capítulo dezessete
Estávamos na última semana de agosto, bem no final do verão.
Dimitri continuou me dando aulas de direção. Pouco a pouco, eu começava a perder o nervosismo, dando lugar ao hábito de dirigir. Ele realmente conseguia me fazer relaxar e até mesmo me divertir enquanto dirigia. Eu nunca o vi tão orgulhoso quanto no dia em que eu finalmente consegui dirigir numa avenida cheia e ainda estacionar depois; foi quando ele disse que eu estava pronta para tirar minha carteira de motorista. Eu, obviamente, estava orgulhosa de mim por conquistar aquilo, mas também estava orgulhosa por conseguir passar aquele tempo com Dimitri com tanta... Maturidade. O passado não poderia — e nem deveria — ser apagado, mas nós conseguimos seguir em frente como dois adultos e ser amigos. Claro, o jovem Tarasova ainda flertava, mas eu já estava acostumada: era parte da sua personalidade.
E, naquela manhã, seria meu exame de direção. Então, acordei cedo e logo fui tomar um chá para me acalmar. Voltei para o quarto de Nikolai, para seu closet onde ficavam algumas das minhas roupas, procurando escolher algo para vestir que fosse formal e bonito. Eu queria causar uma boa impressão. Estava tão distraída analisando aquelas peças de roupa que quase não percebi quando Nikolai entrou no cômodo.
— Nossa, alguém acordou cedo hoje. — disse ele, num tom de brincadeira. Meu noivo todo suado e com o rosto vermelho, pois tinha acabado de chegar de sua corrida matinal.
— Bem, — dei de ombros, sorrindo timidamente — eu sou cheia de surpresas.
— Realmente. E sempre boas surpresas. — pontuou Nikolai, se aproximando para depositar um leve beijo em minha bochecha e depois ir escolher suas próprias roupas do dia. — Vai tocar naquele bar-restaurante agora? Não está um pouco cedo demais?
— Na verdade, é o dia do meu exame de motorista. — disse eu. No meio de tanta coisa, aprender a dirigir, o emprego no barzinho, a festa de noivado chegando, e os pesadelos com o falecido Michael Connor, eu acabara me esquecendo de contar ao meu noivo a data do meu teste.
— Ah, é hoje? — Nikolai arregalou os olhos, surpreso. Assenti com a cabeça. — Bem, não fique nervosa, está bem? Eu sei que você vai arrasar.
— Obrigada, Nick.
Meu noivo, em seguida, pediu licença, pois precisava fazer uma ligação. Então, terminei de me arrumar e deixei o motorista de Nikolai me levar até o lugar do exame. Tive que esperar numa fila enorme, e ainda saí esquisita na foto que ficaria na minha carteira. O meu examinador era um homem baixo, bem magro e careca, usando óculos redondos e me analisando como se fosse um carrasco. Eu estava tremendo quando entrei no carro, mas tentava lembrar das palavras tranquilizadoras que Dimitri costumava me dizer para tentar manter a calma. Precisei de alguns segundos antes de começar, e o olhar crítico do examinador certamente não colaborava.
— Espero que você seja boa mesmo de direção, porque seu noivinho não vai conseguir comprar uma carteira de motorista para você. — escutei o examinador resmungar, e engoli seco, amaldiçoando mentalmente aquele jornal que divulgou o meu noivado com Nikolai, me expondo para qualquer pessoa que lesse aquela matéria.
Sorri para mim mesma quando dei partida no veículo e percebi que havia colocado a língua para fora da boca ao me concentrar, pois foi Dimitri quem notou aquela minha mania. Mas afastei aquele pensamento e foquei como nunca na tarefa em minha frente, em dirigir. Eu precisava de foco para não entrar em pânico.
Ultrapassando as expectativas, até que eu fui bem no exame. Com exceção das subidas, pois teve um momento que eu realmente temi que fosse deixar o carro morrer e nós rolaríamos colina a baixo. Porém, subitamente, uma dica de Dimitri ressurgiu em minha mente, e eu consegui passar sem muito alarde. Eu era surpreendentemente boa em estacionar, logo, quando voltamos, rapidamente parei o carro de costas na garagem e fiquei esperando o examinador dizer meu resultado.
Meu coração batia tão rápido e meu estômago revirava tanto que pensei que fosse vomitar enquanto aquele homem lentamente olhava cada papel em sua prancheta onde ele fizera suas anotações. Em seguida, para minha surpresa, ele me encarou com tédio em suas feições e me disse, sem qualquer pingo de emoção em sua voz:
— Parabéns, você passou.
Um perfeito "o" alegre e surpreso se formou em meus lábios. Eu tinha conseguido, tinha passado no meu teste de direção depois de anos acreditando que eu nunca seria capaz de dirigir. Eu consegui, pensei, sorrindo de orelha a orelha no tempo que meu coração agora batia de felicidade, eu sou uma motorista!
— Meu Deus, sério? Muito obrigada! — exclamei e, me deixando levar pela minha felicidade, acabei abraçando meu examinador. Ao perceber o que fizera, imediatamente me afastei, com os olhos arregalados. — Me desculpe, eu só fiquei muito animada, desculpe... Por favor, não me reprove por isso. — implorei.
— Na verdade... — o homem suspirou, e, para meu espanto, um pequeno sorriso despontou de seus lábios. Um sorriso. Ele estava sorrindo. — Fazia tempo que alguém não me abraçava. Estou... feliz por você, senhorita Róson. Aproveite sua carteira de motorista com sabedoria.
Eu estava saltitante quando saí do local do exame. Liguei para Nikolai para contar-lhe a notícia, mas, como ele não respondeu, apenas mandei uma mensagem. Também mandei uma à minha melhor amiga e madrinha de casamento, Naira Patel. Mas havia outra pessoa que precisava saber daquilo. A pessoa que dedicara tempo e paciência para me ensinar. Eu precisava contar à Dimitri. Portanto, liberei o motorista de Nikolai para passar o dia de folga e peguei aquele carro do meu noivo para me dirigir a um lugar que eu não ia há anos — ao Hotel e Resort Tarasova.
Parecia... igual. Ou quase igual. Algumas reformas provavelmente foram feitas, as plantas decorativas eram novas e parecia um pouco mais moderno que antes, mas, em sua essência, o hotel estava quase que o mesmo. O todas aquelas memórias ali... Meu coração doía pelo falecido Aaron Hopkins, e por todos os momentos bons daquele verão da minha juventude que não voltariam mais.
Não poderia me dar o luxo de me perguntar o que aconteceria se as coisas tivessem terminado de outra forma. Não. Se eu ficasse pensando no que poderia ter sido diferente no passado, acabaria enlouquecendo no presente. E eu estava feliz com a minha vida daquela forma.
— Olá, bom dia. — disse eu, me aproximando do balcão na entrada. — Estou procurando por Dimitri Tarasova. Ele está disponível?
— Bom dia. Pode me dizer seu nome? — falou a atendente.
— É Elaine... Elaine Róson.
— Elaine!
Me virei para ver quem chamara meu nome, apenas para encontrar Henry Tarasova andando — e mancando com uma das pernas — em minha direção com um largo sorriso no rosto. Um total contraste com Celine Han, a chefe de segurança que estava atrás dele, pois ela me olhava como se quisesse me matar. Dimitri certa vez me dissera que, apesar de ser assustadora, Celine era uma das melhores pessoas que ele conhecia. Ainda precisava de mais provas para acreditar nisso, pois, até agora, ela só demonstrara desprezo em relação à mim.
— Henry! — o cumprimentei com o abraço. — É estranho te ver por aqui. Um estranho bom, quero dizer.
Henry riu.
— Eu estava indo jogar a Celine na fonte de água, você sabe, para dar uma esfriada na cabeça dela. Ela ficou puta porque eu ganhei quando estávamos treinando.
— Conseguir me derrubar uma vez não é ganhar. — falou Celine, sua voz era tão severa quanto seus olhos, e suas palavras soavam ácidas e gélidas.
— Depois de tanto tempo sem conseguir nem atingir um golpe em você, sim, isso é uma vitória. — rebateu Henry. — E eu ainda vou ficar melhor que você. Marque minhas palavras.
— Não vai não. — respondeu a chefe de segurança, convicta.
— Vou sim.
— Não vai não.
— Vou sim.
— Pessoal? — interrompi aquela discussão com um sorriso envergonhado. — Vocês sabem se Dimitri está?
Celine gargalhou de forma amargurada, e eu não entendi o motivo. Henry, por sua vez, lançou um olhar de aviso à mulher e se voltou para mim:
— Ele está lá em cima, no escritório. É a porta na frente do nosso apartamento, pode ir lá.
Agradeci ao Tarasova de cabelos cacheados e fui pegar o elevador para me locomover ao andar do escritório, tentando não pensar muito em todas as outras vezes que eu passara por aqueles espaços, durante aquele verão. Com o meu olhar artístico, analisei cada detalhe, procurando por mudanças ou constâncias. Ao chegar no final do corredor, me deparei com a porta do apartamento dos Tarasova no hotel. A encarei por alguns segundos, deixando o sentimento de nostalgia me dominar. Mas, em vez de entrar nela como faria oito anos atrás, eu me virei para a porta do escritório e bati nela. Uma, duas, três vezes. Chamei por Dimitri. Sem resposta.
— Dimitri? — o chamei novamente, dessa vez girando a maçaneta. Estava aberta. Como não queria interromper sua privacidade, somente coloquei a cabeça para dentro, vasculhando o lugar à sua procura.
Eu nunca estivera naquele escritório antes, pois naquela época ele pertencia ao pai dos Tarasova, mas fiquei genuinamente impressionada. Era estonteante. Tinha um aspecto de biblioteca escura, com paredes marrons e estantes de livro cercando quase todo o local, além de uma mesinha cheia de copos e bebidas alcoólicas, e objetos antigos e quadros soturnos decorando as paredes. Algo me dizia que fora Dimitri quem adicionou aquelas estantes quando assumira o escritório. Falando em Dimitri, ele estava... Dormindo. Dormindo em sua cadeira, debruçado em sua mesa com diversos papéis abaixo dele, inclusive babando em alguns deles.
Seu sono parecia... agitado. Havia uma expressão de terror em sua face adormecida e ele gritava "pare!" para ninguém em específico. Se Dimitri estava tendo um pesadelo, eu deveria acordá-lo. Tentei não me assustar com a grande pintura do próprio Dimitri — feito no mesmo estilo que os retratos da realeza no século XVIII — na parede atrás dele quando entrei no escritório, fechando a porta atrás de mim e rapidamente caminhando em sua direção.
— Dimitri... — sussurrei, me inclinando para tocá-lo delicadamente.
— Não! Pare! — ele berrava, aterrorizado, tentando se desvincilhar do meu toque.
— Dimitri, sou eu. — falei, gentilmente, enquanto acarinhava seus cabelos e seu braço. — Sou eu, Elaine. Você está seguro, eu estou aqui.
— Não... não... — o rapaz choramingou, e meu coração se partiu ao vê-lo naquele estado. Mas continuei.
— Está tudo bem, Dimitri. Eu estou aqui. Você está seguro. Volte, Dimitri. Volte para mim.
De repente, ele acordou de supetão, arregalando os olhos e inspirando profundamente. Ainda estava assustado e atordoado, mas minhas palavras e meu toque pareceram rapidamente acalmá-lo.
— Elaine...
— Bem-vindo de volta, bela adormecida. — falei, sorrindo carinhosamente enquanto me recostava na mesa de Dimitri. — Espero que não se importe que eu tenha te acordado. Eu vi você gritando e... Fiquei preocupada. Mas Nikolai não gosta que eu o acorde quando ele tem pesadelos, então eu não sei se você...
— Obrigado. — disse Dimitri, simplesmente, sua voz rouca de sono. — Pesadelos são... Bem, digamos que não é uma das minhas atividades preferidas. — ele riu tristemente.
— Eu não poderia concordar mais.
— Você tem pesadelos também? — questionou, olhando diretamente em meus olhos.
— É, eu tenho. — assenti, tentando esconder minha angústia com um sorriso fraco. — Com a morte de Michael, meu antigo chefe. Mas não é nada com que não possa lidar, eu acho. — dei de ombros.
— Então... seus pesadelos são basicamente uma zumbilandia. — brincou Dimitri, e eu ri, admirada com a sua capacidade de levantar o humor nos piores momentos.
— Basicamente. E você?
— Ah, você sabe, o de sempre. O bom e velho trauma. — foi a vez dele de dar de ombros. — Eu não consegui salvar meu pai, então, nos meus pesadelos, eu não consigo salvar ninguém da minha família. E mais algumas pessoas...
Eu não sabia como Andreas Tarasova morrera, mas para assombrar Dimitri daquela forma... Certamente não fora bonito.
— Não importa o que tenha acontecido, eu tenho certeza de que não foi sua culpa. — disse eu, colocando a mão no seu ombro para demonstrar apoio. — E sua família está aqui. Eles estão seguros. Especialmente com Celine...
Dimitri gargalhou.
— Tem razão.
— Eu sempre tenho. — brinquei, exibindo um sorriso acanhado. — Sempre que precisar falar sobre isso ou qualquer outra coisa... eu estou aqui. Sabe disso, não sabe?
— Estou aqui se precisar também. — afirmou ele. — A não ser que você queira ajuda de uma pessoa feia, nesse caso, eu e minha beleza não poderemos ajudar.
— Convencido. — gracejei, rindo e empurrando seu ombro de leve.
— Agora, vai me dizer o que a trás no meu escritório? — perguntou Dimitri. Com tudo aquilo dos pesadelos, eu até tinha me distraído do motivo de estar ali.
— Bem... Eu queria contar pessoalmente ao meu instrutor que... — fiz uma pausa para criar suspense. — Eu consegui. Passei no exame de direção.
No segundo que escutou a notícia, Dimitri começou a gritar em celebração, se levantando para me abraçar pela cintura e me girar no ar.
— Elaine! Estou tão feliz por você! Eu sabia que ia conseguir!
Dimitri me ofereceu uma bebida alcoólica para comemorarmos juntos. Eu o lembrei que não poderia beber porque estava dirigindo, então brindamos com água. Em seguida, ele queria me ver dirigindo, então, o levei para o carro de Nikolai e demos uma volta pela cidade, até o meu apartamento — o meu, não o de Nikolai — pois queria oferecê-lo um brinde de verdade.
Contudo, para minha surpresa, meu noivo estava parado na frente do prédio, ao lado de um carro volvo xc60 vermelho, com um grande laço dourado no topo.
— Oi, Nick... — o cumprimentei envergonhadamente ao sair do carro. — Pensei que fôssemos nos encontrar na sua casa.
— Eu... — Nikolai pigarreou, alternando o olhar entre eu e o irmão. Nenhum dos dois se deu ao trabalho de se cumprimentar. — Eu queria fazer uma surpresa. — ele apontou para o carro vermelho. — É um presente... pela carteira de motorista.
A única reação que tive foi de sorrir de orelha a orelha para meu noivo, admirada e comovida pelo presente.
— Nick... Você não precisava.
— Tudo pela minha futura senhora Tarasova. — ele sorriu, e eu me aproximei para beijar seus lábios.
— Obrigada.
— Sem querer atrapalhar os pombinhos... — Dimitri nos interrompeu. — Mas acho que já vou indo.
— Pegue esse carro. — falou Nikolai, jogando para ele as chaves do carro que eu dirigira até ali, e colocando o outro braço ao redor do meu pescoço.
— Obrigado. — desse modo, ele se voltou para mim, atravessando a minha alma ao me olhar, como sempre fazia. — Parabéns de novo, Elaine. Por favor, não atropele ninguém na rua, ou vão culpar seu instrutor. — zombou.
— Vai ser muito difícil, mas vou tentar. — ironizei. — Obrigada de verdade. Por tudo.
Dito isso, Dimitri acenou com a cabeça para mim, depois para o irmão, e saiu.
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gente ele deu um carro pra ela não tem como ser #teamdimitri depois disso
amo meu sugar daddy nikolai 🥰❤️🤑
eai gente como vcs estão?
o que fariam se ganhassem na loteria?
beijosss e até o próximo capítulo!
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