10 | "é impossível mandar no coração"

"Sou quem falhei ser./ Somos todos quem nos supusemos./ A nossa realidade é o que não conseguimos nunca.(Álvaro de Campos - Pecado Original)

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Os últimos acontecimentos ainda reverberavam na minha memória enquanto meu dedo ainda tentava se acostumar com a aliança dourada. Após o pedido de casamento, ainda passamos uns três dias em Ilha Grande, relaxando, comendo, nadando na água salgada e fazendo sexo. Aquelas ilhas eram de tirar o fôlego, um destino que ainda iríamos visitar muitas vezes durante a vida, inclusive arrastando Lili para ir junto, já que ela odiava sol e calor.

Quando embarquei no avião para ir embora, senti que estava deixando um pedaço de mim, mas, na verdade, eu havia substituído esse pedaço. Deixei uma parte vazia e voltei para Los Angeles com uma outra parte, cheia de vida e de amor. Chegar na cidade após os enfeites de natal terem sido, quase todos, retirados foi um alívio muito grande, significava que as pessoas voltaram ao seu normal, sem precisar de toda a falsidade natalina.

Apesar de estarmos de aliança e de pedido aceito, eu não queria dar a entender que não ligava muito para grandes festas e mil convidados. Por mim, voltaríamos para aquela praia deserta e nos casaríamos ali mesmo, com um juiz celebrando a união. Porém, Henry aparentava estar muito empolgado, já havia ligado para a família e amigos, deu a notícia com um sorriso enorme. Lili ficou enlouquecida.

— Como assim noivado? E não nos contaram nada? — Disse Lili, quase ofendida enquanto Bea ria de sua atitude boba.

— Estávamos curtindo o lugar, não queríamos contato com o resto do mundo — me defendi.

— Não liguem pra ela, só não é mais louca porque a cabeça não é grande — Bea disse isso e nós começamos a rir, mas Lili bufava de raiva.

— Olhem aqui, só tem um jeito de vocês consertarem isso...

— Sim, Lili, vocês duas serão nossas madrinhas! — Henry disse empolgado e as duas moças começaram a gritar juntas de felicidade e empolgação.

— Vamos fazer a maior festa que Hollywood já viu! — Bea disse quase gritando pela janela, como se fosse para o quarteirão todo escutar.

Os três se divertiram bastante imaginando a festa, enquanto eu apenas ficava no meu canto, rindo de uma bobeira ou piada. Entre taças de vinho e champanhe, as conversas foram ficando muito animadas, até que o síndico ligou para Henry, pedindo que as pessoas abaixassem o volume. Após as meninas irem embora de táxi, eu liguei a TV para passar o tempo até dar sono e o meu noivo, adorava chamá-lo assim, deitou-se no meu colo para que eu pudesse acariciar seu cabelo. Ele falava bastante sobre a festa e sobre as pessoas que deveríamos chamar, da decoração, da música, da comida e da bebida, mas eu não conseguia prestar atenção, aquele assunto já estava me deixando nervoso.

— Você está me escutando? — Recebi um cutucão na costela.

— Estou.

— Então porque não responde as coisas que falo? — Henry se sentou e ficou me encarando. Eu não queria olhar em seu rosto e dizer que o assunto de festa não me interessava, que, por mim, nem precisaria de festa.

— Estou vendo TV, está passando um dos meus filmes favoritos, você já não cansou de falar sobre isso com as meninas? — Pronto, como sempre, deixei a brecha e me expus. Henry já fez uma cara de que não estava entendendo, pois, para ele, o assunto deveria me deixar muito animado.

— Como assim? Você não quer falar sobre isso? — Ele coçou a cabeça e continuou me olhando, não me deixaria em paz até que eu respondesse com sinceridade.

— É que... Olha, eu vou ser bem sincero — Henry fez uma cara de que estava atento, mas com medo do que viria — eu não sou muito de festas e essas coisas, então, me desculpe se não estou tão empolgado.

— O que você quer dizer com isso? Não quer fazer festa? Eu pensei que...

— Não é que eu não queira, só não me empolgo muito com a organização igual você e as meninas — menti.

Henry disse que me entendeu, mas eu sabia que ele não estava confortável com as minhas respostas. Eu não queria festa. A ideia de estar num lugar com várias pessoas que faz décadas que não te vê e fingem se importar, ou de pessoas que estão ali somente pelo status e para exibir o vestido Prada, não me deixava à vontade. Um monte de gente reunida, por vezes até desconhecidos, para saírem falando mal de você e da sua festa, que nunca será boa o suficiente para eles.

Henry queria festa. Comidas chiques, gente famosa, muita música e muitas pessoas. Cada um tem o seu jeito, não o julguei por querer um grande evento e, na verdade, eu até entendi. Ele estava tão feliz que queria mostrar para todo mundo que havia se casado com o homem da sua vida, como ele sempre falava. Isso me deixava com tanta vontade de guardá-lo só para mim. Normal que ele quisesse exibir seu casamento para todos. Como resolver essa situação?

Simples, deixamos o assunto de lado e voltaríamos a falar sobre isso após a série, e o início das gravações já estava chegando. Nos jogamos de cara nos roteiros e esquecemos o resto do mundo, estávamos muito empolgados com voltar a trabalhar. Henry e eu ensaiamos várias vezes as cenas, mas, sempre que tinha um beijo, a gente terminava se agarrando, dizendo adeus para a atenção. Era difícil manter a concentração vendo algo crescer dentro da cueca dele, junto com o peito desenhado de pelos arfando e seu rosto pedindo mais.

O miserável ainda tinha a mania de andar pelado por todo o apartamento quando estava sozinho ou comigo. Como eu poderia prestar atenção em outra coisa senão naquele traseiro passando de um lado para o outro? Ou em toda a musculatura daquele corpo se mexendo quando ele pegava algo em cima da geladeira ou do armário? Irresistível. Falando assim parecia que eu era um bobo apaixonado e não conseguia me livrar dos pensamentos eróticos, e era mesmo. Isso ficava bem explícito no meu rosto quando ele caminhava nu em minha direção. Eu tinha um Apolo só para mim. Meu Apolo-Henry.

Acordamos bem de manhã para não chegarmos atrasados, chegamos no estúdio e fomos direto para o set de gravações. No caminho, as pessoas nos olhavam surpresas, era fácil reconhecer a expressão facial para "o que eles fazem aqui?" de muitos curiosos. Até encontramos alguns conhecidos, Henry adorava a pompa, contava para todo mundo que estávamos noivos. Eu achava bonito da parte dele, mas minha vontade de conversar com aquelas pessoas era mínima, eu as cumprimentava e queria sair logo dali.

Sempre fui fechado, nunca me senti a vontade com pessoas demais. Eu aprendi que elas sempre estão interessadas na sua vida, para sair fofocando depois, ou queriam contar da vida de outras pessoas para mim e odeio esse tipo de coisa. Essa diferença entre mim e Henry era visível, não, era gritante, não havia como disfarçar minha antipatia em contraste com sua simpatia. Respirei aliviado quando Bea nos encontrou, ela nos tirou daquela situação e nos direcionou corretamente para o set de gravação certo.

O local não era como nos grandes filmes, com fundos verdes e cenários gigantescos, havia muitas gravações fora do estúdio, mas as nossas cenas seriam todas no escritório ou casa. Como descrito nos roteiros, Bea interpretava uma moça, já mãe de um filho, Henry seria um de seus pares românticos e eu seria um antagonista que queria ficar com Henry. Parece clichê, mas a trama criada pelos roteiristas fugia um pouco do comum e os planos do antagonista eram executados quase sem que ele mesmo percebesse.

O primeiro dia foi intenso, era incrível como Henry se dedicava a atuar e se transformava no personagem de corpo e alma. Sua paixão pela profissão ia além do profissional, após ele contar sua história e como conheceu as artes cênicas, como seu primeiro amor o influenciou, é compreensível que ele tenha tamanho empenho pelo que faz. Eu não conseguia ficar sem prestar atenção nele, sempre me pegava suspirando ou rindo de suas gracinhas, fazia tempo que tínhamos atuado juntos, foi bom relembrar tudo isso.

Confesso que ver Henry beijar Bea, mesmo que profissionalmente, me dava um negócio no estômago. A moça era linda, não tinha como fingir de morto, quantas histórias de atores se apaixonarem durante as gravações que vemos por aí? São muitas. Inclusive a minha. Não digo que sentia ciúmes, mas algo me deixava desconfortável, principalmente por vê-los repetindo a cena sempre que alguém achava que não estava bom. E Lili, como diretora, era muito perfeccionista, tudo tinha que ficar exatamente como o planejado, repetindo várias vezes se fosse necessário.

— CORTA! — Lili berrou e o estúdio todo ouviu, seu jeito austero era muito imponente, a equipe respondia muito bem aos seus comandos.

— Oi, meu amor, o que achou dessa última cena? — Henry me perguntou, com os lábios ainda vermelhos de seu último beijo cênico.

— Maravilhosa, como tudo o que você faz — respondi quase roboticamente. Por que eu tinha que ser tão transparente?

— O que foi, algum problema?

— Não, tudo tranquilo, deixa eu passar, é a minha vez — e fui saindo sem dar maiores explicações.

Droga! Era ciúme. Eu precisava parar com aquela atitude idiota de esconder as coisas de mim mesmo. Minhas experiências do passado revelavam que isso nunca acabava bem. Era ciúme e eu me achava um tolo por senti-lo. Mas é impossível mandar no coração, não tem como proibi-lo de sentir, ele simplesmente sente, sem chances de te avisar. E foi crescendo com o passar do tempo, principalmente quando percebi o quanto Henry e Bea estavam próximos.

Sempre conversando, trocando mensagens, trocando sorrisos pelos corredores do set, se eu não resolvesse aquela situação, iria ficar louco. Não era sem fundamento, Henry sempre foi adepto de incluir mais de uma pessoa na relação, era só para sexo, mas eu nunca me senti totalmente confortável com isso. Ele, no entanto, sabia que eu não curtia muito essas coisas, então nunca tocava no assunto diretamente e, que eu saiba, nunca havia ficado com ninguém enquanto estava comigo. Mas sua intimidade com a Bea estava me incomodando.

Resolvi conversar com a Lili, a pessoa mais centrada e racional que eu conhecia, sempre tinha uma solução ou um conselho para dar. Pedi que ela me encontrasse numa cafeteria, mesmo com as nossas agendas apertadas com as gravações, ela aceitou. O quão ridículo ia soar o que eu tinha que falar para ela? Além de expor minha fraqueza, ainda despertaria dúvidas sobre sua namorada. Aquele encontro tinha tudo para dar errado.

— Como assim? — Perguntou ela, quando comecei a falar.

— Você acha que pode estar acontecendo algo a mais entre Henry e Bea? — Eu quis enfiar minha cara no primeiro buraco disponível, tenho certeza que fiquei mais vermelho que o morango na minha torta.

— Eu... queria ter falado com você antes — meu coração disparou a galopar sem controle de velocidade — eu também estou sentindo algo estranho em relação a eles.

— Droga! — Suspirei e nem consegui tomar um gole do café. Se Lili desconfiava de algo, era porque tinha algo de errado. Olhei através da vitrine, tentando não demonstrar meu semblante mudando repentinamente — O que você acha que pode ser?

— Uma amizade muito bonita! — Lili riu e meu um tapinha na mão — Ben, você tá vendo coisa onde não tem, posso te garantir. Bea é extremamente profissional e é normal que eles se aproximem por causa dos papeis, mas Henry te ama, seu idiota, põe isso na sua cabeça.

Ainda ficamos ali um bom tempo enquanto Lili conversava bastante comigo. Talvez eu possa dizer que adiantou um pouquinho, que minha preocupação passou, mas a verdade é que não. Nada me tirava aquele sentimento. Como eu odiava meu coração! Ela ainda me disse que se eu estivesse muito encabulado com aquilo, se fosse me atrapalhar de alguma forma, eu deveria resolver a questão e a melhor forma seria através do diálogo.

Mas como eu poderia chegar em Henry e falar tudo para ele? E o vexame de ser visto como um babaca que não tem segurança dos próprios sentimentos? Uma coisa era certa, o aperto no meu coração toda vez que via os dois juntos, mesmo que não estive acontecendo nada, uma mão invisível esmagava tudo, e eu mordia o lábio até quase sangrar, me fazendo lembrar de um personagem de um livro que estava lendo, um que era ciumento ao extremo.

Eu já agia totalmente fora de mim. Certa vez os encontrei conversando no corredor, que era bem estreito, e aquilo me subiu uma coisa pelo rosto que nem sei explicar. Cheguei perto de Henry e lhe dei um beijo na bochecha, virando seu rosto e fazendo-o me beijar na frente de Bea, interrompendo a conversa deles. Percebi que a moça virou o rosto, evitando a cena constrangedora. Henry, visivelmente desconfortável, tentava se desvencilhar, mas eu o agarrei mais, virando todo o seu corpo para meu.

Bea saiu de perto e entrou num dos camarins. Henry me afastou, bravo, percebi pelo seu suspiro, e também saiu. Comecei a sorrir maleficamente, mas o riso deu lugar a um rosto triste, o que eu estava tentando fazer? Entrei para meu camarim e me sentei no pequeno sofá que havia encostado na parede, tampei meu rosto com as mãos e desabei a chorar. Lágrimas de autopunição, por ser tão idiota, estúpido, ridículo. Henry entrou pela porta, penso que pronto para tirar satisfação, mas me encontrou naquela situação.

Sentou-se ao meu lado, sem dizer nada, eu sabia que ele estava nervoso. Ele esperou o meu choro passar e, sem precedentes, o abracei, com todo amor e culpa que tinha dentro de mim. Ele não conseguiu se manter firme em sua raiva, me envolveu firme em seus braços, penteando meu cabelo com os dedos. Ficamos alguns minutos naquela cena, e eu queria que ela se repetisse num loop infinito, nunca escondi o quanto gostava daquele abraço.

Henry me perguntou o que estava acontecendo, dizendo que não entendia a razão de eu estar agindo daquela forma. Contei tudo, desabafei meu sentimento, falei sobre o ciúme que sentia dele com Bea, sobre sua inclinação a ficar com outras pessoas.

— Ben, eu jamais teria coragem de fazer uma coisa dessas com você. Você tem que entender que eu posso gostar de ficar com outras pessoas, mas nunca fiz e nunca farei isso sem o seu consentimento ou, principalmente, sem você estar junto. Eu não entendo o que você compreende que seja isso, mas não é assim que funciona.

— Como assim? — Eu realmente estava confuso.

— Não é que eu vá ficando com todo mundo que eu ver. Eu tenho ou... tinha... um estilo de viver, não acreditava que ficar com uma pessoa só fosse me satisfazer por completo, mas isso mudou tanto depois do tempo que estamos juntos. Você sabe que gosto de apimentar as coisas, fazer sexo a três é bem legal, mas se você não curte, jamais te forçaria ou ficaria com alguém escondido. Me desculpe se foi isso que dei a entender.

— Não, você não tem nada do que se desculpar, eu que não penso nas coisas direito. Ver você com ela se... aproximando... conversando entre sorrisos, me deixou fora de mim.

— Meu amor, Bea e eu somos apenas grandes amigos, assim como você e Lili, não há com o que se preocupar.

Era isso, como eu fui tão tapado? A amizade deles era como a minha com Lili, éramos confidentes, por que ele também não poderia ter uma amizade assim? Virei meu rosto para a direção oposta a de Henry, tentando esconder minha vergonha, pois isso era tudo o que eu sentia naquele momento, vergonha de mim, da minha insegurança, da minha estupidez.

Henry virou meu rosto com todo o carinho que podia e me abraçou novamente, sussurrando um "eu te amo" no meu ouvido. Toda vez que ele pronunciava tais palavras era como música, tão doce e suave, parecia um piano ou um violino. Ainda escorriam lágrimas dos meus olhos, mas Henry me beijou mesmo assim e eu? Só queria pedir desculpas o tempo todo. Toda vez que o via sentia uma necessidade de pedir desculpas, mas não verbalizava, apenas remoía isso dentro de mim.

Quando vi Bea pela primeira vez após a cena constrangedora, quase saí correndo. Minha culpa estava tão evidente, estampado, que ela se aproximou e disse "relaxa, gatão, você e Henry moram aqui — apontou para seu coração — jamais magoarei vocês". Ela sempre me chamava de "gatão", dizia que Henry e eu éramos tão bonitos juntos que se houvesse um concurso de casal mais bonito, a gente ganhava sem esforço.

Depois de semanas mantendo aquele sentimento ruim eu pude me sentir mais leve. Conversar com Henry foi uma das melhores coisas que poderia ter acontecido, desabafei e ele também, colocamos pontos finais em assuntos que estavam sempre incomodando. Finalmente consegui me soltar mais para contracenar com os dois, pude me entregar também, assim como Henry. Teríamos uma trama grande na série, e aqueles sentimentos estavam atrapalhando tudo.

Mas, como sempre haveria algum entrave, chegou uma das cenas que eu temia. Henry e eu nos beijaríamos, para concluir um dos planos do meu personagem. Como eu iria beijar Henry sem as coisas lá embaixo não darem sinal de vida? Eu não conseguia! Os lábios dele eram afrodisíacos e só de imaginá-los tocando os meus, já ficava todo aceso. Eu não podia passar a vergonha de ter uma ereção no meio da gravação, seria a piada do ano!

A minha sorte é que a cena era bem dramática, meu personagem beijaria o de Henry durante uma fragilidade. Naquele dia, rezei para todos os deuses protetores dos atores e fui ver no que dava. Bem, aquela cena passou batida, Henry incorpora tão bem o personagem que foi impossível sentir alguma coisa enquanto meu personagem, que já era sem coração, o beijava. Acho que meu nível de atuação subiu alguns pontos, eu aprendia muito com aquele homem.

Durante o caminho para casa, fomos rindo da situação e comentando sobre como seria quando tivessem que dar um amasso mais quente. O carro em movimento, a noite já havia chegado, passávamos em um túnel deserto quando tive uma ideia. Posicionei minha mão em sua coxa e comecei a apertá-la levemente. Ele se virou para mim com os olhos arregalados e eu apenas fiz sinal para que ficasse quieto e prestasse atenção no trânsito, subi um pouco a mão e já senti algo se mexendo no jeans apertado.

Eu era imprudente, exatamente como um adolescente. A verdade é que eu nunca tinha experienciado nenhum relacionamento como aquele. A adolescência, época de descobrir os amores e as dores, ter as primeiras experiências, foi bem diferente para mim. Eu estava vivendo tudo naquele momento, meu primeiro grande amor, meu primeiro sentimento de ciúmes, loucuras sexuais dentro de um carro em movimento, tudo era novo e eu amava ter Henry ao meu lado, me proporcionando tudo isso.

Chegamos na minha casa e fomos direto para o chuveiro. Quando Henry tirou a roupa percebi a pequena mancha na pele da coxa, onde a bala passou de raspão no episódio que aconteceu no natal. Toda a felicidade deu lugar a um peso no coração, as lembranças me fizeram pensar em todas as crianças vítimas de pais homofóbicos, como o filho daquele homem que nos atacou. Conversei com Henry após o banho, decidimos que doaríamos todo o dinheiro recebido com a participação na série para uma instituição ou ONG que acolhesse jovens LGBT vítimas de violência.

Tínhamos que pensar em todas essas pessoas, em como a sociedade oprime o que é diferente e obriga a se encaixar nas normas. Nós não éramos do tipo ativistas e nem tínhamos intenção de ser notícia por causa da doação, queríamos ajudar, sem fazer alarde, sem posar para fotos e aparecer em revistas. Precisávamos decidir como a doação seria feita, mas algo me dizia que Henry iria querer pelo menos uma reunião com música e comida.

Ainda tinha a tal festa de casamento. As gravações da série não demorariam a acabar, então teríamos que resolver esses assuntos, não dava para ignorar. Por que a minha vida não podia ser normal? Parece que sempre haveria algo para tirar a minha paz. Mas será que uma vida totalmente feliz seria interessante? O que nos torna seres humanos é, justamente, todo esse conjunto de vivências positivas e negativas que temos que passar durante a vida. Todas as frustrações, tristezas, felicidades, contribuem para o crescimento e aprendizado para conseguir ultrapassar novas barreiras. Não adianta correr, a vida sempre nos acha.

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