Capítulo Quatro
Charles Griffin:
Acordei antes de Derick, e, por alguns minutos, me permiti observá-lo dormir. Sua cabeça ainda repousava sobre meu braço, e ele parecia tão tranquilo. Ele era realmente lindo, com os traços suaves do rosto iluminados pela luz suave que entrava pela janela. No entanto, o que mais me chamava atenção era a serenidade que ele exibia, algo raro nos últimos dias. Era como se, naquele instante, todos os problemas que o consumiam simplesmente não existissem mais. Eu sabia exatamente o que ele estava sentindo, pois já havia passado por algo semelhante.
Alguns dias atrás, soube que uma mulher havia ido visitá-lo no hospital. Não precisei que ele me dissesse quem ela era, pois os colegas de trabalho dele e até o pessoal da lanchonete do hospital já haviam comentado. Era a mãe dele. Eu não sabia como havia sido a conversa entre eles, mas desde aquele encontro, algo em Derick mudou. Meu namorado, sempre tão forte e determinado, parecia abalado de uma forma que eu nunca tinha visto antes. Cada dia que passava, ele se afundava mais em pensamentos sombrios, como se estivesse carregando um fardo impossível de suportar sozinho. Ver isso me despedaçava, e eu sabia que ele precisava de uma pausa, de um momento para respirar e se reconectar.
Eu não sabia como ajudá-lo a enfrentar os demônios do passado que aquela visita havia ressuscitado, mas estava decidido a tentar. Talvez, se pudéssemos fugir um pouco dessa realidade, só nós dois, ele pudesse relaxar e encontrar um pouco de paz.
Ele se mexeu suavemente, ainda meio preso ao mundo dos sonhos, antes de se virar para mim. Seus olhos, ligeiramente entreabertos, brilharam com uma leveza que não via há dias, e então, um sorriso suave começou a surgir em seus lábios, aquele sorriso que sempre fez meu coração disparar. Era um gesto pequeno, mas cheio de significado. Por um instante, parecia que o peso que ele carregava havia se dissipado, e ele estava apenas ali, presente, comigo.
Meus dedos deslizaram gentilmente por seus cabelos, e ele soltou um suspiro longo, como se finalmente pudesse respirar sem sentir o peso de tudo o que o rodeava. Aquele sorriso me deu esperança. Talvez, de alguma forma, juntos, pudéssemos encontrar um jeito de afastar as sombras que tentavam nos envolver.
— Bom dia, amor — sussurrei suavemente, minha voz ainda carregada com o calor do momento. Puxei-o delicadamente para mais perto, nossos corpos se encaixando de maneira natural, como se tivessem sido feitos um para o outro. Nossos rostos se aproximaram, e eu lhe dei um selinho suave e carinhoso, sentindo o calor dos seus lábios contra os meus, algo reconfortante e cheio de ternura.
Derick fechou os olhos por um breve instante, como se estivesse absorvendo cada segundo daquele gesto, e o leve sorriso que continuava em seu rosto me dizia que, por um momento, tudo estava bem. Eu queria que ele se lembrasse disso: do quanto o amava, do quanto ele significava para mim, e que esse amor fosse um farol para guiá-lo através da tempestade que o envolvia.
— Bom dia — ele respondeu, com a voz leve e um sorriso que irradiava felicidade. — Esse é o melhor jeito de acordar pela manhã, com certeza.
Havia algo em seu olhar que me encheu de alegria. Talvez fosse o alívio temporário da dor que ele vinha carregando ou simplesmente a presença do momento que compartilhávamos ali. De qualquer forma, a conexão entre nós parecia mais forte do que nunca.
— Ainda temos muito o que aproveitar aqui nessa cabana — murmurei, com um tom brincalhão enquanto o observava se sentar na cama, esticando os braços em um gesto despreocupado.
Ele me olhou com curiosidade, um sorriso preguiçoso nos lábios. Eu me inclinei um pouco mais perto e continuei:
— Mas, antes de mais nada, acho que deveríamos tomar um banho... depois de ontem à noite — minha voz ficou um pouco mais rouca, carregada de intenções. — E, quem sabe, fazer algo divertido no chuveiro, só para começar o dia de um jeito ainda melhor.
Derick riu baixinho, e a faísca em seus olhos me dizia que ele estava mais do que disposto a aceitar minha sugestão.
— Posso dizer que você é um homem safado — ele disse, rindo enquanto me lançava um olhar de pura provocação, aquele brilho travesso que só ele conseguia fazer.
Eu não pude evitar o sorriso que surgiu no meu rosto. Me inclinei um pouco mais para perto, sem perder a oportunidade de brincar de volta.
— E você adora isso — respondi com um tom baixo e malicioso, deixando meus dedos traçarem um caminho suave pela sua pele.
Ele soltou uma risada gostosa, o tipo de riso que fazia o ambiente inteiro parecer mais leve, mais feliz. A verdade é que, apesar de todas as coisas pesadas que ele vinha enfrentando, nesses pequenos momentos juntos, era como se o mundo ao nosso redor não importasse.
— Ok, acho que um banho divertido é exatamente o que a gente precisa agora — ele disse, se levantando da cama e me puxando junto, como se não quisesse perder um segundo do que estava por vir.
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Ele me enganou. Quando achei que iríamos levar a brincadeira adiante, ele apenas riu e me puxou para debaixo do chuveiro, onde acabamos tendo um momento mais suave e íntimo, sem as expectativas que eu tinha em mente. Em vez disso, ficamos trocando carícias debaixo da água quente que escorria pelo nosso corpo, as gotas dançando sobre nossas peles enquanto ele me envolvia em seus braços. Não era o que eu esperava, mas, de certa forma, foi ainda melhor.
A água parecia lavar não só a tensão física, mas também os pensamentos pesados que pesavam sobre nós. Cada toque seu era gentil, quase como se quisesse me dizer, sem palavras, o quanto aquele momento de paz era importante para ele. E ali, sob o chuveiro, envoltos no calor da água e na intimidade silenciosa que compartilhávamos, percebi que às vezes, o simples fato de estar juntos, conectados de uma forma tão profunda, era tudo de que precisávamos.
Ele encostou sua testa na minha, e ficamos assim por um longo tempo, sem pressa, apenas sentindo o conforto um do outro. As palavras não eram necessárias. Tudo que importava estava ali, no silêncio confortável das nossas carícias, no calor dos nossos corpos e no fato de que, de alguma maneira, estávamos nos curando, juntos.
Enrolados nos roupões felpudos que encontramos ali, seguimos para o quarto, sentindo o conforto do tecido quente contra a pele. O ambiente estava quieto, e só o som suave de nossos passos preenchia o espaço. Quando chegamos lá, apontei para uma cômoda ao lado da cama.
— Eu vim alguns dias antes e trouxe algumas roupas pra mim e pra você — falei, sorrindo de leve enquanto me abaixava para pegar nossas roupas que estavam espalhadas pelo chão. A lembrança da noite anterior passou pela minha mente, trazendo um calor agradável que me fez sorrir mais largo.
Ele me olhou com uma expressão mista de surpresa e gratidão, seus olhos se suavizando ao entender que eu já havia pensado em tudo. Era um daqueles pequenos gestos que, para mim, faziam a diferença, mostrando que eu queria cuidar dele, mesmo nas menores coisas.
— Sempre um passo à frente, né? — ele disse, com um sorriso cansado, mas cheio de carinho.
— Alguém precisa pensar nos detalhes — brinquei, entregando as roupas dobradas com cuidado.
Ele pegou as roupas com um olhar terno, e por um momento, o silêncio entre nós foi confortável, como se tudo estivesse exatamente onde deveria estar. Eu sabia que, embora as coisas não estivessem perfeitas, estávamos caminhando juntos, e isso era o que mais importava.
— Você lembra o que eu disse sobre meus pais? — ele perguntou, enquanto se sentava na cama, seus olhos carregando uma mistura de emoções que eu conhecia bem. Apenas assenti em silêncio, sentindo o peso do que estava por vir. Ele respirou fundo antes de continuar, os dedos mexendo nas roupas que eu havia entregado, como se precisasse de algo para se concentrar. — Sobre como eles me descartaram... — ele fez uma pausa, a dor em sua voz mais evidente. — Depois de tudo o que aconteceu, depois de eu ter sido humilhado e usado naquele evento da empresa do meu pai. Eles nem se importaram em me proteger ou em me apoiar quando eu mais precisei. E agora, minha mãe veio me ver — ele olhou para o chão, como se ainda estivesse tentando processar as palavras. — Ela disse que meu pai e ela estão arrependidos... depois de tudo o que me disseram.
O silêncio que seguiu era pesado, denso com a dor que ele carregava. Eu podia ver o conflito em seus olhos, o turbilhão de sentimentos que aquela visita havia provocado. Parte dele queria acreditar, queria se agarrar a qualquer sinal de reconciliação. Mas a outra parte... a outra parte estava ferida, guardando as cicatrizes das palavras duras e do abandono que ele sofreu.
Me aproximei e sentei ao seu lado na cama, estendendo a mão para segurar a dele.
— E o que você sente sobre isso? — perguntei com suavidade, querendo que ele soubesse que não precisava enfrentar isso sozinho. Eu estava ali, disposto a ouvi-lo, a apoiá-lo, independentemente da decisão que ele tomasse.
Ele apertou minha mão, e pude sentir a tensão em seus dedos.
— Eu não sei — respondeu, a voz mais baixa, quase um sussurro. — Parte de mim quer perdoá-los, quer deixar isso para trás. Mas outra parte... outra parte ainda está magoada. Como se, por mais que eles estivessem arrependidos agora, o que eles fizeram ainda estivesse aqui... dentro de mim.
Eu queria dizer a coisa certa, algo que aliviasse a dor, mas sabia que palavras, por si só, não curariam feridas tão profundas. Então, ao invés disso, apenas fiquei ali ao seu lado, deixando que ele soubesse que não precisaria enfrentar isso sozinho.
— Sei que meu pai fez aquilo pensando que era algo que qualquer pessoa faria sem pensar muito — ele continuou, sua voz carregada de mágoa e frustração. — Afinal, nunca fomos muito próximos. Sempre foi assim, uma relação distante, fria. Mas agora... agora minha mãe disse que eles investigaram, descobriram o que realmente aconteceu e querem meu perdão. Só que isso não muda o que aconteceu três anos atrás. Não muda o fato de que, naquele evento, quando eu mais precisava deles, eles me culparam.
Ele parou por um momento, a dor em seus olhos mais intensa, como se as memórias ainda fossem feridas abertas que não tinham cicatrizado completamente.
— Sabe o que é pior? — ele perguntou, a voz embargada de indignação. — As provas estavam bem na frente deles. Qualquer um que quisesse realmente ver a verdade teria percebido. Mas, em vez disso, eles preferiram acreditar nas mentiras daquele acionista idiota que estava roubando a empresa. E eu... eu fui o bode expiatório. Fui jogado debaixo do ônibus, acusado, humilhado... E o único que ficou ao meu lado foi meu tio Erick. Ele foi a única pessoa que acreditou em mim, que me defendeu quando ninguém mais quis.
Sua voz quebrou no final, e eu podia sentir o peso de cada palavra, de cada lembrança dolorosa que ele estava desenterrando. O sentimento de traição era palpável, e eu sabia que o simples pedido de perdão dos pais dele não seria suficiente para apagar toda aquela dor.
— Eu entendo — sussurrei, apertando sua mão com mais força, tentando transmitir meu apoio sem invadir o espaço dele. — O perdão não é algo que se possa pedir e receber de imediato. Eles precisam provar que realmente mudaram, que enxergam o erro que cometeram. E mesmo assim, você não precisa perdoá-los só porque eles pedem. Isso tem que vir de você, no seu tempo, quando e se você estiver pronto.
Ele respirou fundo, como se estivesse tentando absorver minhas palavras, e então assentiu lentamente. Sabia que o caminho para curar aquelas feridas seria longo e incerto, mas eu estava disposto a caminhar ao lado dele, não importa quanto tempo levasse.
Ele permaneceu em silêncio por um momento, o olhar fixo em algum ponto distante, enquanto processava tudo o que tinha dito e o que ainda precisava lidar. A expressão em seu rosto era uma mistura de cansaço e tristeza, mas também havia algo mais — uma determinação silenciosa, como se estivesse começando a perceber que não precisava carregar aquele fardo sozinho.
— Eu não sei se algum dia vou conseguir perdoá-los — ele finalmente falou, sua voz baixa, quase em um sussurro. — Acho que, no fundo, parte de mim quer... mas a outra parte... ainda está tão machucada. Eu só... não sei se consigo deixar isso para trás.
Me aproximei mais, sentindo a necessidade de estar ao lado dele, de mostrar que eu estava ali, presente, pronto para ajudá-lo a atravessar essa tempestade, mesmo que ele não soubesse o que fazer a seguir. Minha mão deslizou suavemente sobre a dele, e nossos dedos se entrelaçaram, formando uma conexão silenciosa que dizia mais do que qualquer palavra.
— E você não precisa saber agora — falei suavemente, meus olhos encontrando os dele. — Ninguém pode te apressar. Você tem o direito de se sentir assim, de demorar o tempo que precisar para curar. Eu estarei ao seu lado, em cada passo, seja qual for a sua decisão.
Ele virou o rosto na minha direção, e por um instante, pude ver algo suavizar em seu olhar. Uma pequena centelha de esperança, talvez. A mão que segurava a minha apertou levemente, e ele se aproximou, encostando sua cabeça no meu ombro. Ficamos assim, em um silêncio confortável, enquanto a luz suave do dia iluminava o quarto ao nosso redor.
— Obrigado — ele sussurrou, a voz rouca de emoção. — Por estar aqui. Por sempre estar aqui.
Sorri, acariciando seu cabelo com a outra mão, sentindo o calor e a proximidade entre nós. — Sempre estarei, Derick. Não importa o que aconteça.
E naquele momento, envoltos no silêncio da cabana, soubemos que, apesar de todos os desafios, estávamos mais fortes juntos. As feridas levariam tempo para cicatrizar, mas enquanto tivéssemos um ao outro, o caminho à frente parecia um pouco menos solitário. E, de algum modo, isso já era suficiente para começar.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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