capítulo seis

verão de 2013

— Acho que aquele se parece com um tubarão. — murmurei, olhando para uma das várias nuvens que salpicavam o céu azul-celeste com tons de branco algodão.

Uma semana se passara desde que eu conhecera a família Tarasova. Eles eram tão acolhedores e divertidos que pouco a pouco eu passava mais tempo com eles. Quando não estava com meus pais, passeando pela cidade, ou pintando em meu quarto, estava com os Tarasova, aproveitando a praia ou lanchando em algum lugar. Eu me sentia confortável com eles, e eles respeitavam a minha timidez, e, ao mesmo tempo, me davam espaço para interagir sendo eu mesma sempre que quisesse.

Naquela tarde, estava deitada na areia usando um maio rosa com decote quadrado no peito e shorts jeans, ao lado do namorado de um dos irmãos Tarasova, Aaron Hopkins. Assim como eu, Aaron não gostava de entrar no mar, por isso, nós passávamos nosso tempo juntos enquanto os outros surfavam nas ondas salgadas de São Francisco. Certa vez tínhamos decidido procurar por estrelas do mar, e outra vez escolhemos um livro para terminar de ler em apenas um dia, e, naquela manhã, estávamos observando as nuvens no céu e o que elas se pareciam.

— Você sabia que, por ano, nós humanos matamos cerca de 97 milhões de tubarões, e eles só matam no máximo dez pessoas? — comentou Aaron, ao me ouvir dizer que achara a nuvem parecida com aquele animal. Pouco depois de nos conhecermos ele me contara que se sentia inseguro ao falar das coisas que gostava, ou sequer falar, pois a maioria das pessoas se desinteressava por aquilo e acabava caçoando dele. Mas com os Tarasova era diferente. Os irmãos, principalmente seu namorado, Henry, sempre fizeram questão de escutar o loiro, fazê-lo se sentir importante. E eu, agora que o conhecia, fazia o mesmo.

— Isso é horrível. — lamentei.

— Eu sei... — disse ele, cabisbaixo. — Tubarões são incompreendidos, eles são animais maravilhosos, com características dignas de admiração, mas todos os veem como monstros.

— Nem todo mundo. Você não. — falei, cutucando-o com o cotovelo, fazendo-o sorrir. — E agora eu também não.

— É por isso que eu quero ser veterinário. Eu quero ajudar os animais. Todos eles.

— Você vai ser o melhor veterinário do mundo, doutor Hopkins.

— Valeu, Elaine. — disse ele, timidamente. — Agora é a minha vez, não é? Hum... — ele semi cerrou os olhos, observando o céu. — Acho que aquela parece um coração. — apontou.

— Não, aquela? Parece uma colina. — protestei.

— Ele só está vendo corações porque está apaixonado por mim. — escutei Henry falar, ao sair da água e se aproximar de nós completamente olhado. Então, o gêmeo de cabelos crespos se ajoelhou e se inclinou para depositar um beijo nos lábios do namorado. Não ver que eu os observava, ele disse: — Não se preocupe, você ganha beijo também.

— Não, você está molhado! — exclamei, me desviando do beijo que Henry ia dar em minha bochecha. Rindo, ele recuou, se sentando e envolvendo um braço ao redor dos ombros do loiro. — Como vocês se conheceram? — perguntei.

— Deixa eu contar a história, por favor! — Kessie exclamou, correndo para se juntar a nós.

— Como se você já não tivesse nos contado essa história milhões de vezes. Acho que ela esquece que estávamos lá. — foi a vez de Dimitri falar, enxugando os cabelos com uma toalha ao se aproximar. Os pingos de água escorregavam pelo seu peitoral e braços, de alguma forma tornando-o ainda mais atraente. Vendo-o sem camisa possibilitava que eu analisasse suas tatuagens: um punhal no antebraço direito e uma onda em suas costas. Ao notar meu olhar, ele se inclinou e sussurrou em meu ouvido: — Cuidado para não babar.

Apenas revirei os olhos.

— Fique à vontade. — disse Henry.

— Tudo começou numa chuvosa manhã de inverno. — a garota suspirou, contando de forma dramática. — Henry, como bem sabemos, é o fotógrafo do jornal da nossa escola, e eles estavam fazendo uma reportagem sobre os terríveis maus tratos contra animais. Como a professora responsável pelo jornal sabia que Aaron era voluntário num abrigo de animais, ela pediu que Aaron levasse seus repórteres até lá, e, conhecendo Henry, sabemos que ele queria ter as melhores fotos, então, ele junto para tirar as fotos. Depois disso, esses dois começaram a passar bastante tempo juntos. Todos notaram que eles se gostavam, menos eles mesmos, claro. — disse, fazendo o irmão gargalhar. — Então, eu tive que bancar o cupido. Na festa de natal do nosso colégio, eu mandei um bilhete para os dois, como se fosse eles escrevendo um para o outro para se encontrarem num certo lugar. Eles foram, logo perceberam quem estava por trás disso, mas quando voltaram para a festa estavam de mãos dadas, e nunca mais se largaram.

Henry sorriu abobado, e Aaron ruborizou.

— Ah! O que o amor não faz na cabeça desses jovens. — brincou Dimitri. Os gêmeos e Aaron continuaram conversando, no tempo que o rapaz de olhos azuis se sentou ao meu lado, observando meu violão, que estava a poucos centímetros de mim. — Por que não vem para a água com a gente? — indagou ele, descontraído, mas encarando-me daquela forma que mexia com a minha cabeça.

— Não sei. É fria, e vocês só ficam surfando de qualquer jeito. — dei de ombros, esquecendo propositalmente de contar-lhe outro fator: eu não queria expor meu corpo.

— Então, você está com sorte minha cara, Elaine, por que eu sou o melhor surfista nessa praia. — disse ele, deixando um sorriso pretensioso surgir em seus lábios.

— Acontece que eu também sei sobre o seu ego. — zombei. — Então, as fontes não são muito confiáveis.

O jovem Tarasova ignorou meu comentário e ficou de pé, estendendo a mão para mim.

— Vem comigo. Você vai ter o privilégio de ter uma aula de surfe com o melhor. — falou pausadamente, com o sorriso apenas aumentando no seu rosto.

— Eu, surfando? — arregalei os olhos, pensando o quão absurdo aquilo soava.

— Claro. Vamos, eu vou te ensinar algo que gosto, e depois você pode me ensinar algo que gosta como... tocar violão. É uma habilidade muito útil quando se vive na praia.

— Está bem. — suspirei, segurando em sua mão para que ele me ajudasse a ficar de pé. Em seguida, fomos até a quadra de esportes, onde havia um galpão que guardava vários equipamentos, como bolas e remos. Para mim, Dimitri pegou uma prancha própria para minha altura, uma que possuía estampa tie dye nos tons patéis de azul, verde e roxo, e logo saímos.

— Aonde vamos? — perguntei, assim que percebi que Dimitri estava se dirigindo ao estacionamento, e não de volta à praia.

— Aquelas ondas não são boas para inciantes, tem um lugar melhor para irmos. — explicou ele. — Ah, aqui está! — ele apontou para um jeep wrangler verde, com a parte de trás aberta, onde ele colocou minha prancha e a dele, que era maior e vermelha. — Está é a verdinha.

Não pude conter o riso.

— Você nomeou o carro em homenagem à maconha? Ou melhor, você nomeou seu carro?

— Ei, não julgue a verdinha, está bem? Ela é um ótimo carro.

— Eu não estou! — contestei. — Eu gostei dela.

Assim que entramos no veículo, Dimitri deu partida, dirgindo para fora do hotel. Escutei atentamente os comentários que o jovem Tarasova fazia sobre vários pontos das ruas da cidade que passavávamos, alguns sobre histórias vividas ali, outros eram apenas curiosidades. Não demorou para que chegássemos a uma estrada de areia, que nos levou a outra praia.

— Aonde estamos indo? — perguntei pela milésima vez após dez minutos apenas dirigindo naquela areia. Eu não entendia porque não podíamos parar ali se o mar estava a poucos metros de nós.

— Relaxe. — ele sorriu para mim, sem tirar as mãos do volante. — Você vai ver.

— Pode, por favor, me dizer logo se isso for parte de um plano para me matar?

— Eu já te falei, relaxe. Ninguém vai morrer, Elaine. A não ser, claro, que tenha um apocalipse agora mesmo, nesse caso eu não posso prometer nada.

Revirei os olhos, rindo. Para minha sorte, logo chegamos no fim da estrada, pois haviam várias pedras enormes bloqueando o caminho. Elas não era as únicas. Aquela praia estava cheia de pedras para todo lado.

— Essa praia é mais tranquila justamente por causa das rochas. — esclareceu Dimitri. De fato, não havia uma pessoa sequer por ali. — O que a maioria não sabe, já que eles não são tão experientes no mar da cidade como eu, é que ali — ele indicou alguns metros longe de nós. — não tem uma pedra sequer e as ondas são mais suaves. — dito isso, ele pulou para fora do carro e correu para o outro lado para abrir a porta para mim. — Desça da sua carruagem, princesa.

— Muito obrigada, cavalheiro. — sorri, segurando em sua mão como apoio para descer. Então, Dimitri pegou a minha prancha e nos levou para a parte sem pedras, colocando o equipamento no chão e passando parafina na superfície dele.

— Ninguém aprende a surfar indo direto para o mar. Você precisa aprender a ficar de pé sobre a prancha primeiro. — o rapaz de olhos azuis começou a me explicar, no tempo que eu ouvia com atenção. — Sobe.

Fiquei um pouco atordoada com aquela repentina ordem, mas logo obecedi. Dimitri me ajudou a subir, entrelaçando seus dedos ásperos minhas pequenas mãos. Eu, por minha vez, apertei firmemente as mãos de Dimitri, com medo de cair. Uma vez sobre a prancha, assenti para que ele continuasse.

— Eu não vou segurar suas mãos, vai te atrapalhar. — Dimitri lentamente se desvincilhou das minhas mãos, e eu num ímpeto de me manter ereta, segurei nos ombros dele. — Mas, relaxa, eu não vou deixar você cair. — então, as mãos dele repousaram na cintura dela. Traindo a minha racionalidade, meu corpo reagiu contra a minha vontade, e senti um pulsar de desejo e meu corpo estremecer com o toque. Porém, aquilo permitiu que eu me sentisse mais segura para soltá-lo de uma vez.

— Coloque o pé que está na frente na altura do peito, na diagonal, e suas pernas tem que ficar um pouco mais abertas do que a largura dos ombros. — Dimitri prosseguiu com as instruções, e eu seguia seus comandos. — Mantenha os joelhos dobrados o tempo todo. Isso vai diminuir seu centro de gravidade e te ajudar a manter seu equilíbrio na prancha. — dizia, enquanto me ajudava a dobrar os joelhos. — Empurre seus quadris para a frente para transferir seu peso para a perna da frente. Mantenha seus braços erguidos, principalmente o braço da frente. Estique-o como se fosse alcançar a ponta da prancha, seu braço de trás também deve estar esticado, mas não se preocupe muito com isso.

— Como você aprendeu a surfar? — questionei, tentando me distrair do que a nossa aproximação me causava. — Digo, como você sabe tudo isso?

Dimitri pigarreou, e, pela sua expressão facial, percebi que era um assunto delicado.

— Meu irmão mais velho. Meu pai queria que eu praticasse basquete, como Henry, e, apesar de eu ser bom, nunca foi algo que eu realmente gostava. Era mais como uma obrigação, já que eu tinha a pressão de ser perfeito como meu pai quer que eu seja. Ele ficou muito puto quando eu saí do time. — ele soltou uma risada amargurada. — Eu sempre gostei de surfar, já que eu cresci no mar, interagindo com crianças mais velhas que surfavam, e acabei meio que aprendendo a prática sozinho. Mas foi meu irmão quem me ensinou a técnica. Ele leu alguns livros e me explicou depois.

— Não sabia que você tinha um irmão mais velho. — murmurei.

— Nunca nos demos muito bem. Ele está na faculdade agora, sendo o filho perfeito para o meu pai. — ele deu de ombros. — Desculpe, eu devo estar te entediando com meus casos de família.

— Não. — neguei com a cabeça, oferecendo-lhe um sorriso reconfortante. — Eu sou toda ouvidos sempre que quiser falar sobre sua família.

— É bom pegar uma pipoca, porque é um verdadeiro filme de drama. — brincou, e ambos rimos.

Vendo que eu estava mais segura, por causa da conversa que me distraíra, Dimitri continuou segurando em sua cintura com uma mão, ao passo que a outra roçou pela parte de trás do meu braço, ajudando-me a esticá-lo. Imediatamente senti minhas bochechas queimarem ao sentir seu corpo tão perto do meu. Ergui a cabeça para encarar dentro dos seus olhos azuis, admirando o brilho no seu olhar enquanto me ensinava sobre uma de suas paixões. Quando nossos olhares se encontraram, Dimitri riu e delicadamente segurou em seu queixo, o que poderia facilmente ter sido a causa da minha morte.

— Olhos para a frente, Elaine. — disse ele, num tom provocativo, vagarosamente colocando meu rosto para frente, como se eu fosse de porcelana. — Eu sei que o seu professor é gostoso e pode ser difícil se concentrar...

— Não... ele não é. — brincou.

— Ah, é? — disse Dimitri, arqueando uma sobrancelha. — Está bem. — assim, sentindo-se provocado, ele soltou a minha cintura, me fazendo, consequentemente, perder o equilíbrio e cair na areia molhada bem na hora que a água bateu ali, encharcando meus shorts.

Meus lábios fizeram um perfeito "o" enquanto eu encarava Dimitri indignada.

— Você vai pagar por isso. — gargalhei, partindo para cima dele, empurrando-o para dentro da água. Pela sua força, eu sabia que ele facilmente poderia resistir, mas, entrando na brincadeira, ele se deixou cair na parte rasa da água e me puxou para dentro.

— Minha vez. — ele sorriu maliciosamente, correndo atrás de mim. Rindo, adentrei ainda mais no mar para fugir, mas logo fui pega por Dimitri, que, por trás, me segurou pela cintura e me rodopiou antes de me jogar dentro d'água. Nenhum de nós conseguia parar de gargalhar quando aquilo virou uma guerra de água, até que percebi o olhar de Dimitri mudar. Ele me observava, parecendo admirado, ou até mesmo espantado.

— O que? — franzi as sobrancelhas, confusas.

— Seu rosto... — ele estendeu a mão para tirar uma mexa de cabelo ondulado da minha face, mas recuou, não querendo me tocar sem a minha permissão. Ao finalmente entender do que ele estava falando, encolhi meus ombros e mordi o lábio, envergonhada. Minha maquiagem saíra, e minhas sardas agora estavam a mostras. Mas, para minha surpresa, o que Dimitri disse foi: — você é linda.

Ele não questionou minha decisão de esconder minhas sardas, não fez nenhum comentário sobre aquela minha insegurança, apenas olhou diretamente nos meus olhos, me vendo completamente exposta, com o corpo molhado e sem maquiagem, e genuinamente dissera que eu era linda. Ele me olhou. E disse que eu era linda.

Não consegui responder. Apenas senti minhas bochechas corarem e sorri timidamente.

— Nós deveríamos terminar a lição de surfe. — murmurei, acanhada.

— Eu sabia que você ia gostar. — ele me lançou uma piscadela.

Mais uma hora de treino — e várias quedas depois — eu finalmente consegui ficar de pé sobre prancha na água. Assim, deixamos o surfe um pouco de lado e nos sentamos na areia para que eu fizesse a minha parte de ensinar Dimitri a tocar violão.

— Por que tem pinturas no violão? — indagou o rapaz de olhos azuis, analisando o objeto.

— Ah, é só... É só um projeto meu. — respondi, como se não fosse nada importante. Mas Dimitri ficou calado, esperando que eu continuasse a explicação. — Eu quero encher o violão com desenhos que simbolizem algo para mim. Estas flores representam o jardim da casa da minha falecida avó, esse é o meu falecido cachorrinho e essas notas musicais você já sabe. — esclareci, apontando para cada um dos desenhos. — Eu não sei mais o que fazer.

— Você quer ajuda? — sugeriu o jovem Tarasova enquanto cautelosamente admirava meus desenhos. — Além de desenhar meu rosto, obviamente... — brincou, me fazendo rir. — Você poderia pintar coisas que foram marcantes nesse verão. E eu te ajudo com a parte das coisas marcantes. Já temos, por exemplo, o muro que saltamos na semana passada para fugir do segurança, e a prancha de surfe de onde. O que acha?

— Eu acho... — disse eu, sem conseguir conter o brilho nos meus olhos. — Eu acho que é uma ótima ideia.

Dimitri e eu sorrimos juntos.

— Agora, me diga o que fazer. — falou ele, colocando o violão no colo.

— Primeiro você tem que deixá-lo bem na vertical. — expliquei, ajudando-o a encontrar a posição correta. — E bem perto do seu corpo... — sussurrei, empurrando o instrumento gentilmente para mais próximo de Dimitri, mas, quando ergui o rosto, nossos olhares se encontraram, nossas faces perto uma da outra. Perto demais. Ri envergonhadamente, me afastando.

Consegui ensinar alguns acordes para ele, até seu pai ligar, exigindo sua presença de volta em casa. Então, rapidamente voltamos para o hotel da mesma forma como chegamos.

— Eu tenho que ir antes que meu pai decida mandar uma força-tarefa atrás de mim. — disse Dimitri, me encarando. — Tenha uma boa noite, Elaine. Espero que sonhe comigo.

— Você é muito convencido. — murmurei. Ele deu de ombros.

— É parte do meu charme. Até amanhã.

Antes que eu pudesse sequer processar o que estava acontecendo, Dimitri depositou um beijo em minha bochecha e disparou para dentro do hotel.

— Até...

No caminho de volta para o meu quarto, já era possível ver o céu se colorir com as cores do por-do-sol no horizonte, o que me fez lembrar que, quando eu era pequena, tinha medo do escuro. Chorava toda vez que o sol se punha, e corria para os braços dos meus pais. A escuridão era agonizante, e não saber o que havia nela era mais assustador ainda.

Mas, naquele momento, vendo a noite cair depois de passar a tarde com Dimitri, eu não sentia nada além de paz.

oiee gente, como vocês estão!

dimitri e elaine se aproximando... o que estão achando do relacionamento dos dois?

vocês gostam de praia?

beijosss e até o próximo capítulo!

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