⠀ ⠀ ⠀ 𝟎𝟗. FLASHBACK

CAPÍTULO 09
── FLASHBACK.

OHIO, 20 ANOS ATRÁS

QUANDO O FIM DO DIA CHEGOU, ANDREI SE VIU APREENSIVO. Enquanto observava sua mãe se mover pelo quarto, ele se mantinha em silêncio. Eva guardava cada item que encontrava e que pertencia a eles, dentro de suas respectivas mochilas. Ela estava nervosa, aflita, era claro que a mulher deixava em cada movimento o quanto toda aquela situação a deixava tensa. Mikhail reunia suas próprias coisas em sua mochila, totalmente em silêncio.

Nenhum dos dois meninos queria ir embora. Andrei por ter se apegado aquelas pessoas e seu irmão por estar cansado de fugir mas, diferente do mais novo, Mikhail conseguia entender, mesmo que muito superficialmente, que aquilo era algo necessário. Eva não dava muitas explicações, mas tudo que dizia continha o máximo de informação que era capaz de dizer.

── Mamãe, por que não podemos ficar? ── Andrei perguntou, após ter se cansado de apenas observa-la. Aquela pergunta já estava pesando sobre ele a tanto tempo. ── Por que temos que ir embora novamente?

Eva parou abruptamente, de costas para Andrei, a poucos passos de conseguir guardar a blusa azul de seu filho dentro da mochila.

── Não faça perguntas idiotas, Andrei. ── Mikhail se intrometeu, com a voz em um tom rabugento. ── Ne bespokoyte nashu mamu seychas¹.

── Mikhail. Não fale assim com seu irmão. ── Eva o repreendeu. Suspirando pesadamente, ela deixou a blusa de lado e se aproximou do filho mais novo. Mikhail não disse nada, apenas prosseguiu com o que fazia. ── Sei que isso não é fácil, querido. Mas precisamos fazer isso.

── Por que? ── ele perguntou, enquanto Eva se abaixava até ficar em sua altura. ── Eu gosto tanto de Ohio...

── Eu também. ── ela sorriu tristemente para ele, passando a mão levemente pelos fios de cabelo dourados dele. ── Gosto dos dias de sol, de ver você andando de bicicleta com a Natasha... Gosto das pessoas que tivemos o prazer de conhecer. E é justamente por causa da proteção delas que precisamos ir embora agora.

Andrei abaixou a cabeça, seu olhar triste caindo para suas mãos em seu colo e para os dedos que brincavam um com o outro. Eva acariciou o lado do rosto dele, tentando passar qualquer tipo de conforto.

── Mas isso não vai durar para sempre, filho. ── Disse Eva, fazendo com que Andrei erguesse o olhar para ela. ── Eu prometo a você, não vamos fugir para sempre. Isso vai acabar um dia, vou fazer com que acabe.

Eva deu um beijo na testa do filho e o abraçou, tentando passar um pouco de conforto para ele. Quando se afastou, pediu para que se todos os dois se apressasem, não tinham mais tempo para ficar ali. Aquele era o momento de partir. Andrei e Mikhail colocaram suas mochilas nas costas, Eva ajeitou a alça de sua bolsa no ombro e os três desceram as escadas para o andar de baixo juntos.

Eles encontraram com Melina, Natasha e Yelena no caminho. Alexei ainda não estava em casa, porém deveria chegar logo. Eva sabia pouco do que eles estavam fazendo ali e não gostaria de saber mais. As duas mulheres se encararam, mas não disseram nada. Não havia nada que pudessem dizer, o melhor era manter o silêncio.

Na garagem, a mulher de cabelos loiros colocou suas coisas nos porta-malas. Sendo bem rápida para que ninguém fosse capaz de ter qualquer vislumbre do que havia ali dentro. Melina, Natasha e Yelena os acompanharam até lá, se despedindo brevemente de todos. Andrei ainda não tinha coragem de dizer adeus. Quando chegou o momento de encarar a garota de cabelos azuis, ele não conseguia agir sem se sentir perto de quebrar.

Natasha o puxou pelo braço e o abraçou fortemente. Andrei se viu cedendo e retribuindo ao ato dela, deixando algumas lágrimas rolarem pelo seu rosto e encharcar a blusa que a menina vestia.

── Vai ficar tudo bem, Andrei. ── garantiu ela com a voz baixa, ele sendo o único a conseguir ouvir o que tinha a dizer. ── A gente vai se ver novamente. Eu sei disso.

Quando eles se afastaram, os dois com os rostos molhados pelas lágrimas derramadas, algo se passou pela cabeça do menino. Ele correu rapidamente para o carro, pegou sua mochila e puxo de dentro mapa que Natasha havia ajudado a terminar. Mikhail e Eva já esperavam no carro, Yelena estava no colo de Melina e as duas observavam o que eles faziam. Assim que voltou novamente para Nat, Andrei partiu a folha ao meio, assustando a amiga.

── Por que você fez isso? ── ela perguntou, com um pouco de indignação no tom de voz, Natasha observou enquanto ele lhe entregava uma parte.

── Quando nos encontrarmos novamente, juntamos esse mapa. ── Disse Andrei. ── Não perca ele, de jeito nenhum. ── apertou a mão dela brevemente. ── Não se esqueça de mim, ok?

── Nunca seria capaz de uma coisa dessas. ── ela disse, sorrindo em meio as lágrimas. Os dois se abraçaram uma última vez.

Eles afastaram quando Eva chamou pelo nome do filho. Mesmo não querendo, Andrei soltou a mão de Natasha e caminhou até o carro, guardando sua parte do mapa em seu bolso. Se sentou ao lado de Mikhail nos bancos de trás e observou enquanto sua mãe ligava o veículo e começava a sair da garagem. Na porta, as três observavam enquanto eles iam embora. Andrei olhando pela janela para a garota uma última vez, sentindo seu coração se apertar mais ainda.

Cada vez que o carro se afastava, mais distantes elas estavam até desaparecerem. Quando olhou para frente novamente, ainda não conseguia parar de chorar. Abaixou a cabeça e olhou para as próprias mãos, as lágrimas pingando nas suas palmas abertas sobre seu colo. Mikhail se aproximou do irmão mais novo.

── Coloque o cinto, Andrei. ── Disse o rapaz, com a voz suave, respeitando a forma como ele se sentia naquele momento. Puxando o cinto de segurança, ajudou o garoto a colocar adequadamente. ── Isso vai passar. Logo, logo você se acostuma. ── Passou a mão pelos cabelos de Andrei, antes de retornar ao seu lugar.

Eva, que observava os filhos pelo retrovisor, apertou mais fortemente o volante. Seus olhos estavam cheios de água, mas ela segurou cada uma das lágrimas que tinha. A sensação que tinha era a pior. Se sentia a pior mãe do mundo, queria poder mudar toda aquela situação e garantir uma vida melhor aos dois. Enquanto continuava a dirigir e agora entrava na rodovia, tentava dizer a si mesma que aquilo era o melhor a se fazer mas uma parte de si mesma continuava pensando no garoto chorando nos bancos de trás. Continuava repassando o mesmo pensamento de que tudo o que estava fazendo era horrível.

Tentando afastar todos aqueles pensamentos tenebrosos, ela colocou uma das fitas de Andrei para tocar. Suas favoritas sendo as músicas do Van Halen e Eva pensava que assim conseguiria pelo menos acabar com aquele silêncio fúnebre. O garoto já não chorava mais, mantinha o olhar pela janela, observando a paisagem mudar, assim como Mikhail. Ele cantalorou brevemente a melodia de Love Walks In, perdido na própria mente.

O percurso continuou tranquilo por um tempo, apenas a música tocando e deixando o ambiente calmo. Tudo parecia bem, até Eva perceber algo pelo retrovisor do veículo. Ela permitiu a passagem de um carro que estava atrás dela, porém o mesmo continuava na mesma velocidade e ia para todos os lugares para o qual a mulher jogava. Tentando não deixar transparecer a preocupação, olhou para frente e continuou a acelerar. A velocidade aumentou gradativamente e isso chamou a atenção de seu filho mais velho.

── Mãe, o que está fazendo? ── Mikhail perguntou, ao se aproximar um pouco do banco do motorista. Olhou pela janela, para o carro atrás deles. ── Ty sledish' za nami²?

A fala do garoto atraiu a atenção de Andrei, que acabou ficando curioso.

── Quem está seguindo a gente? ── Ele perguntou, esperando que algum dos dois respondesse.

── Fiquem quietos e nos seus lugares. ── Ordenou a mulher. ── Mantenham a calma, não deve ser...

Antes que pudesse continuar, o veículo que os seguia acertou a traseira de seu carro com tudo, fazendo com que todos se assustarem com o impacto inesperado. Na avenida vazia, onde apenas os faróis poderiam guia-los naquela noite, Eva se viu fazendo o possível para manter o controle.

Ela acelerou, fazendo o possível para despista-lo porém não conseguiu chegar tão longe. Em um cruzamento, um outro veículo os acertou em cheio fazendo com que o carro saísse da estrada e capotasse até parar batendo em uma árvore. Preso pelo cinto, de cabeça para baixo, Andrei ainda tentava assimilar tudo que havia acontecido tão rápido. Sua visão estava turva, tudo parecia escuro e seus sentidos estavam todos bagunçados.

Quando sua mente começou a voltar, ele ouvia sua mãe chamando. Eva estava agachada do lado de fora do carro, seu rosto com sangue assim como várias partes de suas vestes. Ela estava ao lado de Andrei, fazendo o possível para soltar o cinto dele, mesmo com todo o seu corpo doendo.

── Vamos, querido. Precisamos sair daqui. ── ela disse, com a voz quebrada. ── Não temos muito tempo...

── Мãe... ── Disse Andrei, assim que foi puxado para fora do veículo. Ele olhou para o banco ao seu lado, o lugar vazio. ── Cadê o Mikhail?

── Eu não sei... ── ela disse, então virou o menino para si. ── Andrei, me escute. Preciso que você faça algo por mim... Ok? Preciso que você saía daqui agora.

── O q-que? Mas... ── Gaguejou o Andrei.

── Me escute, filho. Você precisa me escuta! ── Eva o segurou pelos ombros. ── Fuja daqui, vá para bem longe. Mude seu nome, viva uma outra vida, seja outra pessoa. Se esqueça de mim e do seu irmão. N-não... Não importa o quão difícil seja fazer isso... Apenas se salve, ok?

── M-mas... Por que você não vem comigo? ── ele perguntou, com a voz chorosa. ── Eu não quero ficar sozinho, mamãe.

── Eu sei, eu sei. Querido, eu sei. Mas eu não posso proteger você, não posso nos salvar... ── respondeu Eva. ── Vou procurar por seu irmão, tentar encontrá-lo. Enquanto isso, precisa fugir daqui. Seja lá quem for que fez isso, ainda pode estar perto. Faça o que estou te pedindo e fuja daqui!

── Eu não posso...

── Sim, você pode Andrei! Você é meu filho e pode fazer isso! ── ela exclamou, apertando os ombros do filho brevemente. ── Você pode. Pode viver, pode ser melhor do que eu... Agora faça isso. Saía daqui. Agora, Andrei!

Ela o empurrou para a direção oposta, fazendo o possível para movimenta-lo enquanto ficava em pé. No porta-malas, Eva Somodorov puxou a espingarda que mantinha guardada ali dentro.

── Corra. Agora! ── exigiu Eva, olhando para o filho. ── Corra e não olhe para trás. Nem sequer pense em parar. Corra o máximo que puder!

Ele fez o que ela havia pedido, Andrei correu pela floresta enquanto chorava, correu o máximo que pode mesmo cansado, sangrando e com os pés doendo. Em nenhum momento sequer, olhou para trás. Nem mesmo quando ouviu o carro explodir ou quando o som de disparos ecoou pelo noite. Em nenhum momento ousou olhar para trás. Mesmo que doesse, Andrei não o fez.

⧗. TRADUÇÕES ━━
¹Não perturbe nossa mãe agora.
²Estão seguindo a gente?

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