Capítulo 31

A risada sonora dela, seguida de algumas sacolejadas de cabeça e um inspirar profundo para recuperar o ritmo de respiração tinham um contraste estranho com as faces sérias, minha e de meu tio.

— Mãe — falei e engoli saliva. — Por favor.

— Vocês dois armaram direitinho pra mim. — Ela secou os olhos. — Quase acreditei que poderia ser verdade.

— É verdade — meu tio disse.

— Não. Não é, John. Eu não vou cair nessa — ela insistiu.

— Mãe, eu estou grávida! — Aumentei o tom da minha voz e ela parou de rir.

— Co-como assim, minha filha? — Sua fala estava trêmula. — Não, você não está grávida. Eu... Eu...

— Eu sei que é um choque muito grande. Mas aconteceu. Por imprudência minha, mãe.

— Yolanda... Quando você descobriu isso, minha filha?

— Faz umas semanas. Mas eu estava com medo. — Abaixei o olhar.

— Medo de quê? — indagou.

— Da sua reação. Da decepção que teria comigo e...

— Ei — Ela esticou a mão e tocou a minha, que estava sobre a mesa —, um filho jamais vai ser uma decepção pra mim, minha filha. O que me deixa chateada é que você tenha sentido medo de me contar. Eu quero te ajudar. — Sorriu de maneira afetuosa. — Você está se sentindo bem?

Eu fiquei calada, meu tio ainda me encarava com aquele olhar curioso. Não se intrometeu na conversa, mas eu sabia que ele queria perguntar.

— Estou, mãe. — Olhei para John. — Tio, sabe a nossa conversa de ontem?
Minha mãe também virou os olhos na direção dele. John assentiu.

— Eu acho que preciso de você... — Respirei fundo — Pra fazer uma coisa. Tem a ver com a pergunta que você me fez.

— Sobre o pai do bebê? — ele inquiriu.

Fiz que sim, movimentando a cabeça.

— Vai me contar quem é?

— Vou. Mas pega a chave do carro. Preciso que me leve a um lugar, por favor.


O cheiro de gasolina estava me embrulhando o estômago, o pequeno ser que habitava em mim já dava sinais mais fortes de sua existência. Como se já não bastassem os sentimentos ruins que tinha, ainda era obrigada a lidar com todas aquelas sensações horríveis.

— Por que não quis que sua mãe viesse? — John trocou de marcha e olhou para mim, por um instante.

— É uma coisa que eu gostaria de fazer com o meu pai, sozinha, se ele estivesse vivo — respondi.

Meu tio pigarreou, notei sua inquietação. Talvez eu não devesse ter falado de seu irmão falecido. Não era um bom momento.

— Além do mais, eu acho que você pode falar com ele primeiro. Eu não tenho coragem. Aí eu entro na conversa quando o senhor já tiver encaminhado tudo.

— Sabe que é você quem vai ter que contar sobre o filho de vocês, não é?

Anuí.

— Eu só quero ter uma força — falei. — Eu não sei como ele vai reagir.

Engoli seco, estávamos lá, enfim. Olhei para o lado de fora. O tempo estava abafado e parecia que ia chover. Quase ninguém andava pela calçada larga do bairro, estavam todos no conforto de suas casas. Era como eu gostaria de estar também, mas ele merecia saber da criança. Não por mim. Mulheres são fortes, e eu sei que se eu precisasse, meu tio e minha mãe me ajudariam. Mas precisava fazer aquilo por ele, pelo bebê, e pela relação que eles poderiam ter.

Me arrependi, por um instante, de não ter levado a minha mãe conosco. Ela saberia como me confortar naquele naquela hora. Eu sabia que com certeza ela estava aflita em casa, rezando e pedindo a Deus para que tudo ficasse bem. Todavia, eu tinha que enfrentar aquilo, tinha que ser capaz.

— Chama ele — disse ao meu tio, enquanto encarávamos a casa.

— Você vai comigo, Yolanda — John ordenou. — Eu vou te ajudar, mas você precisa enfrentar isso. Sou o seu apoio, não as suas pernas.

Tinha que concordar. Por mais que doesse. Por mais que eu temesse. Descemos do veículo e caminhamos juntos até a pequena varanda da frente. Era possível ouvir o barulho do lado de dentro da casa. Eram passos, uma vassoura em atrito com o chão e uma pá de lixo sendo escorada no piso.

John olhou para mim, depois segurou minha mão com força.

— Chama — disse ele.

Eu neguei. Meus olhos já estavam cheios de água.

— Eu não consigo — murmurei.

— Quem está lá dentro, Yolanda? — Ele arregalou os olhos.

— É o pai do meu filho.

— Você teve medo dele naquele dia?

— Não.

— Então por que teria agora? É a mesma pessoa. — John piscou para mim. — Chama.

Estiquei meu braço e fechei o punho. Suguei o ar ao meu redor e o devolvi ao exterior do meu corpo. Era como beijar uma nuvem carregada, prestes a despejar centenas de raios sobre a terra. Prendi o choro, não, eu não queria chorar.

Bati três vezes. O barulho da vassoura cessou.

— Calma — John sussurrou.

Foi o som cortante do giro da maçaneta que me fez perder o controle do meu próprio coração. A boca secou e as pernas bambearam.

A porta foi aberta devagar, tão vagarosamente que minha pulsação quase parou. Primeiro ele colocou o tronco para fora, para observar quem chamava, depois apareceu por completo.

— Oi — ele disse.

— A Yolanda precisa falar com você, Kalel.




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