansando em um lugar muito bonito, ao lado de seu outro pai Ômega. 

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Ilha de Nabuco - 1689

Alguns meses após realizar os últimos saques, o Luna estava de volta à ilha para negociar as cargas que haviam conseguido. Mais ouro foi adicionado ao porão, dividindo o espaço com as provisões de viagem, e agora estava impossibilitado de armazenar uma única moeda.

— Precisamos esconder esse tesouro. — Abel comunicou em uma reunião. — Saqueamos mais do que conseguimos gastar. Vamos esconder todo o ouro, para assim poder conseguir mais.

— Que ambicioso — um Beta riu, mas concordou logo em seguida: — quanto mais riqueza melhor.

— Temos um verdadeiro império em nosso porão. Somos os mais ricos de todo o mundo! 

— Um império… — Francis murmurou, vendo a euforia dos piratas. — É assim que ele será chamado. O nosso tesouro. Imperium.

— Gostei — Jihoo assentiu. — Demonstra poder. 

— É o que somos. — Abel parou ao lado do Capitão. — Os mais poderosos, os mais temidos. Somos a maior e melhor tripulação!

Francis sorriu, observando o entusiasmo dos piratas.

— Precisamos de um lugar muito bom pra esconder o Imperium. Mas onde?

— Nos mares além do Mar Tenebroso. — O Capitão sugeriu. 

— É muito perigoso — Abel engoliu em seco. 

— Por isso mesmo. Você disse que somos os melhores, então… Prepare o itinerário. Mas antes eu preciso passar em Busan. 

— Sim, senhor.

Antes de partir na longa jornada, o Capitão Francis retornou a sua casa na Coréia, para informar a Sarah sobre a possibilidade de passar meses longe de casa.

— Tanto tempo assim? — A Alfa andou de um lado para o outro. — Esse mar por onde pretende navegar, eu já ouvi histórias sobre ele…

— Nós vamos conseguir. — Francis a tranquilizou. — Voltarei pra você e pro Jack. Eu sempre volto.

— Não demore muito… — Sarah observou o céu pela janela.

— Não irei. — Ele se aproximou e a abraçou carinhosamente.

— Papai… — o abraço foi desfeito quando ouviram o chamado do pequeno Jackson. — Você vai voltar logo?

Francis agachou-se na frente dele, ficando na mesma altura que o filho.

— Sim. Lamento não poder levá-lo agora, mas quando você crescer um pouco mais, eu vou te levar pra conhecer o mundo!

— O mundo todinho?! 

O Ômega confirmou balançando a cabeça.

— E no final de tudo, você terá uma grande surpresa. 

— Que surpresa?

— Não será uma surpresa se eu contar. — O Ômega sorriu, piscando com um olho.

— Tá bom! Eu serei um bom menino e vou esperar. 

Francis sorriu, abraçando o filho fortemente. Ele o encarou por um tempo, apreciando como Jackson poderia fisicamente com ele, apesar de possuir alguns traços de Sarah também.

— Eu te amo, Jack. — Ele o beijou na testa. — Cuide da sua mãe.

— Pode deixar, papai!

Após a despedida, o Luna zarpou mais uma vez rumo a um oceano tão desconhecido. Enfrentaram tempestades inimagináveis durante o tempo em que navegaram pelo Mar Tenebroso, conheceram lugares exóticos e muito especiais. Contudo, nenhum deles foi eficaz o suficiente para a tripulação decidir esconder o Imperium.

 

Quando finalmente Luna ancorou próximo de uma ilha situada ao Norte do Mar Tenebroso, a tripulação finalmente pode descansar da longa e cansativa viagem.

— O mapa já está pronto? — O contramestre perguntou enquanto eram levados por botes até a praia. 

—  Como poderia, Abel? — O Capitão franziu o cenho. — Nem sabemos onde exatamente vamos esconder o tesouro.

— Essa ilha me parece ótima. Está longe de tudo, deve ser definitivamente o fim do mundo. Somente os loucos viriam até aqui, e isso quer dizer, apenas a gente.

Francis riu, concordando. 

A tripulação havia decidido, aquele seria o local para esconder o Imperium. E tudo melhorou quando eles descobriram que havia um poço naquela ilha, onde as lendas locais dizem que escondia uma enorme quantidade de ouro. 

Animados com a informação, os piratas decidiram procurar pelo tal lugar, mas nada encontraram além de um enorme fosso profundo, que levava a um espaço com mais quatro passagens, na qual eles não faziam ideia de para onde levavam. 

— Faremos o seguinte, quatro duplas seguem os túneis e volta aqui para dizer o que tem do outro lado. — Ele resolveu, distribuindo quatro tochas.

— E se não tiver nada? — Alguém perguntou.

— Então você retorna para reportar. — Abel suspirou irritado. — Será possível que vou precisar explicar como se anda, também?

— Não, senhor. 

Todas as quatro duplas seguiram cada uma através de um túnel. Havia um acampamento montado ao redor da entrada do fosso, apenas esperando descobrir se era possível esconder o Imperium ali. 

Dentro de poucos minutos, a primeira dupla retornou afirmando que haviam encontrado um grande salão vazio, nada mais. Mas a tripulação decidiu esperar pelos demais, para saber se realmente já existia algum tesouro por lá.

Contudo, horas haviam se passado e as três duplas restantes não retornaram. Outros decidiram ir atrás, mas igualmente não retornaram. Nem nas horas seguintes, nem mesmo em dia algum.

— O que acha que aconteceu com eles? — Francis perguntou ao contramestre.

— Quem se importa? O salão é grande o suficiente para esconder todo o tesouro. 

— Eles eram bons companheiros.

— Que pena… — O Alfa fingiu. — Já podemos então levar o Imperium até o salão?

— Sim, vão na frente. Vou terminar o mapa e estarei indo logo em seguida. 

O contramestre assentiu, deixando o Ômega em sua tenda. Assim que se viu sozinho, Francis começou a desenhar o mapa, escrevendo algumas informações com as runas lunares, para que apenas ele conseguisse enxergar. 

Como um amante da Lua, Francis era fascinado por suas fases, ele acreditava que cada uma delas manifestava uma força diferente, além de interferir no estado das marés. Assim que concluiu, ele deixou o mapa sobre a mesa e desceu o fosso, para encontrar-se com demais bucaneiros.

O grande salão no final do primeiro túnel estava repleto de um tesouro imensurável. Era literalmente um verdadeiro Império que foi depositado alí. O esforço de saques, batalhas, perdas e glórias estava bem diante deles. 

— As pessoas se matarão, para tentar encontrar esse tesouro. — Abel riu. — E somente nós sabemos onde está. Terminou o mapa certo, Capitão? 

— Sim, eu terminei. — O Ômega adicionou junto ao tesouro uma pequena arca, onde dentro estava  algo de mais valioso para ele. — Vamos embora.

— Mas já? Eu queria saborear este momento um pouco mais.

— Vai poder saborear o porão do Luna cheio de ouro novamente — Abel afirmou. — Eu já quero voltar com os saques!

— Poxa, Abel. Precisamos de um tempo!

— Se quer tempo para vadiar, está na tripulação errada. 

Os Alfas retornaram pelo túnel, com o Capitão seguindo logo atrás. Ele marcou as paredes de terra com runas do sol, onde as mesmas foram absorvidas pelo material, e desapareceram aos seus olhos. Apenas um Alfa lúpus poderia enxergar aquele caminho. Em sua mente, este seria o seu filho, Jackson.

Assim que todos chegaram na superfície, trataram de encontrar alguma espécie de porta para adicionar a entrada daquele fosso. Se os locais acreditavam que havia um grande tesouro escondido ali, muito em breve poderiam encontrar o Imperium em suas buscas.

Os piratas encontraram uma grande pedra circular e levaram até a entrada. Ela era extremamente pesada, então alguns consideraram o suficiente para impedir a entrada de curiosos no esconderijo.

O Capitão Francis escreveu algumas palavras no extinto idioma lúpus, na parte inferior da pedra. Em seguida, eles adicionaram-na sobre o fosso, ocultando a entrada.

— Ótimo. Terminamos. 

— Na verdade, eu não acho que esteja muito seguro. Qualquer idiota pode quebrar essa pedra.

— Não vão conseguir. — O Ômega interrompeu o início de uma discussão. — A pedra foi selada, ninguém jamais conseguirá movê-la. Aquele que tentar quebrar ou utilizar qualquer arte para entrar no fosso, será amaldiçoado e morrerá sofrendo com grande hemorragia.

— E como vamos fazer para entrar e pegar o nosso tesouro?! — Abel quase surtou.

— Assim… — O Ômega sentou de joelhos diante da pedra, e utilizando runas da lua, ele desenhou quatro fases alinhadas um pouco distante uma da outra. — Pronto.

— Pronto o quê? 

— O mapa explicará tudo… — O Capitão disse, tocando em seu colar. — Vamos. 

Mesmo confuso o contramestre assentiu, e logo após desmontar o acampamento, eles comparam mais suprimentos para a viagem de volta.

Mar Tenebroso - 1690

Enquanto o Luna descia seguindo a rota pelo Sul, todos os piratas continuavam satisfeitos por finalmente estarem voltando para casa, ou seja, as invasões e saques a navios mercantes.

Abel foi o único que ficou pensativo sobre o mapa criado pelo Capitão. Depois de muito consultar o pedaço de pergaminho que mostrava onde encontrar o Imperium, mesmo que tenha participado de tudo, o Alfa não conseguia apontar a localização correta em um atlas, seguindo a orientação do mapa. 

— Não há nada aqui além de riscos e figuras desconhecidas — Abel se queixou ao Capitão. — É o mapa mais confuso que já vi em toda minha vida.

— Essa era a intenção. Desse jeito ninguém vai conseguir encontrar nosso tesouro.

— Com isso nós estamos incluídos também. Exceto você. Era o seu plano desde o início, não era? Assim ficaremos impossibilitados de traí-lo.

— Você encontrará as respostas que procura nos livros. — Francis suspirou, terminando de fazer as anotações no diário de bordo. — Eu não pretendo voltar ao esconderijo do Imperium sem vocês.

— Prove! 

O Capitão franziu o cenho. Ele segurou o mapa, podia enxergar cada palavra, cada coordenadora e curva do desenho. As runas brilhavam para ele, e para qualquer outro Ômega lúpus que pusesse seus olhos sobre aquele mapa.

— Tudo bem… — para surpresa e espanto do Alfa, Francis começou a rasgar o mapa. Ele jogou para cima e sete fragmentos voaram se espalhando. — Está satisfeito?

— O que você fez!? — Abel se jogou, tentando recuperar os pedaços. — Vamos colar!

— Não, não vamos colar. Vamos espalhar cada parte do mapa pelos sete mares. Então eu não terei mais acesso ao mapa, assim como nenhum de vocês. 

— Isso é completamente insano!

— O que seria da vida sem uma dose de desafios, Abel? 

— Capitão? — Alguém bateu na porta. — Há um navio se aproximando pela popa.

— Deixe-o se aproximar. — Francis sorriu para o contramestre. — Aí está. Entregue um dos fragmentos para eles.

— Então vamos ter de juntar todos os pedaços se quisermos encontrar o Imperium novamente?

— Isso não o deixa mais tranquilo? Apenas nós dois sabemos disso. Não posso fazer isso sozinho e certamente você também não.

— Tudo bem. Eu que criei o itinerário, logo tenho a vantagem aqui. — O Alfa disse, entregando as outras seis partes ao Capitão. Ele exibiu uma delas: — Vou entregar isso aqui a quem quer que esteja lá fora.

Era um navio seguindo seu rumo para o Brasil. O comandante da embarcação recebeu o fragmento com curiosidade, sem entender ao certo sobre o que se referia. 

 

O comandante fingiu estar muito agradecido, e quando o navio pirata se afastou, ele simplesmente jogou o fragmento em um canto qualquer do navio, que posteriormente iria parar nas mãos dos nativos do Brasil.

O Luna seguiu navegando para o Oceano Pacifico, deixando cada fragmento em algum lugar específico. Um deles foi guardado na cabine de uma embarcação mercante, junto às posses do comandante.

Certa noite, um Alfa dessa tripulação roubou o comandante do navio e tentou fugir para uma ilha que se localizava na Austrália. O Alfa foi capturado pelos nativos canibais e assim, um dos fragmentos permaneceu com o xamã dos nativos, na Ilha dos Kangaroo.

O último fragmento foi deixado em uma ilha próxima do Triângulo da Morte. A tripulação se perguntou o que estavam fazendo naquele lugar, já que aparentemente não fizeram nada por ali. 

— Foi apenas uma parada técnica. — Abel anunciou. — Ora, depois conversamos sobre isso.

Francis o encarou desconfiado, porém, nada disse. Estavam mais próximos de casa a cada milha que percorriam. O Ômega podia sentir por meio da marca o quanto Sarah sentia sua falta. 

Sua desconfiança aumentou com o passar dos dias. O ambiente estava exatamente igual aos dias que precederam o motim contra Benjamin Hornigold. Os piratas não conseguiam disfarçar, eram muito sinceros com suas expressões. 

À noite, enquanto o Luna navegava com velocidade reduzida, Francis chamou seu contramestre no convés superior, para uma conversa longe dos demais bucaneiros. 

Ambos estavam apoiados no parapeito, Francis observando o oceano completamente escuro, e Abel estava inquieto. Se ele o tinha chamado para conversar, então por que não estava falando nada?

— Diminuímos as velas como solicitou, Capitão. — O silêncio desconcertante o fez iniciar um diálogo. 

— Eu vi. — O Ômega continuou encarando o oceano.

— Por que me chamou aqui?

— Eu quero que você seja sincero comigo… — Francis suspirou quando virou o rosto para encarar o Alfa. — Pretende me trair, Abel?

— O quê!? Não! De jeito nenhum! Jamais, em toda a minha existência! Por que eu faria algo assim? Eu sou completamente fiel ao senhor…

Francis voltou a encarar o oceano enquanto Alfa explicava e repetia diversas vezes o quão fiel ele era. Parecia mesmo desesperado para provar sua inocência. Quanto mais exageradamente as pessoas se explicam, mais mentiras saem de suas bocas.

— Entendo. — O Ômega se retirou, sem dizer nada mais.

— Capitão?

Francis continuou seguindo sem olhar para trás, desceu as escadas, entrou no cômodo e trancou a porta. Ele ouviu passos apressados no teto logo acima de sua cabeça, provavelmente Abel correndo para alarmar a tripulação.

O contramestre contou à tripulação a sua versão dos fatos e envenenou a todos a bordo, sobre as verdadeiras intenções do Capitão. Decidiram eles mesmos serem os únicos a saber sobre o Imperium e o mapa. Para isso, era preciso que o Capitão Francis fosse silenciado.

O Ômega andou de um lado para o outro, puxou grande quantidade de oxigênio e o liberou aos poucos. Precisava manter a calma ou Sarah perceberia. Alguém bateu na porta, chamando por ele.

— Capitão? — Era a voz de Abel. — Capitão Francis?!

Francis olhou para a porta, mas não respondeu. As batidas começaram a ficar mais fortes. Ele correu até a mesa e abriu o diário de bordo. As batidas na porta foram sendo substituídas por chutes, e a madeira estava começando a ceder. 

O lendário Capitão Ômega molhou a pena em um tinteiro e abriu o diário na mais recente página utilizada. Sua impecável letra saiu tremida quando escreveu seu último registro:

22 de setembro, 1691

“Estou trancado na cabine enquanto eles tentam derrubar a porta. Cometi um erro confiando demais nesses Alfas. Eu não tenho medo da morte, mas lamento não poder encontrar o Imperium com você, Jack. Mas lembre-se; enquanto a Lua brilhar no céu, eu estarei lá por você.”

A madeira da porta veio ao chão, o primeiro a entrar na cabine foi o contramestre. Ele e demais Alfas e Betas estavam armados, se aproximando lentamente. Francis ergueu o olhar e encarou cada um deles, enquanto fechava o diário.

— Não faça nada precipitado… — Abel tentou argumentar, mas engoliu em seco quando o Ômega colocou a mão no cabo da espada e deu a volta na mesa, na direção deles.

— Se vai mesmo seguir com essa merda, então faça isso direito. — Ele sorriu, desembainhando a espada. 

Não havia medo em seus olhos. Ele avançou contra os traidores, alguns recuaram. Sentiu uma forte dor em seu ombro quando foi atingido por um disparo, mas ignorou. 

Quem segurava espada recuou pela porta e fugiram para o convés, os demais que estavam armados com pistolas dispararam para que ele parasse, não queriam matá-lo com suas próprias mãos. Eram covardes demais para isso.

Embora estivesse com seu ombro e perna feridos, o Capitão Francis atingiu um Alfa com sua espada e virou a lâmina acertando outro que estava ao lado e tentou fugir. Outro disparo na coxa o fez cair de joelhos. Alguém se aproximou para contê-lo e a mão que segurava a espada firmemente ainda teve força para lançar um último ataque, rasgando o pescoço de Jihoo, o timoneiro. 

Francis viu o chão da cabine se tornar escuro, e sons distantes tornando-se confusos em sua percepção, conforme perdia a consciência.

Abel saiu do cômodo, enquanto o médico cuidava dos ferimentos do Capitão, para em seguida amarrá-lo para que não tivesse chance de fuga. Alguns piratas seguiram o contramestre. Abel parecia distante, caminhando pelo convés sem rumo certo.

— Abel? — Um Alfa chamou mais uma vez. — Está me escutando, porra?! Não tá pensando em voltar atrás, hein?

— Não há mais como voltar atrás… Vamos levá-lo até Nabuco e… — Ele pigarreou, recobrando a postura. — Algum caçador dará conta do resto.

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Enquanto estava inconsciente, Francis se viu brincando com Jackson no jardim de Sarah, a Alfa estava tratando os bulbos de suas tulipas, sorrindo enquanto observava os dois. 

Vagarosamente a consciência lhe foi chegando, e quando abriu os olhos ele se viu sentado em uma cadeira. Sentia dor nos ferimentos mal cuidados, assim como em seus membros que estavam presos com bastante firmeza. 

Em sua frente estava Lee Seungho, o Alfa caçador que havia abandonado em uma ilha. Ele conseguiu sobreviver por semanas até que uma embarcação mercante o encontrou e lhe deu carona até Nabuco. De lá, ele partiu para Busan e se reportou ao seu líder. 

Foi compreendido que a missão era deveras difícil para ele, e por isso lhe foram atribuídas outras em seu lugar. Mas o Alfa jamais deixou de pensar em Francis. Ficou obcecado, e jurou que um dia o pegaria. E este dia chegou, com ajuda da tripulação do Luna.

O Alfa estava na ilha quando soube que havia piratas em busca de caçadores. Sabendo que se tratava de tal tripulação, o Alfa se reuniu com Abel e claramente aceitou o encargo de levar Francis Bonny até a Marinha.

— O que eu deveria fazer com você? — Lee sorriu, sentando de frente ao Ômega. — Talvez decepar suas mãos e abandoná-lo em uma ilha? O que você acha?

Francis apenas tossiu um pouco, sentindo a garganta seca.

— Imagine o que vão dizer, quando souberem que o futuro líder da Ordem de caçadores capturou o tão famoso Francis Bonny?

O Ômega encarou Lee e não conseguiu se conter. Ele riu, negando com a cabeça. Não era sua intenção provocar, mas aquele Alfa era patético demais. 

— Quem vai acreditar em você?

— O medo da forca o deixou burro de repente? — Lee gargalhou. — Estou te levando pra Coréia. Todos saberão que eu o levei à forca.

— Pessoas inteligentes irão contestar a sua versão. Está estampado na sua cara o quanto é patético.

Seungho deu de ombros, desacreditando. Ninguém seria esperto suficiente para subentender que as circunstâncias em que Francis Bonny foi capturado por Lee, eram suspeitas. 

Assim sendo, o Alfa deixou o Ômega sozinho no cômodo, e só voltou a vê-lo quando o navio ancorou em Busan. O Capitão foi levado até o quartel da Marinha, e rapidamente a notícia de que o célebre pirata havia sido capturado se espalhou pela cidade. 

Sarah precisou esperar por cerca de uma semana para que fosse liberada a única visita permitida ao condenado. Crianças não eram permitidas, o que era uma grande hipocrisia, visto que as execuções eram feitas em praça pública e todo mundo podia comparecer, inclusive as próprias crianças.

— Francis… — Sarah se aproximou devagar.

O Ômega estava sentado no fundo do calabouço. Ele abriu os olhos e respirou fundo quando enxergou sua Alfa do outro lado da cela, com os braços esticados. 

Francis levantou e caminhou com pressa. A velocidade estava reduzida devido às correntes presas em seus tornozelos e também aos machucados em seus membros.

— Eu vou te tirar daqui! — Eles se abraçaram como pôde, com a grade de ferro entre os dois. — Eu vou te salvar!

— Onde está o Jack?

— Não deixaram ele vir. 

— Eu quero que entregue isso a ele — o Ômega se afastou apenas para retirar seu colar e entregar a ela. — Diga a ele que é importante. Que não o perca.

— Não! Diga você! Você o verá novamente!

— Sarah…

— NÃO! Eu me recuso! Francis… — a voz dela falou. — Eu não posso…

— Você consegue, você é forte!

— Eu não posso sem você… 

— O Jack precisa de você. 

— Eu não vou suportar.

— Acabou! — Um oficial bateu na porta. — Hora de ir.

— Escuta, olha pra mim. — O Ômega pediu. Estavam ambos chorando pesadamente. — Cuida do Jack.

— Eu te amo... — Sarah fechou os olhos e encostou a testa na do Ômega. — Você pode me sentir? Eu estarei com você até o fim…

— Eu te amo, Sarah. — Eles foram separados com aspereza pelo oficial da Marinha. — Diz pro Jack que eu amo ele! Eu sinto muito!

A última visão que Sarah teve de seu Ômega, foi o mesmo encostado nas grades da cela, sorrindo para ela. Aquele sorriso era a personificação das coisas perfeitas, e ficaria eternizado em sua memória. 

A praça de Busan estava lotada de curiosos. Vieram até mesmo pessoas de outros reinos para assistir a execução com seus próprios olhos. Alfas, Betas, Ômegas e crianças esperavam a aparição do tão famoso Capitão.

Ninguém gritou ou vaiou quando Francis Bonny foi guiado até o tablado de madeira, montado para execuções de piratas. O silêncio era melancólico, o público jamais ouviu falar em qualquer atrocidade cometida por aquele Ômega. Apenas histórias contando o quanto o mesmo era incrivelmente forte e astuto.

Essas histórias correriam de pai para filho, por longos anos. Francis Bonny estava eternizado como o maior pirata de toda a história. Não havia Marinha ou Lee Seungho capaz de mudar isso. Seu nome seria temido até mesmo quando ele não estivesse ali.

O atual governador subiu no tablado e começou a discursar. Ninguém prestava atenção em suas palavras, eles estavam ali para ver o pirata. Francis sorria para as pessoas, confirmando tudo o que já ouviram falar sobre ele. O Ômega não temia nada, nem mesmo a morte. Estava prestes a ser executado, mas não tirava o famigerado sorriso presunçoso. 

Dois irmãos estavam se espremendo entre a multidão, tentando enxergar alguma coisa. O mais velho era um Beta e tinha 14 anos, o outro, um pequeno Alfa de 9 anos. 

— A mamãe vai me matar se souber que você está aqui! Vamos voltar, Jungkook!

— Não! Sai Jin! Eu quero ver! É o Francis Bonny!

— Vem! Menino teimoso!

— Me solta! — Os dois começaram a trocar tapas.

Do outro lado, outro Alfa tentava enxergar além da multidão. Jackson possuía a mesma idade que a outra criança Alfa, e fugiu escondido de sua mãe, para estar presente ali. Ele puxou um pequeno caixote e subiu, assim podendo enxergar o seu pai. 

Além da multidão estavam presentes o reverendo, alguns oficiais da Marinha, o suposto caçador que havia capturado o pirata e outras pessoas “importantes”, como o futuro governador, Park Shinsung. Seus dois filhos estavam em casa, longe de toda aquela violência. 

O mais velho, que se chamava Jimin, contava 3 anos de idade. Ele estava em cima de um banquinho para poder enxergar o mar pela janela de seu quarto. Já o mais novo, Jisung, possuía apenas 1 ano, e dormia tranquilamente em um berço um pouco mais atrás.

— Onde está seu tesouro? — O Governador se aproximou de Francis.

— Muito bem escondido. Mas qualquer um pode encontrar…

— Como? — O Alfa inclinou-se ansioso. Era sabido que Francis Bonny possuía o maior tesouro do mundo, e todos desejavam pôr as mãos em sua riqueza.

— O Imperium… — O Ômega murmurou. — Você o quer?

— Sim!

Francis riu.

— Há sete fragmentos do mapa espalhados pelo mundo. Encontre-os, e terá o mapa que leva ao tesouro.

— Está blefando! 

— Talvez sim, talvez não… — O Ômega suspirou. — Somente saberá aqueles que realmente forem dignos de encontrar o Imperium.

— Acabou. — O Governador afirmou.

— Você acha? — Francis o encarou, mantendo o sorriso. — Muitos outros virão depois de mim. Ômegas fortes, inteligentes e corajosos. — No exato momento em que Francis respondia o governador, Jimin estava com seus olhinhos brilhantes admirando o oceano, sem ao menos imaginar o que estava acontecendo naquela praça. — Esses Ômegas estão por aí, e um dia serão temidos e respeitados, como merecem.

— Em seus sonhos. — O Alfa rosnou, encaixando a corda e saindo de perto logo depois.

— Por que tanto medo? 

— Não tenho medo de você! — O Governador rosnou mais uma vez, se distanciando do Ômega preso por correntes e sendo vigiado por dezenas de marinheiros armados.

O Ômega suspirou negando com a cabeça, e voltou a encarar a população. Seus olhos de repente bateram contra os de Jackson. O menino estava paralisado, observando de longe a execução acontecer. 

“Eu te amo”. 

O Alfa leu as palavras nos lábios de Francis, seus olhos encheram de lágrimas quando o carrasco levou a mão à manivela. Ele queria correr e salvar seu pai, mas não tinha forças. Jackson apenas virou de costas quando aconteceu. 

O Ômega fechou os olhos, sentindo-se sufocado. O Ar faltou. Mas em sua marca, ele podia sentir a dor de sua Alfa, mas também o imenso amor que a mesma tinha por si. A escuridão o levou.

O aperto em seu coração e a sensação de sufocamento haviam desaparecido. Ainda mantinha os olhos fechados quando ouviu uma familiar voz chamando seu nome:

— Francis?! — Ele franziu o cenho. A voz continuou: — Não tenha medo. Abra seus olhos!

O Ômega fez assim como a voz aconselhou. Ao invés das muitas pessoas que estavam na praça de Busan, em sua frente estava o oceano que observava todas as manhãs. Ele estava sentado no cais, e podia ouvir o som das ondas batendo contra a coluna que sustentava o deque.

Podia sentir o cheiro da maresia e ver o céu tornando-se claro à medida que o sol aparecia no horizonte. Ele se levantou, olhou para trás e seguiu em busca da voz. 

Yejun estava parado, no lugar em que costumava ser o estaleiro, ao seu lado estava seu outro pai Ômega. Ambos estavam no centro de um jardim com muitas flores coloridas, inclusive tulipas, e sorriam para ele.

Francis sorriu de volta e correu, abraçando-os, e instantaneamente sendo correspondido

Jackson desceu do caixote quando um coral, lamentando, se espalhou pela multidão. Ele saiu correndo quase sem enxergar devido às lágrimas. 

Passou por baixo de uma janela onde o filho mais velho de Park Shinsung estava encarando o oceano. Jimin viu quando um menino Alfa passou correndo, chorando. No mesmo instante ouviu seu pequeno irmão começar a chorar também, e correu chamando pelas babás.

Jackson esbarrou em muitas pessoas até chegar em sua casa. Sarah estava sentada no sofá, encarando o nada. Já não sentia mais a marca no seu Ômega, isso lhe dava a resposta do que havia acontecido. 

— Eu odeio ele! — Jackson parou diante da Alfa, seus olhos vermelhos minavam lágrimas a cada palavra dita com fúria e dor. — Por que os piratas tinham que existir, mãe!?

— Jack… — Embora quisesse abraçar o filho, ela quase não tinha forças para sequer respirar.

— Se a pirataria não existisse, isso nunca teria acontecido! Meu pai estaria aqui! EU ODEIO PIRATAS! — Ele passou as pequenas mãos no rosto. — Eu o odeio! Espero que esteja no inferno!

— Jackson! Não fale essas coisas! — A Alfa se levantou quando o menino correu, mas sentiu as pernas falhando e caiu no sofá novamente.

O Alfa subiu correndo as escadas até seu quarto, e em um ataque de fúria começou a destruir todos os móveis. Ele não odiava seu pai de fato, e não desejava realmente aquilo que gritou. Ele odiava o fato de tê-la perdido, e de não ter sido forte o suficiente para impedir.

Os dois irmãos que antes brigavam pela praça, caminhavam lado a lado, também de volta para casa. O mais novo estava quieto, mas parecia muito impressionado.

— Eu disse a você, Jungkook. Aquilo não é coisa pra criança ver. Aliás, não é coisa pra ninguém ver. Agora você está abalado, e nossa mãe vai comer meu couro!

— Eu não estou abalado, Seokjin! Eu só… Você não ouviu o que ele disse? Outros virão em seu lugar.

— E o que é que tem?

— Imagine outros como ele… Isso seria muito foda, não é?

O mais velho arregalou os olhos, surpreso com o linguajar utilizado pelo outro.

— Onde você aprendeu isso?! 

O Alfa ergueu as sobrancelhas e cobriu a boca, correndo para espaçar da inquisição do irmão.

— Volte aqui! — Seokjin o perseguiu até a casa em que seu irmão mais novo vivia com um casal de pescadores.

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Triângulo da Morte - 1691

Abel e demais piratas da tripulação do Luna estavam navegando pelo Pacifico Sul, em busca do fragmento que deixaram na ilha perto do Triângulo da Morte. Estavam ansiosos para conseguir o mapa de volta. 

Diferente do que imaginou, Abel não se sentia mais tão entusiasmado. O remorso lhe devorava as entranhas, e não havia uma noite sequer, que o Alfa não se lembrasse da terrível traição. O tesouro já não lhe importava mais, havia perdido sua alma.

— Capitão Abel? — O atual contramestre o chamou. — O cozinheiro está nos chamando para o jantar.

— Já estou indo. — Abel permaneceu ainda pensativo na proa. 

Ninguém ali, incluindo ele próprio, merecia estar a bordo daquele navio. Embora eles fizessem parte da tripulação que juntou e escondeu o Imperium, ninguém de fato merecia usufruí-lo.

Era tarde demais para arrependimentos, mas Abel tomou uma decisão que, talvez não fizesse nenhuma diferença, mas ele não iria permitir que aqueles piratas seguissem suas vidas como se nada tivesse acontecido.

Abel desceu até o porão e espalhou pólvora e alcatrão por todas as cobertas, com exceção da cozinha. O cheiro forte começou a chamar a atenção dos marujos, e ele rapidamente subiu até o convés, travando todas as escotilhas para que ninguém mais conseguisse subir.

— O que está acontecendo aqui?! — Um Alfa rosnou, empurrando a grade. 

Abel apareceu caminhando vagarosamente, até parar a vista deles.

— Abel? Abra este caralho imediatamente!

— Não. — O Alfa respondeu calmamente.

— É algum tipo de piada?!

— Piada é…? — O atual capitão riu. — Levarei todos nós a um lugar em que realmente pertencemos.

— Do que está falando?! Abel? 

— Nos vemos no inferno. — O Alfa puxou uma pistola e caminhou até a escotilha da proa.

Ignorando os gritos desesperados dos piratas, Abel disparou em uma trilha de alcatrão, material altamente inflamável, fazendo uma chamada surgir e seguir caminho pela madeira e se espalhando rapidamente.

Várias explosões partiram do interior do Luna, no momento em que o fogo entrou em contato com a pólvora e outras substâncias. A embarcação afundou no Oceano Pacifico levando consigo todos os membros da tripulação que haviam traído o Capitão Francis, incluindo Abel.

Busan - 1693

Sarah não poderia ser chamada de mãe desnaturada. Ela tentou se manter forte, seguindo a vida e criando seu único filho. A dor de ter a marca arrancada tão violentamente, ainda acompanhou a Alfa durante meses. 

A única fonte de força que tinha era direcionada inteiramente para cuidar de Jackson, assim como seu Ômega pediu. Mas a debilidade em sua mente e coração chegaram ao corpo, e uma doença oportunista da época se abateu sobre ela.

Além de ter perdido o pai há dois anos, um ano depois havia perdido sua mãe. Agora, Jackson se encontrava sozinho no mundo. Ele tentou se virar como pôde, para sobreviver. Roubando coisas do mercado central.

Contudo, depois que soube que um garoto ruivo que também praticava pequenos furtos na região, havia sido levado por um caçador, ele resolveu dar fim às atividades criminosas.

Isso o levou a um longo período de fome, mas não iria permitir que os cães da Marinha pusessem as mãos nele também. 

Estava sentado na cozinha, com a testa apoiada na mesa, tentando pensar em algo que não fosse uma comida deliciosa, quando ouviu alguém entrando em sua casa. Alarmado, ele agarrou uma faca e esperou o invasor aparecer.

Era um Alfa alto, vestido elegantemente. Adulto, mas ainda jovem. Assim que viu a criança armada com uma faca, ergueu ambas as mãos para mostrar que não tinha intenções maldosas.

— Olá, Jackson. Meu nome é Lee Seungho, eu sou um caçador. 

O menino ergueu as sobrancelhas. Já ouviu falar sobre eles antes. As pernas começaram a tremer, mas conseguiu se manter firme, segurando o cabo da faca.

— Você veio pra me matar?

— Não. Eu vim aqui para levá-lo, se quiser vir comigo, é claro. 

— Me levar pra onde…?

— Para a Ordem. 

O Alfa continuou explicando sobre a instituição na qual se tornou líder por “seu grande feito”. Ele contou sobre as inúmeras regras, prós e contras de se tornar um caçador. 

Parecia ser algo muito difícil, se tornar um, mas apenas uma informação recebeu toda a atenção do pequeno Alfa. 

— Então eu vou poder matar piratas?

— Recebemos constantemente esse tipo de pedido. Então sim. Se você for aceito.

— Eu quero ir.

Lee conteve um sorriso vitorioso. Aquilo estava mais perfeito do que imaginava. Além de ter se tornado o respeitado líder da Ordem, teria o filho de Francis Bonny para si.

O próprio Lee treinou Jackson pessoalmente por  um tempo, mas logo as obrigações de seu cargo o impediram de acompanhar o progresso do Alfa de perto, quando o garoto foi enviado para ser treinado por outra pessoa.

Um jovem caçador foi designado para ser mentor dos novatos. Ensinar não estava em sua especialidade, o Alfa gostava mais quando se tratava se infligir dor física. Tortura era a sua arte. Mas ele aceitou.

Um grupo de Alfas, Betas e Ômegas aguardavam-no em um centro de treinamento, quando ele surgiu muito despreocupado e sorrindo para todos eles. Poderia ser uma cena normal, não fosse pela mancha de sangue em seu rosto.

— Ele parece ser bom. — Um Alfa de cabelo loiro comentou. 

— Ele é um fracote, Yoongi — Um Ômega ruivo revirou os olhos. — Vai por mim. 

Jackson estava muito próximo deles, e suspirou irritado por que os dois aprendizes não paravam de cochichar.

— Olá a todos. Sou Chanyeol, seu mentor. 

— Jura? — O Ômega ruivo questionou baixinho.

Yoongi e ele riram.

— Imagino que vocês já tenham uma certa ideia do que um caçador é capaz de fazer... — Chanyeol iniciou, escrevendo em um quadro algumas especialidade dos caçadores.

— Ei, Baek — Yoongi chamou o Ômega. — Aposto que aquele sangue no rosto dele foi de algum alvo que ele assassinou. 

— Tenho certeza que ele apenas esbarrou com a cara na porta. — Eles deram as mãos. — Tá apostado.

— Com licença? — Jackson ergueu a mão.

— Sim? — Chanyeol olhou para trás.

— Esses dois não param de conversar. Eu estou tentando me concentrar aqui, mas assim fica difícil.

— Ô Alfa metido — Baekhyun bateu as mãos na mesa quando ficou de pé. — Qual é o seu problema?

— Calma, gente — Chanyeol sorriu erguendo as mãos. — Não vamos nos exaltar.

— Os únicos que parecem ter algum problema aqui são vocês dois. Não param de falar nem por um minuto — Jackson ignorou o mentor, apontando para Baekhyun e Yoongi. — Não precisam aprender mais nada aqui. É só começar a falar e vão levar qualquer alvo à morte instantânea.

— Posso te levar a uma morte instantânea também — Yoongi afirmou, ainda sentado. — Te garanto que não será com palavras.

— Vocês são namorados ou algo do tipo? — Jackson franziu o cenho. 

Um lápis jogado por Baekhyun voou acertando a cabeça dele. Jackson partiu para cima do Ômega e Yoongi finalmente se levantou para ajudar o ruivo. Alguns outros também entraram na briga.

Chanyeol apenas sentou na mesa e assistiu os aprendizes batendo uns nos outros. No final da confusão, ele ainda ofereceu um prêmio para aquele que ele havia considerado o vencedor, ou seja, aquele que mais bateu.

Na aula seguinte ele levou os aprendizagem até uma das câmaras de tortura da Ordem. Os olhos de Chanyeol brilhava a cada aparelho que mostrava, o que fez com que todos os alunos permanecessem estranhamente quietos.

Como um bom mentor, ele observou os melhores da turma, mas que também não eram lá tão unidos como ele pretendia. Com isso, decidiu que algumas das pequenas missões de treinamento que fariam, seria em trios. 

É claro, ele fez questão de escolher os três melhores entre todos os aprendizes para ficarem juntos, na tentativa de uni-los. E funcionou.

Dentro de algumas semanas, ele notou algo de diferente. As ofensas e ameaças continuavam, porém, havia um certo respeito entre eles, e até mesmo admiração.

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Costa Leste da Ilha de Nabuco - 1696

Um navio mercante zarpou da ilha no momento em que todas as cargas foram acomodadas no convés. À medida que a embarcação seguia rumo ao seu destino, a tripulação transportava as caixas do pavimento superior até o porão.

Os novatos com idade inferior a dezesseis anos, chamados de grumetes, eram os mais explorados apenas por pertencerem à hierarquia mais inferior a bordo de um navio. Sem descanso, após levarem as cargas para o navio mercante, eles foram agora atribuídos pelos marinheiros a levar os produtos até o porão.

— Por que a gente tem que fazer isso? — Uma Alfa grumete resmungou.

— Cala a boca, Saori — Um outro exigiu, sussurrando. — Se eles ouvirem são capazes de-...

— Vocês dois! — Um marinheiro se aproximou. — Quais são seus nomes?

Os grumetes responderam respectivamente:

— Saori.

— Jungkook.

— Saori e Jungkook… — o mais velho analisou. Os dois estavam ajudando a transportar os barris. Sua mãos estavam com feridas de tão calejadas. — Quando terminarem aqui, vão limpar todo o convés.

— Sim, senhor — o menino abaixou a cabeça, agarrou o barril e continuou seu caminho.

— Isso é um absurdo! — Ele ouviu a voz de Saori e parou na intenção de observar por uma fresta. — Estamos cansados e esgotados! Nossas mãos estão em carne viva, isso porque vocês, marinheiros vagabundos, estão com preguiça de exercer suas funções! 

Os olhos do Alfa brilharam amarelos quando lançou o dorso da mão no rosto da menina. Saori caiu no chão de maneira imediata. Ele ainda distribuiu alguns chutes, e isso fez Jungkook largar o barril no chão com a intenção de correr ao seu auxílio, mas parou quando o marinheiro chamou outros:

— Prendam essa grumete no mastro. Ela será açoitada por tamanha insolência.

Ainda através da fresta, Jungkook observou a amiga ser levada pelos marinheiros até onde seu campo de visão limitado permitiu, mas ele pôde ouvir o barulho do chicote sendo desferido e lacerando-a.

O jovem grumete ergueu o pesado barril carregado com água novamente, e seguiu seu caminho trabalhando exaustivamente. Assim que terminou de acomodar toda a carga, ele apanhou um balde e um esfregão, e colocou-se a limpar o piso do convés sozinho. 

Com o canto dos olhos ele viu Saori ser retirada do mastro, estava tão débil que mal conseguia andar sozinha. Os marinheiros não tiveram sequer o cuidado de tratar seus ferimentos. Havia médicos a bordo, mas não para os grumetes. 

Jungkook esfregava o chão removendo a gordura e sujeira, pensando no quão cruel foi o castigo atribuído à Alfa, e como são cruéis os comandantes de navios mercantes. O que o menino não sabia era que existiam aqueles que eram ainda piores, mas ele estava prestes a descobrir isso.

Assim que jogou mais um balde com água e espuma, ouviu a correria e desespero da tripulação em virtude da aproximação de um navio pirata. 

— Bandeira vermelha! — O comandante gritou. 

Aquela cor significava que os piratas não teriam clemência em sua invasão. Em vão os marujos se armaram para defender o navio mercante, mas nada puderam fazer mediante o ataque iminente. 

Jungkook viu um navio inteiramente negro se aproximando a bombordo, estava severamente avariado, mas possuía vinte canhões muito poderosos em cada lado, e que ainda funcionavam perfeitamente bem. 

Se distraiu admirando a bandeira sombria com o insígnia de um cisne, não percebendo quando o convés estava inteiramente cheio de piratas, matando a tripulação do navio mercante sem dó, mesmo que já tenham se rendido. 

Jungkook olhou ao seu redor em busca de uma fuga rápida, mas estava cercado pelo oceano. Ele correu para se esconder atrás de uma tampa de escotilha aberta, mas o próprio Capitão o encontrou. 

— Olha só, um rato se escondendo — Alma Negra gargalhou mirando a pistola nele. 

— Não me mate… — Jungkook sussurrou.

— O quê?! — O pirata franziu o cenho. — Pede isso direito! A sua vida vale tão pouco assim?! 

— Não me mate. — O mais novo repetiu com mais firmeza.

— Por que eu deveria poupar a sua vida? — Alma Negra encostou o cano da pistola no queixo dele e ergueu seu rosto. — Você não é nada!

Jungkook respirou profundamente, encarando o capitão em seus olhos. Alma Negra viu seus olhos mudando para uma coloração avermelhada, o lúpus do mais novo estava furioso pelo que o capitão estava fazendo. 

Alma Negra franziu as sobrancelhas, se afastando para observá-lo melhor. Ele suspirou vendo que sua tripulação havia executado toda a tripulação do navio mercante, depois olhou para o menino outra vez. 

Jungkook ainda o encarava intensamente, porém, seus olhos voltaram para a cor negra natural. Alma Negra pensou que talvez seria uma boa vantagem ter aquele lúpus a sua disposição. O menino ainda era bastante jovem, logo ele poderia educá-lo à sua maneira e usá-lo como arma.

— Vamos levar este aqui. — O Capitão disse, puxando o mais novo pelo braço e seguidamente o empurrando. — Bem vindo ao Black Swan, grumete.

Jungkook tropeçou quando foi empurrado. Ele seguiu os piratas até a embarcação de velas negras, e assim que pisou no convés do navio pirata, Alma Negra ordenou que seus Alfas afundassem o navio mercante, e vinte tiros de canhão afundaram-no alguns instantes depois.

— Fique atento às regras do Capitão — o contramestre levou o novo membro consigo. — Aborrecer Alma Negra em qualquer ato que seja resultará em morte… Qual é o seu nome?

— Jeon Jungkook. — Ele respondeu observando tudo ao redor.

— Jeon? Por acaso você é filho do Estripador?

O garoto de fato era filho de Jeon, o Estripador, mas não respondeu.

— Vamos batizá-lo em Folsom! — O cozinheiro gritou. 

— Sim! — Outros concordaram. 

Alma Negra gargalhou, considerando a ideia estupenda. Logo, o navio desviou seu curso para a ilha referida. 

Jungkook tentou se adaptar àquela tripulação. O que dificultava era o comportamento extremamente selvagem dos piratas. Foi obrigado a cometer atos violentos contra inúmeras embarcações, como a que aconteceu no navio mercante em que havia sido encontrado. 

Sabendo que a punição para qualquer desobediência era a morte, ele seguia estritamente as ordens que lhe eram atribuídas. Ações que ele mesmo considerava bárbaro demais para sequer cogitar em fazer, contudo, haviam algumas coisas que ele tinha a liberdade de decidir por si mesmo, já que não influenciava diretamente o Black Swan.

Mas ele não era o único que se distinguia daquela terrível tripulação. Jungkook se uniu a alguns Alfas que, assim como ele, estavam a bordo do Black Swan apenas para sobreviver. 

Por enquanto…

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Japão - 1700

O recém eleito governador, Park Shinsung, estava em sua primeira viagem diplomática para garantir o desenvolvimento pacífico entre os Reinos. 

Sempre que fazia viagens, levava seus dois filhos consigo. Não confiava deixar os dois Ômegas aos cuidados de qualquer um. Eles poderiam entrar em contato com as “coisas do mundo ”, logo, o próprio Alfa teria um melhor controle da situação se sempre os mantivesse embaixo do seu nariz.

Um jantar foi oferecido pelo próprio Imperador, como um regalo de boas vindas. Os pequenos Jimin e Jisung estavam vestidos com seus trajes sofisticados, que custavam mais do que o salário dos empregados daquela mansão. 

A mesa da cozinha estava repleta de comidas deliciosas, prontas para serem servidas a qualquer instante. As crianças olhavam para os doces com os olhinhos brilhantes, mas não eram permitidos sequer entrar na cozinha. 

— Aqueles bolinhos pareciam tão bons — Jisung comentou passando a mão sobre a barriga. — Queria pegar pelo menos um, escondido.

— Não podemos — Jimin respondeu. Estavam dividindo um pequeno banquinho no jardim.   

— Mas eu tô com fome… Será que ainda vão demorar?

O mais velho olhou na direção do salão, onde os adultos conversavam distraídos. É claro que iriam demorar. Estavam ocupados demais com seus assuntos entediantes. 

— Você pode esperar só um pouquinho? — Jimin virou a atenção para o mais novo. Jisung suspirou entristecido, mas balançou a cabeça com um sim. 

Esse “pouquinho” do mais velho havia se tornado vários longos minutos. Jisung estava quieto com o queixo apoiado na mão, mexendo nas folhas de uma roseira que enfeitava bem ao lado. Com o tempo que se passou, obviamente sua fome havia aumentado.

Jimin sentiu vontade de comunicar ao seu pai, mas teve medo de ser repreendido. Precisava agir como um bom Ômega, e levar contrariedades ao seu pai não seria um comportamento exemplar. Mas não podia deixar seu irmão mais novo com fome.

 — Escuta, Ji… — Ele chamou o menor.

— Hm? 

— Eu tive uma ideia pra conseguir pegar alguns bolinhos… está disposto a ajudar?

— Sim! — Jisung pulou do banquinho.

— Precisa fazer exatamente o que eu disser…

Os adultos ainda conversavam no salão, quando Jisung caminhou distraidamente entre eles. Ele fingiu tropeçar nos próprios pés e se jogou no chão, com uma expressão chorosa.

— Ai, meu pezinho!

Todos imediatamente puseram sua atenção sobre o pequeno Ômega em prantos. Park Shinsung correu preocupado, com a intenção de amparar seu filho.

— Está doendo muito, filho? — O menino balançou a cabeça confirmando. — Mandem um médico imediatamente!

— Oh, coitadinho… — diziam algumas pessoas.

O alvoroço chamou a atenção daqueles que estavam na cozinha, e no momento em que eles saíram para espiar o que havia acontecido, Jimin se aproveitou para roubar quatro bolinhos e mais alguns doces para eles. 

Quando saiu da cozinha e estava prestes a passar pela janela, para fazer sinal ao seu irmão, um Alfa amigo de seu pai que fumava do lado de fora entrou em seu caminho. Estava tão distraído observando o corpo do menino, que não se importou com o que ele poderia estar levando consigo naquela bolsinha.

— Olá, Jimin. É bom vê-lo bem.

— Olá, sr. Guggenheim. — Ele parou para cumprimentá-lo.

— Que adorável. Diga-me, com quantos anos está?

— Doze.

— Hmmm… E já tem um noivo? — Ele pigarreou quando o menino arregalou os olhos. Jimin apenas balançou a cabeça negando. — Mas já teve seu primeiro heat, certo?

— O que é heat? 

— Oh, nada... — Ele tocou no ombro de Jimin e suspirou com um sorriso simpático. — Vou conversar com seu pai. Foi bom falar com você. Até breve.

Jimin sorriu com com educação, mas não respondeu. Ele não queria conversar com aquele Alfa, e muito menos vê-lo outra vez.

Assim que se viu livre dele, Jimin acenou para seu irmão da janela e logo Jisung se sentiu curado de uma hora para outra, antes do médico chegar. 

Os meninos comeram os docinhos, escondidos no jardim. Jimin sempre com um lencinho limpando as bochechas do irmão, para que este não fosse visto sujo, como filho de um qualquer. Como bons Ômegas, precisavam estar sempre bem vestidos e impecáveis. Jimin entendia e fazia de tudo para cumprir com suas obrigações.

Os irmãos foram acomodados no quarto ao lado do governador Park. À noite, após o jantar, Jimin e seu irmão estavam se preparando para dormir, quando ouviram o barulho estrondoso de um trovão.

— O que foi isso?! — Jisung sobressaltou na cama.

— Parece que há uma tempestade se aproximando — Jimin observou da janela. Ele fechou as cortinas e voltou para a própria cama. — Não se preocupe, estaremos seguros aqui dentro.

— Podemos deixar a lamparina acesa, por favor?

— Tudo bem. — Jimin viu que o irmão estava bastante assustado, olhando para os cantos mais escuros do cômodo. Ele foi mais um pouco para o lado, deixando um espaço em sua própria cama. — Você quer dormir aqui comigo?

— Quero! — Jisung respondeu sem enrolação, só estava esperando o mais velho perguntar.

O Ômega desceu de sua cama apenas para subir na do lúpus, e se acomodar deitado lado a lado com o irmão. Ele sentiu a mão de Jimin segurar a sua com firmeza, embaixo do lençol, e fechou os olhos suspirando tranquilo. 

Enquanto Jimin estivesse segurando sua mão, nada de mal iria lhe acontecer.

FIM.

Obrigada por ter lido, espero que tenha gostado 🥰💜

A Sarah e o Francis feitos por Anyavoeg 😍🤧

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