Capítulo 13

Os seus olhos são desenhos perfeitos,
São como a água e o azul do céu.
Olhando sua face, não enxergo defeitos,
Entre a perfeição e a beleza você é o véu.

Para: Yolanda Morgan


Eu estava sentada naquele sofá marrom desgastado, com um copo de água nas mãos e o coração apertado. Nós quatro nos encarávamos de tempos em tempos, revezando entre um gole de água e um encarar constrangedor.

O que dizer a alguém que acabou de perder um filho? O que fazer se aquilo também me machucava?

— Você... Está bem? — Ophelia, mãe de Dominic e Derek, perguntou.

— Acho que bem não é a palavra — respondi e coloquei o copo de água sobre a mesinha de telefone, ao lado do estofado. — Agora eu estou tentando colocar minha cabeça no lugar, pensando no que vou fazer daqui pra frente. Afinal de contas, eles não iriam querer que eu estagnasse minha vida por causa disso.

Era mentira. A única coisa que eu tinha certeza é que não faria absolutamente nada de produtivo durante um bom tempo. Meu desejo era simplesmente deitar e dormir por um ano. Mas eu tinha certeza que, dizendo aquilo, pareceria mais forte e dessa forma faria com que os pais de Dom ficassem mais aliviados. Eles se preocupavam comigo demasiadamente.

— Derek — chamei sua atenção. — Eu acho que já vou embora — falei, não havia mais o que fazer naquela casa. Algumas poucas palavras e eu já me sentia em pedaços.

— Espera — Joseph, pai de Dominic pediu. — A Ophelia queria te pedir uma coisa.

— Pode dizer, dona Ophelia.

— O quarto do Dom, eu... Eu não sei o que ele gostaria de doar e o que ele iria querer outro fim. Só você o conhecia bem o bastante. Será que poderia me ajudar?

Eu juro por tudo que minha vontade foi sair correndo daquela casa e me enfiar embaixo do primeiro carro que aparecesse, estava entre a cruz e a espada, só eu poderia fazer aquilo e eu sabia que me afundaria em um buraco se prosseguisse. Mas eu deveria ajudar, não deveria?

— É claro. — Dei um sorriso fechado.

Ophelia e eu fomos até o quarto. Conforme ela girava a maçaneta eu sentia algo esmagar meu coração, como um sentimento muda de acordo com a situação... Já havia estado ali tantas vezes, entrado naquele quarto, dormido lá dentro, e naquele instante o simples fato de pensar em entrar já me causava náuseas.

Derek permanecia perto, seu pai preferiu não se juntar a nós, e fez bem, eu também não passaria por aquilo se tivesse alguma escolha.

O cheiro chegou a mim antes da imagem, e as lágrimas pareciam forçar meus olhos para serem libertas. Podia quase enxergar a imagem de meu melhor amigo, sentado na cama.

Fugi de uma situação para me enfiar em outra parecida e quiçá ainda mais dolorosa. A presença de Dominic ainda era muito marcante, em todos os pôsteres do Three Days Grace pendurados na parede, em cada espaço bagunçado daquele quarto meio escuro. Em cada lápis jogado sobre a escrivaninha. Sim. Ele estava ali em espírito e eu não sabia como lidar com aquilo.

— Querida, eu... Vou separar as roupas dele para uma instituição de caridade. Dê uma olhada no resto das coisas, vê o que era muito pessoal dele, pra eu separar e guardar ao invés de doar.

Assenti e engoli seco.

— Já volto, vou ali buscar alguns sacos — ela disse e saiu, me deixando sozinha com Derek.

Eu não suportei, escorei meus braços na mesa e chorei. Ele percebeu como eu estava abalada e colocou as mãos em minha cintura, como se sustentasse meu corpo para não cair.

— Me desculpa — pedi, secando algumas lágrimas. — É que ele... — Minha voz estava fanha. — Ele gostava tanto daqui. Era o cantinho dele, todas as vezes que eu ficava triste, era aqui que ele me trazia pra ficar melhor. Era como se esse lugar fosse um universo paralelo, onde nada nos afetava. Agora é só um monte de lembrança vazia.

— Eu imagino como está sofrendo, Yolanda. Também não é nada fácil pra mim, entrar aqui, lembrar dele. — Os olhos de Derek passearam pelo quarto e Ouvimos os passos de Ophelia.
Tentei me recompor, algo que não surtiu muito efeito. Mas todos fingíamos estar bem, o choro já era algo comum, como respirar.

— Vou levar esses livros aqui lá para o quarto onde eu estou — Derek informou. — Talvez consiga ficar com algum deles, quero ter alguma coisa do meu irmão.

Ele pegou a pilha de livros ao lado da cama, e mais um, pequeno, que estava entre o colchão e o estrado.

— Dona Ophelia, eu acho que daqui, ele gostaria de doar tudo. Eu só quero uma coisa desse quarto, a senhora me permite pegar?

— Fique à vontade, Yolanda — ela disse enquanto colocava as roupas dentro das sacolas.

Eu dobrei o cobertor azul que estava sobre a cama e enfiei em uma das bolsas. Aquele pedaço de tecido me trazia muitas recordações, coisas que eu não queria esquecer. Meu melhor amigo sempre dizia que aquele cobertor era nossa capa da invisibilidade, onde nada era capaz de nos alcançar ou nos ferir. E eu acho que eu precisava daquela magia na minha vida para conseguir superar sua partida.

Assim que acabamos, eu dei um abraço em Ophelia e deixei a casa. Coloquei o cobertor na cesta da bicicleta e já estava pronta para ir embora, mas Derek me impediu.

— Ei! — ele chamou. — Posso ir contigo até à praça? Vou pegar meu carro.

— Claro. Só estou com um pouco de pressa. — Olhei para o relógio de pulso. — Meu tio disse pra eu não voltar tarde, e já é quase noite.

Ficamos muito tempo arrumando as coisas de Dominic, a hora voou.

— Se preferir, podemos ir os dois na bicicleta. Eu te carrego — ele disse.

— Ah, melhor então.

Desci do selim e ele foi para onde eu estava. Me ajeitei entre seu corpo, no quadro, e ele começou a pedalar. O ar batendo no rosto era uma boa sensação, por mais que por dentro eu estivesse a ponto de cometer uma loucura por tanta tristeza, momentos como aquele me deixavam menos melancólica.

Chegamos à praça, ele me devolveu meu veículo de duas rodas e nos despedimos com um abraço. Eu sabia que as línguas maldosas do bairro iriam usar aquela situação como fato verdadeiro para suas fofocas matinais. Em questão de dias eu tinha certeza que diriam que estávamos tendo um caso. Pouco me importei, quando não temos mais quem amamos ao nosso lado, as palavras das pessoas passam a ser apenas o que elas realmente sempre foram: apenas palavras das pessoas.
O que aquilo iria interferir em minha vida? Meu namorado confiava em mim e eu nele, e se o povo quisesse falar, que falasse. Nossa relação era forte o bastante para suportar burburinhos.

Pena que esse não foi o único problema que encontramos depois.

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